O cabimento do mandado de segurança contra decisão acerca de tutela provisória e os meios para obtenção de efeito suspensivo ope iudicis aos recursos trabalhistas: primeira análise da nova redação da Súmula 414 do TST – Por Gilberto Carlos Maistro Junior

30/05/2017

Coordenador: Ricardo Calcini 

Diante da necessidade de enfrentar as diversas questões decorrentes da incompletude da legislação processual trabalhista e da consequente indispensabilidade da sua integração pela via da aplicação supletiva e subsidiária da legislação processual comum - permitida pelo disposto no Código de Processo Civil de 2015, artigo 15 e, antes, quanto à aplicação subsidiária, pelos artigos 769 e 889 da Consolidação das Leis do Trabalho - o Tribunal Superior do Trabalho, recentemente, promoveu mais uma alteração em sua jurisprudência consolidada.

Trata-se da nova redação dada ao verbete nº 414 da Súmula do TST, “em decorrência do CPC de 2015”, como expressamente traz a Resolução nº 217, de 17 de abril de 2017 (DEJT divulgado em 20, 24 e 25.04.2017).

Nele, são enfrentadas questões pertinentes à adequação do mandado de segurança como via para a “impugnação” de decisão que concede ou não tutela provisória. Trata, ainda, da adequação do mandamus como instrumento para veicular pretensão de obtenção de efeito suspensivo a recurso trabalhista.

O referido verbete sumulado pelo TST, antes da recente alteração, carregava a seguinte redação, dada pela Resolução 137/2005:

“Mandado de segurança. Tutela antecipatória. Antecipação de tutela (ou liminar) concedida antes ou na sentença. Hipóteses de cabimento ou não do ‘writ’. Lei 1.533/51, art. 1º. CPC, art. 273.

I - A antecipação da tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. A ação cautelar é o meio próprio para se obter efeito suspensivo a recurso. (ex-OJ 51/TST-SDI-II - inserida em 20/09/2000).

II - No caso da tutela antecipada (ou liminar) ser concedida antes da sentença, cabe a impetração do mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio. (ex-OJs 50/TST-SDI-II e 58/TST-SDI-II - ambas inseridas em 20/09/2000)

III - A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão da tutela antecipada (ou liminar). (ex-OJs 86/TST-SDI-II - inserida em 13/03/2002 e 139/TST-SDI-II - DJ 04/05/2004).”

Observa-se, portanto, que o verbete trazia a posição dominante na jurisprudência da Mais Alta Corte Trabalhista brasileira frente à aplicação subsidiária, no âmbito do Processo do Trabalho, do disposto no Código de Processo Civil de 1973, vigente à época da edição do entendimento sumulado em questão (2005), bem como da antiga lei do Mandado de Segurança (atualmente, vigora a Lei nº 12.016/2009). Vale lembrar que o CPC anterior manteve-se vigente até 17.03.2016 (o CPC/2015 entrou em vigor dia 18.03.2016).

Ocorre que, com a entrada em vigor do CPC atual, algumas questões até então solucionadas no verbete nº 414 da Súmula do TST passaram a exigir novo enfrentamento.

A primeira delas, sem dúvidas, encontrava-se retratada na segunda parte do item I, que, na trilha da antiga Orientação Jurisprudencial nº 51 da Subseção de Dissídios Individuais II do TST, esclarecia acerca do meio próprio para obtenção de efeito suspensivo a recurso: a ação cautelar. O problema começa a ser construído na medida em que se reconhece que nem a CLT, nem qualquer lei processual trabalhista, traz qualquer previsão específica para um Processo Cautelar Trabalhista. A consequência é que, para tanto, pela via autorizadora do artigo 769 da mesma Consolidação, aplicava-se o disposto no Livro III do CPC/1973, com as necessárias adaptações ao modelo processual trabalhista.

