O workfare state e a (i)lógica da privatização dos estabelecimentos prisionais

25/03/2015

Por Anthony Thiesen - 25/03/2015

 1. Introdução

Neste artigo abordaremos o fenômeno da privatização dos estabelecimentos prisionais sob a perspectiva criminológica e social da passagem do welfare para o workfare state, com origem no modelo neoliberal norte americano, amplamente disseminado por todo o mundo. Situamos esse momento histórico como ponto de partida para a (re)legitimação da lógica punitivista, sustentada por objetivos declarados e não declarados epistemologicamente contraditórios e sociológica e criminologicamente falhos. Aborda-se aqui como o jogo de objetivos declarados e não declarados funcionam nesse contexto para tentar sustentar a lógica da privatização do que determina-se como monopólio estatal: o direito de punir e o uso da força.

 2. Do Welfere ao Workfare State e a lógica neoliberal

Boaventura de Sousa Santos assim define o “Estado Social” ou “Estado Providência”:

“(...) os capitalistas renunciam a parte da sua autonomia enquanto proprietários dos fatores de produção (aceitam negociar com os trabalhadores temas que antes lhes pertenciam em exclusividade) e a parte dos seus lucros no curto prazo (aceitam ser mais fortemente tributados), enquanto os trabalhadores renunciam às suas reivindicações mais radicais de subversão da economia capitalista (o socialismo e, para o atingir, a agitação social sem condições face à injustiça da exploração do homem pelo homem).”

Reagan (EUA) e Thatcher (RU) foram os rostos do neoliberalismo. A base dessa política é uma cruzada contra o Estado Providência por meio de um “menos Estado” econômico e social, compensado por um “mais Estado” policial e penitenciário; leia-se: a dessocialização do trabalho assalariado, o recuo da proteções coletivas, a “mercantilização” das relações humanas e a (in)consequente naturalização do crime como produto de um criminoso definido pela posição que ocupa na estrutura das relações de competição, subordinação e dependência social, numa mistura capitalista de Lombroso e Ferri.

Define Vera Andrade que para a criminologia positivista “a criminalidade é um meio natural de comportamentos e indivíduos que os distinguem de todos os comportamentos e de todos os outros indivíduos”. O punitivismo neoliberal opera-se na mesma ordem, opondo os indivíduos das consideradas classes inferiores, os “criminosos”, de forma a distingui-los e segregá-los da sociedade considerada “normal” dos indivíduos trabalhadores e não criminosos (criminalizados).

Para além do controle social, a influência dos Estados Unidos opera-se por meio da economia, agravando aquele. Constata-se sua operacionalização através do crescimento da economia do sistema carcerário no setor privado e da “sabotagem intelectual das noções e das políticas keynesianas” (WACQUANT). O objetivo é mascarar e conter, através da maior presença estatal no campo punitivo, as consequências danosas da desregulamentação do trabalho assalariado e da deterioração da proteção social no ambiente “inferior” social, que passa a ser vigiado e punido com cada vez mais energia.

Esse boom punitivo em âmbito mundial se deu, e ainda se dá, através do que Wacquant chama de uma “operação planetária de marketing ideológico” nos campos político-burocrático, econômico, midiático e “intelectual”. Quanto a este, traveste-se de intelectual e científico qualquer “teoria” ou política que compactue com os interesses da utopia neoliberal punitivista. Para a disseminação dessas ideias, recorre-se ao financiamento de uma elite econômica e social – com interesse na operacionalização da lógica – com sua distribuição massiva no meio.

O raciocínio individualista neoliberal, além de trazer benefícios unilaterais para um pequeno grupo e de esconder os reais propósitos lucrativos e de dominação de classe, almeja desvalorizar o ponto de vista sociológico, “acusando-o” de desresponsabilizante. Este cenário desvia a atenção das desapropriações coletivas em matéria de equipamento urbano, escolar e econômico.

