O ano é novo, mas o caminho é o mesmo – Por Paulo Silas Taporosky Filho

01/01/2017

Finalmente 2017. Muitos suspiram aliviados que o terrível ano de 2016 acabou, já que foi um ano turbulento, repleto de acontecimentos que ainda não foram totalmente digeridos. No campo do direito não foi diferente. Em sua última coluna (Senso Incomum) do ano, Lenio Streck[1] listou várias “decisões ativistas-behavoristas de 2016” que demonstram que o estrago no direito também foi grande. Sim, a coisa foi demasiadamente complicada, e por mais esperança que todo o início de ano nos traga, vejo pouca coisa em concreto que aponte para a possibilidade de mudanças efetivas nesse ano de 2017.

Claro que temos uma importantíssima linha de frente doutrinária que pratica aquilo que Lenio Streck chama de constrangimentos epistêmicos. Temos também atores jurídicos comprometidos com o desempenho escorreito de suas funções. Essa luta é importante e muito necessária. Denunciar, constranger e se insurgir contra as mazelas que permeiam o Direito é preciso. O problema é que as ervas daninhas estão se proliferando exponencialmente, enquanto os efeitos da resistência são paulatinos.

Não podemos perder essa guerra, em que pese as baixas já sejam grandes. Ocorre que acreditar que é com a simples mudança de ano que a coisa magicamente acontecerá é uma postura em tanto quanto ingênua. No plano concreto, a mudança de um ano para outro nada significa. Organizamos nosso tempo de acordo com a forma pela qual o tempo é organizado. Mas depende de nós colocar em prática todas aquelas promessas de final de ano que são feitas. A maioria fica apenas na promessa. Basta passar o torpor da emoção da virada de ano que tudo volta ao normal. É sempre assim. Os problemas persistem, dependendo de um plano prático efetivo para que sejam superados.

Um problema maior que existe e podemos apontar no campo do Direito é que sequer as promessas são feitas. Por mais que a maioria das pessoas as descumpram, as promessas de fim de ano servem como fontes motivadoras para mudanças no ano seguinte, de modo que acabam valendo a pena para alguns poucos, ou seja, há pessoas que colocam em prática tudo (ou parte) aquilo que se prometeu. Se a intenção é perder peso, dietas e exercícios entram nos planos. Se for uma guinada na carreira, dedicação e estudos podem estar entre as programações feitas. Mas e no Direito, o que e como se faz?

Como dito, inexistem sequer promessas de final de ano feitas por aqueles que operam o e no Direito. Que bom seria ver alguns professores dizendo: “Ano próximo mudarei minha abordagem na sala de aula, a começar pelos livros que utilizo e indico para a leitura. Menos manuais plastificados e mais autores robustos”. Ou certos alunos: “Prometo que em 2017 faltarei menos aulas para ir ao bar, bem como lerei os livros que o professor manda ler”. Quem sabe alguns juízes: “Me esforçarei para evitar decisões que se pautem naquilo que eu penso ser o justo, prezando assim por decisões com base no que o Direito, e não a moral, regula como deve ser”. Ou ainda certos promotores: “Prometo parar de promover um espetáculo a cada denúncia que ofereço”. Determinados advogados também não escapariam: “Prometo evitar a criação de oportunismos, chicanas temerárias, bem como parar de ficar prometendo coisas impossíveis aos meus clientes”. Que bom assim fosse. Mas cá estamos, em 2017, sabendo que nenhuma dessas promessas foi feita.

O ponto é que por mais que tenha se iniciado um novo ano, as esperanças se esvaem quando se percebe que as posturas permanecem inalteradas. Digo que o caminho é o mesmo pelo fato de que o conduzir da situação no cenário jurídico é procedido de igual forma pelos mesmos que assim faziam no ano passado (e nos anteriores). Um novo ano não traz boas novas por si só. Isso é metafísica superada. O que um novo ano pode gerar são expectativas, desde que pautadas em projeções concretas a fim de que se possa acreditar em mudanças. Aí sim pode se falar em esperança. Mesmo com as várias celeumas existentes, eu tenho a minha esperança, a saber, que tenhamos um Direito mais sério, mais coerente, mais digno. Mas é necessário que se persista na batalha com robustez, estando cientes de que novos cercos virão e muito se lamentará pelos baques que Direito vai sofrer. Vale a persistência. Só não vale desanimar. A esperança ainda é a última que morre.


Notas e Referências:

[1] STRECK, Lenio Luiz. Breve ranking de decisões que (mais) fragilizaram o Direito em 2016. Disponível em: http://www.conjur.com.br/2016-dez-29/senso-incomum-breve-ranking-decisoes-fragilizaram-direito-2016 . ISSN 1809-2829. Acesso em 29/12/2016.


 

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