Por Gabriel Antinolfi Divan e Alexandre Morais da Rosa - 15/06/2015
Liberdade – essa palavra que o sonho humano alimenta: que não há ninguém que explique, e ninguém que não entenda!
Cecília Meirelles [1]
Há quem tenha medo, que o medo acabe
Mia couto
A participação do escritor moçambicano Mia Couto na edição de 2011 das Conferências do Estoril se destaca logo prima facie por um início inusitado. Marcante timidez era visível no rosto do literato ao inicialmente se ‘desculpar’ com o público – e frente aos debatedores ali presentes - por pretender ler sua intervenção: Mia Couto assume uma espécie de sentimento relativo à ausência de propriedade de seu local de fala, por ser um ficcionista participando de uma discussão temática com área que não lhe é (ou seria) afim: a segurança pública.
O que se vê, no entanto, nos pouco mais de sete minutos que o texto elaborado pelo escritor ocupa em sua leitura, é uma das mais contundentes, emocionantes, lúcidas e (nenhuma novidade para o público leitor de suas obras) belas aproximações que o tema já recebeu [2].
Notadamente em nosso tempo, e especialmente em relação à margem periférica política onde estamos incluídos, a questão de uma cosmovisão (neo)liberal e a forma como a concepção da necessidade/limites de atuação dos diversos aparelhos estatais ganham contornos estranhos. Nesse viés, é importante perceber a captura do termo ‘liberdade’ para confins de uma nova significação que, em alguns momentos, dá tons de uma exclusiva matiz no preenchimento substantivo da ideia, e, em outros, força o léxico e a pertinência semântica da palavra no vernáculo para lhe ostentar uma definição que o vira ao avesso.
Vivemos em um momento curioso onde algumas reciclagens de ideários passados ostentam nomes e fachadas legitimantes, mas procuram deixar de lado elementos desses mesmos ideários na proposta de uma recauchutagem teórica. A problemática reside em o que renovar e no que se podem estabelecer prioridades de descarte relativas a discursos tão datados quanto pertinentes, em um ou outro aspecto.
Vivemos, pois, em um cenário jurídico-político onde há uma espécie de coleta seletiva de valores calcados (supostamente) em uma noção de liberalismo que ganha ares alvissareiros quando se fala em livre-iniciativa (do ponto de vista de ‘mercado’), e recrudesce até um verdadeiro elogio mascarado (ou nem tanto) de uma lógica sinistra de controle em campos onde uma liberdade em sentido estrito vivifica seu significado mais natural.
Truque lastreado em proposições legais que agem como se (ironia) radicais livres fossem receptáculos férteis para acoplagem a tendências veladas e falácias tão evidentes quanto triunfais. Truque que não escapa, no entanto, do filtro de uma crítica igualmente atenta e forte (‘é preciso estar...’), capaz de identificar o deslizar dos significantes num fluxo contínuo de recombinação de sentidos [3].
Quando a liberdade está atrelada à ordem, e mais, a um específico conceito de ordem, [4] que é epiderme de um leitmotiv que precisa de encobrimento quando não ousa dizer seu nome, estamos esfacelando preceitos em nome de outros – e o pior: buscando logros que convençam o público do picadeiro do contrário.
O reflexo político e o reflexo jurídico desse logro é querer fazer crer que, como em um jogo orwelliano, há mais liberdade num sentido amplo e irrestrito quando houver (nenhum rubor) menos ‘liberdade’: a dissidência deve ser submetida a uma espécie de estágio neutro de temperatura e pressões (sociais), onde a bússola vislumbra apenas um referencial e coliga, ou tolera ou ainda destrói as possibilidades que lhe possam atormentar. Em nome de um cenário onde a bola da vez é, e sempre será, um mercado e uma lógica que lhe é atinente (em sentido lato) e própria (especificamente), as lentes focalizam um modus vivendi que soaria estranho para alguém cujo pensamento – no quesito – deveria ser icônico [5].
Nem sequer a lógica jurídica que tem a particularidade intrínseca de se colocar num ‘natural’ posicionamento de ‘protagonismo’ supera a armadilha e se vê enredada na trama dos conceitos dessa liberdade (mercadológico-religiosa) no altar do capital. A segurança cidadã passa a ser dado de accountability para fomentar índices de risco que, em última análise, dispõem sobre investimentos especulativos ‘no país’.
E enquanto alguns ainda creem em mitos teóricos monoculares e em apropriações jurídicas que se afastam da discussão política – vivificando no século XXI (ainda) o inaceitável isolamento dogmático já vergonhosamente desvelado – a grande tarefa parece perceber[6] e problematizar ainda mais essa sempre obscena relação: os ‘choques de ordem’ orquestrados[7] e os acentos paladinos dos discursos jurídico-políticos atinentes a essa lógica são mandatários fiéis de uma ordem clara – no caso a de tolerar, em nível ‘zero’, instabilidades desinteressantes para que o cotidiano do capital - a bússola da pertinência social - siga seu curso. No caso, reflexo ou efeito disso é uma acentuada retroalimentação dos discursos punitivos ‘oficiais’ e do senso comum que suplementam um ao outro, não conseguindo ocultar notas classistas, higienistas e racistas.
A violência é constitutiva da sociedade e a leitura, com alicerce na psicanálise pode, quem sabe, nos aproximar um pouco mais do fenômeno stalking. Faz-se necessário, então, um retorno a Freud[8], na via da leitura jurídica e com Lacan. Pode-se iniciar com a proibição do incesto, esta lei básica e estruturadora das relações sociais. A lei básica, que inaugura a cadeia de significantes, é uma interdição sexual; por certo, a questão do Direito orbita sob a sexualidade. O Direito Penal, na sua pretensão de regulamentar a vida social, impondo limites, possui inscrita a ordem das pulsões, enfim, fala de sexualidade, quer queiram, quer não, mormente os (falsos) pudicos de plantão, conforme afiança Lacan: “lembrarei ao jurista que, no fundo, o direito fala do que vou lhes falar – o gozo.”[9] A pulsão, por sua vez, segundo Freud[10], seria um conceito limite entre o psíquico e o somático, não podendo ser estudada em si mesma (onticamente)[11] por ser um ser-da-passagem, o qual marca a transição e que cobra caminhos diferentes, movida pelo recalque, sua ‘pedra angular’, porque sempre retorna. O movimento pulsional (de vida e de morte), assim será interpretado pela psicanálise e a inscrição pulsional está vinculada às identificações do sujeito, no Imaginário (Eu Ideal) e no Simbólico (Ideal do Eu), em suas relações com o Outro[12].
Por outro lado, Freud reconstrói o advento do social em face do mito – fundador – do crime praticado em conjunto contra o Pai da Horda. O atributo Totem – antepassado comum ao grupo – é um animal, podendo assumir mais raramente as feições de um vegetal ou mesmo um fenômeno da natureza, o qual mantem, todavia, uma relação peculiar com o grupo, constituindo-se, assim, como objeto de Tabu[13]. Além de venerar o Totem, o grupo tem a obrigação sagrada de não o destruir, advindo daí as obrigações/restrições da sociedade. Em síntese: constitui o aspecto identificatório do Totem e dos Tabus. Os diversos povos primitivos erigiam proibições sexuais próprias, com suas peculiaridades, mantendo, contudo, a proibição de incesto, independentemente dos laços de sangue. O Tabu, por sua vez, significava as interdições e proibições, sem que se soubesse, muitas vezes, os fundamentos de tais limites, não podendo ser confundido com uma neurose[14]. O importante é que onde há uma interdição há um desejo limitado, consoante explica Freud: “Visto que os tabus se expressam principalmente em proibições, a presença subjacente de uma corrente positiva de desejo pode ocorrer-nos como algo de bastante óbvio e que não exige provas exaustivas baseadas na analogia das neuroses, porque, afinal de contas, não há necessidade de se proibir algo que ninguém deseja fazer e uma coisa que é proibida com a maior ênfase deve ser algo que é desejado.”[15] Como tal, a lei jurídica impõe uma proibição à realização do desejo humano. Advém daí a funcionalidade do ordenamento jurídico penal, eis que somente se proíbe o que se manifesta como propensão humana[16], ou, como diz Freud, “porque o desejo proibido no inconsciente desloca-se de uma coisa para outra.”[17] E esse modelo de contenção, de renúncia, ato fundante do desejo, protrai seus efeitos até os dias atuais.
