O favor debitoris tem aplicação no direito material e no direito processual no ordenamento jurídico brasileiro. Na primeira hipótese o favor debitoris se traduz em uma ratio ou dispositivos que têm o efeito de excluir a condição de devedor ou minorá-la de modo relevante, como nos casos das obrigações fundadas na boa-fé objetiva, o negócio realizado em estado de perigo, a ideia do abuso do direito na acepção objetivista, a limitação dos juros moratórios, quando não convencionados, o dispositivo de que o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal, a resolução dos contratos de execução continuada ou diferida por onerosidade excessiva, a lesão subjetiva, o preceito que estabelece que o devedor pode alterar o local pré-determinado para o pagamento, sempre que ocorrer motivo grave, a oneração da cobrança indevida, etc.
Na segunda hipótese se está tratando do favor debitoris como mecanismos assegurados pelo ordenamento processual para a proteção ao devedor ou normas de conduta obrigatória pelo exequente, como a impenhorabilidade das provisões de alimento e de combustível, necessárias à manutenção do devedor e de sua família durante 1 (um) mês; os livros, as máquinas, os utensílios e os instrumentos, necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; o imóvel rural, até um módulo, desde que este seja o único de que disponha o devedor, ressalvada a hipoteca para fins de financiamento agropecuário, o princípio da responsabilidade do exequente, o princípio da certeza e liquidez do direito, a regra impeditiva da penhora, se for evidente que o valor dos bens encontrados seria absorvido totalmente pelas custas da execução, a proibição da arrematação por preço vil e o art. 805 do CPC, no qual se estipula que, quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor.
A expressão favor no direito romano assume o significado daquilo que se desvia do rigor do direito[1]. Moreira Alves considera que a expressão favor denota a atitude do legislador e da jurisprudência de favorecimento a uma situação especial que decorre de uma causa favorabilis, ou seja, a tendência a privilegiar esta situação, pela sua relevância e importância dentro do ordenamento jurídico, desde que a interpretação dada não seja absolutamente destoante da lógica jurídica[2]. É o caso do testamento, através do favor testamenti, pelo qual, na dúvida sobre uma disposição, a jurisprudência tem a tendência a favorecer o desejo do testador, da maneira mais ampla possível, com larguíssima interpretação, de modo a evitar a sucessão intestada[3].
A causa favorabilis da qual decorre o favor pode ser compreendida como aquela que, em determinado ordenamento jurídico e época, possui um apreço de bem objetivo, é um bem fundamental, e, como tal, impõe a todos, o dever de favorecê-la e defendê-la[4]. A interpretação que decorre do favor deve levar em conta sobretudo o valor transcendente da causa favorabilis e, assim, excluir considerações que decorram da aplicação de outros princípios, mormente aqueles oriundos de aplicações mecânicas de caráter formal.
Deste modo, os limites da interpretação que decorre do favor são os mais amplos possíveis, tanto subjetiva quanto objetivamente. Do ponto de vista objetivo, dizer que há uma situação jurídica beneficiada por um favor significa considerar que esta realidade é merecedora de valorização em si, tratando-se de um bem fundamental e que, como tal, deve ser privilegiada em confronto com outros argumentos jurídicos porventura relevantes.
O favor, em síntese, pode ser definido como o complexo de prerrogativas, quando não um próprio privilégio, que atribui uma posição de vantagem a uma pessoa, seja porque se leva em consideração a sua qualidade pessoal, seja porque a proteção do interesse individual é muito frequentemente o único meio de satisfazer o interesse de ordem coletiva.
A regulamentação jurídica de proteção do devedor no direito romano é um fenômeno típico do período pós-classico. No direito romano clássico havia um equilíbrio entre a pretensão do credor e a preocupação para com o devedor[5].
Na época de Augusto, a lex Iulia iudiciorum privatorum instituiu a cessio bonorum. Esta autorizava o devedor que, sem culpa, se encontrasse em desastrosa situação patrimonial, a se subtrair à execução em sua pessoa mediante a cessão de todos os seus bens ao credor, o qual não adquiria a propriedade mas era tão-somente legitimado a revendê-la e a satisfazer o seu crédito. Tal medida evitava a infâmia que decorria da venda do devedor insolvente[6].
No período clássico, surge também o beneficium competentiæ, pelo qual alguns devedores somente podiam ser condenados a pagar não a totalidade da dívida mas apenas aquilo que estivesse dentro de suas possibilidades patrimoniais (in id quod facere possunt)[7].
A proteção do devedor surgida no período clássico sob a influência da humanitas[8] consolida-se com os imperadores cristãos, ampliando-se as formas de tutela do devedor.
No período justinianeu, ampliam-se significativamente as disposições que tornam o exercício do direito de crédito menos inexorável do que era no período clássico. O beneficium competentiæ muda o seu perfil. Admite-se a exclusão de alguns bens da execução patrimonial, com a finalidade de garantir a subsistência do devedor e evitar que este ficasse reduzido à indigência. É a deductio ne egeat, prevista em D. L. 17, 173 pr., estendida a todos os devedores que gozavam da condenação limitada[9].
Sob a égide de Justiniano, foi proibido o anatocismo, fixando-se que, se alguém houvesse estipulado juros além da taxa estabelecida, ou juros dos juros, tenha-se por não expresso aquilo que ilicitamente se expressou, e que se possa pedir apenas o que é lícito[10]. Pela legislação justinianéa, não poderiam os juros ser inseridos em estipulação nem exigidos quando o capital já tivesse dobrado por conta de juros[11].
Por razões de clemência, ainda que do desagrado dos credores, Justiniano concede a datio in solutum necessaria pela Novela IV, 3, do ano de 535 d.C. Nesta, determina-se que o devedor que não dispusesse de dinheiro para restituir a quantia que recebera, mas que fosse proprietário de imóveis, poderia, por não encontrar comprador para eles, dirigir-se ao juiz competente e, feita escrupulosa avaliação deles, dar os melhores em pagamento[12].
Moreira Alves cita diversas passagens nas quais o direito justinianeu elabora uma proteção reforçada ao devedor. Assim, nesse direito, o termo presume-se aposto ao negócio jurídico em favor do devedor; há também a concessão de prazo de graça para o devedor[13].
Outro aspecto importante da proteção do devedor no direito romano é a vedação da læsio enormis através de rescrito de 285 d.C. do Imperador Diocleciano. Sob a rubrica De rescindenda venditione, este rescrito oferece ao vendedor a possibilidade de invocar a rescisão do contrato de compra e venda se o preço obtido com a venda da coisa tiver sido inferior à metade do verdadeiro preço. Ao comprador, porém, foi concedida a faculdade de evitar a rescisão mediante o oferecimento do que faltar para o justo preço, constituindo-se em efetivo mecanismo de proteção do devedor.
Em 320 d.C., uma lei de Constantino proíbe o pacto comissório pelo qual as partes avençam que o credor, no caso de a dívida não ser paga e não se extinguir de outra forma, possa, após o vencimento da mesma, obter a satisfação na coisa penhorada[14].
A proibição de adoção de providências vexatórias para a cobrança do crédito no direito romano é ressaltada por Moreira Alves em diversas passagens, como na cessio in potentiorem, na qual, por uma constituição dos imperadores Honório e Teodósio, estabelece-se a perda do crédito quando o credor o transferisse para pessoa mais poderosa. Considerava-se manifesta a voracidade dos credores que compram dívidas de outros para poder exercitar as correspondentes ações de execução[15].
O Imperador Justiniano também estabeleceu regra cogente de que ninguém seria obrigado a ceder todos os seus bens por dívida. Considerando tal estado de coisas e, nas suas palavras, desejando render culto a Deus, proíbe aos magistrados reduzir, através da cessio bonorum, o devedor à miséria, quando este jurasse pelos evangelhos que não tinha em suas coisas outros bens ou dinheiro que pudessem satisfazer a dívida.
A interpretação do direito igualmente altera-se no direito justinianeu para estabelecer a maior proteção do devedor. Em D. L, 17, 34, nas Diversas Regras Gerais do Direito Antigo, estabelece-se, especialmente na parte final tida como interpolada, a elucidação de que, se for incerta a regra, deve-se preferir a interpretação que mais favoreça o devedor. A interpretação assume nítido benefício em favor do devedor, estabelecendo a regra iuris de que nas coisas obscuras atemo-nos sempre ao que é o menos[16].
Assim, o ius civile romano desenvolve-se em um processo de crescente humanização, sob o influxo do estoicismo[17], pelo apreço da humanitas[18] e pela extraordinária benignidade do espírito cristão, culminando no estabelecimento de uma efetiva esfera de proteção ao devedor, o que justifica pensar, a partir dele, em um verdadeiro favor debitoris.
A recepção do direito justinianeu e da obra dos glosadores em Portugal dá-se a partir do século XIII. As Siete Partidas, sobretudo, influenciaram profundamente o direito das primeiras ordenações portuguesas – as Afonsinas – e possibilitaram a transmissão para o ordenamento português dos institutos de proteção ao devedor do direito romano.
No direito português antigo, são inúmeras as disposições de favorecimento do devedor. Paschoal José de Mello Freire, em seu Curso de Direito Civil Português, ao falar das regras de interpretação das leis, anuncia em sua primeira regra que, para explicar o sentido de uma lei, deve-se dar preferência àquele que ela tem tido na prática do foro, e, se um sentido não tiver um uso preferido, deve-se preferir aquele em que menos rigor se der[19].
A cessio in potentiorem, pela qual, por uma constituição dos imperadores Honório e Teodósio, estabelece-se a perda do crédito quando o credor o transferisse para pessoa mais poderosa[20], foi recebida no direito português nas Ordenações Afonsinas, as quais previram que, se um credor tiver uma demanda contra um devedor e, antes da demanda começada, a ceder a uma pessoa mais poderosa em razão do Ofício, perderá todo o direito e ação que até então tinha[21]. Igual disposição encontra-se nas Ordenações Manuelinas[22] e nas Filipinas[23].
Moreira Alves relata que a cessio bonorum, que permite ao devedor ceder todos os seus bens aos credores para livrar-se da execução pessoal e, portanto, da servidão e do cárcere, é admitida pelas Ordenações Afonsinas e que, utilizando-se desse benefício, o devedor não deve ser preso pela dívida, mas continua obrigado pelo saldo, embora, se vier a adquirir novos bens, goze do beneficium competentiæ[24].
A disciplina da lesão, no direito lusitano, remonta às Ordenações Afonsinas (Livro IV, Título XLV) e Manuelinas (Livro IV, Título XXX), inspiradas indiscutivelmente no direito justinianeu, mas temperadas pela influência canônica.
Nas Ordenações Filipinas, a figura da lesão assumiu um caráter objetivo, de inspiração romana (læsio ultra dimidium). O campo de incidência era vasto, abrangendo as alienações de bens móveis ou imóveis. As Ordenações Filipinas[25] previram, além da figura jurídica da lesão enorme (læsio enormis), a lesão enormíssima, que ocorria quando alguém recebesse somente a terça parte do justo valor da coisa.[26] A læsio enormissima não foi conhecida no direito romano, havendo sido concebida pelos canonistas.
No que concerne à usura e ao anatocismo, as Ordenações proibiam-nos expressamente, como se deduz das Ordenações Afonsinas, IV, 19[27]. Este também era o prescrito nas Ordenações Manuelinas[28] e nas Ordenações Filipinas[29].
As penas convencionais no direito das ordenações também são limitadas em benefício do devedor e não podem exceder o principal[30]. As Ordenações vedavam ainda a lex commissoria em se tratando de garantias reais, estabelecendo em síntese que era nula a cláusula que autoriza o credor pignoratício, anticrético ou hipotecário a ficar com o objeto da garantia, se a dívida não fosse paga no vencimento[31].
Relata igualmente Moreira Alves que as ordenações estabeleceram normas de proteção ao devedor próprias, que não se encontravam no direito romano. Assim, quando o credor cobrasse injustamente em juízo a dívida antes do tempo devido, a pena seria: "Haverá o reo todo aquelle tempo, que faltava, para haver de ser demandado, quando o autor primeiramente o demandou, como outro tanto"[32]. Por outro lado, quem demandasse outrem por dívida já integralmente paga ou pela parte recebida seria condenado a dar em dobro o recebido, além de ser condenado no dobro das custas[33].
