O advogado e a advocacia: uma percepção pessoal

01/05/2016

Por Nayara Swarowski - 01/05/2016

PAPER POSITION

Devido à relevância desta temática deontológica a nossa formação acadêmica, a obra em análise[1] vem a complementar o caráter profissional que nos bancos da Graduação construímos. De modo introdutório, faz-se mister alongar um parágrafo ao privilégio de conhecer – ou relembrar – um tanto a mais acerca da carreira jurídica do autor da obra que embasa o que passamos a expor, mesmo que brevemente.

César Luiz Pasold já nos é conhecido a partir do primeiro semestre: apresentam-nos desde a disciplina de Metodologia Científica, em que ele se torna um dos maiores referenciais teóricos ao que diz respeito à investigação científica no âmbito jurídico; tanto nas disciplinas de caráter material quanto nas de forma propedêutica, diria que ler Pasold é condição precípua ao investigador jurídico. A Academia muito tem a preconizá-lo.

“Inevitavelmente, o pensamento sobre a sanidade do Professor Pasold novamente me cutucou. Ocorre que, desta vez, o Mestre estava nos ensinando a ler de verdade, a perceber de maneira efetiva o conteúdo do texto. Estava nos mostrando como potencializar os estímulos discursivos abertos pelas palavras contidas naquelas páginas”.[2]

O livro in voga aborda, em suma e na percepção de César Pasold, a descrição do autor acerca da formação recomendada à um profissional da Advocacia, além de propor uma reflexão no tocante às qualidades primordiais que o advogado deve possuir e nutrir ao longo da sua jornada almejando um direito humanizado.

Metodologicamente, o livro é composto por agradecimentos iniciais feitos pelo próprio autor, momento em que de antemão identificamos a postura também da humildade científica e intelectual, em relação ao próximo, sem que se prenda à arrogância, tão difundida ante aos profissionais das mais diversas carreiras jurídicas contemporâneas.

Mais que mera formalidade, portanto, o respectivo autor é frequentemente citado por renomados juristas como Lenio Luiz Streck, não apenas por seu conhecimento, mas também por sua trajetória impoluta, que vem ao encontro do entendimento da autora do presente escrito.

Há, ainda quanto à estrutura física da obra, um prefácio do autor incutido em sua opinião introdutória. Na primeira parte, Pasold explana acerca dos bacharéis em Direito e seus desafios, condição em que aproxima mais a autora desse texto e o autor da obra em pauta, havendo identificação quanto à reflexão do cenário em que eles – os bacharéis – se encontram e que, em breve, encontrarei logo à frente no estirão jurídico a que sou ou estou predestinada.

Na segunda parte da obra, Pasold destaca o advogado em suas características básicas, sua condição ante a nossa Constituição Federal de 1988, e faz, de modo plenamente compreensível, um apanhado burocrático que regulamenta toda a atuação e todo o exercício da Advocacia.

Fortemente recomendada, a leitura vem a ser mais incisiva no que diz respeito à ética do profissional em pauta: como agir de forma ética, cumprir a nobre missão da Advocacia em um cenário contemporâneo que tenta, a todo custo e a qualquer preço, dissuadir o profissional? Como honrar o discurso de Rui Barbosa de Oliveira?

O objetivo deste presente trabalho concentra-se em destacar o modus operandi do profissional da Advocacia – tanto pública, por meio do Defensor Público, quanto privada – em seu compromisso com a justiça ou com o justo. É relevante constar que se trata apenas de uma visão acadêmica da obra, uma releitura para que jamais, enquanto in perpetuum estudante de Direito, jamais me esqueça da respectiva obra.

De modo introdutório, o renomado autor relata seus anos na Academia e como foi constituindo sua personalidade profissional. É perceptível, portanto, a postura que um acadêmico de Direito necessita adquirir já nos primeiros momentos do curso, tão logo lhe seja introduzida a seara jurídica: por exemplo, possuir boa oratória, ter facilidade em comunicar-se, possuir excelente escrita são atributos inicialmente requisitados, mesmo que de modo ameno.

Quase que como uma narrativa, Prof. Pasold conta que, nessa obra, busca resgatar os elementos que identificavam seu perfil antes de iniciar sua graduação em Direito e na perspectiva de adentrar ao curso. Este é um ponto relevante do prefácio, que vem ao encontro da postura do estudante: a expectativa de um calouro, recém inserido no curso e que nada aprendeu sobre a ciência jurídica e nem sobre a dinâmica da vida universitária, constrói em pouco tempo uma série de conceitos acerca dessa nova etapa de sua vida. Com todos os acadêmicos ocorre o mesmo. O mesmo processo é natural, intrínseco a quem está, abruptamente, nessa fase da vida. A expectativa do que fazer de sua vida. Como será aquele (novo) desafio? Quais barreiras poderá ou irá encontrar? A justiça é mesmo para poucos ou o justo é para todos? É necessário ser original no exercício da função ou deve-se seguir um padrão de sucesso anteriormente consagrado? De que forma poderá contribuir para a sociedade e como a sociedade reagirá às suas ações? Ergo, são questionamentos inerentes ao raciocínio de um aprendiz na cena universitária e jurídica.

A conjuntura acadêmica hoje nos fornece muitas mais facilidades em comparação ao tempo de Pasold na Academia: os livros eram escassos, de elevados preços. Hoje, em nosso cenário, é cediço que a tecnologia muito nos empoderou o estudo e potencializou seus compartilhamentos.

O autor nos dá dicas preciosas quanto ao labor advocatício, implícitas em suas impressões, no recôndito de suas sensações iniciais à sua época de graduando. Exemplo disso quando diz que, a seu tempo, não existia a disponibilidade de materiais quanto contemporaneamente encontramos, o que dispendia dele mais interesse (no sentido de ter culhão) no exercício da profissão. O interesse deve estar presente tanto para localizar um livro e desbravá-lo quanto para atuar na própria Advocacia, ante a um caso complexo: o interesse, o brio do profissional é colocado, sim, em pauta desde o início da Graduação, de uma forma ou de outra.

Caros leitores, sabemos que, por vezes, a insegurança ronda o jovem advogado, que desde já contrai notável responsabilidade. As dúvidas são incontáveis e intermináveis, ao passo que as certezas mais se abrangem às obrigações inerentes ao exercício da Advocacia.

A contextualização acima em relação ao cenário acadêmico e toda a circunscrição era necessária. Não há possibilidade de descrever o atuar de um advogado sem relatar sua relação com o Direito desde sua época de faculdade. Esse entrelaçamento é fundamental. Por ora, cuido, pois, de adstringir o conteúdo do texto apenas ao fulcro da Advocacia e sua operacionalização, repito, dentro de uma perspectiva acadêmica.

Há de se mencionar que, nem sempre e nem por todos, é conhecido o real papel do advogado, em sua essência. Os transeuntes a frente da faculdade não sabem de seu primordial encargo, assim como nossos familiares igualmente desconhecem por mera insipiência. Ele atua na parcela da sociedade que não se conhece nem se domina do Direito. E, justamente por isso, socorrem-se a ele. Ele é o responsável por traduzir o que o Estado exprime (e oprime) à sociedade, leigos e vis. Talvez aí more uma das mais nobres incumbências do profissional: estar onde a margem da sociedade se encontra, para dar-lhes amparo que nem mesmo seus semelhantes tem a benevolência de conceder.

A tríade escrita por Pasold em seus apontamentos iniciais da obra denotam bem a “atitude ideal” de um advogado: competência cultural (não meramente técnica), ética irrepreensível e espírito público e cidadania ativa. O primeiro é o que hoje se busca arduamente, um jurista e advogado com atuação humanista frente às questões legalistas e manuais com as quais se deparam – e seu feeling em perceber a distinção dessa antítese; a segunda competência necessária trata-se da ética perfeita em sua conduta mesmo com o orbe ao seu redor tentando seduzi-lo e, por fim, como terceira característica, espírito público e cidadania ativa condizem com a pose dinâmica do profissional, sendo este empenhado com a causa e laborar com verdadeira paixão pelo ofício.

