Medidas indutivas inominadas: o cuidado com o fator Shylokiano do art. 139, IV, CPC

26/09/2016

Por Jorge Bheron Rocha, Bruno Campos Silva e Diego Crevelin de Sousa - 26/09/2016  

1 – Considerações Iniciais

Segundo o art. 139, caput e inciso IV, CPC, o juiz dirigirá o processo, incumbindo-lhe decretar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.

Tirante o excesso de entusiasmo que legou alguns equívocos técnicos – o dispositivo chega ao exagero de tratar medidas indutivas e coercitivas como coisas distintas, embora estas sejam espécies daquelas, além de dispor sobre o efeito (mandamental) da decisão como se técnica executiva fosse[1] –, o texto do dispositivo não deixa dúvidas: desde o CPC/15, o juiz está munido de amplos poderes executórios, podendo utilizar toda e qualquer medida indutiva inominada[2] para efetivar as obrigações exequendas, inclusive as de pagar quantia.

O dispositivo é ovacionado por parte da doutrina. Na empolgação promovida pela dicção legal qualquer medida, alguns defendem que, respeitado o limite da prisão civil, cabível apenas contra o devedor de alimentos (o STF, por força do Pacto de São José da Costa Rica, veda a prisão civil do depositário infiel), esses poderes são praticamente ilimitados. Insistindo no mau vezo de listar hipóteses em abstrato, ignorando que o sentido só se dá na aplicação (situação concreta, real ou fictícia)[3], as sugestões são as mais engenhosas: suspensão de CNH, retenção de passaporte, restrição de fim de semana, cancelamento de cartões de crédito etc., para ficar apenas nestas.

Não nos parece producente elencar um rol abstrato das medidas que poderiam ser aplicadas pelo juiz a título do art. 139, IV, CPC. Se o que se busca é a efetividade da execução é certo que as medidas necessárias para tanto só podem ser definidas no contexto do caso concreto. De modo que o ideal é enveredar pela lógica modular (=soluções adequadas o caso), e não genérica (=soluções de pretensa adequação abstrata e universal).

Ademais – e esse é o ponto que nos parece mais caro –, como o dispositivo franqueia uma gama aparentemente ampla de poderes do juiz e não define prévia e minimamente as condições de licitude da sua aplicação, mostra-se prudente ocupar-se primeiramente (ou, no mínimo, a conjuntamente) não da definição do que o dispositivo permite que seja feito, mas do que ele não permite. Ou seja, propõe-se a sua compressão por exclusão. Afinal, se o dispositivo pode, quando aplicado adequadamente, contribuir para a real satisfação dos direitos, também pode, quando empregado de modo açodado, provocar graves lesões ao executado. Sendo certo que em direito os fins não justificam os meios, daí ressalta como prioritária a necessidade de estabelecer limites.

A preocupação primordial com os limites justifica-se, ademais, pelo fato de que o art. 139, IV, CPC, não constitui a única nem a principal ferramenta de efetivação dos direitos. Ao contrário, todas as modalidades obrigacionais contam com procedimento legal executório mais ou menos preciso, servindo o dispositivo em liça como mais um mecanismo de efetivação. Destacar esse aspecto é necessário até mesmo para que não haja uma hipertrofia do emprego das medidas indutivas atípicas, desprezando-se os expedientes especificamente tipificados pelo legislador.

2 – O caso analisado

Não se fará uma análise em abstrato. Parte-se de uma decisão – que repercutiu nacionalmente – proferida em execução que tramita na comarca de São Paulo-SP no bojo da qual foi determinada, a um só tempo, a suspensão da CNH, a apreensão do passaporte e o cancelamento do cartão de crédito do executado.

In casu, a juíza ressaltou, com acerto, que as medidas indutivas inominadas, conquanto cabíveis, “não poderão ser aplicadas indiscriminadamente”, devendo seguir “alguns critérios de excepcionalidade, para que não haja abusos, em prejuízo aos direitos de personalidade do executado”, quais sejam, “o esgotamento dos meios tradicionais de satisfação do débito” e a existência de “indícios que o devedor usa a blindagem patrimonial para negar o direito de crédito ao exequente”, relevante este último porque “não se pode admitir que um devedor contumaz, sujeito passivo de diversas execuções, utilize de subterfúgios tecnológicos e ilícitos para esconder seu patrimônio e frustrar os seus credores”. Também destacou a necessidade de buscar a medida menos onerosa ao executado (art. 805, CPC) e de respeitar os direitos e garantias assegurados na Constituição, pré-excluída a prisão civil.

Sobre a sucessão fática, registrou que: o processo tramita desde 2009; de lá pra cá, foram utilizadas e frustradas medidas executivas típicas cabíveis; o executado não paga, não indica bens à penhora, não faz proposta de acordo e “não cumpre de forma adequada as ordens judiciais” (embora sem explicitar o que seja esse descumprimento).

Ponderou que “se o executado não tem como solver a presente dívida, também não recursos para viagens internacionais, ou para manter um veículo, ou mesmo manter um cartão de crédito. Se porém, mantiver tais atividades, poderá quitar a dívida, razão pela qual a medida coercitiva poderá se mostrar efetiva.

Em face disso, determinou a suspensão da CNH, a apreensão do passaporte e o cancelamento do cartão de crédito do executado.

O executado reagiu. Impetrou habeas corpus (writ de duvidosíssimo cabimento na espécie) e obteve liminar junto à 30ª Câmara Cível, fundada no seguinte argumento: “O art. 8º, do CPC/2015, também preceitua que ao aplicar ordenamento jurídico, o juiz não atentará apenas para a eficiência do processo, mas também aos fins sociais e às exigências do bem comum, devendo ainda resguardar e promover a dignidade da pessoa humana, observando a proporcionalidade, a razoabilidade e a legalidade”. Por isso (e apenas isso!), foi determinado o desfazimento do ato impugnado[4].

Pois bem.

3 – Análise das decisões proferidas

Em primeiro lugar, é forçoso reconhecer a falta de fundamentação adequada das decisões em questão, sobretudo daquela proferida em segundo grau. Nesta, o julgador simplesmente transcreveu o art. 8º, CPC, dispositivo repleto de termos genéricos, sem explicitar seu conteúdo e o modo como incide no caso concreto, violando o art. 489, § 1º, I e II, CPC.

Já na decisão de primeiro grau, a magistrada não explicou a correção das premissas por ela mesma estabelecidas – por que quem não tem dinheiro para pagar dívidas não pode dirigir? Por que quem não tem dinheiro para pagar dívidas não pode ter passaporte? Por que quem não tem dinheiro para pagar dívidas não pode ter cartão de crédito? Nada disso é explicado –, além de não tê-las seguido efetivamente – disse ser necessário haver o exaurimento dos meios tradicionais de busca de bens penhoráveis e indícios de ocultação ou dissipação de bens, mas só demonstrou a incidência apenas da primeira, nada falando sobre o segundo.

Ora, como o art. 139, IV, CPC, possui redação vaga – fala em todas as medidas –, é necessário que doutrina e Judiciário, sobretudo este, contribuam para a sua densificação, o que exige a demonstração de que a medida é adequada (ou não) ao caso concreto. Decisões vagas como aquelas proferidas no caso sob análise são problemáticas porque não fornecerem critérios para orientar quando e quais medidas devem ser aplicadas.

Referido dispositivo é exemplo privilegiado da inadiável necessidade de consolidação de uma tradição de fundamentação pormenorizada das decisões judiciais, que permita definir racionalmente o que pode, ou não, com sua aplicação. E decisões como as ora referidas, data maxima venia, persistem em pseudofundamentações que em nada contribuem para a edificação de uma parametrização consistente, com prejuízo à segurança jurídica e à efetividade da prestação jurisdicional. Realmente, sem a elaboração dessa criteriologia, corre-se o risco de o dispositivo ser superestimado (animando arbitrariedades mediante emprego de medidas excessivas) ou subestimado (esvaziando-o com restrições injustificáveis), gerando colapso por ele ou dele, respectivamente.

Ainda mais um dado deve ser referido em relação à decisão de primeiro grau: tudo indica que o executado não foi ouvido antes da prolação da decisão, o que configura violação do contraditório. Decididamente, fora das exceções do parágrafo único do art. 9º, CPC, toda decisão deve ser precedida do contraditório, inclusive na execução[5]. Ainda que em menor extensão do que no processo/fase de conhecimento, deve ser assegurada ao executado a possibilidade de influir eficazmente no desenvolvimento e resultado da execução (p.ex. arguindo questões cognoscíveis de ofício, pleiteando a substituição de bem penhorado etc.). De modo que o juiz só pode aplicar o art. 139, IV, CPC, após oportunizar a manifestação das partes, especialmente do executado, até porque tais medidas podem causar gravame de impossível mensuração prévia, potencializando o risco de empregar-se meio mais gravoso sem permitir que o executado possa demonstrar tal fato ou mesmo de indicar meios menos onerosos (art. 805, parágrafo único, CPC)[6]. Fora daí, é proferir decisão surpresa, violando o art. 10, CPC. De lembrar que uma das dimensões do contraditório substancial é justamente controlar o poder decisório do juiz, de modo que a sua fragilização abre caminho para o solipsismo (e o moralismo) judicial, o que não se compraz com o processo democrático[7].

4 – A contumácia do executado

Nessa fase da investigação, cumpre indagar: seria correto dizer que a maior ou menor frequência com que o executado paga seus débitos é critério idôneo para aplicar, ou não, o art. 139, IV, CPC?

A resposta é negativa.

A execução persegue a efetivação da tutela jurisdicional mediante os meios capazes de promover o melhor resultado para o exequente de modo menos oneroso ao executado. Ora, se as medidas indutivas inominadas visam conferir maior efetividade à execução e se todo exequente faz jus a uma tutela efetiva, o ao emprego delas pouco importa a maior ou menor frequência com que o executado desonra seus débitos. Do contrário, seria necessário concordar que o exequente que demanda contra executado contumaz faz jus a medidas indutivas mais efetivas do que o exequente que demanda contra executado que raramente cai em inadimplência, o que não faz o menor sentido. De mais a mais, a maior ou menor contumácia do executado só poderia modular a intensidade da medida se a sua natureza fosse punitiva, o que não é o caso (ela é indutiva).

5 – Necessidade e adequação das medidas

As medidas indutivas devem ser necessárias e adequadas, sob pena de converter de indutiva para punitiva[8].

Efetivamente, aplicar medida desnecessária ou inadequada nada mais é que punir o executado que, não tendo bens penhoráveis, também não abre mão das regras protetivas de impenhorabilidade erigidas para garantir-lhe o mínimo existencial.

Para ser mais claro: aplicar o art. 139, IV, CPC, quando exauridos, sem êxito, os meios tradicionais de busca de bens penhoráveis, máxime quando inexistente qualquer indício concretamente demonstrado de ocultação ou dissipação de bens, é pressionar o executado a abrir mão daquilo que a lei impede seja-lhe tomado à força (art. 833, CPC, e demais disposições que tratam de impenhorabilidades).

Claramente, essa pressão visa dar uma aparência de voluntariedade à indicação de bens impenhoráveis pelo próprio executado, que, na verdade, só age assim por ser a única forma de ver-se livre de um gravame imposto por medida indutiva despida de qualquer necessidade ou adequação. Uma intolerável perversão!

Evidente que o direito pátrio não admite esta contraditio in terminis, sendo inaceitável a coexistência de regra protetiva do executado com outra que concede ao juiz poderes para forçar (ainda que indireta e veladamente) o executado a abrir mão daquela proteção[9]. Decididamente, as medidas indutivas inominadas não podem ser empregadas para forçar o executado a dispor de bens impenhoráveis, por ser solução despida de integridade e coerência (no sentido dworkiano).

Vejamos se, no caso concreto, as medidas foram empregadas necessária e adequadamente ou se perverteram indução em punição.

Como visto, a magistrada de piso disse expressamente que a aplicação do art. 139, IV, CPC, pressupõe (i) o exaurimento das vias tradicionais de localização de bens penhoráveis e (ii) indícios de ocultação ou dilapidação patrimonial. Curioso que, mais adiante, disse que (i) estava presente, nas nada falou (nem sequer sugeriu!) sobre (ii).

