Os contratos empresariais, sua relação com a atividade empresária, com o Direito Empresarial e o uso da AED como elemento hermenêutico - Por João Carlos Adalberto Zolandeck

25/01/2018

Em vários artigos publicados na Coluna Empório do Direito tratamos de alguns contratos empresariais típicos e atípicos, onde tivemos a oportunidade de avaliar algumas características que lhes são essenciais e a repercussão positiva da utilização da Análise Econômica do Direito (AED).

Todavia, antes de avançar sobre outros contratos empresariais em espécie, é fundamental trazer a lume os fundamentos de base para interpretá-los de maneira mais adequada a fim de dar efetividade às relações entre empresários.

Obviamente que os contratos empresariais decorrem da lógica da atividade empresarial e são cotidianamente firmados para dar vida à empresa, revelando-se fundamental não apenas dar destaque às características que lhes são comuns, mas também sobre o direito a ser aplicado para a melhor concretização dos objetivos particulares, em equilíbrio com os objetivos-fim da Sociedade Brasileira.  

Paula Forgione esclarece que os contratos empresariais são elevados a uma categoria autônoma, pois possuem diferenças marcantes em relação aos contratos de consumo e os contratos civis. Diz que “o diferenciador marcante dos contratos comerciais reside no escopo de lucro de todas as partes envolvidas, que condiciona seu comportamento, sua vontade comum e, portanto, a função econômica do negócio, imprimindo-lhe dinâmica diversa e peculiar”[1].

A Autora antes citada tem-se posicionado com frequência sobre a proposta de releitura do direito empresarial como um todo, a partir da teia de contratos que a empresa agrega e forma o seu relacionamento, seja em decorrência de contratos empresariais, civis ou consumeristas, pois a empresa está em constante relacionamento com os clientes/consumidores (pessoas físicas ou jurídicas), fornecedores, enfim, outras empresas.

Cabe ressalvar, desde logo, que o CDC tem sido aplicado, de forma extensiva ou ampliativa, em um universo de relações civis, comerciais e consumeristas, muitas vezes, equivocadamente. É evidente que, diante de um contrato de consumo, formado a partir da relação entre consumidor e fornecedor, a aplicação é ampla e irrestrita, especialmente quando da adoção da teoria finalista mitigada ou maximalista, mas o mesmo não ocorre nos contratos interempresariais.

É bom ponderar que a empresa também pode ser consumidora ou fornecedora e participar de contratos de consumo, oportunidade em que poderá ter, em seu favor ou desfavor, as regras do CDC, mas isso não torna o CDC aplicável aos contratos interempresariais, que partem, na essência, de interesses privados vinculados ao negócio empresarial, ao mercado e ao lucro, pressuposto para a continuidade da atividade empresária.

Aplicar o CDC significa submeter o pacto a um controle Estatal muito maior, onde as regras legais de ordem dispositiva não são transacionáveis, sendo, portanto, de observação obrigatória. Por essa razão a ressalva é pertinente, cujo objetivo é evitar a aplicação despropositada do instituto consumerista onde ele não tem lugar.

Falar sobre o direito empresarial ou contratos empresariais preocupa sobremaneira o escritor, diante das repercussões e das variáveis decorrentes da atividade empresária frente ao universo de situações que decorrem das relações de que o empresário participa no seu dia-a-dia. São as características dessas relações e dos sujeitos que submeterão a análise do caso concreto a este ou àquele ramo do direito.

Marcia Carla Pereira Ribeiro e Eduardo Oliveira Agustinho, ao tratarem sobre a constitucionalização do direito e a influência do neoconstitucionalismo no âmbito empresarial, concluem que “os efeitos da constitucionalização são mais presentes na relação entre o Estado e os empresários, âmbito da disciplina do Direito Econômico, permanecendo, o tratamento das relações empresariais privadas, no âmbito do Direito Empresarial, mais distantes da irradiação das normas constitucionais[2]”.

De qualquer forma e com muita propriedade, não descartam que o direito constitucional interfere também nos interesses de ordem privada para alcançar não apenas os princípios de funcionamento da ordem econômica, mas também os princípios-fim, como diretrizes.

É o artigo 170 da Constituição da República que traz os fundamentos da Ordem Econômica, vinculados aos princípios da valorização do trabalho, da livre iniciativa e aos objetivos de existência digna e de justiça social.

