O Estado empreendedor e a inovação tecnológica verde – Por Wagner Carmo

11/06/2017

A revolução industrial verde, compreendida como a terceira revolução industrial do mundo, é um caminho sem volta para a humanidade. O problema da mudança de clima, denominando de crise ambiental global, fruto das atividades econômicas existentes no mundo e atreladas ao uso de energias poluentes, demonstram o quanto é precípuo que o Estado promova investimentos em tecnologias, informações e inovação para o desenvolvimento de energia limpa.

Mariana Mazzucato[1], na obra “O Estado Empreendedor”, afirma que a revolução industrial verde exige do Estado responsabilidade para impulsionar e transformar a infraestrutura energética atual em energia limpa.

A revolução industrial verde pressupõe o uso de novas tecnologias; a constituição de empresas inovadoras e o apoio constante e sistemático do Estado. Segundo Mazzucato, a revolução industrial verde é a transformação do sistema industrial global por outro que seja sustentável.

A sustentabilidade, por sua vez, exige uma transição energética que coloque a tecnologia de energia limpa, não poluente, na linha de frente, afastando paulatinamente, a dependência de energia/combustível fóssil e nuclear por energia renovável.

Para Mazzucato, a construção de um sistema industrial sustentável requer o uso de tecnologias nas seguintes áreas: a) materiais recicláveis; b) técnicas avançadas de gestão de resíduos; c) aprimoramento de práticas agrícolas; d) investimento na infraestrutura da dessalinização de água e, e) investimento em politicas hídricas.

Entretanto, a autora afirmar que para começar a revolução industrial verde e lidar com a questão da mudança do clima precisamos mais uma vez de um Estado ativo que assuma a grande incerteza dos estágios iniciais, temida pelo setor privado.

A primeira questão que se coloca diz respeito ao financiamento da revolução industrial verde. Para Mariana Mazzucato, apesar da experiência e do conhecimento sobre energia limpa, geralmente o apoio do governo tem sido historicamente inexistente e oscilante.

A presença do Estado Empreendedor é fundamental, pois, o setor privado não financia o desenvolvimento sustentável sem antes apurar se o Estado absorveu parte da incerteza do negócio ou de avaliar se as iniciativas e projetos governamentais foram bem sucedidos.

Assim, para que se alcance a terceira revolução industrial é necessário que governos assumam o compromisso de aumentar investimentos, em longo prazo, para politicas de Pesquisa e de Desenvolvimento de energias limpas.

A segunda questão que se coloca é a compreensão sobre as diferentes maneiras como os países estão reagindo ao desafio de desenvolver uma indústria e uma economia verde.

Mariana Mazzucato explica que na corrida pelo desenvolvimento sustentável, enquanto alguns países assumem a liderança outros vão ficando para trás. A autora destaca que como os investimentos em inovação são cumulativos e os resultados dependem do histórico – as inovações de hoje dependem das inovações de ontem – é provável que os lideres que estão surgindo dessa corrida continuem a ser lideres por muitos anos.

Um dos principais problemas de alguns países quanto à presença do Estado no desenvolvimento sustentável é a irregularidade nos investimentos em relação às politicas de energia limpa.

Dentro deste contexto, Mariana Mazzucato destaca a situação da China, do Brasil, dos Estados Unidos da América e do Reino Unido.

O destaque à China repousa no fato de que o Estado criou o Banco de Desenvolvimento Chinês – BDC, que apenas no setor de tecnologia de geração de energia solar ofereceu 47 bilhões de dólares, em 2010, para cerca de quinze (15) fabricantes de painéis solares voltaicos para financiar suas necessidades de inovação e expansão (atual e futura), transformando a indústria chinesa e rivalizando economicamente com as empresas sediadas na União Europeia e nos Estados Unidos da América.