Observa-se, portanto, no direito português antigo que a tradição do favor debitoris do direito romano foi substancialmente mantida e mesmo criadas novas situações protetivas do devedor. Vejamos, agora, como tais orientações inseriram-se no direito brasileiro.
No Brasil Império e durante parte República, permaneceram em vigor as Ordenações Filipinas e as leis extravagantes, até o início da vigência do Código Civil em 1917.
É expressa na Consolidação das Leis Civis de Teixeira de Freitas, de 1850, (que atualizavam as Ordenações para os usos do Foro) a proteção ao devedor. O instituto da lesão está previsto no art. 359, que estatui que todos os contratos, em que se dá, ou deixa, uma coisa por outra, podem ser rescindidos por ação da parte lesada, se a lesão for enorme; isto é, se exceder metade do justo valor da coisa[34].
Acrescenta esse autor que a presença da lesão enorme é ordinária no direito brasileiro e está admitida em nossos costumes. Em se tratando de compra e venda, a lesão pode ser invocada tanto pelo comprador quanto pelo vendedor[35].
A lesão enormíssima também é admitida no art. 567: "Mas, se a lesão for enormíssima, restituir-se-á a coisa precisamente, e com os frutos desde o dia da venda"[36]. São reprovadas nas escrituras as cláusulas que estabelecerem a renúncia à ação de lesão[37].
O pacto comissório pelo qual as partes pactuam que o credor, no caso da dívida não ser paga e não se extinguir de outra forma, possa, após o vencimento da mesma, obter a satisfação na coisa penhorada é expressamente vedado pelo art. 769 da Consolidação[38].
Subsistia a disposição de que as penas convencionais não podem exceder o valor da obrigação principal (art. 391). A cessio bonorum também persiste no direito das obrigações, na abalizada opinião de Manoel Ignácio Carvalho de Mendonça em 1911[39]. Pela extinção da cessio bonorum no direito brasileiro manifestava-se Teixeira de Freitas (Consolidação, art. 839, nota 24), porém, sem demonstrar a sua afirmativa.
A datio in solutum necessaria, com plenos efeitos para a quitação da dívida, foi admitida pelo Decreto nº 917, de 24 de outubro de 1890, como relata Carlos de Carvalho no art. 940 da sua Nova Consolidação das Leis Civis[40].
Não se pode negar, à vista de todo esse panorama, que o favor debitoris constituía regra corrente no direito brasileiro anterior ao Código Civil de 1916. A imensa maioria da doutrina preconizava uma proteção reforçada aos despossuídos e vítimas de dívidas[41].
E, por fim, há na Consolidação de Carlos Augusto de Carvalho a consagração do favor debitoris como princípio geral de interpretação dos atos jurídicos no direito das obrigações, preconizando que, nos casos duvidosos, em que não se possa resolver segundo as regras estabelecidas, decidir-se-á em favor do devedor (favor debitoris) (art. 288)[42].
O Código Civil de 1916, impregnado pelo individualismo jurídico e pela doutrina do laissez-faire, pelo liberalismo econômico smithiano, não recepcionou muitas das medidas de proteção ao devedor acima expostas. Moreira Alves relata que não se encontram nesse código normas que admitam as moratórias, o beneficium competentiæ, a cessio bonorum como meio de extinção do débito (que se traduz numa verdadeira datio in solutum coativa) ou vinculada ao beneficium competentiæ, a querela ou a exceptio non numeratæ pecuniæ, o benefício do inventário, a pena do credor que cobrasse judicialmente antes do prazo, a lesão enorme, a lesão enormíssima, o pagamento parcial coativo, bem como as que vedem a usura, o anatocismo e as cessões aos poderosos[43].
O Código Civil de 1916, entretanto, manteve também dispositivos favoráveis ao devedor. Um deles é a proteção do bem de família, introduzida no Código pelo Senador Feliciano Pena, em 1912, e inspirado no Homestead Act norte-americano de 1862.
No Código Civil de 1916, permaneceu a proibição do pacto comissório a todos os direitos reais de garantia no seu art. 765[44]. O art. 920 do referido Código estabelece que o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal. Foi incluído por iniciativa da Comissão do Governo[45].
O art. 9º do Decreto 22.626, de 07 de abril de 1933, previu, posteriormente, disciplinando todos os contratos (estipular em quaisquer contratos, art. 1º), que não é válida a cláusula penal superior à importância de 10% do valor da dívida.
Para o devedor que cumpriu em parte a obrigação, o Código (art. 924) previu a faculdade de o juiz reduzir proporcionalmente a pena estipulada para o caso de inadimplemento. Este é um relevante preceito protetivo do devedor, vez que permite ser aplicado, a título de redução da multa, a todas as situações em que o devedor inadimplente pede a extinção da obrigação; obtendo-a, a redução da cláusula penal que previa a perda das prestações garante ao devedor a devolução de uma parte do que pagou.
O art. 1531 do Código Civil de 1916 discorreu que, aquele que demandar por dívida já paga, sem ressalvar as quantias recebidas, ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se, por lhe estar prescrito o direito, decair da ação.[46]
No que concerne à legislação extravagante ao Código, o Decreto 22.262, de 1933, reintroduziu a usura no direito brasileiro ao prever que é vedado estipular, em quaisquer contratos, taxas de juros superiores a 12% ao ano e que é considerado delito de usura toda a simulação ou prática tendente a ocultar a verdadeira taxa do juro ou a fraudar os dispositivos do referido Decreto, para o fim de sujeitar o devedor a maiores prestações ou encargos, além dos estabelecidos no respectivo título ou instrumento. Também foi proibido nesse Decreto o anatocismo, dispondo este que é proibido contar juros dos juros: esta proibição não compreende a acumulação de juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a ano (art. 4º). A Lei nº 1521, de 1951 (art. 4º) veio reforçar o instrumental jurídico protetivo do devedor, agora de natureza penal, ao dispor que constitui crime a usura pecuniária ou real.
Na alienação fiduciária em garantia da lei 4728, de 14 de julho de 1965, estabeleceu-se a proibição da lex comissoria, ao preceituar a norma legal que é nula a cláusula que autorize o proprietário fiduciário a ficar com a coisa alienada em garantia, se a dívida não for paga no seu vencimento (art. 66, § 7º).
Destarte, percebe-se que, embora sob uma perspectiva fortemente liberalizante e hipostasiada do princípio da autonomia da vontade, a legislação, nesse período, em diversos aspectos, sufragou a proteção do devedor, precipuamente na legislação extravagante.
O atual Código Civil retomou a tradição reinícola e brasileira de maior proteção ao devedor, afastando-se do exacerbado individualismo do Código de 1916. O Novo Código tem como princípíos a socialidade, a eticidade e a operabilidade. Tais princípios espraiam-se em diversas regras protetivas no Código, como o art. 113, ao estabelecer que os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé. A boa-fé objetiva, que os alemães definem por Treu und Glauben (lealdade e crença), é um dever global: dever de agir de acordo com determinados padrões, socialmente recomendados, de correção, lisura e honestidade para não frustrar a confiança da outra parte.
A presunção de que devem ser mantidos, porque de boa-fé, os negócios ordinários que garantam a subsistência do devedor (art. 164) é modificação importante porque altera o ordenamento anterior e fixa um patrimônio mínimo a ser assegurado para o devedor.
O Código Civil abrigou a ideia do abuso do direito na acepção objetivista. No que concerne à proteção do devedor esse instituto desdobra-se, por exemplo, na proibição do venire contra factum proprium que protege uma parte (via de regra, o devedor) contra aquela que pretenda exercer uma posição jurídica em contradição com o comportamento assumido anteriormente. Depois de criar uma certa expectativa, de conduta seguramente indicativa de determinado comportamento futuro, há uma quebra dos princípios de lealdade e de confiança se vier a ser praticado ato contrário ao previsto, com surpresa e prejuízo à contraparte.
Na senda de proteção ao devedor, o art. 412 dispõe que o valor da cominação imposta na cláusula penal não pode exceder o da obrigação principal.[47]
No caso em que o montante da penalidade a ser cobrado do devedor for manifestamente excessivo, o art. 413 determina que a penalidade deve ser reduzida equitativamente pelo juiz tendo-se em vista a natureza e a finalidade do negócio.[48]
O Código Civil reintroduz também na legislação brasileira (arts. 478 a 480) a resolução dos contratos de execução continuada por onerosidade excessiva, com base na superveniência de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, capazes de comprometer o equilíbrio entre as prestações, tal como originalmente estabelecido pelos contraentes.
A lesão é prevista no art. 157 do Código Civil. No dispositivo em epígrafe, a lesão é definida como a exagerada desproporção de valor entre as prestações de um contrato bilateral, concomitante à sua formação, resultado do aproveitamento, por parte do contratante beneficiado, de uma situação de inferioridade em que então se encontrava o prejudicado.
Na proteção do devedor em matéria de pagamento avulta também o art. 329, estabelecendo que o devedor pode alterar o local pré-determinado para o pagamento, sempre que ocorrer motivo grave e desde que não haja prejuízo ao credor. Caberá ao juiz decidir sobre a gravidade do motivo. No mesmo diapasão o art. 330, pelo qual o pagamento reiteradamente feito em outro local faz presumir renúncia do credor ao previsto no contrato.
O art. 940 do Código Civil discorre que aquele que demandar por dívida já paga, no todo ou em parte, sem ressalvar as quantias recebidas, ou pedir mais do que for devido, ficará obrigado a pagar ao devedor, no primeiro caso, o dobro do que houver cobrado e, no segundo, o equivalente do que dele exigir, salvo se houver prescrição.[49]
Portanto, o Novo Código Civil de 2002, como se verifica nessa apertada síntese, incrementa consideravelmente os dispositivos de proteção ao devedor, retomando institutos tradicionais de nosso direito e fundando novas diretrizes protetivas.
O Código de Processo Civil de 1973, no campo da execução, também assegurou diversos mecanismos de proteção ao devedor.
O art. 649 do CPC de 1973 estabeleceu que são absolutamente impenhoráveis as provisões de alimento e de combustível, necessárias à manutenção do devedor e de sua família durante 1 (um) mês; os livros, as máquinas, os utensílios e os instrumentos, necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; o imóvel rural, até um módulo, desde que este seja o único de que disponha o devedor. Essas disposições foram mantidas no atual Código de Processo Civil (art. 833)
Também é princípio específico da execução do CPC de 1973 o fato de que esta sempre se realiza no interesse do credor (CPC de 1973, art. 612). Somente tem necessidade de promover a execução quem é sujeito de um título executivo que lhe atribua a exigir de outrem determinada prestação. E toda a atividade executória se dirige no sentido de realizar em concreto a satisfação do crédito do exequente. Corolário desse princípio é a regra impeditiva da penhora, se for evidente que o valor dos bens encontrados seria absorvido totalmente pelas custas da execução (CPC, art. 659, § 2º). Essa rega foi mantida no atual CPC (art. 836), com alterações procedimentais de pequena monta.
Outro dispositivo processual do CPC de 1973 de proteção do devedor é aquele que proíbe a arrematação por preço vil (CPC, art. 692). No atual CPC a regra foi mantida e acrescida a definição de preço vil. Considera-se vil o preço inferior ao mínimo estipulado pelo juiz e constante do edital, e, não tendo sido fixado preço mínimo, considera-se vil o preço inferior a cinquenta por cento do valor da avaliação (art. 891).
Outro dispositivo de proteção ao devedor do CPC de 1973 foi a regra jurídica sobre poder o juiz conceder ao credor o usufruto de imóvel ou de empresa, se menos gravoso ao devedor e eficiente para a solução da dívida (CPC, art. 716). Essa regra foi substancialmente mantida no atual CPC, agora sob a figura do poder do juiz de ordenar a penhora de frutos e rendimentos da coisa móvel ou imóvel.
E, finalmente, o art. 620 do CPC de 1973, no qual se estipulou que, quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor. A norma foi modificada no atual CPC que acrescentou um parágrafo que disciplinou que ao executado que alegar ser a medida executiva mais gravosa incumbe indicar outros meios mais eficazes e menos onerosos, sob pena de manutenção dos atos executivos já determinados. Trata-se de uma opção do legislador pela execução balanceada, que, não obstante, não altera a necessidade da observância da menor onerosidade que há de ser aferida a partir da situação subjetiva do devedor (art. 805).
Tratando do mesmo princípio protetivo no Código de Processo Civil de 1939, ao versar sobre o art. 903, Pontes de Miranda o define como favor debitoris, uma regra de interpretação das leis e dos atos jurídicos. Entre duas condutas possíveis de serem aplicadas na interpretação de um contrato ou de uma execução, o juiz determinará aquela menos gravosa (mais favorável) ao devedor[50].
O Ministro Teori Albino Zavascki ressalta a existência no direito de uma tendência humanizadora da execução forçada que se faz sentir mediante a imposições de limites à patrimonialidade da execução prevista no art. 591 do CPC de 1973 (atual art. 789 do CPC). Busca-se preservar o mínimo de dignidade do devedor e de sua família. Alcança-se tal meta através de vários dispositivos, como o dos bens impenhoráveis (CPC de 1973, art. 649 e 650 e atual CPC, arts. 833 e 834), o bem de família (art. 1º, Lei 8009/90), a proibição de efetuar penhora quando inútil para o credor (CPC de 1973, art. 659, §2º, atual CPC, art. 836, §§ 1º e 2º), tudo isso compondo o princípio do favor debitoris[51].
Candido Rangel Dinamarco salienta, em adendo, que:
“Pode-se mesmo dizer que existe um sistema de proteção do executado contra excessos, um favor debitoris inspirado nos princípios de justiça e equidade, que inclusive constitui uma das linhas fundamentais da história da execução civil em sua generosa tendência de humanização”[52].
Teori Zavascki acentua que o preceito do artigo 620 do CPC de 1973, presentemente art. 805 do atual CPC, veículo do favor debitoris, é típica regra de sobredireito, cuja função não é a de disciplinar situação concreta e sim a de orientar a aplicação das demais normas do processo de execução, com a nítida finalidade de evitar atos executivos desnecessariamente onerosos para o devedor. Acrescenta ele que a riqueza do art. 620 do CPC de 1973 (atual art. 805 do NCPC) reside, justamente, em consagrar um princípio de direito, que se caracteriza como tal, distinguindo-se de uma regra normativa comum pelo seu modo de atuar: enquanto a regra atua sobre a específica situação nela descrita, o princípio ocupa todos os espaços possíveis em que não encontrar oposição da ordem jurídica[53].
Tal caráter principiológico do favor debitoris em matéria de execução vem sendo acolhido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) que em diversos julgados tem estabelecido nos processos de execução a excepcionalidade da penhora sobre o faturamento da empresa, quando esta tenha apresentado outros bens passíveis de garantir a execução[54]. A atuação do princípio na jurisprudência do STJ visa não inviabilizar a sobrevivência do devedor[55].
Da mesma maneira, o STJ admitiu que o promissário-comprador inadimplente que não usufrui do imóvel tem legitimidade ativa “ad causam” para postular nulidade da cláusula que estabelece o decaimento de metade das prestações pagas e que este direito à devolução das prestações pagas decorre da força integrativa do princípio geral de direito privado “favor debitoris” (corolário, no Direito das Obrigações, do “favor libertatis”)[56].
Consagrada, pois, a recepção do favor debitoris na codificação de 2002 e na execução civil desde o Código de 1939, verifiquemos se este configura um princípio geral do direito das obrigações.
A proteção do devedor é, no meu entender, um princípio geral do direito das obrigações porque constitui uma pauta diretiva a partir da qual as regras serão criadas ou aplicadas. A doutrina e a jurisprudência eram uníssonas, na vigência do antigo Código Civil, em admitir a presunção de renúncia do direito de credor pela tolerância deste a comportamento diverso do devedor, o que acabou se positivando no art. 330 do atual Código Civi[57]. A teoria da imprevisão, em benefício do devedor, foi admitida em nosso ordenamento[58] apesar de não haver norma jurídica com essa previsão[59] no Código anterior. Deste modo, como salienta Moreira Alves, tem-se o favor debitoris como uma pauta diretiva, fonte supletiva de direito a permitir que o juiz, na lacuna da lei e dos costumes, julgasse com base nele como princípio geral de direito, criando-se, posteriormente, por lei, o instituto que supriu essa lacuna[60].
Legislações protetivas de um patrimônio jurídico mínimo que não inviabilize a existência condigna do devedor são da lógica do direito, consoante essa pauta diretiva[61]. A extinção da prisão civil por dívidas fora das hipóteses constitucionais, a impenhorabilidade de tudo o que seja útil ou imprescindível ao exercício da profissão do devedor[62], a impenhorabilidade do módulo rural e do bem de família, os diversos institutos jurídicos do Código Civil, têm a informá-los esse mesmo princípio da proteção ao devedor.
A proteção ao devedor constitui-se num princípio porque também configura uma norma jurídica de otimização, compatível com vários graus de concretização, consoante condicionamentos fáticos e jurídicos. Desta maneira, no caso do art. 413, quando a penalidade houver de ser reduzida equitativamente pelo juiz, são as condicionantes fáticas que a determinarão, tendo-se em vista a finalidade do negócio. Na definição do que seja a superveniência de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, capaz de comprometer o equilíbrio das prestações, a concretização condicional do princípio avulta com toda a sua força. A forma do art. 330 do Código Civil, ao prever que o comportamento concludente do credor insere-se no programa contratual para exonerar o devedor de modo de cumprimento do contrato anteriormente previsto, também evidencia que é ao princípio da proteção do devedor, na sua multifacetada configuração, que se está a recorrer.
No Código de Processo Civil, o art. 805 do atual CPC prevê que, quando por vários meios o credor puder promover a execução, o juiz mandará que se faça pelo modo menos gravoso para o devedor. É um princípio de ordem material mais do que processual, porque seu escopo último é o de assegurar o sinalagma da relação obrigacional. Deste modo, o princípio da proteção incide para, por exemplo, no caso da penhora on line[63], determinar que esta só se faça em última instância. A noção de obrigação informada pela boa-fé objetiva e sua realização através do favor debitoris preconiza que se deve proteger o interesse do credor, e proporcionar-lhe a satisfação de seu crédito o quanto antes, mas não se deve cegamente perseguir tal pretensão e violar inúmeros direitos do devedor, ofendendo diversas normas e princípio éticos e jurídicos que regem a vida em sociedade.