2.1. O modelo de “tolerância zero”

O modelo de maior (in)sucesso implantado sob a ótica neoliberal punitivista é a reorganização do trabalho policial empreendida por Willian Bratton em Nova York, conhecido como “tolerância zero”. Além de inserir parte da população, “ociosa”, em seu locus no sistema capitalista, o que veremos mais a diante, há aqui a intenção não declarada de incitar para depois, declaradamente, refrear o medo das classes superiores, votantes. Isso se dá através da perseguição aos pobres nos espaços públicos e a punição de todo e qualquer delito por eles praticados. É um ciclo criado de alimentação do próprio medo ao qual se atribui a necessidade de tal política de forma a isentar o Estado de suas responsabilidades na gênese social e econômica, chamando a responsabilidade individual do subproletariado.

O objetivo econômico não declarado de fomento da indústria carcerária aparece quando do questionamento acerca do aumento da população encarcerada por consequência da “tolerância zero” surge a resposta: basta, então, construir novas prisões. É nesse estágio de evolução da retórica neoliberal que entram os lucros do investimento feito pelas empresas da área da segurança na propagação dos ideais pseudocientíficos criados para justificar o “vigiar e punir” dos pobres.

Lombroso, Ferri e a era segregacionista são ressuscitados na operacionalização do “tolerância zero”. A experiência mostrou que a vigilância e punição se deram com relação a um estereótipo baseado no vestuário, aparência, comportamento e cor da pele. Cria-se um fosso de desconfiança “entre a comunidade afro-americana e as forças de ordem, o que lembra as relações que mantinham na era segregacionista” (WACQUANT). Em todos os estágios do processo de criminalização há uma nítida e constante vigilância de uma parcela da população. O excesso de apreensões pela simples desconfiança vai contra, inclusive, o próprio discurso garantista, presente para legitimar o agir do aparelho punitivo estatal.

Outro efeito colateral da política criada em Nova Iorque é a sobrecarga dos Tribunais. Inicia-se um jogo processual penal diante da lentidão do deslinde das ações gerando falsas confissões em troca de redução da pena e dilações repetidas de prazo a fim de eventual anulação das acusações.  Apesar do concomitante aumento carcerário, observou-se que muitas prisões se efetivaram sem motivo judiciário, mas meramente perseguidor, externando o labelling approach[1].

2.2. O workfare

Observa-se que a passagem do welfare ao workfare se dá com a perseguição da massa “ociosa” previsto no plano capitalista como constituinte necessário das engrenagens, possuindo seu local marcado: mão de obra barata, não qualificada e sem perspectiva de sucesso/progresso econômico ou ”social”. O meio encontrado pelo Estado para trazer o grupo que sabotou o plano é a vigilância e punição. Para encobrir os reais objetivos, outra parcela, dominante economicamente e em nome do Estado, instaura o medo e a política de segregação de forma a justificar seus atos e conquistar o real objetivo de funcionamento da máquina capitalista.

 Do lado de fora dos muros das prisões, além de evitar a ajuda material aos pobres, o Estado passa a condicioná-la ao trabalho assalariado forçado, ignorando/omitindo os direitos sociais e trabalhistas. O pensamento neoliberalista atribui um fracasso ao Estado Social por não obrigar contraprestação a seus beneficiários. Passa-se do Estado-providência materialista para o Estado-punitivo paternalista.

(Não declaradamente) A técnica capitalista precisa dos pobres como mão de obra barata. As condições precárias e os baixos salários, no entanto, não compensam a participação voluntária dos mesmos no sistema. Para inseri-los no programa, que, repito, prevê e necessita de sua “participação”, o Estado declara que o não trabalho se dá pela incompetência social e imperícia moral dos pobres, tirando o problema da ótica socioeconômica e eximindo o Estado de responsabilidade sobre o âmago da questão. É a reafirmação da autoridade moral do Estado no momento em que ele próprio é atingido pela impotência econômica.