Sabe-se, contudo, que o CPC/2015 extirpou do sistema a figura do Processo Cautelar, ao qual era dedicado o Livro III do Código anterior. Assim, atualmente, as tutelas cautelares são consideradas espécies do subgênero denominado tutelas de urgência (v. CPC/2015, artigos 300 a 302 quanto às disposições gerais; 303 e 304 quanto ao procedimento da tutela antecipada – outra espécie de tutela de urgência -  requerida em caráter antecedente; 305 a 310 acerca do procedimento da tutela cautelar requerida em caráter antecedente) que, por sua vez, integra o gênero referido na lei como tutelas provisórias (v. CPC/2015, artigos 294 a 299, quanto às disposições gerais; 300 a 310 sobre as tutelas de urgência; 311 sobre a tutela da evidência). De modo direto e despretensioso, pode-se sintetizar o que aqui se busca demonstrar do seguinte modo:

gráfico

Desta feita, sempre nos pareceu que a solução, a partir da entrada em vigor do CPC/2015, era simples: aplicar o disposto no próprio CPC! Em outras palavras, o meio adequado para fim de postular a concessão de efeito suspensivo a recurso trabalhista passou a ser um requerimento diretamente no Tribunal competente (Juízo ad quem), com a demonstração das razões de fato e de direito que escoram a pretensão, em especial quanto aos elementos que evidenciam a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo (v. CPC, artigo 300). Tal se afirma pois, se antes, na vigência do Código Buzaid, era exigida a propositura de ação para tanto, dando ensejo ao desenvolvimento de um procedimento próprio, típico do chamado Processo Cautelar (sem ignorar os reflexos práticos também verificados a partir da inclusão do §7º ao artigo 273 do Código revogado), com o atual CPC basta o requerimento, de modo incidental ou antecedente, nesse último caso observado o procedimento previsto nos artigos 305 a 310. Pois bem. Se de um lado exibe-se inegável que não existe mais, no sistema processual, a figura da ação cautelar, de outro e de modo não menos claro, há de se reconhecer que a tutela de natureza cautelar continua possível, sendo certo que os meios para a sua perseguição sofreram nítida simplificação com o CPC/2015.Diante do exposto, considerado o fato de que o entendimento do TST sobre a matéria era no sentido de que a concessão de efeito suspensivo a recurso, no Processo do Trabalho, somente poderia ser obtido pela via da propositura de ação cautelar na qual restasse demonstrado o fumus boni iuris e o periculum in mora - em especial decorrente dos prejuízos irreparáveis ou de difícil reparação que a parte condenada no cumprimento de determinada obrigação poderia sofrer frente à possibilidade de início de execução provisória - com a supressão da autonomia do Processo Cautelar pelo CPC/2015 e a falta de previsão específica na lei processual trabalhista, nesse tocante, qual passaria a ser o procedimento adequado para a parte que necessita buscar a atribuição de efeito suspensivo ao seu recurso, impetrado perante órgão da Justiça do Trabalho?

Ademais, essa conclusão experimenta reforço no que traz o artigo 1.029, §5º, do Código de Processo Civil em vigor, quanto ao procedimento para obtenção de efeito suspensivo aos recursos especial e extraordinário, importantes para fim de definição da autoridade para quem deve ser endereçado o requerimento. Traz o referido dispositivo:

“Art. 1.029.  O recurso extraordinário e o recurso especial, nos casos previstos na Constituição Federal, serão interpostos perante o presidente ou o vice-presidente do tribunal recorrido, em petições distintas que conterão:

[...].

§ 5O pedido de concessão de efeito suspensivo a recurso extraordinário ou a recurso especial poderá ser formulado por requerimento dirigido:

I – ao tribunal superior respectivo, no período compreendido entre a publicação da decisão de admissão do recurso e sua distribuição, ficando o relator designado para seu exame prevento para julgá-lo;            (Redação dada pela Lei nº 13.256, de 2016)      

II - ao relator, se já distribuído o recurso;

III – ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, no período compreendido entre a interposição do recurso e a publicação da decisão de admissão do recurso, assim como no caso de o recurso ter sido sobrestado, nos termos do art. 1.037”.  