A proteção ao devedor configura assim um princípio geral do direito das obrigações porque tem uma relação direta com a ideia de direito, atua como um standard juridicamente vinculante radicado na noção de justiça. A obrigação contemporânea, como visto, só pode ser pensada dentro de um quadro de cooperação com vistas ao adimplemento e esta cooperação só se torna possível quando se procura manter, na medida do possível, as condições de dignidade e o próprio sinalagma contratual com a parte mais fraca.
É da ideia de justiça, como assinalado em artigo do economista Pedro Malan (insuspeito de nutrir um viés protetivo para com os devedores), que decorre a noção de que não se pode priorizar o direito do credor em detrimento da própria viabilidade humana e econômica do devedor. Daí o favor debitoris como princípio, que pode chegar mesmo, em casos extremos, como os descritos, ao próprio perdão da dívida[64].
A noção de que o favor debitoris como princípio geral do direito das obrigações funda-se na ideia de direito pode ser comprovada por todo o excurso histórico que realizamos. É do espírito de um ordenamento no tempo que se extrai a inspiração comum que o anima, os seus princípios, como o presente da proteção à debilidade jurídica ou econômica de uma das partes da relação obrigacional[65].
De todas as normas particulares de proteção ao devedor antes examinadas extrai-se o espírito do ordenamento jurídico examinado. Da particularidade das leis se volve à universalidade do direito. O espírito que anima e envolve o direito obrigacional brasileiro é o de favorecer a liberdade, numa cooperação com vistas ao adimplemento e, como tal, impõe-se, historicamente e como princípio a proteção do devedor decorrente do favor debitoris.
Como bem conceitua Moreira Alves, deve-se evitar o rigorismo do apego extremado à intangibilidade do pacta sunt servanda, quando ocorrerem situações subjetivamente iníquas para o devedor em decorrência da adoção de técnicas jurídicas especialmente para a proteção do credor, as quais, se admissíveis para as variações normais que se enquadrem nas oscilações previsíveis, não deverão sê-lo para as que resultem de situações acentuadamente anormais que venham a impossibilitar o pagamento do débito, impossibilidade que, sem essas circunstâncias, não ocorreria para o devedor[66]. O art. 805 do CPC é expresso nesse diapasão ao preconizar expressamente em seu parágrafo único a execução balanceada da obrigação.
Por último, o caráter de princípio da proteção ao devedor decorrente do favor debitoris singulariza-se porque este é o fundamento de regras, constitui a ratio de regras jurídicas e possui uma capacidade deontológica de justificação.
Moreira Alves, em alentado artigo, discorre que o favor debitoris substancia a ratio das regras jurídicas obrigacionais concernentes ao devedor no direito visigótico, no Fuero Juzgo, no Fuero Real, nas Siete Partidas, na Nueva Recopilación, na Novísima Recopilación, no Código Civil espanhol de 1889, nos Códigos Civis do Chile, Argentina, Uruguai, Colômbia, Venezuela e também nos recentes Códigos Civis da Bolívia, Peru e Paraguai[67].
Há, deste modo, no direito ibérico e no direito latino-americano, uma mesma tradição comum de proteção ao devedor que constitui a ratio de todas essas regras de direito civil e de direito processual nos diversos Códigos.
As Décimas Jornadas Nacionais de Direito Civil realizadas na Universidad Nacional del Nordeste, em Corrientes, na Argentina, em 1985, expressamente estabeleceram através de sua Comissão nº 02 que: 1) o favor debitoris é um princípio residual do direito civil que deve ser entendido no sentido da proteção da parte mais débil em um contrato; 2) em caso de que no contrato não exista uma parte mais débil, a interpretação deve favorecer a maior equivalência das contraprestações; 3) o favor debitoris não se aplica às obrigações que têm sua origem em um fato ilícito.
Insofismável, em conclusão, que a proteção do devedor decorrente do favor debitoris constitui um princípio geral do direito das obrigações no direito brasileiro porque estabelece uma pauta diretiva a partir da qual as regras serão criadas ou aplicadas nesse ordenamento, requerendo para sua aplicação uma mediação concretizadora do juiz ou do legislador. Ainda que não positivado, funda-se na ideia de direito como o comprova o desenvolvimento histórico dos seus institutos, atenua os rigores do pacta sunt servanda, reequilibrando a noção de obrigação, e consubstancia a ratio e a justificação deontológica das regras protetivas do direito ibérico e latino-americano.
Notas e Referências:
[1] Como se verifica nas palavras de Ulpiano em D. XL, 5, 24, 10.
[2] ALVES, José Carlos Moreira Alves. As normas de proteção ao devedor e o favor debitoris: do direito romano ao direito latino-americano. Notícia do Direito Brasileiro. Nova Série. Brasília, n. 3, p. 109-165, jan./jul., 1997, p. 112/113.
[3] “Ha de señalarse que el favor testamenti del Derecho clásico llega a ser en el derecho posterior favor testantis, y los textos de Justiniano contienen muchas decisiones en las cuales se hace eficaz o lo que se entiende haber sido el deseo del testador, aunque esta interpretación no sea verdadero resultado de lo que él há dicho, o lo que sea necesario para evitar la sucesión intestada” BUCKLAND, W. W. & McNAIR, Arnold. D. Derecho romano y Common Law: uma comparación en esbozo. Madrid: Universidad Complutense, 1994, p. 160/161.
[4] Como se verifica na lição de Sua Santidade João Paulo II no seu discurso aos membros do Tribunal da Rota Romana na inauguração do Ano Judiciário de 2004, ao defender o favor matrimonii: “Nesta perspectiva o favor matrimonii, afirmam, deveria ceder o lugar ao favor personae ou ao favor veritatis subiecti ou ao favor libertatis. Para avaliar corretamente as novas posições é oportuno, em primeiro lugar, reconhecer o fundamento e os limites do favor em questão. Na realidade, trata-se de um princípio que transcende enormemente a presunção de validade, dado que informa todas as normas canónicas, tanto substanciais como processuais, no que se refere ao matrimónio. Com efeito, o apoio ao matrimónio deve inspirar todas as atividades da Igreja, dos Pastores, dos fiéis e da sociedade civil, em síntese, de todas as pessoas de boa vontade. O fundamento desta atitude não é uma opção mais ou menos opinável, mas sim o apreço do bem objetivo, representado por toda a união conjugal e por cada família. Precisamente quando é ameaçado o reconhecimento pessoal e social de um bem tão fundamental, descobre-se mais profundamente a sua importância para as pessoas e para as comunidades. À luz destas considerações, manifesta-se com clareza que o dever de defender e favorecer o matrimónio cabe certamente, de maneira particular, aos Pastores sagrados, mas constitui também uma responsabilidade específica de todos os fiéis, sobretudo dos homens e das autoridades civis, cada qual segundo as suas próprias competências” . JOÃO PAULO II. Discurso aos membros do Tribunal da Rota Romana na inauguração do Ano Judiciário de 2004. Disponível em: http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/speeches/2004/january/documents/hf_jp-ii_spe_20040129_roman-rota_po.html. Acesso em: 20 dez. 2016.
[5] “Il diritto della obbligazione si sviluppa secondo uma linea di protezione del debitore; ma pertutta l´epoca classica rappresenta un sapiente equilibrio tra la pretesa del creditore e la pietà verso il debitore” BIONDI, Biondo. Instituzioni di diritto romano. Milano : Giuffrè, 1972, p. 341
[6] SCHULZ, Fritz. Derecho romano clásico. Barcelona : Bosch, 1960, p. 203/204.
[7] Sobre a matéria ver, no direito brasileiro, VELASCO, Ignácio M. Poveda. A execução do devedor no direito romano. São Paulo : Livraria Paulista, 2003.
[8] SCHULZ, Fritz. Princípios del derecho romano. Madri : Civitas, 1990, pp. 211-242.
[9] VELASCO, Ignácio M. Poveda. A execução do devedor no direito romano. São Paulo : Livraria Paulista, 2003, p. 17.
[10] D. XXII, 1, 29.
[11] D. XII, 6, 26, 1.
[12] Novela IV, 3, citada por ALVES, José Carlos Moreira. op. cit., p. 116.
[13] ALVES, José Carlos Moreira. op. cit., p. 117
[14] KASER, Max. Direito privado romano. Lisboa: Calouste Gulbenkian, 1999, p. 187.
[15] C. II, 13, 2
[16] D. L, 17, 9.
[17] CÍCERO, Marco Túlio. Tratado dos Deveres. Coleção Cultura Clássica. São Paulo: Edições Cultura Brasileira, s.d., cap. VII.
[18] SCHULZ, Fritz. Principios del derecho romano. Madrid : Civitas, 1990, pp. 211-242.
[19] FREIRE, Paschoal José de Mello. Curso de Direito Civil Portuguez. Anotado por Antonio Ribeiro de Liz Teixeira. Coimbra : J. Augusto Orcel Editor, 1856, p. 33.
[20] C. II, 13, 2.
[21] Affonso V. Ordenações Afonsinas, III, CXVIII. Fac-símile. Lisboa : Calouste Gulbenkian, 1984, p. 425
[22] Ordenações Manuelinas, III, 84.
[23] Ordenações Filipinas, III, 39.
[24] ALVES, José Carlos Moreira. op. cit., p. 144; ver também Ordenações Afonsinas, III, op. cit. p. 434.
[25] Ordenações Filipinas, IV, 13, 10, in fine.
[26] TELES, José Homem Corrêa. Digesto Português, Rio de Janeiro : Livraria Cruz Coutinho, 1909, art. 253.
[27] Ordenações Afonsinas, IV, 19, op. cit., p. 94 e 95.
[28] Ordenações Manuelinas, IV, 14.
[29] Ordenações Filipinas, IV, 67, Fac-símile. Lisboa : Calouste Gulbenkian, 1985, p. 871-874.
[30] Ordenações Filipinas, IV, 70, op. cit., p. 880/881.
[31] Ordenações Afonsinas, IV, 39; Ordenações Manuelinas, IV, 26 e Ordenações Filipinas, IV, 56.
[32] Ordenações Filipinas, III, 35, op. cit., p. 619.
[33] ALVES, José Carlos Moreira. op. cit. , p. 150.
[34] FREITAS, Augusto Teixeira de. Consolidação das leis civis. 3. ed. Rio de Janeiro : H. Garnier Editor, 1896, p. 242.
[35] A respeito do tema, esclarece Carlos de Carvalho que a lesão só pode ser contemporânea ao contrato (art. 1071). CARVALHO, Carlos Augusto de. Nova Consolidação das Leis Civis. Rio de Janeiro : Livraria Francisco Alves, 1899, p. 318.
[36] A mesma disposição é assente em Carlos de Carvalho (art. 1073, § 2º). CARVALHO, Carlos Augusto de. op. cit. p. 318.
[37] FREITAS, Augusto Teixeira de. op. cit. art. 390, p. 273.
[38] A mesma regra se encontra em a Nova Consolidação das Leis Civis de Carlos de Carvalho (art. 681).
[39] MENDONÇA, Manoel Ignácio Carvalho de Mendonça. Doutrina e prática das obrigações. V. 1. 2. ed. Rio de Janeiro : Francisco Alves, 1911, nº 445, pp. 744/747.
[40] CARVALHO, Carlos Augusto de. op. cit. art. 940, p. 282.
[41] Carlos Augusto de Carvalho era expresso ao afirmar que o direito romano justinianeu, de nítida inspiração protetiva, era fonte do direito civil de caráter subsidiário (art. 5º, II, a). Do mesmo modo fixava, fundado no Assentamento 321, de 02 de março de 1786, no Alvará de 23 de fevereiro de 1771 e no Alvará de 15 de julho de 1755 que, no que concerne à aplicação e interpretação das leis, as leis que tem em vista maior cômodo do Império se entendem extensivamente, uma vez que não fiquem mais onerosas às partes. CARVALHO, Carlos Augusto de. op. cit. art. 5, p. 4.