Pavarini explicita “a existênca de dois subsistemas teleológicamente orientados (...): o primeiro, ideológico, declara seguir a finalidade de ressocialização e se sustenta nas promessas da LEP e na gradual abertura do sistema em prol de alternativas à privação da liberdade; o segundo, eminentemente tecnocrático, é aquele dirigido aos ‘inimigos do momento’ (...) para os quais não se fala em ressocialização, mas simplesmente neutralização e incapacitação”. O objetivo de todo o sistema é a manutenção da ordem de classe atrelada à manutenção da ordem publica.

2.3. A expansão do modelo punitivista neoliberal

Independente da situação fática (que demonstrava a falha dos objetivos declarados do Estado-paternalista punitivista e o sucesso dos objetivos não declarados), “consegue se generalizar, com cada país tomando como pretexto o ‘sucesso’ dos outros na matéria para adotar um técnica de vigilância e ostensividade que, embora fracasse por toda parte encontra-se de fato validada em virtude de sua própria difusão”. (WACQUANT) (grifo nosso)

Nos países considerados “subdesenvolvidos” a implantação da (ir)racionalidade neoliberal é ainda mais violenta. As nações mais (?) desenvolvidas estabelecem (impõem) medidas de “ajuste estrutural” como forma de condição para a concessão de fundos internacionais, obrigando aqueles a incorporarem o modelo.

3. Dos Financiamentos às Privatizações

Viu-se que todo discurso montado e declarado (além de forjado) expandiu-se pelo globo em proporções astronômicas com ajuda, dentre outros, de empresas do ramo da segurança e do encarceramento. Essas obtiveram um crescimento exponencial de valorização na bolsa de valores, de forma a fomentarem cada vez mais o discurso oficial amparada pelo que Wacquant chama de pseudociência mais sintonizada com a problemática midiático-política.

O resumo da ópera é a instauração do medo, o ganho de votos na política e o fomento da economia carcerária com o aumento das intervenções privadas naquele que deveria ser um serviço de monopólio estatal.

“A chave da prosperidade norte americana, e a solução para o desemprego em massa, residiria numa fórmula simples, para não dizer simplista: menos Estado” (WACQUANT). Ao se referir a um “menos Estado”, Wacquant se refere à falta de intervenção estatal no que tange a políticas sociais e econômicas. Institui-se o trabalho assalariado como norma de cidadania através do workfare.

Essa nova configuração do Estado desenhada acima é a chave para entendermos a (i)lógica da privatização carcerária. Com o workfare busca-se, não declaradamente, ocupar toda a massa “ociosa”, necessária ao capitalismo. As prisões tem um papel fundamental de aglomerar as massas e inseri-las em um trabalho de baixo salário e baixa (sem) proteção trabalhista. Assim, a classe “inferior” da sociedade é obrigada a se submeter aos interesses e progressos econômicos da elite, dentro e fora dos presídios. Aí está o cerne do (in)sucesso do Estado punitivista e do crescimento vertiginoso das desigualdades, que serve de motor para o reinício do ciclo de segregação, criminalidade e generalização da insegurança social.

3.1. A criação de empregos

Sob a perspectiva do número de pessoas trabalhando o modelo neoliberal punitivista é um sucesso. No entanto, não há promoção proposital de qualificação para que a mão de obra continue barata e sem proteção e que haja manutenção do status inferior atribuído à parte da população. No ciclo prisão/”liberdade” de (sobre)vida dos pobres, o Estado é aplaudido em seu discurso midiático/político, quem sai colucrando é a indústria do encarceramento e a máquina da desigualdade prevista no capitalismo continua a todo vapor.

3.2. A instrumentalização empresarial

Para entendermos o tema da privatização dos presídios e seus reais propósitos, comecemos com uma noção simples, mas fundamental. Toda empresa é regida por um objetivo: o lucro. Este, por sua vez, vem com o aumento da produtividade e diminuição dos custos.

A privatização é a outorga de serviço ou bem público de maneira definitiva e integral à iniciativa privada. Já nas Parcerias Público-Privadas (PPPs) a Administração Pública e a iniciativa privada trabalham em conjunto, sendo as atividades administrativas em sentido estrito executadas pelo poder estatal e as de execução material, atribuídas a entidades privadas. Com relação aos estabelecimentos prisionais, em amos os casos são realizados contratos em que o Estado repassa um valor “X” por preso e se obriga a manter “Y”% da capacidade do estabelecimento em troca do serviço.

Para justificar a implantação de tal modelo, utiliza-se (dentre vários) o discurso do corte de gastos. No entanto, trata-se de uma falácia de fácil desconstrução. Em consulta objetiva aos dados estatais, observa-se que o montante repassado “per capta” ao presídio sob iniciativa privada é muito maior daquele destinado aos presídios estatais. Se não bastasse, ao trabalhar sob a égide do lucro o estabelecimento busca o corte de gastos e, ao final, o “custo” real de um preso acaba sendo muito menor do repasse. Por consequência, um estabelecimento prisional de administração privada acaba custando mais caro aos cofres públicos.

O Estado (teoricamente) democrático de direito assume declaradamente a função de um direito penal mínimo. Por consequência conclui-se que seu objetivo é diminuir as punições, a iniciar-se pelas mais severas. Comprometer-se com a iniciativa privada de manter ou aumentar o número de encarceramentos ao invés de diminuir é um atentado aos princípios basilares da constituição estatal.

3.3. O trabalho do preso nos presídios privados

Uma última observação (para não nos alongarmos nas inúmeras incongruências do modelo) é pertinente. Com relação aos salários recebidos pelos encarcerados utilizemos o exemplo da penitenciária de Ribeirão das Neves/MG. Na experiência mineira, envia-se pelo Estado somente os detidos que aceitam trabalhar. Isso, é claro, de forma não declarada. Murilo Andrade de Oliveira, subsecretário de Administração Penitenciária do Estado de Minas Gerais, no documentário “Quanto mais presos, maior o lucro”, diz: “nós estabelecemos inicialmente o critério de que [pode ir para a PPP] qualquer preso, podemos dizer assim, do regime fechado, salvo presos de facção criminosa – que a gente não encaminha pra cá – e preso que tem crimes contra os costumes, estupradores. No nosso entendimento esse preso iria atrapalhar o projeto”. Sabe-se que a iniciativa é pioneira no Brasil. Com os critérios apresentados fica muito mais fácil falar em sucesso do sistema e disseminar a cultura, bem como manter o lucro. Isso (também) porque se houver rebeliões, fugas ou outras manifestações do tipo, o consórcio perde parte do repasse de verba e é multado. Manifesta-se, mais uma vez, a estratégia midiática que visa não para mostrar um sucesso (até porque ele não existe), mas construí-lo por discursos, não por fatos.

Ainda sobre o trabalho dentro dos estabelecimentos privados ou em PPP, importante destacar que segundo a LEP os encarcerados podem receber ¾ de um salário mínimo, sem benefícios, e não estão submetidos à CLT. Em muitos casos, parte do salário recebido volta para o consórcio sob a justificativa de destinação para manutenção do estabelecimento. Não bastasse o alto repasse estatal, a operacionalização sob a diretiva da diminuição de custos, a submissão do preso a condições de trabalho e de direito precárias, a empresa ainda tira uma parte do pouco que é pago ao preso pelo seu trabalho.

Mostra-se um negócio que, ao contrário do que preza a livre concorrência e o princípio da assunção dos riscos por parte do empreendedor (ambos liberais), os estabelecimentos prisionais se mostram como um investimento de risco quase zero e lucro certo.

3.4. Os cartéis do submundo da indústria prisional

Os consórcios da administração dos presídios privados são os responsáveis pelos acertos de parcerias com as empresas para as quais os presos trabalham. Observa-se na experiência, inclusive do presídio de Neves, que a grande maioria dessas empresas é da área da segurança. Por conseguinte, os presos acabam produzindo por um valor muito menor,artigos necessários para manutenção dos presídios. Por fim, há a venda desses artigos ao próprio presídio.

Objetivamente: os consórcios responsáveis pelos presídios acertam com essas empresas não questões relacionadas ao trabalho dos presos, mas à compra dos produtos do trabalho destes por um valor muito menor que o de mercado de forma a diminuir ainda mais os custos do estabelecimento (como toda empresa). Observa-se, ao final, a formação de um verdadeiro cartel que burla todas as regras da livre concorrência louvadas pelo capitalismo de forma (mais uma vez) não manifesta.

Atende-se mais uma vez aos objetivos não declarados do sistema punitivista sob o argumento da ressocialização do preso através do trabalho, considerado condição de cidadania da técnica capitalista. O preso, através da exploração de sua força produtiva acaba forçado a alimentar a própria indústria que o colocou no status de criminoso e deslocado social.

3.5. A exploração da mão de obra encarcerada

Juarez Cirino dos Santos explicita de forma clara o problema da submissão da força de trabalho encarcerada a autoridades não estatais:

“Por último, sistemas de trabalho carcerário que submetam a força de trabalho encarcerada a qualquer outra autoridade diferente do Estado – como, por exemplo, o empresário privado – representam violação inconstitucional da dignidade da pessoa humana (art. 1o, CF), por uma razão elementar: a força de trabalho encarcerada não tem o direito de rescindir o contrato de trabalho, ou seja, não possui a única liberdade real do trabalhador na relação de emprego e, por isso, a compulsória subordinação de seres humanos a empresários privados não representa, apenas, simples dominação do homem pelo homem, mas a própria institucionalização do trabalho escravo. Se o programa de retribuição e de prevenção do crime é definido pelo Estado na aplicação da pena criminal pelo poder Judiciário (art. 59, CP), então a realização desse programa político-criminal pelo poder Executivo através da execução da pena, vinculada ao objetivo de harmônica integração social do condenado (art. 1o, LEP), constitui dever indelegável do Poder Público, com exclusão de toda e qualquer forma de privatização da execução penal.

A conclusão é óbvia: o dever social de trabalho do condenado representa condição de dignidade humana se realizar a finalidade educativa e produtiva (art. 28 e §§, LEP) de promover a formação profissional do condenado, somente possível pelo gerenciamento por fundação ou empresa pública (art. 34, LEP), com exclusão de qualquer exploração lucrativa por empresários privados, movidos pela idéia exclusiva de valorizar o capital mediante a mais intensa e cômoda extração de mais-valia do trabalho carcerário.[2]

Considerações Finais

Há muito se conhecem as debilidades estatais no que diz respeito aos problemas e à desigualdade social. No entanto, há uma necessidade estrutural capitalista de manutenção dessa situação e os governos buscam sob um discurso aparentemente revolucionário e baseado em ilusões, atingir objetivos não declarados que coadunam com os interesses da elite que se encontra no topo da pirâmide social capitalista. A legitimação desses discursos pelo Estado acaba por perpetuar a estrutura e, portanto, os problemas pelos quais o próprio discurso inicial dizia lutar contra.

Buscar relegitimar a pena de prisão buscando resolver seus problemas com mais prisão e com a intervenção privada é um perigo ainda maior para a situação original de caos carcerário e social. É fundamental entendermos que a prisão e a fábrica são instituições básicas das sociedades capitalistas contemporâneas. A primeira é o mais importante meio de controle social que busca “transformar o sujeito real (condenado) em sujeito ideal (trabalhador), adaptado à disciplina da fábrica, principal instituição da estrutura social” (SANTOS, Juarez Cirino dos). A privatização dos estabelecimentos prisionais é mais um meio perverso de configuração da estrutura social conforme o plano capitalista que, apesar de pregar o contrário, busca e precisa da identificação e colocação de determinados indivíduos em um lócus pré estabelecido e fixo. Atende-se, assim, aos interesses de lucro da estamental e segregacionista sociedade capitalista e o que é dito como a panaceia do cárcere apresenta-se apenas como mais um instrumento de manutenção dos reais problemas.