Ora, considerada a regra trazida na CLT, artigo 899, caput, os recursos trabalhistas são recebidos com efeito meramente devolutivo – portanto, são desprovidos de efeito suspensivo. Da mesma forma, no tocante aos recursos especial e extraordinário, em regra, são desprovidos de efeito suspensivo – é sempre importante lembrar da exceção do artigo 987, §1º, do CPC, que carrega hipótese de concessão de efeito suspensivo ope legis aos recursos especial ou extraordinário. Porém, como é possível observar no disposto no artigo 1.029, §5º, do mesmo Código, o sistema permite a concessão do efeito suspensivo ope iudicis, mediante requerimento do recorrente. Como esclarece Alexandre Freitas Câmara, nesse caso, a “atribuição de efeito suspensivo ao recurso especial é medida concessiva de tutela de urgência, de natureza cautelar, razão pela qual tem como pressupostos a existência de fumus boni iuris (probabilidade de que o recurso especial ou extraordinário venha a ser provido) e de periculum in mora (risco iminente de dano para o direito material ou para o resultado útil do processo” (O Novo Processo Civil Brasileiro. São Paulo: Atlas, 2015. p.548).

Nota-se que há identidade entre as situações. E mais: há, também, identidade, no que toca às soluções atribuídas no artigo 1.029, §5º - possibilidade de obtenção de efeito suspensivo ope iudicis pela via de tutela cautelar – e a consagrada no entendimento do TST, na forma da Súmula, verbete nº 414, I, in fine – ação cautelar -, a permitir a adaptação do entendimento, inclusive em prestígio à aplaudida simplicidade, com a substituição da providência antes exigida – ação – por um requerimento de concessão de tutela provisória de natureza cautelar, observadas as regras procedimentais dispostas no próprio artigo 1.029, §5º, por analogia, no mínimo.

Esse entendimento restou prestigiado na nova redação do verbete nº 414. Na busca de atualizar os entendimentos sumulados pertinentes a matéria processual, adequando-os ao trazido pelo CPC/2015, o TST, como já salientado, em 17 de abril de 2017, deu nova redação ao mencionado verbete, que passou a trazer, no seu item I, parte final, o seguinte: É admissível a obtenção de efeito suspensivo ao recurso ordinário mediante requerimento dirigido ao tribunal, ao relator ou ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, por aplicação subsidiária ao processo do trabalho do artigo 1.029, § 5º, do CPC de 2015”.

Vale anotar, aqui, uma outra novidade carregada pelo texto atual do verbete apontado, item I. Antes da Resolução nº 217 (ou seja, antes de 17 de abril deste ano), a Súmula do TST indicava que, por meio da ação cautelar, era possível buscar-se a atribuição de efeito suspensivo a recurso. Com a nova redação, alude ser admissível a obtenção do dito efeito ao recurso ordinário, interpretação restritiva que não parece adequada frente ao reconhecimento de possibilidade de atribuição do mesmo efeito, ope iudicis, até mesmo aos recursos especial e extraordinário (v. o já referido artigo 1.029, §5º, do CPC).

Mas a nova redação do verbete em estudo não inovou apenas nessa questão.

Alguns entendimentos foram mantidos, sofrendo, apenas, atualizações no que toca às referências nominais a institutos do CPC/2015. Dentre elas, nota-se que, na primeira parte do mesmo item I, trazia o verbete nº 414 da Súmula do TST que a antecipação de tutela concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança uma vez que, contra ela, cabe recurso ordinário.

O referido entendimento afina-se ao disposto no artigo 5º, II, da Lei nº 12.016/2009 (Lei do Mandado de Segurança). Traz o referido dispositivo que não se concederá mandado de segurança quando se tratar de decisão contra a qual caiba recurso com efeito suspensivo. Aqui, em que pese o disposto no artigo 899, caput, da CLT, ou seja, que os recursos trabalhistas são recebidos com efeito meramente devolutivo, há de se considerar o entendimento acima já estudado no sentido de que, pela via da tutela cautelar, pode-se buscar a atribuição do efeito suspensivo ao recurso.

A nova redação apenas alterou o texto do item I do verbete para substituir antecipação de tutela por tutela provisória. Passou a trazer: “I – A tutela provisória concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário”.

Duvidosa a necessidade da referida alteração, afinal, a tutela antecipada não deixou de existir no sistema processual civil, tratando-se de espécie do subgênero tutela de urgência, que, por sua vez, integra, ao lado da tutela da evidência, o gênero tutela provisória.