O Estado, quando se mostra mais visível e regulador, traz para aquela relação jurídica a influência mais ativa de outros ramos do direito, como o Consumerista para as relações de consumo e o Direito Econômico nas relações entre o Estado e o empresário[3]

O que resta então ao Direito Empresarial? Nas palavras dos referidos Autores, todas as demais questões em que os empresários estabelecem relações entre si. Esse é o ponto fulcral deste pequeno texto, no sentido de que interessa, sim, ao Direito Empresarial (e a ele estarão submetidos) os contratos empresariais, nos quais, de lado a lado, o objetivo do negócio jurídico é o lucro, como antes ficou assente.

É nessa perspectiva que se defende a utilização máxima das regras de direito comercial e empresarial para solucionar conflitos decorrentes das relações entre empresários, onde há pouca ou nenhuma influência de outros ramos do direito, justamente para que se fortaleça cada vez mais a ideia de paridade entre os sujeitos envolvidos, valendo-se, eles, muito mais das definições lançadas nos contratos e da prevalência do seu conteúdo.

Diante da pertinência do texto citado, cabe utilizar a mesma base hermenêutica, igualmente defendida em artigos anteriores na Coluna Empório do Direito, reiterando-se, portanto, a importância do elo ou do diálogo entre o Direito e a Economia, não apenas para a elaboração e interpretação de regras de Direito Empresarial, mas também para subsidiar a solução de conflitos e a construção de uma Ordem Econômica mais justa.

O apoio a este raciocínio também emerge dos Autores já citados, ao mencionarem que “o diálogo entre o Direito e a Economia não pode ser negligenciado. Como visto, o diferencial entre estas ciências pode ser dado pela compreensão de que, enquanto a Economia prioriza resultados, o Direito prioriza valores”[4].  

Esse é o elemento hermenêutico para uma boa interpretação dos contratos empresariais, ou seja, utilizar-se da AED não apenas para interpretar, mas para aplicar o direito com mais eficiência. “Quando a eficiência e a justiça coincidem, tem-se o ponto ‘ótimo’. Quando não, é preciso buscar compreender ambas para poder melhor conjugá-las”[5].

Conclui-se com a ideia de que as relações entre empresários são tratadas, submetidas e resolvidas pelo Direito Empresarial, onde se particularizam relações genuinamente privadas, cujas repercussões são apresentadas e sentidas pelos particulares e pelo mercado, sem descuidar dos objetivos-fim da Sociedade Brasileira, pelo viés da leitura constitucional do Direito Empresarial.

Como visto, a tese da releitura do direito empresarial a partir dos contratos é coerente, pois a vida da empresa depende de seus laços e de sua teia relacional, cujos vínculos se estabelecem a partir de sujeitos e se aperfeiçoam pelo conteúdo e objeto, enquanto que a Análise Econômica do Direito, caracterizada pelo diálogo entre o Direito e a Economia, constitui-se de importante base hermenêutica de apoio ao Direito Empresarial para a interpretação dos contratos que a ele se submetem, ressalvados os conflitos entre a eficiência e os valores, cuja avaliação para além da AED somam-se às teorias da justiça.  

 

Notas e Referências:

[1] FORGIONI, Paula A. Contratos empresariais: teoria geral e aplicação. 2ª. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016, p. 37-38.

[2] RIBEIRO, Marcia Carla Pereira, e OLIVEIRA, Eduardo Agustinho. Apontamento sobre a hermenêutica do direito empresarial constitucional a partir da análise econômica do direito. Anais do XIX Encontro Nacional CONPEDI realizado em Fortaleza – CE, 2010. p. 430.

(http://www.publicadireito.com.br/conpedi/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3582.pdf).

[3] RIBEIRO, Marcia Carla Pereira, e OLIVEIRA, Eduardo Agustinho. Obra citada, p. 430-431.

[4] RIBEIRO, Marcia Carla Pereira, e OLIVEIRA, Eduardo Agustinho. Obra citada, p. 437.

[5] RIBEIRO, Marcia Carla Pereira, e OLIVEIRA, Eduardo Agustinho. Obra citada, p. 437.

 

Imagem Ilustrativa do Post: 4812114571_0305106999_o // Foto de: aiesecgermany // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/aiesecgermany/6108752101

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura