O direito de certidão: é uma garantia constitucional

15/04/2023

A palavra certidão vem do latim certitūdo, ĭnis, que significa “certeza”. Assim, na prática, uma certidão é um documento que certifica (dá certeza a) algo. Mais especificamente, uma certidão atesta (garante) a existência de um ato ou de um fato jurídico (relevante no mundo jurídico), sendo uma garantia que uma informação é verdadeira, pois essa informação se sustenta por fé-pública (foi emitida por uma autoridade pública).

A primeira vez que o Direito de Certidão surgiu em território brasileiro foi na primeira Constituição da Era Vargas, a Constituição de 1934. Em seu Artigo 113, inciso 35, a Constituição trazia que:

“A lei assegurará o rapido andamento dos processos nas repartições publicas, a communicação aos interessados dos despachos proferidos, assim como das informações a que estes se refiram, e a expedição das certidões requeridas para a defesa de direitos individuaes, ou para esclarecimento dos cidadãos acerca dos negocios publicos, resalvados, quanto ás ultimas, os casos em que o interesse publico imponha segredo ou reserva. (português da época)”.

Todo cidadão tem o direito de requerer as certidões necessárias à defesa de direitos e ao “esclarecimento de situações de interesse pessoal” e o artigo 5º da Constituição Federal assegura que o Estado fornecerá os documentos gratuitamente. Garantia estabelecido no inciso XXXIV do artigo constitucional que trata dos direitos e deveres individuais e coletivos em decisões relacionadas a atos administrativos. 

Ambos os direitos (petição e certidão) são normas de eficácia imediata, ou seja, produzem efeitos por si só. Apesar disso, ambos encontram respaldo em leis federais. No caso do direito de certidão, a Lei 9.051/95 estabelece o prazo de 15 dias para a emissão de uma série de certidões após sua solicitação.

O direito de obtenção de certidão é pessoal. Trata-se, neste particular, de garantia individual de natureza constitucional.

A Constituição disciplina o tema no art. 5°, XXXIV, da CF/88.

“art. 5°(…)

XXXIV – são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:

a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;

b) a obtenção de certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal”.

O que diz a jurisprudência:

EMENTA HABEAS DATA. REMÉDIO CONSTITUCIONAL NÃO CABÍVEL NA HIPÓTESE SUB JUDICE. DIREITO DE OBTER CERTIDÃO. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA. EXTINÇÃO DO FEITO. A ratio essendi do Habeas Data é assegurar, em favor da pessoa interessada, o exercício de pretensão jurídica que se distingue nos seguintes aspectos: a) direito ao acesso de registro; b) direito de retificação de registro e c) direito de complementação de registros. Portanto, o referido instrumento presta-se a impulsionar a jurisdição constitucional das liberdades, representando no plano institucional a mais eloquente reação jurídica do Estado às situações que lesem, de forma efetiva ou potencial, os direitos fundamentais do cidadão. O não fornecimento de certidão de tempo de serviço da impetrante junto ao Poder Público, dá ensejo à impetração de mandado de segurança e não de habeas data, porquanto a pretensão é de obtenção de certidão para defesa de direitos de interesse pessoal (art. 5º, XXXIV, CF). Extinção do feito, ante a inadequação da via eleita. (TJ-MT – HD: 10036526920168110000 MT, Relator: HELENA MARIA BEZERRA RAMOS, Data de Julgamento: 04/05/2017, Turma de Câmaras Cíveis Reunidas de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 19/05/2017)

O STF já formou entendimento sobre o Direito de Certidão e a sua gratuidade:

Ação direta de inconstitucionalidade. Lei Federal nº 9.289/96. Tabela IV. Cobrança de custas pela expedição de certidões pela Justiça Federal de primeiro e segundo graus. Direito de gratuidade de certidões (art. 5º, inciso XXXIV, alínea b, da CF/88). Imunidade tributária. Garantia fundamental dotada de eficácia plena e aplicabilidade imediata. Interpretação conforme à Constituição.
1. A Constituição da República garante aos cidadãos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a gratuidade na obtenção de certidões nas repartições públicas, desde que “para defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse pessoal” (art. 5º, XXXIV, CF/88). Nas palavras do eminente Ministro Celso de Mello, “o direito à certidão traduz prerrogativa jurídica, de extração constitucional, destinada a viabilizar, em favor do indivíduo ou de uma determinada coletividade (como a dos segurados do sistema de previdência social), a defesa (individual ou coletiva) de direitos ou o esclarecimento de situações” (RE 472.489-AgR, Segunda Turma, DJe de 29/8/08). Essa garantia fundamental não depende de concretização ou regulamentação legal, uma vez que se trata de garantia fundamental dotada de eficácia plena e aplicabilidade imediata.
2. O direito à gratuidade das certidões, contido no art. 5º, XXXIV, b, da Carta Magna, também inclui as certidões emitidas pelo Poder Judiciário, inclusive aquelas de natureza forense. A Constituição Federal não fez qualquer ressalva com relação às certidões judiciais, ou àquelas oriundas do Poder Judiciário. Todavia, a gratuidade não é irrestrita, nem se mostra absoluta, pois está condicionada à demonstração, pelo interessado, de que a certidão é solicitada para a defesa de direitos ou o esclarecimento de situações de interesse pessoal. Essas finalidades são presumidas quando a certidão pleiteada for concernente ao próprio requerente, sendo desnecessária, nessa hipótese, expressa e fundamentada demonstração dos fins e das razões do pedido. Quando o pedido tiver como objeto interesse indireto ou de terceiros, mostra-se imprescindível a explicitação das finalidades do requerimento.
3. Ação direta julgada parcialmente procedente, de modo que, conferindo interpretação conforme à Constituição à Tabela IV da Lei 9.289, de 4 de julho de 1996, fique afastada sua incidência quando as certidões forem voltadas para a defesa de direitos ou o esclarecimento de situação de interesse pessoal, consoante a garantia de gratuidade contida no art. 5º, XXXIV, b, da Carta Magna, finalidades essas presumidas quando a certidão pleiteada for concernente ao próprio requerente, sendo desnecessária, nessa hipótese, expressa e fundamentada demonstração dos fins e das razões do pedido.
(ADI 2259, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 14/02/2020, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-071 DIVULG 24-03-2020 PUBLIC 25-03-2020)

Observe, por fim, que, evidentemente, o direito de obter certidão não é direito absoluto. Pode ser negado, por exemplo, quando imprescindível a segurança da sociedade ou do Estado.

 

Notas e Referências

BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil, de 16 de julho de 1934. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm>. Acesso em: 08 de abr. de 2023.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 08 de abr. de 2023.

 

 

Imagem Ilustrativa do Post: An old De Soto (ring a bell?) fro the 50ties, hehehe. It was still running.

// Foto de:  // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/72283508@N00/5943217166

Licença de uso: https://creativecommons.org/publicdomain/mark/2.0/

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura