Por Débora Carvalho Fioratto - 11/08/2015
Leia também as Partes I, II, III, IV, V, VI e VII
Art. 283. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não possam ser aproveitados, devendo ser praticados os que forem necessários a fim de se observarem as prescrições legais.
Parágrafo único. Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados desde que não resulte prejuízo à defesa de qualquer parte.
A norma prevista neste art. 283 CPC2015 corresponde ao art. 250 CPC/73. Ler comentários ao art. 276 quanto ao sistema da instrumentalidade das formas.
Em relação aos enunciados aprovados no FPPC em Belo Horizonte, também se aplica a este dispositivo o Enunciado n.º 279 do FPPC: Para os fins de alegar e demonstrar prejuízo, não basta a afirmação de tratar-se de violação a norma constitucional. (Grupo: Competência e invalidades processuais) (CARTA DE BH, 2014).
A parte final do parágrafo único deste art. 283 foi acrescida da expressão “de qualquer parte”, para explicitar que na ausência de prejuízo para qualquer parte (autor ou réu), o ato processual praticado com erro de forma será aproveitado.
A aferição do prejuízo é fundamental para o reconhecimento da nulidade processual. A argumentação deve estar atrelada às garantias constitucionais do contraditório, ampla argumentação, terceiro imparcial e fundamentação das decisões. Ademais, se o ato processual praticado ou a omissão de ato processual violar o modelo constitucional de processo, ou seja, desrespeitar a base principiológica uníssona, o prejuízo deixa de se vincular à forma/formalidade legal e passa a se vincular ao conteúdo dos princípios que efetivam o processo como garantia constitutiva de direitos fundamentais, demonstrando-se o efetivo prejuízo para a parte.
Destaca-se que no Estado Democrático de Direito cada caso é único e, mesmo havendo uma teoria geral do processo, compreendida a partir do modelo constitucional de processo e da base principiológica, e uma teoria das nulidades, é imprescindível a discussão do prejuízo de forma efetiva para que ele seja sempre argumentativamente demonstrado.
Crítica: A partir da análise jurisprudencial, verifica-se a manipulação da teoria do prejuízo e da finalidade do ato, que são cláusulas genéricas, para legitimar a interpretação do julgador quanto ao reconhecimento ou não da nulidade de um ato viciado/defeituoso, comprometendo a eficácia de princípios constitucionais ou processuais que estão presentes naquela determinada norma cuja formalidade deveria ter sido observada. Por isso a importância de se garantir o contraditório prévio, sempre que o julgador for reconhecer nulidade ex officio, afastando o seu subjetivismo e interpretação exclusiva e propiciando uma consulta às partes para argumentarem sobre a existência ou não do prejuízo a partir da interpretação compartilhada do alcance da norma inobservada e da necessidade de se sancionar o ato defeituoso (Conferir Fioratto, 2013 e 2014).
Levando-se em consideração que (i) nulidade é sanção cominada pelo órgão julgador após garantido o espaço argumentativo aos afetados, (ii) não existe, portanto, nulidade de pleno direito e (iii) o reconhecimento da nulidade ocorre em dois momentos distintos (primeiro, verifica-se a desconformidade do ato com o modelo constitucional, arguindo sua irregularidade, para, depois, no espaço argumentativo do contraditório e da ampla argumentação, verificar a (in) existência binômio finalidade-prejuízo para o reconhecimento da nulidade ou da convalidação do ato irregular), outra conclusão não há que afirmar que inexiste a distinção entre nulidade absoluta e relativa no Estado Democrático de Direito.
No Estado Democrático de Direito deve-se vincular o reconhecimento das nulidades processuais ao conteúdo principiológico advindo com a forma/formalidade do ato cuja previsão legal é garantia para a parte, de maneira que a discussão do prejuízo abranja, de forma conexa, a violação às garantias constitucionais que devem estar presentes em qualquer processo (contraditório, ampla argumentação, terceiro imparcial, fundamentação das decisões).
Notas e Referências:
CARTA DE BH: Enunciados consolidados do Fórum Permanente de Processualistas Civis. In: IV ENCONTRO DO FÓRUM PERMANENTE DE PROCESSUALISTAS CIVIS em Belo Horizonte/ Dezembro de 2014. Disponível em: <http://prestandoprova.blogspot.com.br/2015/05/enunciados-do-fppc-sobre-o-novo-cpc.html>.Acesso em 17 de março de 2015.
FAZZALARI, Elio. Instituições de direito processual. Trad. Elaine Nassif. Campinas: Bookseller, 2006.
FIORATTO, Débora Carvalho. Teoria das nulidades processuais: interpretação conforme a Constituição. Belo Horizonte: Editora D´Plácido, 2013.
FIORATTO, Débora Carvalho. AS NULIDADES PROCESSUAIS E SUA CONFORMIDADE CONSTITUCIONAL. In: Rosimere Ventura Leite;Luana Pedrosa de Figueiredo Cruz;Alexandre Freire Pimentel. (Org.). Processo e jurisdição I - CONPEDI/UFPB. 1ed.FLORIANÓPOLIS: CONPEDI, 2014, v. , p. 82-111.
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Nulidades no processo. Rio de Janeiro: Aide, 1993.
PASSOS, José Joaquim Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
Débora Carvalho Fioratto é autora da obra "Teoria das Nulidades Processuais: Interpretação conforme a Constituição". O livro pode ser adquirido diretamente pelo site da Editora D'Plácido. Também disponível em versão eletrônica - eBook.
Débora Carvalho Fioratto é Professora da PUC Minas. Mestre em Direito Processual pela PUC Minas. Licenciada em Letras pela UFMG. Pesquisadora e Orientadora no Grupo de Estudos de Direito, Constituição e Processo Prof. José Alfredo de Oliveira Baracho, da Faculdade Mineira de Direito, da PUC Minas.
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