Mediante o crime perpetrado contra o Pai terrível da Horda e partilhado pelos irmãos, estes podem reconhecer em si[18] o mesmo ódio dirigido ao Pai, constituindo esse momento como a tomada da potência originária, pois “o desejo deles é de conjurar a impotência e de escapar à fascinação mortífera à qual se submetem, bem como à admiração e ao temor frente ao onipotente.”[19] Ao assassinato segue-se o banquete[20], no qual, afirma Enriquez “ao comerem juntos da mesma carne, os irmãos se reconhecem definitivamente como tal, isto é, em igualdade, repartindo os despojos, unidos pelo mesmo sangue.”[21] De modo que o sangue do Outro passa a correr em suas veias e o reconhecimento da culpa – que mesmo censurada e reprimida – pelo assassinato partilhado retorna. Entretanto, com o fantasma de seu regresso na figura de um dos filhos-irmãos, estes renunciam à força e instituem o Totem, personificado na figura paterna. A partir de então, abandonando o estado de natureza e constituindo o poder da comunidade, materializado pelo mecanismo do castigo, erigem a ‘Civilização’, e seu ‘mal estar’: “O que está em questão é o medo do exemplo infeccioso, da tentação a imitar, ou seja, do caráter contagioso do tabu. Se uma só pessoa consegue gratificar o desejo reprimido, o mesmo desejo está fadado a ser despertado em todos os outros membros da comunidade. A fim de sofrear a tentação o transgressor invejado tem de ser despojado dos frutos de seu empreendimento e o castigo, não raramente, proporcionará àqueles que o executam uma oportunidade de cometer o mesmo ultraje, sob a aparência de um ato de expiação. Na verdade, este é um dos fundamentos do sistema penal humano e baseia-se, sem dúvida corretamente, na pressuposição de que os impulsos proibidos encontram-se presentes tanto no criminoso como na comunidade que se vinga. Nisto, a psicanálise apenas confirma o costumeiro pronunciamento dos piedosos: todos nós não passamos de miseráveis pecadores.”[22]
Nesse movimento de tensão imaginária entre o eu e o outro, floresce a disputa, a competição pelo lugar, lugar completo e perfeito, lembrança da imagem especular, mas impossível. Isso gera uma disputa com e para o outro, o qual aparenta possuir o que o eu não tem, que goza o que o eu não pode[23]. Nessas trocas relacionais o outro apresenta-se como um dilema – o que ele tem que eu não tenho? –, oscilando entre o amor e a ameaça, inscrita a partir da imagem primordial, geradora de um fantasma do outro que pode tanto aniquilar como erotizar a relação[24]. Consequência disso são as possibilidades de movimentos de agressividade a partir da clivagem originária, constitutiva do seu eu, cujos efeitos da exclusão se farão sentir no receio de que o outro queira seu lugar e exclua, afaste ainda mais a colimada plenitude, oscilando entre o amor e o ódio, num equilíbrio vacilante e inconstante que refoge à razão. Sustenta Philippi: “Mas, se no reflexo do espelho o outro pode ser percebido como alguém que detém aquilo que é inacessível ao sujeito, essa mesma miragem, em virtude da antecipação de uma imagem unitária, possui, igualmente, um valor cativante para o ser humano, um ideal do eu, que lhe permite estabelecer relação com o mundo em geral. Enquanto na primeira fase do narcisismo o eu se situa como sendo o seu próprio ideal – inexistindo, portanto, nesse momento estrutural, qualquer instância transcendente ao sujeito como parâmetro para o estabelecimento de um outro tipo ideal –, em um segundo momento, caracterizado pela constituição de um ideal do eu, surge a possibilidade de uma mediação entre os homens, o que implica dizer que a alteridade como valor se encontra presente no registo do ideal do eu, a partir do qual se desenrola o campo da intersubjetividade inexistente ao tempo do narcisismo primário, marcado pela primazia de um eu ideal.”[25] A satisfação decorrente do estar apaixonado promove a procura do retorno às condições infantis para amar, direcionadas ao objeto e capaz de remover as repressões e devolver as perversões, sendo que o outro é confundido com a satisfação do desejo. Por isso o ‘estar apaixonado’ é uma tentativa de retorno, mesmo que fugaz, à pretensão de plenitude. Esbarra, todavia, na pulsão de morte, da qual o sono descortina e propicia aquilo que a vida não consegue curar, dado que se está alienado na existência da representação especular do outro, que angustia e gera o medo[26].
Preparada a terra, então, estabelece-se o sentido da lei – metáfora do limite – na formação do registro do Símbólico dos ocidentais, identificada com a palavra do pai – único sujeito – garantidor da legalidade da estrutura, do aparelho psíquico. Esse lugar fundante do Outro tentará fazer a ponte entre as formações do inconsciente e a lei jurídica, bem como seus efeitos no ato de interpretação. A estrutura da Lei do inconsciente, estabelecedora do limite, é desnudada, fazendo parte integrante das manifestações pessoais e sociais. A subjetividade ganha, assim, um novo componente não afeto às estruturas racionais, operando com mecanismos cifrados – do Real –, os quais poderão ser indicados pela psicanálise. O sujeito é uma construção, não nasce assim, assim..., enfim não se auto-funda, até porque é filho de alguém que deve ceder seu lugar de filho[27], tem um nome pré-dado, e quando nomeado se aliena. Por sua história singular o sujeito pode redescobrir a constituição de sua subjetividade e a dos motivos pelos quais alguns juízes gostam tanto do Direito Penal, dos crimes sexuais, por exemplo, Divan bem sabe.
A convivência social e suas vicissitudes, por sua vez, geram angústia e medo. Sempre. No modelo atual o que se passa, de alguma forma, como diz Luis Alberto Warat[28], é que as pessoas buscam se amar desde uma distância confortável, nos seus lugares, desde que os deixem em paz. A paz, muitas vezes do discurso consciente, contracena com o desprezo, a intolerância em relação ao outro. O encontro é similar à lógica do “amor cortês” no sentido de evitar o encontro com a “coisa”, enfim, como no “amor cortês”, é um falso amor. Por detrás do discurso esconde-se, não raro, uma intolerância primordial. Evitar-se o encontro ao máximo, com medo do trauma que daí advém, sempre. E quando acontece o encontro, por exemplo, com a violência, o conflito, a intolerância impera soberana. Por isso que Lacan (ética da psicanálise), ao afirmar que o Real existe, mas é impossível, refere-se ao axioma: “ama o teu próximo”, porque ele para ser amado deve permanecer a certa distância, sem encontro, porque quando isto se dá, o trauma acontece. É sobre este trauma que muitas vezes a mediação é chamada a se manifestar. A sociedade vive numa convivência à distância, um contato sem contato, e os contatos são traumáticos por definição. Daí o perigo dos discursos de “Paz por Paz”, alienados da dimensão humana, na esperança metafísica – e muitas vezes religiosa – de uma perenidade de humanos tornados em anjos, imaginariamente. Este é um projeto inalcançável e que fomenta – muito de boa-fé – as atividades sociais totalitárias. Procura-se, neste pensar, uma dessubjetivação, com o apagamento da dimensão de negatividade do sujeito, de sua pulsão de morte. Procura-se eliminar o sujeito humano que molesta.
Aceitar o sujeito é admitir que age sem o saber, movido por uma estrutura subjetiva singular, própria, embalada pelo princípio de morte, na eterna tentação de existir. Pode ser ali, no ato molestador, uma tentativa de o sujeito se fazer ver, aparecer. A abordagem tradicional busca calar esta voz, não deixar o sujeito dizer de si, de suas motivações, previamente etiquetadas e formatadas, por tipo penais. Há um sujeito implicado no ato criminoso. E a ideia da mediação, por exemplo, possibilita que ele se faça ver, dando-lhe a palavra, sempre. É com a palavra, com a voz, que o sujeito pode aparecer. A violência em nome da lei, imposta, simplesmente realimenta uma estrutura de irresignação que (re)volta mais e mais. Nessa abordagem se pretende mostrar que não se pode gozar tudo, pois há um impossível a se gozar em sociedade. Busca-se, ao inverso do discurso padrão, construir laço social, e não a imposição de um respeito incondicional kantiano que, por básico, opera na lógica: não discuta, cumpra. Buscar que o sujeito enuncie seu discurso e não despeje enunciados, como diz Lebrun, ocupando um lugar e uma função. A aposta que se faz, neste contexto, pois, é a de reconhecer o outro, a alteridade, na medida em que se descobre sujeito. Dito de outra forma, aceitar o outro sob a forma de uma relação conflituosa, somente assim ocorre laço social. Do contrário, há intolerância. Sempre. Com Zizek[29] pode-se afirmar que é preciso de alguma maneira aceitar a violência, porque a tolerância à distância, própria do modelo liberal, é muito mais cínica. Enfim, arriscar o impossível: aceitar e se relacionar com o outro singular.
De qualquer forma, para fins desse curto artigo, o que vale sublinhar é que o giro neoliberal no campo penal, reafirme-se, possui um papel fundamental na manutenção do sistema, eis que mediante legitimação do uso da coerção, impõe a exclusão do mundo da vida com sujeitos engajados no projeto social-jurídico naturalizado, sem que se deem conta de seus verdadeiros papéis sociais. Acredita-se que se é um excepcional funcionário público, tal qual Eichmann[30] (em Jerusalém), reeditado por Kafka em sua Colônia Penal[31].
Wacquant[32], por outra face, demonstra que com o fenecimento do ‘Estado Caritativo’ nos EUA houve um aumento do ‘Estado Penal’ na perspectiva de criminalizar as consequências da miséria mediante a transformação dos programas sociais em vigilância permanente e o encarceramento da pobreza, especialmente os ‘empregados das drogas’[33]. A análise dos dados americanos deixa evidenciada que a readequação do modelo assistencial e repressivo busca normatizar a miséria, excluindo, ademais, o ‘refugo do mercado de trabalho’:
Desregulação social, ascensão do salariado precário (sobre um fundo de desemprego de massa na Europa e de ‘miséria laboriosa’ na América) e retomada do Estado punitivo seguem juntos: a ‘mão invisível’ do mercado de trabalho precarizado encontra seu complemento institucional no ‘punho de ferro’ do Estado que se reorganiza de maneira a estrangular as desordens geradas pela difusão da insegurança social.[34]
Como se pode perceber, a situação brasileira segue o vácuo do modelo americano de exclusão[35], bastando que se veja a dimensão do ‘bolsa-escola’, cadastramento de famílias, ‘Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI’, dentre outras iniciativas – mesmo de governos que se dizem democráticos – que escondem para os incautos os mesmos mecanismos americanos de ‘normatização’[36], com a particularidade de que o discurso da ‘Nova Escola Penal’ não foi esquecido e é retomado com uma nova maquiagem: a eficiência. O discurso do ‘determinismo positivista’ é realimentado em face das condicionantes sociais, reeditando a necessidade de ‘tutelar’ os desviantes – consumidores falhos – mediante prevenção, repressão e terapia.
3 – O Estado Intervencionista da ‘Nova Escola Penal’ está de volta na sua missão de defender os cidadãos ‘bons e sadios’ dos ‘maus e doentes’[37], desenterrando o discurso etiológico, perfeitamente conveniente para mídia e para classe dominante. Sob o mote de curar ao mal, tendo a sociedade como um organismo vivo, na perspectiva de uma vida social sadia, a violência oficial se mostra mais do que justificada: é necessária à sobrevivência social. Sustenta Arend que: “O mais assustador é que há um estratégico e eficiente contágio ideológico programando as pessoas para servirem como a voz que chama a ação do poder do Estado para combater a violência, com a presença da autoridade e ataque aos perigosos. Perdeu-se a aspiração do Estado social. A utopia agora é a do Estado Penal, mediante a ação capilar e absoluta do Estado Policial.”[38]
4 – Na mesma toada e fundamentado no contrato social, Jakobs defende que o ‘inimigo’ seria aquele que rompeu com as regras contraídas, justificando a visão de não-membro e, por via de consequência, a intervenção penal busca evitar os perigos que ele representa[39], podendo, assim, o Estado restringir para o ‘inimigo’ as normas – garantias – conferidas ao cidadão. A ‘Defesa Social’ e o ‘direito penal do autor’ retornam, sob nova fachada, mantendo, todavia, o lugar cativo. Estabelecida a distinção entre ‘cidadão’ e ‘inimigo’, para os últimos, na defesa dos bons cidadãos, deve-se, para Jakobs, restringir as garantias penais e processuais, constituindo o que se denominou de ‘Direito Penal do Inimigo’. Isto é:
Quien por principio se conduce de modo desviado no ofrece garantia de un comportamiento personal; por ello, no puede ser tratado como ciudadano, sino debe ser combatido como enemigo. Esta guerra tiene lugar con un legítimo derecho de los ciudadanos, en su derecho a la seguridad; pero a diferencia de la pena, no es derecho tambíen respecto del que es penado; por el contrario, el enemigo es excluído.[40]
Qualquer aproximação com os discursos da ‘Lei e Ordem’ não é mera coincidência, dado que reeditam a necessidade de ‘Defesa Social’ redefinindo os ‘tipos penais’ para difusos ‘bens coletivos’, cuja densidade se mostra impossível, e os ‘papagaios jurídicos’ se restringem a repetir, porque pensar complica a premissa maior e ‘inconstestável’ da lei. Desconsidera-se, por evidente, a dignidade da pessoa humana (Cap. 3o). Mas é preciso resistir.
§ 6º - A porta aberta por onde serpenteia o discurso da ‘Lei e Ordem’“Fala-se nas penas da lei como se esta fosse uma galinha prodigiosa. As penas da lei são as penas dos homens, sempre classistas, preservadores dos direitos dos que dominam o jogo social.” Millôr Fernandes
1 – Baseados, então, em pressupostos ultrapassados, mas ideologicamente interessantes e bem articulados midiaticamente, é possível a construção de um caminho de legitimação social do discurso da ‘Tolerância Zero’, do ‘terror’ calcado no ‘medo’. Somente nesse contexto é possível compreender o ‘Movimento da Lei e Ordem’, referência um tanto quanto evasiva, pegajosa, camaleônica e tal qual um jogo de espelhos, irrompe tanto no Parlamento como na decisão jurisdicional, esgueirando-se simbolicamente no senso comum teórico, nas every day theories (Baratta).
Choukr assevera:
Mais do que tudo, pois, a emergência penal é um estado de fato. (...) Esta situação de fato, onde existe uma sorte de sentimento comum pela necessidade de adoção de medidas extraordinárias em face do aumento crescente e incontrolado de criminalidade (sobretudo a matiz organizada) recebe criminologicamente o rótulo de movimento da lei e ordem (law and order). (...) Inegavelmente remanesce, no entanto, o fundo majoritariamente político do tema, cujas manipulações ideológicas podem chegar a traduzir determinadas situações como absolutamente incontroláveis a ponto de justificar o incremento de tais regras.[41]
Na divisão de mundos (bem x mal) Dotti assevera que: “os defensores desse pensamento partem do pressuposto maniqueísta de que a sociedade está dividida entre bons e maus. A violência destes somente poderia ser controlada através de leis mais severas, impondo longas penas de prisão, quando não a morte.”[42] Por isso, razoável chegar-se mais perto do que esta visão apregoa, tendo como pano de fundo a herança na ‘Nova Escola Penal’ e a ideologia neoliberal, na lógica do encarceramento-exclusão e do ‘panóptico for windows’.
2 – Miranda Coutinho e Carvalho fazem uma crítica pertinente sobre o movimento de ‘Tolerância Zero’ “e sua matriz ideológica, a chamada Broken Windows Theory (Teoria da Janelas Quebradas), invencionice americana vendida aos incautos como panacéia no mercado da segurança pública mundial.”[43] Na perspectiva de ‘melhorar a qualidade de vida na cidade de Nova York’, em 1994, os administradores iniciaram um programa de controle ostensivo de todo-e-qualquer-desvio-social, independentemente de sua ofensividade, com o objetivo de ‘manter a ordem’ sob a premissa cínica de que a sua tolerância fomenta o crime[44]. Foram articulados, para tanto, diversas iniciativas, dentre elas, o ‘policiamento comunitário’ – que já se alastra por aqui – e a ‘truculência policial’, um mal necessário ao ‘bem comum’. Contudo, os resultados demonstram que a ‘corrida repressiva’ não possui os méritos que seus defensores apregoam, além de varrer para debaixo do tapete as verdadeiras causas.
Reabre-se espaço, pois, para medidas de salvaguarda da sociedade antes mesmo que aconteça qualquer ação – profilática –, consoante se verifica na banalização das prisões preventivas[45], nos ‘tipos de perigo abstrato’, aferidas – se é que se pode usar o termo – diante da periculosidade do agente, ou melhor, no estereótipo e a cargo da ‘criminalização secundária’ (Zaffaroni). É que os pobres, diante de suas condições pessoais e sociais – acredite se quiser – seriam mais propensos à delinquência. E se acontecer o delito, a postura é de ‘reformar’ o desviante com educação moral, ou melhor, ‘canonização moral-penal’. “Tudo é muito ingênuo, mas é esta a idéia, sem mais. O problema é nela crer!”[46]
Essa funcionalidade do sistema carcerário, ademais, no que se refere à reprodução da delinquência, não é novidade, tendo Foucault pontuado: “O adversário do soberano, depois inimigo social, transformou-se em desviador, que traz consigo o perigo múltiplo da desordem, do crime, da loucura.”[47]
3 – No atual estágio, o que se verificou com a ‘Nova Escola Penal’ retorna, na perspectiva de atender aos anseios da elite e da classe média[48] – que se ilude incluída[49] –, pelo medo de dissolução social, com o discurso da ‘Lei e Ordem’ e suas múltiplas facetas, já que atende ao interesse de manutenção do status quo, ‘regenerando (?!) quem pode’, a baixo custo, principalmente com penas alternativas e, se não for possível, excluindo no sistema penitenciário privado[50]. Afinal de contas é preciso dar um destino aos não-consumidores e a saída é a exclusão, em penitenciárias privadas, claro: gerando lucro. E quanto mais e maior a pena – a exclusão – maior o lucro, principalmente se forem ‘penitenciárias industriais’, nas quais os direitos dos presos são mandados às favas e pode-se, além do lucro pela ‘hospedagem’[51], explorar, sob o pálio da ‘Lei e Ordem’, legal-mente o trabalho humano, quer pela utilização da força em trabalhos internos, quer pela mais-valia![52] Por isso a lembrança de Miranda Coutinho:
Ora, no fundo, o que é necessário é parar de viver esse sonho e tratar de acordar para a realidade. Parar de viver esse sonho que vivemos a partir da manipulação discursiva. Mais ou menos aquilo que a gente vê, na porta dos campos de concentração dos nazistas. Pois saibam que o que mais me chocou no campo de concentração de Dachau, perto de Munique, na Alemanha, não foram os fornos crematórios, não foi o museu com aquela célebre frase de Santayana: Coloro che non si ricordano del passato sono condannati e reviverlo. Não! O que mais me chocou foram os dizeres na porta principal, que, por sinal, está escrito também, salvo engano, em Buchenwald, arbit macht frei – o trabalho liberta. Não há nada no mundo que seja mais significativo do que o golpe de linguagem; do que o giro de discurso; do que isso que está aí como lobo em veste de cordeiro.[53]
§ 7º– A função da propaganda: Adão, Eva e o Pe(Mer)cado“Televisão/Deusa da fascinação/Balcão de fantasia/De produto sempre nobre/Cega rico cega pobre/É consumo, hipocrisia.” G.R.E.S. Estácio de Sá – 1991
1 – Retomando o argumento de Legendre, a ‘propaganda’ possui, desde a sua criação pela Igreja[54], um objetivo bem definido: propagar e reiterar a ‘crença de amor’[55]. A ‘ciência do sorriso’ ganha espaço para fazer os sujeitados amarem o Poder, apontando o ‘Mal’ a ser perseguido/aniquilado em nome do ‘Bem’, palavra do enunciador, claro, divulgando-se a existência inata, em cada ser humano, da distinção entre os bem aventurados e os recalcitrantes. Diretamente – sempre Adão e Eva[56] –: entre os pecadores e os inocentes; porque para estes últimos, o paraíso está reservado[57].
Os enunciados fantasísticos, difundidos na Idade Média em versões bem populares graças à predicação sobre as consequências penais do pecado, significam mais ou menos isto: ‘Vejam as coisas terríveis que lhes acontecerão, se vocês seguirem a inclinação de seus desejos; se vocês fizerem o que a Lei proíbe, e se vocês não se acusarem por serem culpados diante do confessor, nada poderemos por vocês’. O pecador que sofre de seu desejo é assim convidado a procurar substitutos; o objeto de substituição por excelência, ideal e sublime, é a própria Lei, transformada em objeto de amor.[58]
Mesmo sendo um discurso ultrapassado, porque a ‘Criminologia Crítica’ (Baratta) assim o mostrou, remanesce principalmente pelos interesses ideológicos que subjazem e reproduzem a obediência. Por mais que existam processos conscientes de secularização, a herança religiosa está no âmago da ‘Instituição’ – do Estado – e suas agências, portanto, é fundamental à dominação, consoante Legendre: “Contanto que os novos símbolos substitutivos assumam a relação com alguém ou alguma coisa que os doutores legítimos, mestres das propagandas da Fé, possam garantir com verossimilhança: eis o lugar-tenente-do-pai.”[59]
2 – A mídia possui um papel destacado no fomento do discurso da ‘Lei e Ordem’. Isto porque “o clima de insegurança passado pela imprensa, no tocante à violência criminal, de certa forma garante a manutenção do ideal dominante.”[60] Não se pode, todavia, imputar-lhe simplesmente a vontade deliberada de tal proceder, porque ela baila conforme o ‘Mercado’, na lógica capitalista, dos interesses que se escondem por detrás da tela.[61] Batista assevera: “A televisão como novo panótico tem mais presença nos lares brasileiros que as geladeiras, e da sua telinha escorre lentamente todos os dias o veneno de um certo olhar sobre o crime e a pobreza.”[62] Desta avenida de entrada nos lares é possível a articulação da ‘cultura do medo’ para justificar e naturalizar como um caminho ‘doloroso e necessário’ para salvação: o agigantamento do sistema penal.
3 – Bourdieu argumenta que a televisão opera a ‘violência simbólica’[63]. Seu pensamento hegemônico simbolicamente homogêneo, coloca em risco diversas esferas do saber, dentre elas o Direito e, em última escala, a Política e a própria Democracia, principalmente numa sociedade capitalista na qual o objetivo é o lucro, sem ética. Em nome da audiência, então, são exploradas as ‘paixões mais primárias’ dos telespectadores: sangue, sexo, drama e crime, diz Bourdieu, “sempre fizeram vender, e o reino do índice de audiência devia alçar à primeira página, à abertura dos jornais televisivos.”[64] Para tanto, são articuladas ‘censuras’ veladas de quem irá ter ‘voz e imagem’ na programação, bem assim a construção de ‘especialistas’ autolegitimados pelas ‘redações’, e sempre a mando de alguém que não aparece: o Ausente. Acrescente-se, ainda, que a ‘censura econômica’, do patrocinador, é um condicionante importantíssimo para se manter ‘no ar’. O que não choca, não agride, mantem o consenso, acaricia a audiência e ocupa o espaço do que pode ser importante para as pessoas “devotas de corpo e alma à televisão como fonte única de informações. A televisão tem uma espécie de monopólio de fato sobre a formação das cabeças de uma parcela muito importante da população.”[65] Uma das estratégias gregárias indicadas por Bourdieu é a de ‘ocultar mostrando’, apresentando as informações dramatizadas, fragmentadas, não permitindo ou impedindo a compreensão do todo, o que atrapalha o raciocínio de quem assiste, pois as respostas estão prontas confundindo realidade e ficção[66], movimentadas pela ‘urgência’ do ‘furo de reportagem’. Os substratos de sentido (poder) maquiados sob diversas formas (reportagens, telejornais, programas, músicas, filmes, decisões judiciais, argumentos retóricos, etc.) são repetidos pela ‘cultura de massa’ e pelo senso comum teórico sem maiores pudores, sonegando-se as diferenças, negando-se a singularidade e a exclusão social que campeia os próprios excluídos que se sentem menos excluídos ao verem reproduzidos na TV, o seu modo de vida. Daí o sucesso de programas como o do ‘Datena’ ou o do ‘Ratinho’, que impõem à realidade uma cena e causam nos telespectadores uma sensação de ‘determinismo’ que lhes acalenta a alma/falta. São variações funcionais sobre o mesmo tema, mantendo a imposição de ideias e os interditos à crítica. Os estereótipos são verdadeiras próteses linguísticas: os cúmulos de artifício[67]. E o produto crime, interessa!
§ 8º – Mídia e o Produto: ‘Crime’. Voltamos em dois minutos: Não saia daí“Todos los actos de drama de la historia mundial se han desarollado ante un coro popular que rie.” Mikhail Bakhtin
1 – No tocante aos crimes, melhor se forem ‘bárbaros’, por não envolverem disputa, pois ao invés de dividir – todos querem Justiça! – formarão consenso sobre a pena, e interessar à população jogada na ‘inautenticidade do a gente’ (Heidegger), podendo ocasionar mobilizações em prol do único remédio conhecido – por eles – para conter a ‘chaga do crime’: cadeia neles!; se possível linchamento em praça pública, com hora marcada, fogueira, enxofre, muito sangue e patrocinadores a peso de ouro, retomando-se o suplício do corpo dos condenados[68]. Sustenta Freire que “o modo de tratar esta realidade ‘feia, ‘pobre’, ‘desdentada’ e ‘não-branca’ é fazer como se ela não existisse e, quando isso não é possível, a saída é eliminá-la, fisicamente se preciso for, para que o fantasmagórico mundo global volte a ser o aconchegante ninho dos bem-nascidos.”[69]
Wacquant bem expressa o slogan: “’tranque-os e jogue fora a chave’ torna-se o leitmotiv dos políticos de última moda, dos criminólogos da corte e das mídias prontas a explorar o medo do crime violento (e a maldição do criminoso) a fim de alargar seus mercados.”[70] Os programas ‘sangue-show’ são conduzidos por jornalistas que se submetem às expectativas mais primitivas do humano, indicadas por Juvenal: pão e circo[71]. A fascinação pela barbárie encontra na mídia delivery seu melhor canal para o embrutecimento humano, sua servidão voluntária (La Boétie)[72], conforme sustenta Sloterdijk: “Durante a época do Império [Romano], a provisão de fascínios bestializadores para as massas romanas havia se tornado uma técnica de dominação indispensável, rotineiramente aprimorada, e que, graças à fórmula ‘pão e circo’ de Juvenal, persiste até hoje na memória.”[73] Nestes casos, surgem sempre os ‘fast-thinkers’ capazes de emitir comentários pseudocientíficos, sem qualquer análise mais detida dos fatos[74], armando-se (este é o termo), ao depois, ‘debates verdadeiramente falsos ou falsamente verdadeiros’ (Bourdieu) nos quais a encenação é patética e o resultado conhecido de antemão. Afinal, o patrocinador não pode ter sua imagem prejudicada. A ‘moral vedete’ surge nos discursos moralizantes e normatizadores, enunciados pelos ‘Juízes Midiáticos’, nos quais as garantias penais e processuais são francamente vilipendiadas[75], mas sempre surge um acusador juntando a ‘fita do programa’ aos autos ou a exibindo, com certo orgulho, no plenário do Júri, quando deveria democraticamente impedir tais violações.
2 – Esses discursos midiáticos, por certo, influenciam no julgamento e não podem ingenuamente ser deixados a latere[76], ou como diz Batista: “Estamos fora do modelo convencional do trial by media: não se trata aqui de influenciar um tribunal, senão de realizar diretamente o próprio julgamento.”[77] Dentre os programas ‘escorre sangue’, um deles merece destaque por sua estética, a qual mescla fatos com ficção (jornalismo + novela) e além de inevitavelmente condenar os acusados – com presunção de inocência –, gera efeitos nefastos no mundo da vida: ‘Linha Direta’ (Globo), o qual termina invariavelmente: “de forma grosseiramente óbvia, a despertar a indignação dos telespectadores, convocados a informar algo sobre o paradeiro do vilão, que escapou às consequências de seu bárbaro cometimento.”[78] Mendonça[79] procedeu instigante reflexão sobre o programa, deixando evidenciado que em termos de índice de audiência, a montagem é perfeita, gera lucro com sobras, ao custo das garantias democráticas[80]. Mas quem se importa? Muito poucos, de regra, taxados ingenuamente de defensores de bandidos. Dentro da lógica da ‘Defesa Social’, o programa se enquadra ‘perfeitamente’, dado que possibilita achar que o vizinho ou o garoto da esquina são o ‘bandido fugitivo’ e quando, enfim, ele é preso, respira-se aliviado: ‘menos um malvado solto’.
3 – Em tempos de cinismo absoluto, especial enfoque se dá aos desvios sexuais, com a caça aos respectivos delinquentes. Nos EUA são o alvo privilegiado da imprensa, principalmente depois da ‘Lei de Megan’ que divulga a lista dos agressores sexuais[81], os quais jamais se livram da pena, pois. Tudo sob o pretexto hipócrita de moralizar a sociedade e manter em segurança os bons diante dos criminosos, claro. A mídia, na esteira, mantem uma programação palpitante sobre os ‘criminosos’, com direito a ‘fotos’, perguntas abusivas, etc...
§ 9º– A ‘Cultura do Medo’: quanto mais terror melhor“A televisão me deixou burro, muito burro, demais. Agora eu vivo nesta jaula junto dos animais.” Titãs
1 – Por aí se percebe a procedência do argumento de Legendre[82], uma vez que a ‘Ciência do Sorriso’ – propaganda – apresentando-se sob o mote ‘somos todos amigos’, reorganiza o discurso do poder para excluir sempre os mesmos, demonstrando sua patente funcionalidade, reiterada por Foucault. Então, dirigindo-se ao público que ‘acredita estar a quilômetros de sua selvageria’, seleciona e estigmatiza uma fantasmagoria do bem-educado e do mal-educado, do criminoso e do bom cidadão, enfim, da necessidade cada vez maior do pastoreio.
Resultado disso é o fomento da ‘cultura do medo’, com a mitigação do senso crítico dos cidadãos, vendo-se no outro qualquer o ódio estampado pela sensação de nirvana somente existente antes do nascimento, mas que se busca – aponta a psicanálise (Cap. 1o) – com uma compulsão assustadora. Mesmo sem nunca se ter tido a ‘paz’ almejada, fala-se de um tempo perdido de segurança, facilitando-se discursivamente, pelas emoções, a prevalência de discursos de opressão social, tudo em nome da contenção da escalada avassaladora da criminalidade[83].
2 – Pastana assevera que o clima de insegurança atende aos anseios políticos de manutenção do status quo, sempre afirmando-se a ocorrência de violência, mas sem nunca resolvê-lo, ocupando matreiramente o tempo dos cidadãos que se encontram, pois, eclipsados do que importa numa sociedade democrática:
Paradoxalmente, o medo e a insegurança neste período democrático permitem ao Estado medidas simbólicas cada vez mais autoritárias, leis cada vez mais punitivas, legitimadas por demandas sociais de proteção reais e imaginárias, principalmente da elite. Além disso, justificam a criação de empresas de segurança e o apoio à privatização da polícia. (...) A cultura do medo que se criou em torno da criminalidade provoca um generalizado desejo de punição, uma intensa busca de repressão e uma obsessão por segurança. A lei passa a ser a ‘tábua de salvação’ da sociedade e, quanto maior for a sua dureza, mais satisfeita ela estará. Além disso, todos os programas e notícias que lidam de forma direta com esse pânico passam a ser produtos muito consumidos e por isso muito divulgados, aumentando ainda mais o próprio alarme. A segurança torna-se plataforma política e algumas vezes a causa da derrocada de um governo. A promessa é sempre repressão.[84]
Acrescente-se, como consequência, bem ao gosto capitalista, a diminuição do Estado, apanágio da vertente neoliberal, com o aumento das empresas de segurança privadas, de vigilância, mudanças de hábitos – viva aos Shoppings Centers, onde há mais segurança – construção de condomínios fechados[85], dentre outras mudanças comportamentais[86], como por exemplo a ‘vídeo-vigilância, na qual se é observado nas ruas das cidades[87], sem que se saiba, violando-se o ‘Direito à Intimidade’, construindo-se um ‘panóptico social’[88], tudo em nome do ‘big-brother’ que olha por ti, afinal, como apontou Orwell em 1984: – “Gerra é paz/ Liberdade é escravidão/ Ignorância é força.”[89] – tendo razão, portanto, Estévez Araújo:
A ‘vídeo-vigilância’ indiscriminada e sem controle está convertendo o espaço público britânico em um ‘panóptico’ no sentido em que Bentham propôs para os cárceres: um lugar no qual os presos pudessem estar sempre vigiados, mas sem que eles soubessem se em um determinado momento estavam ou não sendo observados. E se é certo que uma pessoa não tem o direito ao mesmo grau de proteção de sua intimidade em sua casa como na rua, a luta contra a criminalidade não justifica transformar os espaços públicos em algo similar a uma prisão.[90]
Novamente, a poesia de Galeano[91] reflete as angústias humanas dessa sociedade do medo:
A fome alimenta medo. O medo do silêncio atordoa as ruas. O medo ameaça:
Se você ama, terá AIDS.
Se fuma, terá câncer.
Se respira, terá contaminação.
Se bebe, terá acidentes.
Se come, terá colesterol.
Se fala, terá desemprego.
Se caminha, terá violência.
Se pensa, terá angústia.
Se dúvida, terá loucura.
Se sente, terá solidão.
Notas e Referências:
[1] MEIRELES, Cecília. Romanceiro da Inconfidência. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989, p. 106.
[2] A intervenção do autor pode ser assistida em : http://www.youtube.com/watch?v=jACccaTogxE (acesso em 09 de agosto de 2012).
[3] “Desde a ascensão monetarista, fundamentalmente com Hayek e Friedman, o discurso ganhou um significante verbete: ‘liberdade’ (...) ao Estado, compete retirar os entraves de uma economia que deve funcionar livremente conforme as leis do mercado. Este discurso surge para (re)legitimar as desigualdades de sua matriz, dado que fundadas na propriedade privada, excludente por definição (um é proprietário enquanto os outros não) e na liberdade de contratar. O discurso de clara estrutura religiosa, da fé, no mercado, neutraliza a ‘justiça da desigualdade’, carro chefe e latente do discurso neoliberal da ‘igualdade’. Conta, também, com sua ‘Inquisição’, ou seja, seu braço armado que se encarrega de ‘excluir’ os dissidentes, os ‘hereges’, como bem demonstra Naomi Klein. Com efeito, Hayek é um autor extremamente sedutor no encadeamento lógico de suas proposições. Coloca a concepção de ‘liberdade individual’ como significante primeiro para depois deslizar nos significantes sem perder este princípio, verdadeiro dogma. A noção manipulada de ‘liberdade’ irá permear toda sua construção teórica de ‘ordem espontânea’, via mercado”. MORAIS DA ROSA, Alexandre. “Crítica ao discurso da Law and Economics. A exceção econômica do direito” in MORAIS DA ROSA, Alexandre. LINHARES, José Manuel Aroso. Diálogos com a Law & Economics. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009, p. 39.
[4] HAYEK, Friedrich. Direito, Legislação e Liberdade: uma nova formulação dos princípios liberais de justiça e economia política. Trad. Ana Maria Capovilla et al. São Paulo: Visão, 1985, pp. 36 e seguintes.
[5] “Society can and does execute its own mandates: and if it issues wrong mandates instead of right, or any mandates at all in things with which it ought not to meddle, it practises a social tyranny more formidable than many kinds of political oppression, since, though not usually upheld by such extreme penalties, it leaves fewer means of escape, penetrating much more deeply into the details of life, and enslaving the soul itself. Protection, therefore, against the tyranny of the magistrate is not enough: there needs protection also against the tyranny of the prevailing opinion and feeling; against the tendency of society to impose, by other means than civil penalties, its own ideas and practices as rules of conduct on those who dissent from them; to fetter the development, and, if possible, prevent the formation, of any individuality not in harmony with its ways, and compels all characters to fashion themselves upon the model of its own”. MILL, John Stuart. On Liberty. Batoche Books Ltd: Ontario, 2001, p. 9.
[6] “Este enfoque no es muy nuevo y ha sido explorado en una diversidád de temas. El estudio de las afinidades entre los procesos legales e las corrientes dominantes de la ideología política parecían especialmente prometedores. Se pensaba que después de todo los regímenes políticos se legitiman a través de la admninistración de la justicia que establecen. Seguiendo esta veta, numerosos autores han sostenido que el diseño es sensible a las variaciones particolares de la ideología, imperante, especialmente las oscilaciones entre individualista y colectivista, liberal y autoritaria, u otras posiciones com este tipo de etiqueta (...) En buena parte do que se há dicho hasta aquí, estos dos temas se han entrelazado y confundido: ciertos compromissos del Estado se asocian invariablemente com ciertos tipos de organización del poder”. DAMASKA. Mirjan R., Las caras de la justicia y el poder de lo Estado. Análisis comparado del proceso legal. Trad. Andréa Morales Vidal. Santiago: Editorial Juridica de Chile, 2000, pp. 21-23.
[7] “The concept of zero-tolerance would seem to have six key components: 1 a lowering of tolerance to crime and deviance; 2 the use of punitive, somewhat drastic measures to achieve this; 3 a return to perceived past levels of respectability, order and civility; 4 the awareness of the continuum between incivilities and crime with both low spectrum 'quality of life' rule breaking and serious crimes being considered problems; 5 the belief that there is a relationship between crime and incivilities in that incivilities unchecked, by various routes, give rise to crime; 6 the key text repeatedly mentioned as the inspiration for this approach: Wilson and Kelling's classic 1982 article in Atlantic Monthly, entitled 'Broken Windows’’. YOUNG, Jock. The exclusive society. London: SAGE Publications inc., 1999, p.124.
[8] FREUD, Sigmund. Totem e tabu. In: Obras psicológicas completas. Trad. Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1996, p. 21-162, v. XIII.
[9] LACAN, Jacques. O seminário: mais, ainda. Trad. M. D. Magno. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985. (Livro 20), p. 10.
[10] FREUD, Sigmund. Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade. Trad. Jayme Salomão. Rio de Janeiro: Imago, 1997, p. 13-14.
[11] LACAN, Jacques. Escritos..., p. 865: “A pulsão, tal como é constituída por Freud a partir da experiência do inconsciente, proíbe ao pensamento psicologizante esse recurso ao instinto com que ele mascara sua ignorância, através da suposição de uma moral na natureza.”
[12] FINK, Bruce. O sujeito lacaniano: entre a linguagem e o gozo. Trad. Maria de Lourdes Sette Câmara. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998, p. 26-29: “Na medida em que o desejo habita a linguagem – e em uma estrutura lacaniana não há, a rigor, desejo sem linguagem – podemos dizer que o inconsciente está repleto de tais desejos estranhos. (...) Nesse sentido, podemos interpretar o enunciado de Lacan de que o inconsciente é o discurso do Outro, de uma maneira muito direta: o inconsciente está repleto da fala de outras pessoas, das conversas de outras pessoas, e dos objetivos, aspirações e fantasias de outras pessoas (na medida em que estes são expressos em palavra). (..) O corpo é escrito com significantes.”
[13] FREUD, Sigmund. Totem e tabu..., p. 40: “A palavra ‘tabu’ denota tudo – seja uma pessoa, um lugar, uma coisa ou uma condição transitória – que é o veículo ou fonte desse misterioso atributo. Também denota as proibições advindas do mesmo atributo. E, finalmente, possui uma conotação que abrange igualmente ‘sagrado’ e ‘acima do comum’, bem como ‘perigoso’, ‘impuro’ e ‘misterioso’.”
[14] FREUD, Sigmund. Totem e tabu..., p. 83-84: “Existe, entre os povos primitivos, o temor de que a violação de um tabu seja seguida de uma punição, em geral alguma doença grave ou a morte. A punição ameaça cair sobre quem quer que tenha sido responsável pela violação do tabu. Nas neuroses obsessivas, o caso é diferente. O que o paciente teme, se efetuar alguma ação proibida, é que o castigo caia não sobre si próprio, mas sobre alguma outra pessoa. A identidade da pessoa, via de regra, não é enunciada, mas em geral pode-se demonstrar sem dificuldade, através da análise, que se trata de uma pessoa das mais próximas e queridas do paciente. Aqui, então, o neurótico parece estar comportando-se altruisticamente e o homem primitivo, egoisticamente. Somente quando a violação de um tabu não é automaticamente vingada na pessoa do transgressor é que surge entre os selvagens um sentimento coletivo de que todos eles estão ameaçados pelo ultraje; e em seguida, apressam-se em efetuar eles próprios a punição omitida. Não há dificuldade em explicar o mecanismo desta solidariedade.”
[15] FREUD, Sigmund. Totem e tabu..., p. 81-82.
[16] FREUD, Sigmund. Totem e tabu..., p. 51: “O tabu é uma proibição primeva forçadamente imposta (por alguma autoridade) de fora, e dirigida contra os anseios mais poderosos a que estão sujeitos os seres humanos. O desejo de violá-lo persiste no inconsciente; aqueles que obedecem ao tabu têm uma atitude ambivalente quanto ao que o tabu proíbe. O poder mágico atribuído ao tabu baseia-se na capacidade de provocar a tentação e atua como um contágio porque os exemplos são contagiosos e porque o desejo proibido no inconsciente desloca-se de uma coisa para outra. O fato de a violação de um tabu poder ser expiada por uma renúncia mostra que esta renúncia se acha na base da obediência ao tabu.”
[17] FREUD, Sigmund. Totem e tabu..., p. 51.
[18] ENRIQUEZ, Eugène. Da horda ao Estado: psicanálise do vínculo social. Trad. Teresa Cristina Carreteiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999, p. 31: “O pai, enquanto tal, não existe a não ser morto realmente ou simbolicamente; que nos leva a uma noção fundamental: o pai não existe a não ser como ser mítico. (...) Mas o pai, em sua função mítica, é aquele que provoca reverência, terror e amor ao mesmo tempo, o pai é aquele que sufoca, castra e que deve então ser morto ou, no mínimo, vencido; ele é, além disso, o portador e depositário das proibições. Seu assassinato é acompanhado de culpa e veneração. Não existe mais o pai real. O pai real é sempre um pai morto, e o pai morto é sempre um pai mítico. A partir do momento em que a função paterna é reconhecida, os filhos são oprimidos.”
[19] ENRIQUEZ, Eugène. Da horda ao Estado..., p. 31.
[20] ENRIQUEZ, Eugène. Da horda ao Estado..., p. 32: “O banquete coletivo, durante o qual são incorporados as virtudes e os poderes daquele que imagina possuí-los, é o momento em que o grupo vive um sentimento coletivo, no transe e na excitação, em que cada um pode ver no olhar do outro o mesmo ódio e o mesmo contentamento, se identificar ao outro na medida em que este se torna seu semelhante pela incorporação de uma potência, de uma carne e de um sangue único. O sangue do onipotente corre na veia de todos.”
[21] ENRIQUEZ, Eugène. Da horda ao Estado..., p. 33.
[22] FREUD, Sigmund. Totem e tabu..., p. 83-84.
[23] PHILIPPI, Jeanine Nicolazzi. A Lei..., p. 167-168: “Assim, continua o autor, a referência do sujeito a qualquer outro possui sempre algo de derrisório. Quando o indivíduo refere-se ao seu semelhante como alguém que vive no equilíbrio, que é em todo caso mais feliz do que ele, que se não coloca questões e dorme um sono descansado, não se trata de um ciúme banal, mas sim de uma inquietação que nasce no homem a partir da sua relação com o outro – aquele que, imaginariamente, participa de uma certa forma de gozo, de uma superabundância vital, inacessível ao próprio sujeito.”
[24] PHILIPPI, Jeanine Nicolazzi. A Lei..., p. 168: “As trocas humanas comportam, com efeito, uma certa marca persecutória? O outro sempre traz consigo uma promessa de amor ou uma ameaça possível, que evoca no indivíduo o drama inicial da sua existência. O caos primordial – projeção dos medos, dúvidas e ruína possível do sujeito em face daquele que pode se revelar como perseguidor e malfeitor – permanece presente, mesmo de uma forma velada, nos pensamentos e gestos humanos. O sujeito confronta-se constantemente com a possibilidade de desintegrar-se, desde que a miragem fantasmática do carrasco converta-se em realidade.”
[25] PHILIPPI, Jeanine Nicolazzi. A Lei..., p. 170.
[26] PHILIPPI, Jeanine Nicolazzi. A Lei..., p. 176: “Se é no nível do desejo de sono (...) que o desejo sem nome pode aparecer, é por tratar-se de um estado intermediário – esta modorra é o estado vital mais natural. A vida só pensa em morrer – morrer, dormir, sonhar talvez (...). A vida não quer sarar. A reação terapêutica negativa lhe é fundamentalmente própria. Sarar, aliás, o que é? Realização do sujeito por uma fala que vem de alhures e que o atravessa. A vida da qual somos cativos, vida essencialmente alienada, existente, vida no outro, está, como tal, conjugada à morte, ela sempre retorna à morte, e só é puxada para dentro de circuitos cada vez maiores e com maiores rodeios, por aquilo que Freud chama de elementos do mundo externo.”
[27] LEGENDRE, Pierre. Lecciones VIII: el crimen del cabo Lortie – Tratado sobre el Padre. Trad. Federico Álvarez. Madrid: Siglo veintiuno de España editores, 1994, p. 67: “Hay que volver a esta realida antropológica de base para captar un punto muy delicado: cuando un ser humano se convierte en padre, no está subjetivamente en un lugar automático de padre frente al recién venido, sino que debe conquistar esse lugar renunciando a su propio estatuto de hijo. Dicho de otro modo, debe morir en su condición de hijo para cederla a su hijo. Contrariamente a las aparencias, esto no es algo obvio; este balanceo no puede cumplirse más que si ya su propio padre había cedido su lugar de hijo, y así sucesivamente. ... Para un padre, seguir siendo hijo significa, con respecto a sua propio hijo, dirigir a éste una demanda de hijo, o, dicho de otro modo, ponerlo en el lugar de padre.”
[28] WARAT, Luis Alberto. O ofício do mediador. Florianópolis: Habitus, 2001.
[29] ZIZEK, Slavoj. Arriesgar lo imposible: Conversaciones com Glyn Daly. Trad. Sonia Arribas. Madri: Trotta, 2006, p.116
[30] ARENDT, Hannah. Eichmann em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. São Paulo: Cia das Letras, 1999, p. 60. A autora afirma que os monstros nazistas não eram a encarnação do mal, mas muitos deles eram apenas homens incapazes de pensar, e que acreditavam cumprir seus papéis sociais cumprindo as leis. A "falha mais específica, e também mais decisiva no caráter de Eichmann era sua quase total incapacidade de olhar qualquer coisa do ponto de vista do outro." E hoje será que acontece algo similar no Judiciário?
[31] KAFKA, Franz. A colônia penal. Trad. Modesto Carone. Rio de janeiro: Paz e Terra, 1996, p. 15: “As coisas se passam da seguinte maneira: fui nomeado juiz aqui na colônia penal, apesar da minha juventude. Pois em todas as questões penais estive lado a lado com o comandante e sou também o que melhor conhece o aparelho. O princípio segundo o qual tomo decisões é: a culpa é sempre indubitável.”
[32] WACQUANT, Loïc. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos. Trad. Nilo Batista. Rio de Janeiro: Revan, 2001.
[33] No Brasil, conferir: BATISTA, Vera Malaguti. Difíceis ganhos fáceis: drogas e juventude pobre no Rio de Janeiro. Rio de Janeiro: Revan, 2003.
[34] WACQUANT, Loïc. Punir os pobres..., p. 135.
[35] YOUNG, Jock. A sociedade excludente: exclusão social, criminalidade e diferença na modernidade recente. Trad. Renato Aguiar. Rio de Janeiro: Revan, 2002.
[36] BATISTA, Vera Malaguti. Prefácio. WACQUANT, Loïc. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos. Rio de Janeiro: Revan, 2001, p. 10: “Como não pensar na ‘bolsa-escola’, carro chefe do PT light, ou no ‘cheque-cidadão’ do clientelismo provinciano que distribui dinheiro público a partir de uma rede de igrejas selecionadas?”
[37] CUNHA, Rosa Maria Cardoso da. O caráter retórico..., p. 26: “O critério que assegura a divisão entre os homens bons e os homens maus provoca ainda o efeito de escamotear o caráter setorial da justiça. Ele supõe uma sociedade não estratificada econômica e valorativamente, homogênea em sua concepção de justiça, onde apenas os maus violam um pacto que tem por credor o todo social uniforme.”
[38] AREND, Marcia Aguiar. Estado Policial: a resposta do poder às emergências sociais. In: Revista Discente – CPGD - UFSC. n. 1. Florianópolis, 2002, p. 120.
[39] JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Derecho penal del enemigo. Madrid: Civitas, 2003, p. 47: “Quien no presta una seguridad cognitiva suficiente de un comportamiento personal, no sólo no puede esperar ser tratado aún como persona, sino que el Estado no debe tratarlo ya como persona, ya que de lo contrario vulneraría el derecho a la seguridad de las demás personas.”
[40] JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Derecho penal del enemigo..., p. 55-56.
[41] CHOUKR, Fauzi Hassan. Bases para compreensão e crítica do direito emergencial..., p. 137-138.
[42] DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 13.
[43] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson; CARVALHO, Edward Rocha. Teoria das Janelas Quebradas: e se a pedra vem de dentro? Disponível em: http://www.direitopenal.adv.br/artigos.asp?pagina=28&id=974. Acesso em: 05 mar. 2004.
[44] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson; CARVALHO, Edward Rocha. Teoria das Janelas Quebradas: e se a pedra vem de dentro?...,: A Broken Windows Theory foi articulada no artigo supracitado de James Wilson e George Kelling, sendo baseada na premissa de que ‘desordem e crime estão, em geral, inextrincavelmente ligadas, num tipo de desenvolvimento seqüencial’ (Wilson e Kelling, 1982, p. 31). Segundo eles, pequenos delitos (como vadiagem, jogar lixo nas ruas, beber em público, catar papel e prostituição), se tolerados, podem levar a crimes maiores. A idéia não é complexa e faz adaptação do ditado popular ‘quem rouba um ovo, rouba um boi’ (Wacquant, 2001, p. 25): se um criminoso pequeno não é punido, o criminoso maior se sentirá seguro para atuar na região da desordem. Quando uma janela está quebrada e ninguém conserta, é sinal de que ninguém liga para o local; logo, outras janelas serão quebradas.”
[45] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão..., p. 36: “Por outro lado, devem ser recordadas as diversas medidas de defesa social presentes em nosso ordenamento – das medidas de prevenção àquelas de segurança, incluindo as medidas cautelares de polícia –, todas irrogáveis não como conseqüência de fatos legalmente indicados e judicialmente comprovados como delitos, mas derivados de pressupostos subjetivos dos mais variados: como a mera suspeita de haver cometido delitos ou, pior, a periculosidade social do sujeito, legalmente presumidas conforme as condições pessoais ou de status, como as de ‘desocupado’, ‘vagabundo’, ‘propenso a delinqüir’, ‘reincidente’, ‘delinqüente habitual’, ou ‘profissional’, ‘de tendência delituosa’ ou similares.”
[46] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson; CARVALHO, Edward Rocha. Teoria das Janelas Quebradas: e se a pedra vem de dentro?...,: “É, em suma, de se fazer prevalecer a ordem sobre a desordem; porque os desordeiros estão contra os ordeiros. As pessoas desordeiras incluem ‘pessoas não respeitáveis, turbulentas ou imprevisíveis: catadores de papel, bêbados, viciados, adolescentes arruaceiros, prostitutas, vadios e os perturbados mentais’ (1982, p. 30). São – acredite-se, se for possível – os ‘bêbados fedorentos’ e os ‘pedintes inoportunos’ (1982, p. 34). Nós contra eles, num verdadeiro labelling approach (etiquetamento) antecipado: os desordeiros de dentro precisam ser controlados; os de fora, excluídos. De acordo com o artigo, são os ‘forasteiros’ ou ‘estranhos’ que cometem crimes (1982, p. 36). Os ‘regulares’, por sua vez, tendem a não causar problemas. Controlando os desordeiros, prendendo-os, excluindo-os, o problema estará resolvido. A ordem voltará a reinar e o crime desaparecerá.”
[47] FOUCAULT, Michael. Vigiar e punir..., p. 248.
[48] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. O papel da jurisdição constitucional..., p. 53: “Os juízes que saem da classe média decidem em favor da classe média, contra a patuléia, contra a choldra, como diz o Lenio. E é contra isso que é preciso se rebelar, porque quase sempre é assim, quase sempre foi assim. Por quê? Porque acaba sobrando sempre para eles, para os outros.”
[49] FREIRE, Jurandir Costa. Razões públicas, emoções privadas..., p. 91.
[50] HAYEK, Friedrich A. Principios de un orden social liberal..., p. 92.
[51] WACQUANT, Loïc. Punir os pobres..., p. 137: “O aprisionamento com fins lucrativos refaz, portanto, sua aparição a partir de 1983 [nos EUA] para se apossar rapidamente de um duodécimo do ‘mercado’ nacional, ou seja, cerca de 150.000 detentos, três vezes a população penitenciária da França. Estas firmas cotadas em bolsa no mercado Nasdaq ostentam taxas de crescimento e de lucro recordes e são as meninas dos olhos de Wall Street. A ‘nova economia’ americana não é somente Internet e as tecnologias da informação: é também a indústria do castigo! A título indicativo, as prisões do estado da Califórnia empregam duas vezes mais assalariados do que a Microsoft...”
[52] RAUTER, Cristina. Criminologia e subjetividade no Brasil..., p. 103-104: “Mas o que queremos ressaltar é que o trabalho é algo a ser compreendido no jogo das múltiplas forças institucionais: a possibilidade de trabalhar é vista pelo preso como um privilégio, em virtude dos benefícios secundários que acarreta. Além disso, ela é um imperativo, do ponto de vista da preservação da sanidade mental, para alguém mantido em confinamento por longos anos. (...) Este talvez seja o único ‘lucro’ do preso que trabalha: a preservação de sua saúde psíquica. Fora este aspecto, lucra sempre a instituição, realizando um ideal antigo do capitalismo: o trabalhador barato, servil, que deseja apenas trabalhar, exigindo muito pouco.”
[53] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. O papel da jurisdição constitucional..., p. 57.
[54] LEGENDRE, Pierre. O amor do censor..., p. 215: “Valor da anedota: lembro a origem canônica do próprio termo Propaganda (Congregação para a Propaganda da Fé, organismo central fundado em 1622 pelo papa Gregório XV, para gerir as Missões).”
[55] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. Jurisdição, Psicanálise e o Mundo Neoliberal..., p. 48-49.
[56] LEGENDRE, Pierre. O amor do censor..., p. 115: “Antes da falta, explica-se, Adão vivia no paraíso preservado de doença e dispensado da morte. Se ele tivesse guardado a inocência desse estado, teria ignorado a paixão, a ponto de que, no ato gerador, ele não teria sentido mais prazer do que ao tocar uma pedra com a mão. Ele teria, desse modo, engendrado uma raça santa e pura. Mas, sobreveio o pecado, daí procede todo o mal para a humanidade inteira, que sofre assim da condição de Adão, genitor primordial, segundo um conhecidíssimo texto de Agostinho comentado infinitamente pelos escolásticos. Seu crime consumado, nossos primeiros parentes conheceram a vergonha de se verem nus; conseqüência imediata do pecado: os órgãos genitais estavam para sempre corrompidos, tornaram-se a sede do prazer.”
[57] VIANNA, Túlio Lima. Fundamentos de direito penal informático: do acesso não autorizado a sistemas computacionais. Rio de Janeiro: Forense, 2003, p. 97.
[58] LEGENDRE, Pierre. O amor do censor..., p. 127.
[59] LEGENDRE, Pierre. O amor do censor..., p. 25.
[60] PASTANA, Débora Regina. Cultura do medo: reflexões sobre a violência criminal, controle social e cidadania no Brasil. São Paulo: Método, 2003, p. 78.
[61] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão. Trad. Maria Lucia Machado. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997, p. 54: “A televisão é um universo em que se tem a impressão de que os agentes sociais, tendo as aparências da importância, da liberdade, da autonomia, e mesmo por vezes uma aura extraordinária (basta ler os jornais de televisão), são marionetes de uma necessidade que é preciso descrever, de uma estrutura que é preciso tornar manifesta e trazer à luz.”
[62] BATISTA, Vera Malaguti. Prefácio...., p. 7.