Um ponto primordial que o Prof. Pasold coloca o leitor à parte é quando fala da consciência jurídica. Segundo ele, esta vem a ser:

“(...) é a noção clara, precisa, exata, dos direitos e dos deveres que o indivíduo deve ter, assumindo-os e praticando-os consigo mesmo, com seus semelhantes e com a sociedade. Portanto, a consciência jurídica, num primeiro momento, é a noção explícita que alguém detém a respeito de seus direitos e obrigações.”

É o bacharel em Direito que desde o momento em que se forma, adquire a responsabilização por sua consciência jurídica. Concomitantes são – ou deveriam ser – seus modus operandis e suas culturas éticas formadas no andar da Graduação. O êxito, a plenitude dessa consciência jurídica é que resulta a figura do genuíno jurista, limpidamente descrita pelo Prof. Pasold.

O dinamismo do acadêmico do Direito, agora retornando à análise da formação profissional do advogado, deve ser, segundo Pasold, dirigido ao caráter “reflexivo, pesquisador e político”. Outra tríade de suma importância ao indumento do advogado. Anotem. Com o passar das leis, talvez nos esqueçamos desses conselhos.

O acadêmico com vistas à Advocacia já deve ter interesse e gosto pela leitura, pela comunicação, mostrando seu domínio persuasivo ante a qualquer argumento – por mais ínfimo que seja para dar ensejo ao defensor de logo adiante.

Igualmente ainda o acadêmico necessita ter postura investigativa, dedicar-se à leitura de todo o gênero a fim de ampliar sua gama de conhecimentos, convencendo-se de que nunca esgotará sua sapiência, em qualquer área da Ciência Jurídica, principalmente porque esta modifica-se no tempo, no espaço e de acordo com os valores estabelecidos pela sociedade.

Não menos importante, despindo-se da vaidade acadêmica, o estudante e o executor da ordem devem possuir espírito crítico para constituir opiniões construtivas, a fim de contribuir com a cultura jurídica.

Ao que concerne à sua caracterização básica e Legal, o advogado, como bem disciplina Pasold, é capacitado para postular a qualquer órgão do Poder Judiciário e exercer as atividades de consultoria, assessoria e direção jurídicas, por óbvio, mediante inscrição na OAB – Ordem dos Advogados do Brasil.

O advogado é tão primordial na conjuntura política-jurídica-social, que na Carta Magna há comprovação e instituição de sua essencialidade, conforme a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988:

“Art. 133. O advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.”

Ainda sob a égide legalmente aferida ao profissional da Advocacia, vê-se que a ele também é depositada responsabilidades administrativas e funcionais, dentro do que a Lei o concede quanto ao ofício.

Ganha especial proeminência o Código de Ética e Disciplina da OAB na obra estudada. É perceptível a preocupação do Poder Judiciário no seu correto e restrito cumprimento, por parte do profissional do Direito habilitado legalmente para a função, em que se aguarda do mesmo a postura realmente apropriada para o honesto labor. Faz-se necessária a menção de que os causídicos também são regidos “subjetivamente” pelo Regulamento Geral do Estatuto da Advocacia e da OAB.

Quando Pasold coloca que o alavancar do profissional da Advocacia depende de algumas características salientadas acima (cultural e técnica; ética; espírito público e cidadania ativa, bem como a lembrança da sua missão primordial) a serem desenvolvidas e reconhecidas pelos profissionais da Advocacia.

Em relação à característica cultural e técnica, condiz com o interesse e tino do advogado buscar sempre o aperfeiçoamento pessoal, profissional e intelectual, de modo a contribuir socialmente. E, tecnicamente, denota ao advogado emergir-se em sua sofisticação intelectual, cujos efeitos incidirão em sua comunidade.

Ao que tange à característica ética inerente à função do advogado, Pasold postula que não basta o profissional jurídico possuir senso ético, se este não agir eticamente em seu meio.

Além da postura ética do profissional da Advocacia e de suas características culturais e técnicas intrínsecas ao seu perfil laboral, o advogado deve possuir espírito público e cidadania ativa, que levam-no à concretização de sua missão principal.