Em relação ao Brasil, a autoria chama de caso promissor. Similar à China, o Brasil criou o Banco de Desenvolvimento Econômico Brasileiro – BNDES, que a titulo de exemplificação, aprovou crédito de mais de 4,23 bilhões de dólares, em 2011, para financiar tecnologia limpa. Cita, ainda, que o BNDES concentrou investimentos para financiar as empresas de biotecnologia que passaram pelo vale da morte (fase do processo de inovação que ocorre entre a validação de um conceito e a realização de todos os testes e a aprovação pelo mercado).

Em relação aos Estados Unidos da América, a autora indica uma situação de alerta. Os Estados Unidos da América, embora tenha criado programas governamentais como o DOE – Departamento de Energia, datado de 1978, com a missão de buscar respostas às constantes crises mundiais no setor de energia; a DARPA - Agencia de Pesquisa Avançada de Defesa, responsável pelo investimento no programa multibilionário, descrito como a força inovadora há mais de cinquenta anos, realizando pesquisas fundamentais que criaram as bases da internet, do Windows da Microsoft e do GPS e a ARPA-E - Agencia de Projetos de Pesquisa Avançada para Energia, criada para focar na indústria transformadora não convencional que a indústria convencional não apoiaria devido aos altos riscos; tem mostrado tendências contraditórias, pois, embora o Estado esteja investindo em tecnologias verdes, a ação não possui visão e objetivos claros, faltando um comprometimento, de longo prazo, com varias tecnologias fundamentais. Por tal motivo, não conseguem fazer mudanças significativas no mix energético do País.

No caso do Reino Unido, Mariana Mazzucato destaca que o País não aprendeu a lição de que nas revoluções tecnológicas anteriores, com o investimento ativo do Estado o País ficou em primeiro lugar e colheu retornos futuros crescentes. Segundo a autora o Reino Unido finge fazer desenvolvimento e os empresários, quando o assunto é investimento em tecnologias, suspeitam do Estado pela falta de sinais políticos claros.

A principal reação do Reino Unido foi criar um banco de desenvolvimento verde para oferecer financiamento do tipo seedcorn, concebido pela noção de que basta um empurrãozinho do Estado para que o setor empresarial comande a revolução verde. O Reino Unido esqueceu, entretanto, que os investidores não tomam decisões de longo prazo baseados em politicas governamentais de curto prazo.

A terceira e conclusiva questão acerca do Estado Empreendedor diz respeito ao capital paciente. Mariana Mazzucato afirma que no jogo da inovação é essencial que o financiamento seja paciente e consiga aceitar o fato de que a inovação tem um alto grau de incerteza, além demorar bastante.

O capital paciente mais visível disponibilizado para os desenvolvedores e fabricantes de tecnologias renováveis, em regra, é originário dos investimentos financiados pelo Estado ou pelos Bancos de Desenvolvimento.

A experiência de capital paciente de sucesso aconteceu na Alemanha com a política feed in ou FIT. Trata-se de um mecanismo utilizado por políticas públicas destinadas a acelerar o investimento em tecnologias de energias renováveis por meio da oferta de contratos de longo prazo aos produtores de energias renováveis, normalmente com base no custo de geração de cada tecnologia.

No caso do capital paciente o papel e o âmbito dos bancos de desenvolvimento vão além do simples financiamento de projetos. Os bancos de desenvolvimento devem procurar investir em áreas de maior valor social, fazendo empréstimos arriscados, evitados pelo setor particular.

O Estado e o empresariado historicamente têm sido parceiros no processo de desenvolvimento econômico e tecnológico. Entretanto, sem governos dispostos a assumir uma parcela fundamental do risco, da incerteza e dos custos do desenvolvimento tecnológico revolucionário, o empresariado provavelmente não realizará por sua própria conta. Os riscos financeiros e tecnológicos do desenvolvimento da energia renovável são altíssimos para o capital de risco em virtude da dimensão e da duração dos riscos técnicos.


Notas e Referências:

[1] MAZZUCATO, Mariana. Estado empreendedor. Desmascarando o mito do setor público vs o setor privado. Tradução Elvira Serapicos. 1ª ed. São Paulo: Portfolio Penguin, 2014.


 

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