Já os itens II e III, além da substituição da menção a antecipação de tutela e/ou liminar por referência a tutela provisória, sofreram outra alteração importante. Nota-se que o item II do verbete em estudo trazia que, no caso da tutela antecipada ou liminar ser concedida antes da sentença, cabe a impetração de mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio.

Vale lembrar que a CLT, no artigo 893, §1º, fixa a regra da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias, de modo tal que o agravo de instrumento não se mostra cabível, na Justiça do Trabalho, para os mesmos fins pontuados no CPC, artigo 1015, dentre outros. Sabe-se que, no Processo do Trabalho, há recurso homônimo mas com hipótese de cabimento restrita ao combate a decisões que negam recebimento a outro recurso (v. CLT, artigo 897, b). Aliás, ainda no sentido da irrecorribilidade imediata das decisões interlocutórias, em regra, o entendimento fixado pelo TST no verbete nº 214 da sua Súmula.

Assim, considerado o disposto no já referido artigo 5º, II, da Lei nº 12.016/2009, contrario sensu, correta se mostrava a conclusão carregada na Súmula do TST sobre o cabimento do mandamus nesse caso – por não caber, nos domínios do Processo do Trabalho e de forma imediata, recurso contra decisão interlocutória.

Ocorre que o verbete em análise, item II, fazia menção ao dito cabimento apenas frente à concessão da tutela de urgência antes da sentença, deixando de referir à mesma possibilidade nos casos de não concessão (indeferimento do requerimento).

Ora, tão grave quanto (ou até mais que) a situação daquele que sofre – contra os seus interesses – a concessão da tutela de urgência, exibe-se a daquele que, embora tenha demonstrado a probabilidade do seu direito e o periculum in mora, encontra-se diante do indeferimento do requerimento formulado, com a não concessão da tutela de urgência perseguida, indispensável, não raro, para preservar o seu direito ou, na seara trabalhista, até mesmo garantir a subsistência digna no curso do processo – que, há de se reconhecer, nem sempre se desenvolve de modo atento à garantia constitucional da duração razoável (CF, artigo 5º, LXXVIII).

Sensível a estas e outras constatações semelhantes, o TST deu nova redação ao mencionado item II, de modo a solucionar essa injustificável omissão. Traz, agora, o seu texto: No caso de a tutela provisória haver sido concedida ou indeferida antes da sentença, cabe mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio”.

Por fim, na mesma linha, alterou-se o texto do item III para, agora, carregar: “A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão ou o indeferimento da tutela provisória”.

Vale, então, rememorar o texto da Súmula do TST, verbete nº 414, atual redação, por inteiro: 

MANDADO DE SEGURANÇA. TUTELA PROVISÓRIA CONCEDIDA ANTES OU NA SENTENÇA (nova redação em decorrência do CPC de 2015) - Res.  217/2017 - DEJT divulgado em 20, 24 e 25.04.2017

I – A tutela provisória concedida na sentença não comporta impugnação pela via do mandado de segurança, por ser impugnável mediante recurso ordinário. É admissível a obtenção de efeito suspensivo ao recurso ordinário mediante requerimento dirigido ao tribunal, ao relator ou ao presidente ou ao vice-presidente do tribunal recorrido, por aplicação subsidiária ao processo do trabalho do artigo 1.029, § 5º, do CPC de 2015. II – No caso de a tutela provisória haver sido concedida ou indeferida antes da sentença, cabe mandado de segurança, em face da inexistência de recurso próprio. III – A superveniência da sentença, nos autos originários, faz perder o objeto do mandado de segurança que impugnava a concessão ou o indeferimento da tutela provisória”.

Essas, as considerações iniciais sobre o tema, traçadas apenas como introdução ao estudo das relevantes questões enfrentadas pelo TST nesse verbete, indispensáveis para a viabilização da prestação jurisdicional adequada que, no instituto da tutela provisória, encontra instrumentos valiosos à pacificação das relações jurídico-sociais, da aproximação do Direito à Justiça bem como da monitorização do procedimento judicial, tão relevante para, no plano do sensível aos jurisdicionados, obter-se, se não de modo definitivo, ao menos de forma efetiva – em que pese provisória -, a harmonização razoável entre tempo e processo.

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