Entretanto, na circunscrição acadêmica, a vaidade intelectual do Advogado, especialmente do militante, é inversamente proporcional à ética requisitada em sua profissão. Para cumprir sua incumbência social, nobremente incutida em sua atividade, o advogado necessita despir-se de quaisquer pré-conceitos, medos ou repulsas.

A parte final da obra in voga vem a ser, naturalmente, a conclusão do autor acerca do tema proposto. A percepção pessoal e as esperanças quanto ao curso de Graduação em Direito, ao Bacharel, ao Advogado, à OAB, à administração da Justiça, e quanto a própria obra são destaques derradeiros que tiveram o exame do respectivo autor.

É válida a menção quanto às expectativas do autor, que coincide com a da autora desse texto, quanto aos cursos de Graduação em Direito: estima-se a qualificação do ensino jurídico brasileiro, propondo mais qualidade e atenção aos conteúdos abordados. Verifica-se, à minha análise, a necessidade de atualização – sem esquecer do que nos é consagrado – do que nos é transmitido em sala de aula; não menos imprescindível, as disciplinas propedêuticas suplicam maior cautela e por mais espaço por parte das grades curriculares das faculdades.

Do mesmo modo como se roga por ética e vigor no exercício da Advocacia ao profissional recém habilitado na OAB, é explicito que se busca incessantemente por universitários mais ativos desde o princípio da graduação.

Em relação ao Bacharel, Pasold espera que a consciência jurídica o tome por inteiro, percepção esta a qual comungo, visto que a partir do momento que o bacharel entra nessa condição, na iminência de escolher uma – dentre as mais diversas – carreiras jurídicas, este a escolha e escolha para exercer da forma mais estimuladora e direita possível, sempre se embasando na porção ética que ronda o profissionalismo da área jurídica.

Pasold menciona ainda suas expectativas quanto ao advogado, sendo a principal a da vocação. Sob minha ótica, com ela, o profissional deve possuir altivez, coragem, bravura, brio, culhão para exercer sua função social, mesmo que o ambiente externo tente desvirtuá-lo. Este ponto crucial de nossa análise responde, inclusive, as perguntas introdutórias do presente escrito.

Quanto à OAB – Ordem dos Advogados do Brasil e à administração da justiça, o autor categoricamente aguarda que haja veracidade e paixão à respectiva função, sendo que, deste modo, cumpre-se a função social da Advocacia de modo conciso por meio de seus regulamentos e regimes a ela instituída especialmente.

De modo concludente, em consonância com a autora desse texto, Pasold possui esperanças quanto aos efeitos da leitura do livro no leitor ávido, exaltado ou mesmo curioso: que não se perfaça essa reflexão a que me propus nesse trabalho, que haja pensamento crítico acerca de tudo aquilo que se tem como consagrado: pois, se a dúvida é o princípio da sabedoria, como remate temos que a sapiência não é esgotável, as dúvidas e mesmo os paradoxos são saudáveis ao ponto de debatê-las, no intuito de edificar intelectualmente a si mesmo. Até a próxima!


Notas e Referências:

[1] PASOLD, Cesar Luiz. O advogado e a advocacia – uma percepção pessoal. Florianópolis: Ed. Terceiro Milênio, 1996. 178 p.

[2] Fragmento de artigo escrito por Claudio Melim no site Empório do Direito, em homenagem ao autor da obra em análise, Cesar Luiz Pasold. Disponível em: << http://emporiododireito.com.br/homenagem-a-cesar-luiz-pasold-por-claudio-melim/ >>


Nayara Swarowski. Nayara Swarowski é Graduanda em Direito pela Universidade do Vale do Itajaí. Monitora do Grupo de Pesquisa e Extensão Paidéia-BC do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas da UNIVALI (BC). Pesquisadora na área de Direitos Humanos e Cidadania, Sociologia Jurídica, Criminologia e Direito Empresarial. .


Imagem Ilustrativa do Post: Just can't put this book down ! // Foto de: Craig Sunter // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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