Coordenador: Ricardo Souza Calcini
Temática bastante frequente em processos trabalhistas, cuja dúvida me foi enviada recentemente por um leitor, diz respeito ao seguinte caso prático: o funcionário que vier a trabalhar em escala de revezamento, v.g., 4x2 ou 5x2, e que preste serviço no dia de feriado, lhe é devido ou não o direito à remuneração em dobro, considerando que o labor se realizará em dia normal que coincida com o feriado devido a escala de revezamento?
E, neste ponto, impende salientar que a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) não trata especificadamente da temática do feriado, uma vez que há apenas uma singela referência no artigo 70[1], dizendo que feriados serão objeto de legislação própria, cuja regulamentação ocorreu por meio da Lei nº 605/1949.
Por seu turno, a Lei nº 605/49 concedeu a todos os empregados urbanos, rurais ou trabalhadores avulsos, o direito ao descanso semanal remunerado de 24 (vinte e quatro) horas consecutivas, preferencialmente aos domingos e nos dias feriados civis e religiosos, na forma do artigo 7º, XV e XXXIV, da Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB).
Assim, para o Direito do Trabalho, os feriados são lapsos temporais de um dia, situados ao longo do ano-calendário, eleitos pela legislação em face de datas comemorativas cívicas ou religiosas específicas, em que o empregado pode sustar a prestação de serviços e sua disponibilidade perante o empregador.[2]
Feita tal contextualização, e em resposta à interessante dúvida trazida em sala de aula, é correto afirmar que para o trabalho prestado em dia feriado, não compensado, é devido sim seu pagamento de forma dobrada. Isso porque, ainda que seja um dia normal de serviço para o funcionário que labore em escala 4x2 ou 5x2, imperativa se torna a adoção do entendimento consubstanciado na Súmula nº 146 do Colendo Tribunal Superior do Trabalho, “in verbis”:
SUM-146 TRABALHO EM DOMINGOS E FERIADOS, NÃO COMPENSADO (incorporada a Orientação Jurisprudencial nº 93 da SBDI-I) - Res. 121/2003, DJ 19, 20 e 21.11.2003.
O trabalho prestado em domingos e feriados, não compensado, deve ser pago em dobro, sem prejuízo da remuneração relativa ao repouso semanal.
Note-se que o citado verbete sumular não faz distinção em relação ao regime da escala de trabalho a que estiver submetido o funcionário. Ao contrário, o entendimento jurisprudencial é bastante claro ao dispor que, via de regra, prestar serviços em domingos e feriados enseja o pagamento da remuneração em dobro, isto é, acrescido do adicional de 100%, salvo que for concedida folga compensatória.
Assim, é possível afirmar que os feriados não estão incluídos em tais regimes de compensação e, portanto, se o dia de trabalho da escala recair em feriado o empregador deverá pagá-lo em dobro, salvo se conceder folga compensatória além daquela prevista na escala.
Essa é a razão pela qual, inclusive, se editou à época a Súmula nº 444 do C. TST, e que diz respeito ao regime especial 12x36 da jornada de trabalho:
SUM-444 JORNADA DE TRABALHO. NORMA COLETIVA. LEI. ESCALA DE 12 POR 36. VALIDADE - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 – republicada em decorrência do despacho proferido no processo TST-PA-504280/2012.2 – DEJT divulgado em 26.11.2012
É valida, em caráter excepcional, a jornada de doze horas de trabalho por trinta e seis de descanso, prevista em lei ou ajustada exclusivamente mediante acordo coletivo de trabalho ou convenção coletiva de trabalho, assegurada a remuneração em dobro dos feriados trabalhados. O empregado não tem direito ao pagamento de adicional referente ao labor prestado na décima primeira e décima segunda horas.
De mais a mais, a reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017) nada contribuiu para o deslinde da presente discussão. Ao contrário, o texto da Medida Provisória nº 808, de 14 de novembro de 2017, apenas se limitou a dispor que “é facultado às entidades atuantes no setor de saúde estabelecer, por meio de acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho, horário de trabalho de doze horas seguidas por trinta e seis horas ininterruptas de descanso, observados ou indenizados os intervalos para repouso e alimentação” (CLT, art. 59, §2º).
Assim sendo, o labor em dias de feriado não é compensado com a adoção de escalas 4x2 ou 5x2, sendo devido seu pagamento em dobro, tendo em vista que os feriados possuem característica única, por permitir ao empregado sua inserção no âmbito de sua comunidade, seja como sujeito político (feriados civis), seja como ser espiritual (feriados religiosos), sendo tais datas festivas insusceptíveis de regular compensação simples, tal como acontece com o repouso semanal remunerado.
Pensamento em sentido contrário, no caso, não se coaduna com a finalidade protetiva do arcabouço normativo celetista, cuja melhor interpretação jamais será aquela que venha a restringir os direitos conferidos aos trabalhadores. Ao revés, o objetivo da legislação é permitir que o funcionário desfrute do convívio social e familiar, servindo a remuneração qualificada para ao menos tentar compensar o trabalho exercido pelo labor em dias feriados.
Nesse prumo, inclusive, é a diretriz adotada pelo E. TRT/SP da 2ª Região, na Súmula Regional nº 58 que, em seu item II, preceitua, expressamente, que “os feriados laborados na escala 4X2 devem ser remunerados em dobro, por ausência de compensação”. O mesmo raciocínio, por corolário lógico, também é aplicável à escala 5x2 da jornada de trabalho.
Logo, se não for concedido o descanso do feriado ao empregado, a remuneração pelo trabalho em tal dia, ainda que em escala 4x2 ou 5x2, deverá ser paga em dobro, consoante dispõem o artigo 9º da Lei nº 605/49 c/c artigo 6º, §3º, do Decreto nº 27.048/49 c/c Súmula nº 461 do STF.
Por fim, não deixe de me enviar sua dúvida, que pode ser a mesma de tantos outros leitores, e que diga respeito a um caso concreto referente à aplicabilidade prática da legislação trabalhista, para que seja objeto de um próximo texto explicativo!
Notas e Referências:
[1] CLT, Art. 70. Salvo o disposto nos arts. 68 e 69, é vedado o trabalho em dias feriados nacionais e feriados religiosos, nos termos da legislação própria (redação dada pelo Decreto-Lei nº 229, de 28/2/1967).
[2] DELGADO, Mauricio Godinho. Curso de direito do trabalho. 16. ed. rev. e ampl..— São Paulo : LTr, 2017, p. 1.088.
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