O FIM DO MINISTÉRIO DO TRABALHO É O FIM

03/01/2019

            Publicado em 1º de janeiro deste ano, o texto da Medida Provisória 870, acaba, oficialmente, com o Ministério do Trabalho e Emprego na estrutura básica dos órgãos da Presidência da República e Ministérios. Quase inacreditável se pensar que, pela primeira vez, na história democrática brasileira, não haverá um Ministério para fiscalizar as relações de trabalho e emprego, bem como para o fortalecimento de políticas públicas de geração de renda. A extinção do Ministério do Trabalho parece ser bastante simbólica e representativa daquilo que se apresenta: a necessidade de se eleger sempre um inimigo a extirpar. Agora, quase noventa anos depois de sua criação, o Ministério já inexistente ganha a alcunha de ser o entrave para o desenvolvimento econômico do país e preocupado em apenas burocratizar as relações de trabalho e emprego.

            Na mesma onda já experimentada pela Reforma Trabalhista de 2017, a extinção do Ministério do Trabalho apenas sedimenta aquilo que a própria alteração da CLT já evidenciara: o caminho para a desregulamentação das relações trabalhistas. Embora o grande slogan da Reforma fosse a prevalência do negociado sobre o legislado e a autonomia entre empregados e empregadores na relação contratual de trabalho, o que se percebe é a tentativa de retirar do Estado o seu papel de fiscalizador das condições de trabalho a que são submetidos os cidadãos, como se esta relação fosse centrada exclusivamente em uma base econômica, inobstante ser o trabalho um valor e direito social, inscrito no artigo 6º de nossa Constituição Federal.

            Dentre as suas competências, cabia ao Ministério do Trabalho e Emprego o estabelecimento de políticas e diretrizes para a geração de emprego e renda e de apoio ao trabalhador; das políticas e diretrizes para a modernização das relações do trabalho; da fiscalização do trabalho, inclusive do trabalho portuário; da política salarial; da formação e desenvolvimento profissional; da segurança e saúde no trabalho; política de imigração e cooperativismo e associativismo urbanos. A existência do Ministério do Trabalho se dava justamente como forma de coibir abusos por parte de empregadores, mas, ao mesmo tempo, proteger as empresas dando os caminhos necessários para sua regularidade perante os órgãos governamentais. A partir de agora, estas competências, no que se refere especialmente, à geração de trabalho e renda, fiscalização, saúde e segurança do trabalho passam a fazer parte do Ministério da Economia, um retorno explícito à lógica que tenta colocar o trabalho como um opositor ao desenvolvimento econômico. Trabalho e capital se completam, e devem compreender a dinâmica que sustenta tal relação. Se ao empresário cumpre o investimento do capital e criação das condições necessárias para o início das atividades, tal função só será possível se houver trabalhadores capacitados e dispostos a fornecer seu intelecto e força para que esta máquina gire. É a união dessas forças que gera resultado econômico e social.

            Mas o que mais chama a atenção é o fato de estar sob o amparo do Ministério da Justiça e Segurança Pública o registro sindical. Parece, mais ume vez, bem claro, que os sindicatos são eleitos como os inimigos da modernização das relações de trabalho. Ao mesmo tempo, é uma contradição: busca-se a flexibilização das relações de trabalho, com menor interferência estatal nos contratos individuais e coletivos de trabalho, mas desloca-se ao responsável pela Segurança Pública o registro do ente sindical, função esta que era exclusiva do Ministério do Trabalho. Qual a mensagem que está por trás dessa reestruturação? Olvida-se que os sindicatos protegem tanto as categorias profissionais quanto econômicas e que sem o fortalecimento da negociação coletiva, o grande chamariz da Reforma simplesmente cai por terra.

            No final do ano de 2018, percebeu-se que os índices de desemprego mantiveram a mesma tendência já observada ao longo dos doze meses, em torno de 11% a 13%, com uma tendência já de queda e geração de empregos formais, o que era bastante animador, eis que com a possibilidade hoje legalizada de terceirização de atividade fim, de pejotização, de contratação de autônomos com exclusividade, perceber que as vagas criadas eram com carteira assinada poderia representar o reinício de uma retomada da empregabilidade no Brasil, cujos índices mantiveram-se estagnados, mesmo com a Reforma Trabalhista e sua promessa não cumprida de geração de novas vagas. Mais do que isso, atento ao próprio desenvolvimento tecnológico e de novas formas de trabalhabilidade. Não raro, o próprio Ministério do Trabalho e Emprego encampou em novembro de 2018 uma consulta pública sobre Trabalho e Tecnologia, evidenciando que havia uma preocupação do setor público com esta nova forma se se enxergar o trabalho na contemporaneidade.

            Neste primeiro momento, a extinção precoce do Ministério do Trabalho não se mostra uma medida que, a curto prazo, possa melhorar os índices de geração de trabalho e emprego no Brasil, não há uma definição clara de quais políticas públicas serão adotadas, sobre a forma de funcionamento da fiscalização das condições de saúde e segurança do trabalho pelo Ministério da Economia, quais serão os novos procedimentos para registros sindicais, entre tantos outros fatores necessários para a tão sonhada retomada de empregos no país. Evidentemente, é preciso dar tempo ao tempo, para que se possa avaliar tais medidas a partir de dados estatísticos que venham a ser divulgados, oportunamente, sobre a criação de vagas, mas, em nada apaga o sentimento de que, em uma democracia, em um país que vive uma crise no mercado de trabalho, a extinção do Ministério responsável por esta área é, efetivamente, o fim.

 

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