Um dos debates políticos e ideológicos presente nos Estados modernos, com aguda manifestação no processo eleitoral de importantes nações e com destaque para as disputas presidenciais envolvendo os países do bloco europeu; é a discussão sobre qual deve ser a participação e o tamanho do Estado diante das políticas de desenvolvimento econômico e social.
O pressuposto conservador do sistema capitalista, representado pelo neoliberalismo, compreende que o Estado deve ser mínimo. A concepção de Estado mínimo requer o afastamento do Estado pela não intervenção na econômica e na sociedade. A máxima do Estado mínimo é a liberdade individual e a competição entre os agentes econômicos; restando ao Estado o papel de regular as relações, de garantir a legalidade e de executar os serviços mínimos e necessários à manutenção da ordem.
A teoria do Estado mínimo, vigente no século XX, surgiu para contrapor a ideia de Estado financiador do capital e do Estado garantidor de políticas sociais (Estado máximo ou Estado intervencionista). Como Estado financiador, haveria uma atuação direta na economia, constituindo empresas estatais e fomentando/financiando o desenvolvimento industrial e agropecuário. Como Estado garantidor de políticas sociais, atuaria na criação de emprego e no atendimento das necessidades humanas básicas, dentre as quais, a saúde, a educação, a previdência social e a moradia.
A questão, portanto, repousa em saber qual seria a melhor alternativa política, econômica e social; o Estado mínimo ou o Estado máximo? Para José dos Santos Carvalho Filho[1] a sociedade almeja um Estado médio, capaz de participar atreves de intervenções necessárias e adequadas. Necessidade e adequação – esses os parâmetros do atual Estado Interventivo. Para tanto, exige-se equilíbrio para evitar o paradoxal fenômeno de um Estado em demasiadas áreas e de carência em outros setores.
Decidir por um modelo de Estado não se mostrar fácil e muito menos permite afirmar que a escolha por uma única concepção filosófica seja suficiente para atender as necessidades da sociedade. Os dilemas que envolvem os defensores do Estado máximo ou intervencionista circundam questões afetas ao excesso de burocracia, ao desperdício de recursos financeiro e aos problemas éticos e morais envolvendo atos de corrupção e de improbidade – fala-se em falta de gestão. Já em relação ao Estado mínimo, a critica alcança o sistema de regulação dos serviços essenciais, prestados pela iniciativa privada após o processo de desestatização; a falta de investimentos na rede de proteção social (saúde, educação, saneamento básico, moradia); na geração de emprego e renda e, sobretudo, no financiamento e no fomento do desenvolvimento de inovações e tecnologias precípuas à cadeia de produção no campo e na cidade.
Luiz Nassif, em reportagem da Revista Carta Capital (www.cartacapital.com.br), postada em 03/fevereiro/2013, acessada em 25/maio/2017, explica que o Brasil, aos poucos, vai encontrando o meio termo pragmático para a questão dos investimentos e da operação de ativos públicos. Destaca que o Brasil, no regime militar, desenvolvia politica econômica pró Estado e, depois, com o fim do regime de exceção, passou a desenvolver politicas para eliminar o Estado.
Em meio a tais discussões surge o debate sobre o papel do Estado na economia. Indaga-se, ainda, sobre como deve ser o ativismo do Estado no universo do desenvolvimento da indústria e qual é o papel da economia/indústria financiada pelo Estado no desenvolvimento verde.
Mariana Mazzucato[2] adverte que nunca foi tão importante quanto atualmente questionar o papel do Estado na economia, pois, em muitas regiões do mundo estamos testemunhando uma retirada massiva do Estado justificada como forma de tornar a economia mais ‘dinâmica’, ‘competitiva’ e ‘inovadora’.
Verifica-se a existência de um discurso consensual que atrela ao comércio/indústria a ideia de inovação, eficiência e tecnologia, ao passo que em relação ao Estado repousa a pecha de burocrático, paralisante e incompetente.
Para Mariana Mazzucato, atrelar a imagem do Estado como uma instituição atrasada e arcaica é um erro, pois, sob o ponto de vista histórico, o Estado desempenha um papel de empreendedor. Afirma que o Estado não deve ser retirado do processo econômico e não deve restringir ou encerrar os programas do Estado em nome ou por uma economia mais competitiva ou mais empreendedora. Recomenda avaliar como o Estado pode garantir uma recuperação sustentável, especialmente em momento de crise ou da pós-crise.