[42] CARVALHO, Carlos Augusto de. op. cit. art. 288, p. 97.
[43] ALVES, José Carlos Moreira. op. cit. , p. 154.
[44] BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado. Vol. 3. 8. ed. Rio de Janeiro : Francisco Alves, 1951, art. 756, p. 358.
[45] Ordenações Filipinas, IV, 4, 70, pr. e §2º, in fine, bem como Regimento nº 737, de 25 de novembro de 1850, art. 431; Teixeira de Freitas, Consolidação, art. 391; Carlos de Carvalho, Nova Consolidação, art. 246. BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado. Vol.4. 8. ed. Rio de Janeiro : Francisco Alves, 1950, art. 920, p. 68.
[46] Igualmente mantém-se nesse dispositivo a tradição, diferindo apenas a sanção, como exposto no direito das Ordenações, III, 36; Teixeira de Freitas, Consolidação, art. 829 e Carlos de Carvalho, Nova Consolidação, art. 872, § 2º.
[47] Ordenações, IV, 70, pr. e §2º, in fine, Regimento nº 737, de 25 de novembro de 1850, art. 431, Teixeira de Freitas, Consolidação, art. 391 e Carlos de Carvalho, Nova Consolidação, art. 246, Código Civil de 1916, art. 920.
[48] O Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Recurso Especial nº 11527 / SP, Relator Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, julgado de 01/04/1992 fixou o princípio de que a redução pelo juiz da pena convencional é norma de ordem pública, inderrogável por convenção das partes no sentido de ser a multa devida por inteiro em caso de inadimplemento parcial da obrigação. Esclarece o STJ que a moderna doutrina e atual jurisprudência se opõem à clássica doutrina civilística da autonomia da vontade preferindo optar pelo caráter social de proteção da parte presumidamente mais frágil. Lex STJ, vol. 35, p. 185.
[49] Da mesma forma, mantém-se nesse dispositivo a tradição, diferindo apenas a sanção, como exposto no direito das Ordenações, III, 36; Teixeira de Freitas, Consolidação, art. 829 e Carlos de Carvalho, Nova Consolidação, art. 872, § 2º e Código Civil de 1916, art. 1531.
[50] MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. Tomo XIII. 2. ed. Rio de Janeiro : Forense, 1961, p. 157/158.
[51] ZAVASCKI, Teori Albino. Comentários ao Código de Processo Civil. v. 8. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 399.
[52] DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução civil. 6. ed. São Paulo : Malheiros, 1998, p. 307.
[53] ZAVASCKI, Teori Albino. op. cit. p. 400/401.
[54] STJ, AgRg na MC 8911 / RJ, Relator Ministro Francisco Falcão, Relator(a) p/ Acórdão Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, Data do Julgamento: 14/12/2004 , Data da Publicação/Fonte: DJ 21.03.2005 p. 214.
[55] STJ, AgRg na MC 8275 / RJ ; Relator Ministro Teori Albino Zavascki, Órgão Julgador : Primeira Turma, Data do Julgamento: 29/06/2004 , Data da Publicação/Fonte : DJ 23.08.2004 p. 119.
[56] STJ, REsp 345725 / SP ; Relator Ministra Nancy Andrighi, Órgão Julgador: Terceira Turma, Data do Julgamento: 13/05/2003, Data da Publicação/Fonte: DJ 18.08.2003 p. 202; RSTJ vol. 181 p. 262.
[57] ALVES, José Carlos Moreira. O favor debitoris como princípio geral de direito. In: Revista Brasileira de Direito Comparado, nº 26, p. 03-23, 1º semestre de 2004.
[58] No Brasil, já em 1938, o Supremo Tribunal Federal reconhecia a possibilidade de se resolverem contratos por onerosidade excessiva, Revista dos Tribunais, nº 387, p. 177.
[59] “Diante da alteração do ambiente objetivo no qual se formou o contrato, acarretando para o devedor uma onerosidade excessiva e para o credor um lucro inesperado, a solução só pode ser a resolução do vínculo, operando ex nunc, substituído para o credor o exercício, em forma específica, dos seus direitos, pelo respectivo valor econômico. Dá-se, assim, como que uma expropriação judicial dos direitos do credor, para evitar uma iniquidade, com plena salvaguarda de suas legítimas expectativas, quanto aos lucros que foram ou podiam ser previstos na data da obrigação” FONSECA, Arnoldo Medeiros da. Caso fortuito e teoria da imprevisão. 2. ed. Rio de Janeiro : Imprensa Nacional, 1943, p. 334/335.
[60] ALVES, José Carlos Moreira. O favor debitoris como princípio geral de direito. op. cit., p. 11.
[61] Como a lei 9533/97 que autoriza o Poder Executivo a conceder apoio financeiro aos Municípios que instituírem programas de renda mínima associados a ações socioeducativas.
[62] “Na prática forense vem a impenhorabilidade sendo estendida ao direito de uso do telefone que sirva a médico, ou a vendedor autônomo, ou instalado em escritório de advocacia, ou a qualquer profissão autônoma ou mesmo em residência, desde que, em qualquer destes casos, necessário ou útil ao exercício da profissão” FACHIN, Luiz Edson. Estatuto jurídico do patrimônio mínimo. op. cit. p. 233/234.
[63] A penhora on line é utilizado nas Varas de Fazenda Pública, como meio de bloquear as contas bancárias de contribuintes em débito com o Fisco. Ela é o meio pelo qual o Poder Judiciário determina o bloqueio das contas correntes do executado, para assegurar a satisfação do crédito de eventual credor ou exequente.
[64] MALAN, Pedro. Para entender a dívida externa. Disponível em: http://www.fazenda.gov.br/portugues/documentos/2000/pr000903.asp . Acesso em: 17.12.2005
[65] ALVES, José Carlos Moreira. O favor debitoris como princípio geral de direito. op. cit., p. 15.
[66] ALVES, José Carlos Moreira. O favor debitoris como princípio geral de direito. op. cit., p. 23.
[67] ALVES, José Carlos Moreira Alves. As normas de proteção ao devedor e o favor debitoris: do direito romano ao direito latino-americano. Notícia do Direito Brasileiro. Nova Série. Brasília, n. 3, p. 109-165, jan./jul., 1997.
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