O conceito legal de poluidor.

10/03/2019

 

Introdução.

A poluição do meio ambiente é uma ação humana constante, diretamente ligada a sobrevivência da humanidade, com quem mantem imbricação através da perspectiva da sustentabilidade. Definir adequadamente o conceito (legal) de poluidor é uma importante chave para solução de conflitos na seara da responsabilidade pelos custos relacionados com a prevenção de danos ou com reparação de danos ao ambiente.

Em regra, não é difícil encontrar e apurar os danos ao meio ambiente, pois, geralmente são visíveis “a olho nu”, não exigindo explicações técnicas especificas para que um Ser Humano “mediano” possa descrever práticas relacionadas com afetações poluidoras do ambiente natural, construído, cultural e do trabalho. É relativamente inteligível reconhecer a ocorrência de uma queimada; a circunstância de um desmatamento; a existência de destruição de sítios arqueológicos histórico-culturais e a falta de políticas públicas urbanas de uso consciente da água ou da educação para a coleta seletiva do resíduo sólido. É fatigante, entretanto, entrever o responsável pela execução ou pela participação (direta ou indireta) no dano ao meio ambiente.

Nesse sentido, o presente ensaio pretende apresentar o conceito legal de poluidor, acrescentando as observações doutrinais e jurisprudenciais sobre tema.

O conceito legal de poluidor. 

O conceito legal de poluidor decorre da Lei da Política Nacional de Meio Ambiente – lei n.º 6.938/81, cujo art. 3º, inciso IV, descreve como sendo “a pessoa física ou jurídica, de direito público ou privado, responsável, diretamente ou indiretamente, por atividade causadora de degradação ambiental.”.  

É importante notar, preliminarmente, que no conceito da lei n.º 6.938/81, a palavra de ordem não é “poluidor ambiental” e sim “degradador ambiental”. Etimologicamente, poluir quer dizer “corromper” ou “macular”, ou seja, na aplicação ambiental, é o mesmo que tornar sujo o ambiente. Já a palavra degradar, etimologicamente quer dizer “destruir”, ou seja, na aplicação ambiental, é igual a destruir o ambiente e não o alterar.

A lógica impõe compreender, portanto, que degradar denota um conceito cuja acepção é mais ampla que a expressão poluir, já que degradar é o mesmo que alterar adversamente qualquer das características do meio ambiente, ao passo que poluir, na forma do art. 3º, inciso III da lei n.º 6.938/81, pressupõe entender a degradação apenas da qualidade ambiental que possa ser resultante de ações que venham a prejudicar a saúde, a segurança e o bem-estar; que criem condições adversas às atividades sociais e econômicas; que afetem desfavoravelmente a biota; que afetem as condições estéticas ou sanitárias do meio ambiente ou, ainda, que lancem matérias o energias em desacordo com os padrões ambientais.

O poluidor licito e o poluidor ilícito.

A poluição do meio ambiente, por mais que possa parecer paradoxal, pode ser classificada como sendo poluição “licita” e poluição “ilícita”. Haverá poluição “licita” quando a ação do Ser Humano ou da Pessoa Jurídica for realizada mediante autorização expressa do órgão público responsável pela concessão dos licenciamentos ambientais.

A poluição “licita” é parametrizado através do Sistema Nacional de Meio Ambiente – SISNAMA, que por meio dos órgãos ambientais estabelece os parâmetros mínimos de sustentabilidade do ambiente através de índices de carga máxima de poluição por ecossistema.   

Entretanto, advirta-se que a poluição “licita” ou “licenciada” não exclui a responsabilidade civil do poluidor na hipótese de geração de danos ambientais em razão da natureza reparadora e não sancionadora do ato jurídico ambiental.

A poluição “ilícita”, por sua vez, é a ação que degrada o ambiente e viola o equilíbrio do ecossistema, sendo objeto de combate direto pelo sistema legal por meio das diversas normas, dentre as quais, a norma que prevê os crimes ambientais – Lei n.º 9.605/98.

As pessoas jurídicas de direito público e de direito privado como poluidor.

Diferentemente do que se possa pensar, além da pessoa física, as pessoas jurídicas de direito público e de direito privado podem ser poluidoras, inclusive com responsabilidade penal. Especificamente no que concerne às pessoas jurídicas de direito público, a condição de poluidor pode ser alcançada através de atos comissivos e omissivos, seja pela exploração direta da atividade econômica ou quando atua na condição de órgão licenciador (expedição de licença ambiental irregular que resulte em degradação atrai a responsabilidade como poluidor indireto).

O Poder Público, inclusive, segundo a jurisprudência mais recente do STJ, admite a responsabilidade objetiva para as hipóteses em que ocorram danos ao meio ambiente nos casos de omissão da fiscalização ambiental[1], nesse particular, com execução de natureza subsidiária[2].

Conclusão.

Vê-se, que o conceito de poluidor encontra limites na lacuna da legislação em razão da falta de uniformidade quanto aos conceitos de poluidor e de degradador. De igual forma, verifica-se que o poluidor pode ser objeto de persecução civil, penal e administrativa por atos e omissões, alcançado inclusive o Poder Público.

As informações demonstraram, ainda, que o poluidor ou degradador é imanente à natureza da vida em sociedade e, sobretudo, do sistema de produção e consumo (sistema socioeconômico); quer dizer, o Ser Humano e o sistema capitalista precisam poluir para fazer a vida acontecer.

O problema, entretanto, é que a partir do modelo de desenvolvimento econômico vigente na humanidade; da aplicação da mais-valia na relação trabalhador-emprego; do processo de indução ao consumo insustentável, orientado pelo mercado para aumentar as vendas e os lucros, a poluição “licita” não surtirá o efeito desejado de crescimento sustentável.

Logo, a persistirem as condições de uso dos recursos naturais nos patamares atuais, aliado com a falta de bom-senso e a busca do lucro a qualquer custo; não haverá ambiente ou ecossistema com capacidade de regeneração ou de atender as necessidades da sociedade atual. É fato que não podemos retroceder a vida social ao estágio rudimentar ou medieval, com a finalidade de reduzir a poluição do ambiente (aliais, a hipótese não seria uma garantia de equilíbrio ambiental), porém, também é fato que não há condições ecológicas que sustentem a voracidade do sistema no uso irrestrito dos recursos naturais sem prejudicar a vida no planeta hoje e amanhã.

É necessário, pela lógica da sobrevivência, a pronta revisão do modelo de sociedade e do modelo de desenvolvimento, alterando os alicerces atuais (poluir para viver e consumir) por uma base ecológica (conservar, recuperar, restaurar e reciclar), suprimindo a visão antropocêntrica por uma perspectiva que inclua o respeito a todos os seres existes e vivos do planeta. 

 

 

Notas e Referências

[1] REsp 1.071.741, 2009.

[2] AgRg no REsp 1001280, 2011.

 

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