No Brasil, um exemplo da aplicação empreendedora do Estado pode ser encontrado nas politicas publicas de fomento à atividade empresarial através das incubadoras; na política tributária que envolve a mitigação da exação das Sociedades Empresarias nas Zonas de Processamento e Exportação (ZPE) ou no programa SUDENE.
O Estado, em tais condições, assume o papel de estrategista, passando a subsidiar o crescimento da economia, com o consequente fortalecimento da indústria, por meio de regras jurídicas, subsídios e destinação de verbas orçamentárias. Mariana Mazzucato cita, positivamente, a experiência do financiamento da indústria no Brasil e na China pelos bancos de desenvolvimentos, que por meio de politicas de empréstimo fomentam a indústria, especialmente a indústria de inovação e tecnologia.
Desta forma, a primeira conclusão possível é a de que o Estado deve permanecer na economia, ao contrario do que apregoa o pensamento neoliberal, especialmente cumprindo o papel de empreendedor de politicas econômicas e de fomentador da indústria e da geração de emprego. A presença do Estado na econômica, aliais, perfaz a teoria do John Maynard Keynes, cujas ideias propunham a intervenção estatal na vida econômica com o objetivo de conduzir a um regime de pleno emprego.
Sobre a importância decisiva do Estado no desenvolvimento econômico, em particular no Brasil, Ivo Marcos Theis[3] sustenta que se verificou um desenvolvimento das forças produtivas no Brasil durante os anos de 1970 pela forte participação do Estado. Explica, ainda, que em razão da presença do Estado nos anos de 1970 o capital privado pode se deslocar para outras regiões do país, sobretudo em razão do planejamento estatal levado a efeito pelo Plano Nacional de Desenvolvimento e também pelos bancos regionais.
Fixado, portanto, que o Estado não deve estar ausente da econômica e que deve exercer papel de empreendedor; a questão que se coloca para o século XXI refere-se à ética da sustentabilidade por parte do Estado no fomento/financiamento da atividade econômica. Seria ético e sustentável que os recursos públicos, advindos do orçamento, financiassem práticas economias e/ou industriais poluidoras? Qual deve ser a contrapartida da fomentado no processo de desenvolvimento/uso de tecnologia de energia limpa?
Mariana Mazzucato, sobre o assunto, acertadamente, comenta:
A sustentabilidade exigirá uma transição energética que coloque tecnologia de energia limpa não poluente na linha de frente. Ela nos afasta da dependência dos combustíveis fosseis e nucleares, que são finitos, favorecendo fontes de combustíveis ‘infinitos’ – os combustíveis ‘renováveis’ originários do sol. A construção de um sistema industrial sustentável também requer tecnologia para materiais recicláveis, técnicas avançadas de gestão de resíduos, aprimoramento das práticas agrícolas, medidas de eficiência energética mais fortes em todos os setores e infraestrutura de dessalinização de agua.
Assim, é adequado concluir que o Estado é essencial para o desenvolvimento econômico e, particularmente responsável por fomentar a revolução industrial verde; passando a investir na Pesquisa e no desenvolvimento de tecnologias de energias limpas e, sobretudo, alterando o ordenamento jurídico para condicionar o financiamento público à iniciativa privada ao uso ético e sustentável dos recursos naturais e ao apoio à ciência e tecnologia com foco na redução do desperdício e na redução da poluição.
Notas e Referências:
[1] FILHO, José dos Santos Carvalho. ESTADO MINIMO X ESTADO MÁXIMO: O DILEMA. Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE), Salvador. Instituto Brasileiro de Direito Público, nº 12, dezembro/janeiro/fevereiro, 2008. Disponível na internet – http://www.direitodoestado.com.br/rere.asp. Acesso em 23 de maio de 2017.
[2] MAZZUCATO, Mariana. Estado empreendedor. Desmascarando o mito do setor público vs o setor privado. Tradução Elvira Serapicos. 1ª ed. São Paulo: Portfolio Penguin, 2014.
[3] THEIS, Ivo Marcos. Desenvolvimento cientifico, tecnológico e território no Brasi. Chapeco: Argos, 2015
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