Notas e referências:

ANDRADE, Vera Regina Pereira de. Do paradigma etiológico ao paradigma da reação social: mudança e permanência de paradigmas criminológicos na ciência do senso comum. Sequêcia. Junho/1995; vol. 30: p. 24-36.

PAVARINI M, GIAMBERARDINO A. Teoria da Pena e Execução Penal: Uma Introdução Crítica. 2ª ed. Rio de Janeiro: Livraria e Editora Lumen Juris; 2012. Capítulo 6, “Sobre o escopo da pena”; p. 103-121.

SACCHETTA, Paula. Quanto mais presos, maior o lucro. Agência Pública, 2014. Disponível em: < https://vimeo.com/96243525>. Acesso em 15/09/2014.

SANTOS, Juarez Cirino dos. Privatizações de Presídios. Instituto de Criminologia e Política Criminal. Disponível em:< http://www.cirino.com.br/artigos/jcs/privatizacoes_presidios.pdf>. Acesso em 13/09/2014.

SANTOS, Boaventura de Sousa. O Estado social, Estado providência e de bem-estar. Diário de Notícias [Internet]. 29/12/2012.  Disponível em: <http://www.portaleducacao.com.br/educacao/artigos/48764/referencias-bibliograficas-tiradas-na-internet-como-colocar-no-trabalho#>. Acesso em 10/09/2014.

Loïc WACQUANT, A ascensão do Estado penal nos EUA, in Discursos sediciosos (crime, direito E sociedade), 2002, n. 11, p. 30.

[1] Cabe aqui destaque para o labelling approach trabalhado por Vera Andrade no artigo “Do paradigma etiológico ao paradigma da reação social: mudança e permanência de paradigmas criminológicos na ciência e no senso comum”: “Daí o desenvolvimento de três níveis explicativos do labelling approach, cuja ordem lógica procede aqui inverter:a) um nível orientado para a investigação do impacto da atribuição do status de criminoso na identidade do desviante (é o que se define como “desvio secundário”); b) um nível orientado para a investigação do processo de atribuição do status de criminoso (“criminalização secundária”ou processo de seleção); c) um nível orientado para a investigação do processo de definição da conduta desviada (criminalização primária)15 que conduz, por sua vez, ao problema da distribuição do poder social desta definição, isto é, para o estudo de quem detém, em maior ou menor medida, este poder na sociedade. E tal é o nível que conecta o labelling com as teorias do conflito. (BARATTA, 1991a, p.87; PABLOS DE MOLINA, 1988, p.588, 592-3) A investigação se desloca, em suma, dos controlados para os controladores e, remetendo a uma dimensão macrosociológica, para o poder de controlar. Pois ao chamar a atenção para a importância do processo interativo (de definição e seleção) para a construção e a compreensão da realidade social da criminalidade, o labelling demonstrou também como as diferenças nas relações de poder influenciam esta construção. ((HULSMAN, 1986, p.127) Assenta, pois, na recusa do monismo cultural e do modelo do consenso como teoria explicativa da gênese das normas penais e da sociedade, que constituía um pressuposto fundamental da Criminologia positivista.”

[2]  Retirado do artigo “Privatizações de Presídios”, escrito para o Instituto de Criminologia e Política Criminal.


Anthony ThiesenAnthony Thiesen é Graduando em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina. Estagiário na Defensoria Pública da União de Florianópolis/SC. Presidente da Associação Atlética Direito UFSC (AADUFSC). Contato: (48) 9910-7281                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         


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