Por Tiago Gagliano Pinto Alberto - 22/03/2016
Olá a todos!!!
Há um interessante filme intitulado, em português, “O preço do amanhã”, dirigido por Andrew Niccol e protagonizado por Justin Timberlake e Amanda Seyfried, cuja trama se passa em uma sociedade futurista, onde para obter mais tempo de vida, as pessoas devem comprar esse tempo. Cada pessoa é “equipada” com uma espécie de marcador de tempo que é acionado após um período de sua vida e, a partir de então, passa a contar regressivamente os anos, meses, dias, horas, minutos e segundos, de modo que se o indivíduo não adquire mais tempo, acaba morrendo; adquirindo-o, no entanto, não há limites para a sua vida terrena.
No contexto do filme há uma clara distinção entre os mais abastados, cujo tempo é próximo ao infinito, e aqueles com menos posses, que lutam diariamente por alguns minutos ou horas a mais de vida. A reflexão propiciada pelo filme é muito interessante e perpassa pela compreensão da importância de se valorizar cada momento, porque os dias, horas, minutos e segundos passam inexoravelmente, para ricos e pobres. Claro, a distinção levada a cabo entre aqueles financeiramente mais estáveis e a grande maioria da população representa o pano de fundo por intermédio do qual se verifica toda a trama, envolvendo uma mulher rica e um homem pobre.
O que neste momento importa e justifica a menção ao filme é o paralelo que pode ser traçado com a nossa sociedade atual e, principalmente, as últimas manifestações dos integrantes da cúpula do Governo Federal, cuja legitimidade já foi de tal modo aplainada que não sei mais se ainda pode ser medida.
Uma rápida olhadela nos noticiários de quaisquer veículos de imprensa nos demonstra a efetivação de manifestações em diversas avenidas, praças, ruas e casas, em diversos locais do país e a qualquer momento. A mesma situação pode ser verificada a partir da leitura de qualquer feed de notícias das redes sociais. Há manifestações contra e pró-governo por todos os lados. Piadas são recorrentes, assim como animações, caricaturas, vídeos e todo tipo de veículo eletrônico transmissor da ideia de revolta contra as manifestações entendidas como de evidente e inequívoca corrupção nos meandros da alta cúpula do Governo brasileiro.
No exterior, brasileiros também se revoltam, carregando faixas, saindo às ruas e deixando bem clara, por meio de palavras de ordem, a sua ideia de discordância fática e ideológica ao que percebem estar sendo levado a cabo nas instâncias máximas do Poder a nível Executivo e Legislativo.
O Governo, por outro lado, tenta o que pode para se manter no Poder. Adquire o seu tempo de todas as formas possíveis, lícitas ou nem tanto, assim como no filme mencionado. Seu marcador de tempo está correndo regressivamente em uma velocidade nunca antes vista neste país e, como decorrência de inúmeras manobras questionadas no âmbito do Poder Judiciário e sem respaldo ao menos de grande massa da população, perde em credibilidade, legitimidade e apoio a cada segundo, fazendo com que o relógio corra ainda mais rápido.
Em paralelo a isso, nada mais funciona. Projetos de lei não são apreciados, porque o Parlamento está com a atenção centrada nos últimos acontecimentos das Operações que aparentemente estão desmontando estruturas nefastas de negociatas perpetradas às sombras e com o auxílio de máscaras ideológicas, minando o que resta da legitimidade popular; e, por outro lado, focado no procedimento do impeachment, que promete substituir o seis pela meia dúzia em termos de poder, ainda que assim não o diga.
O Poder Executivo, na alta esfera federal, está paralisado. À vista de bizarras nomeações sob o ponto de vista jurídico, questionadas judicialmente desde a primeira instância até a Corte Suprema, e em decorrência de movimentações políticas com esperança de ao menos afrouxar o nó da corda amarrada pelo próprio governo em seu pescoço, tenta-se recuperar o banquinho que se situava bem abaixo dos pés, evitando o irremediável fim, porque as instâncias institucionais já apresentam sinais de que a recuperação, se houver, dar-se-á talvez após algumas décadas.
E o marcador do tempo continua com a sua contagem regressiva em velocidade cada vez mais rápida...
É momento de questionar, independentemente do acerto de teses, legalidade de interceptações, ou aspectos pessoais da atuação de juízes ou políticos, se essa resistência em não movimentar o país à conta de uma espécie de manutenção forçada no Poder encontra-se legitimada. Estamos perdendo em termos econômicos com os desgastes políticos. As bolsas e investidores não sabem mais o que fazer. Ora o dólar está alcançando a mais alta cotação, ora cai como se saltasse de um penhasco. Exportações estão sendo abaladas, importantes deliberações legislativas proteladas, pautas e agendas do Judiciário perdendo importância e a sociedade, confusa entre os apoiadores do governo (remunerados ou não) e os desfavoráveis, encontra-se à beira de uma guerra civil, esperando apenas um estopim, que pode ser um confronto aberto nas ruas, um incêndio em alguma entidade, um discurso realizado, ou até mesmo mais um telefonema revelado.
E o marcador continua correndo...
Sob o pano de fundo da luta entre ricos e pobres, como no filme, pretende-se obter um pouco mais de tempo, ideologizando algo que faticamente está se revelando de difícil, senão impossível, sustentação. A clássica técnica de acreditar na mentira até que não possa mais ser vista como tal não está mais funcionando tão bem. Tentar polarizar a sociedade entre os apoiadores do impeachment, a elite, e aqueles pró-governo, os injustiçados, nada mais faz senão desviar a atenção para os temas centrais, a corrupção e a falta de governabilidade.
E o marcador continua correndo, cada vez mais rápido...
Políticos envolvidos nesta trama dantesca, entendam que estão prejudicando o país! Não se trata mais de quem está ideologicamente correto, ou não. O país está parado e precisa urgentemente se movimentar. A economia está gritando de desespero e os projetos políticos dormitando em berço esplêndido enquanto se espera a cessação de um sangramento que flui sem aparente torniquete.
É preciso que a visão republicana seja, nesse momento, superior à individual e mesmo à ideológica. Prejudicar o país diuturnamente quase que por manha, ou quiçá por temor de investigação futura, não é comportamento que se justifique sob qualquer apanágio ideológico. Tenham temperança, se lhes falta alteridade.
No filme mencionado, há um momento em que uma personagem passa o seu tempo para outra, não apenas como forma de salvá-la, mas para que atinja a uma finalidade maior, que interessa a ambas na trama e à sociedade como um todo. Agora, trazendo a ficção para a nossa realidade, é tempo de fazer o mesmo: não importa se quem receberá o tempo restante está, ou não, em nível evolutivo messiânico; o que não há mais como admitir é que o relógio continue incessantemente o seu caminhar, cada vez mais rápido, e a finalidade maior, a governabilidade, não seja alcançada.
E o marcador continua correndo...
Um grande abraço a todos. Compartilhe a paz!
Tiago Gagliano é Doutor em Direito pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Professor da Escola da Magistratura do Estado do Paraná (EMAP). Professor da Escola da Magistratura Federal em Curitiba (ESMAFE). Coordenador da Pós-graduação em teoria da decisão judicial na Escola da Magistratura do Estado de Tocantins (ESMAT). Membro fundador do Instituto Latino-Americano de Argumentação Jurídica (ILAJJ). Juiz de Direito Titular da 2ª Vara de Fazenda Pública da Comarca de Curitiba.
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