[63] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão..., p. 22: “A violência simbólica é uma violência que se exerce com a cumplicidade tácita dos que a sofrem e também, com frequência, dos que a exercem, na medida em que uns e outros são inconscientes de exercê-la ou de sofrê-la.” BOURDIEU, Pierre; PASSERON, Jean Claude. A Reprodução: elementos para uma teoria do sistema de ensino. Trad. Reynaldo Bairão. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1982.
[64] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão..., p. 22.
[65] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão..., p. 23.
[66] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão..., p. 28: “Os perigos políticos inerentes ao uso ordinário da televisão devem-se ao fato de que a imagem tem a particularidade de poder produzir o que os críticos literários chama o efeito do real, ela pode fazer ver e fazer crer no que faz ver. Esse poder de evocação tem efeitos de mobilização. Ela pode fazer existir idéias ou representações, mas também grupos.”
[67] WARAT, Luis Alberto. O Direito e sua linguagem..., p. 102: “Pode-se afirmar, juntamente com Barthes, que a semiologia política deve se ocupar da linguagem que se produz e se espalha sob a proteção do poder. Este tipo de linguagem tem uma instituição como interlocutor privilegiado. As instituições sociais são, por sua vez, instituições que oficializam as linguagens, expropriando e reduzindo as significações enunciadas. A estereotipação discursiva cumpre um papel fundamental, pois sutilmente reveste as significações de uma forma canônica, as recupera para a metafísica institucional dominante, as ornamenta de verdades, as torna ahistóricas e, enfim, as rouba do sentido original de sua enunciação. Daí, a palavra ou discurso estereotipado ser um dado político. Ignorar isto é contribuir para a própria conservação do discurso como estereótipo.”
[68] FOUCAULT, Michael. Vigiar e punir..., p. 9-29.
[69] FREIRE, Jurandir Costa. Razões públicas, emoções privadas..., p. 91.
[70] WACQUANT, Loïc. Punir os pobres...,
[71] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão..., p. 74: “E a mesma busca do sensacional, portanto do sucesso comercial, pode também levar a selecionar variedades que, abandonadas às construções selvagens da demagogia (espontânea ou calculada), podem despertar um imenso interesse ao adular as pulsões e as paixões mais elementares (com casos como os raptos de crianças e os escândalos capazes de suscitar a indignação popular), ou mesmo formas de mobilização puramente sentimentais e caritativas ou, igualmente passionais, porém agressivas e próximas do linchamento simbólico, com os assassinos de crianças ou os incidentes associados a grupos estigmatizados.”
[72] LA BOÉTIE, Étiene de. Discurso sobre a servidão voluntária. Trad. J. Cretella Jr. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2003, p. 41: “Os teatros, jogos, farsas, espetáculos, lutas de gladiadores, animais estranhos, medalhas, quadros e outros tipos de drogas, eram para os povos antigos os atrativos da servidão, o preço da liberdade, as ferramentas da tirania. Os antigos tiranos possuíam este meio, esta prática, estes atrativos, para iludir os súditos sob seu jugo. Assim, os povos, enlouquecidos, achavam belos esses passatempos, entretidos por um vão prazer, que lhes passava diante dos olhos, e acostumavam-se a servir como tolos, mas piores do que as criancinhas que, para ver as imagens reluzentes dos livros iluminados, aprendem a ler.”
[73] SLOTERDIJK, Peter. Regras para o parque humano: uma resposta à carta de Heidegger sobre o humanismo. Trad. José Oscar de Almeida Marques. São Paulo: Estação Liberdade, 2000, p. 18.
[74] BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio..., p. 277-278: “O caso do ‘maníaco do parque’ exumou a psiquiatria forense mais rasteira e atrasada. (...) O alimento criminológico do público, portanto, são esses hambúrgueres conceituais, servidos em poucas linhas nos jornais e em poucos segundos na televisão.”
[75] DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral..., p. 14: [com a abertura, pós ditadura] “um imenso contingente de profisionais e amadores do jornalismo, do rádio e da televisão assumiram o papel de juízes paralelos para o efeito de noticiar, comentar e julgar antecipadamente os fatos delituosos no pressuposto de que assim o fazem na defesa da sociedade. (...) Além da ofensa ao princípio da dignidade humana, os apóstolos da salvação pública também violentam a presunção de inocência em favor da presunção de culpa.”
[76] BOURDIEU, Pierre. Sobre a televisão..., p. 82: “Tem-se a impressão de que a pressão dos jornalistas, exprimam eles suas visões ou seus valores próprios, ou pretendam, com toda a boa-fé, fazer-se os porta-vozes da ‘emoção popular’ ou da ‘opinião pública’, orienta por vezes muito fortemente o trabalho dos juízes. E alguns falaram de uma verdadeira transferência do poder de julgar.”
[77] BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio..., p. 283.
[78] BATISTA, Nilo. Mídia e sistema penal no capitalismo tardio..., p. 285.
[79] MENDONÇA, Kleber. A não-voz do criminoso: o Linha Direta como crônica moral contemporânea. In: Discursos Sediciosos, Rio de Janeiro, n. 12, p. 333-346, 2002.
[80] MENDONÇA, Kleber. A não-voz do criminoso: o Linha Direta como crônica moral contemporânea..., p. 340: “O Linha Direta não só silencia a voz do criminoso como leva este mesmo gesto a funcionar na caracterização da maldade do assassino. Este silenciamento se dá em três momentos diferentes dentro da reconstituição. O assassino, em momento algum, tem seu passado mostrado. Tampouco sua versão sobre o que de fato aconteceu merece ser simulada. Além disso, a própria voz do foragido é silenciada no momento em que sua prisão se concretiza.”
[81] WACQUANT, Loïc. Punir os pobres..., p. 118: “Desde 1997, uma das atrações mais concorridas das feiras dos condados organizados na Califórnia durante a bela estação, junto com as corridas de cavalos, a pesagem dos leitões e os concurso de cuspe à distância, é o ‘outing’ dos condenados por atentado aos costumes: entre a carrocinha do vendedor de sonhos, o estande de tiro ao alvo e a barraca que exalta as qualidades dos produtos da horta, sob uma imensa faixa de cores gritantes (‘Check it out! Relação dos delinquentes sexuais com acesso livre’), o Ministério da Justiça oferece seus sete computadores equipados com o CD-ROM da Lei de Megan, no qual o freguês pode digitar o código postal de seu domicílio e ver aparecer instantaneamente na tela a foto dos (ex)delinquentes sexuais residentes em seu bairro.”
[82] LEGENDRE, Pierre. O amor do censor..., p. 169-171.
[83] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. O papel da jurisdição constitucional..., p. 54-55: “A televisão faz plim-plim e aquela mulher (com cara de Paulo Autran, sem nenhuma expressão), vira para a câmera e diz: em uma chacina na periferia de São Paulo, São Miguelzinho, morreram mais 14 neste final de semana. E logo se pensa: dane-se, morreu, morreu, que bom que não fui eu! Não estou nem aí! É o supra-sumo da representação narcisística.”
[84] PASTANA, Débora Regina. Cultura do medo..., p. 97-98.
[85] MIRANDA COUTINHO, Jacinto Nelson de. Segurança Pública e o Direito das Vítimas..., p. 142: “É por isso que se consegue entender – aceitar é impossível! – o aumento desenfreado das agências de segurança privadas (vende-se proteção, agora legalmente), assim como cada um trata, na medidas das suas possibilidades, de fazer a sua parte e, com isso, os condomínios ganham articuladíssimos sistemas de proteção – do que Alphaville, em São Paulo, é o exemplo para o mundo (Hans-Peter Martin & Harald Schumann) – contra intrusos. São os chamados guetos de bem-estar; em verdade prisões (pelo menos de consciências), onde os aparentemente ‘mocinhos’ é que estão presos, enquanto os ‘bandidos’ estão soltos. Há, nisso tudo, pelo menos um efeito miopia, ou seja, as maiores vítimas, como é primário e sabem todos (seria cínico dizer o contrário), não têm condições de se proteger. E seguem o calvário de ter que conviver com a criminalidade à sua porta.”
[86] PASTANA, Débora Regina. Cultura do medo..., p. 63-72.
[87] VIANNA, Túlio Lima. A era do controle: introdução crítica ao direito penal cibernético. Revista dos Tribunais, São Paulo, a.93, n. 819, p. 448-456, jan. 2004.
[88] FOUCAULT, Michael. A verdade e as formas jurídicas..., p. 87: “O Panaption é a utopia de uma sociedade e de um tipo de poder que é, no fundo, a sociedade que atualmente conhecemos – utopia que efetivamente se realizou. (...) Vivemos em uma sociedade onde reina o panoptismo.”
[89] ORWELL, George. 1984..., p. 9.
[90] ESTÉVEZ ARAUJO, Jose Antonio. Um olhar a partir da Europa. Trad. Lédio Rosa de Andrade. Tubarão: Studium, 2002, p. 106.
[91] GALEANO, Úselo y Tírelo - El mundo del fin del milênio visto desde uma ecologia latinoamericana, 1994, p.170, tradução nossa (El hambre desayuna miedo. El miedo al silencio aturde las calles. El miedo amenaza: Se usted ama, tendrá sida. Se fuma, tendrá cáncer. Se respira tendrá contaminación. Se bebe, tendrá accidentes. Si come, tendrá colesterol. Si habla tendrá desempleo. Se camina tendrá violencia. Si piensa, tendrá angustia. Si duda, tendrá locura. Si siente, tendrá soledad.).


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