Mas ora, se o executado não tem bens penhoráveis (foram exauridas as vias tradicionais de localização de bens penhoráveis) e não há indícios de que oculta ou dissipa bens, as medidas aplicadas seriam adequadas aos fins a que se destinavam (levar o executado a pagar) ou serviriam apenas para puni-lo (simbólica e ou realmente)?

A resposta é negativa, conforme se vê em relação a cada uma das que foram aplicadas.

Sobre a suspensão da CNH, o exaurimento infrutífero das buscas de bens penhoráveis (conforme informado na decisão de primeiro grau) autoriza concluir, à míngua de mais informações, que o executado: (i) não é proprietário de veículo, (ii) é proprietário, mas o veículo é impenhorável (v.g. táxi instrumento de trabalho) ou (iii) é proprietário de veículo penhorável, mas o exequente não teve interesse no bem (v.g. por estar em péssimo estado de conservação).

Em qualquer dessas hipóteses, constata-se que a suspensão da CNH não apresenta qualquer justificativa razoável, só se explicando com o incorreto emprego da medida como forma de (no mínimo) pressionar o executado abrir mão de algum bem impenhorável para levantar dinheiro e pagar.

Nesse ponto, um problema adicional merece consideração: a suspensão da CNH é consequência de infração administrativa regida pela legalidade estrita e só aplicável ao cabo de devido processo administrativo no bojo do qual haja sido oportunizado o contraditório e a ampla defesa à pessoa física envolvida[10]. Não parece correto utilizar essa medida assim, sem previsão legal específica, para pressionar executados a pagar.

Quanto à retenção do passaporte do executado, por que fazer isso? Há provas de que ele viajou para o exterior enquanto a execução tramitava infrutiferamente? Há – mesmo sabendo-se que isso não é razão, por si só, à fixação da medida – alguma prova de que o executado está com viagem programada para o exterior? Aliás, no caso o executado tem passaporte?

Nada disso consta na decisão, deixando sem justificativa a medida em questão, senão (no mínimo) para pressioná-lo a dispor de bem que não pode ser tomado à força.

As mais variadas circunstâncias revelam o equívoco de tal medida aplicada assim, genericamente. Com efeito, nada justifica reter o passaporte do executado e impedi-lo de viajar para o exterior quando é agraciado, inclusive com todas as despesas pagas, com presente, sorteio ou prêmio (por completar tempo de serviço ou atingir metas produtividade na sociedade empresária em que trabalha). Como todo o custo é suportado por terceiro e, por isso mesmo, tal valor não poderia ser direcionado para satisfazer a execução, a sua realização pelo executado não traria qualquer prejuízo ao exequente e a retenção do passaporte seria injustificável.

Deixam-se duas provocações para a consideração do leitor: considerando que algumas viagens domésticas são mais caras do que para o exterior, poderia o juiz proibir, também, o executado de realizar viagens dentro do Brasil? No intuito de impedir que o executado gaste seu dinheiro sem ser com o pagamento da execução, o juiz poderia impor restrição de frequentar determinados locais (p.ex. casas noturnas, shows, cinema, teatro, festas regionais etc.)? A resposta a essas questões passa pela seguinte questão de fundo: qual é a relação entre a restrição de circulação, que diz com o direito de ir e vir (liberdade), com o pagamento de dívidas, que diz com a responsabilidade patrimonial?

Quanto ao cancelamento do cartão de crédito, a magistrada fundou a decisão na afirmação de que quem não paga seus débitos não deve ter cartão de crédito. Assim, sem mais. Mas por que essa é uma afirmação correta? Ela não diz. Toma-a como correta (como se isso fluísse livremente da natureza das coisas) e daí tira a consequência (igualmente natural, como que por implicação lógica) de que o contrato de cartão de crédito deve ser cancelado.

Reconhece-se que as razões da afirmação ora questionada são até intuitivas, mas é plenamente possível problematiza-las. Não se encontra justificativa idônea para que o juiz possa cancelar o contrato do executado com a administradora do cartão de crédito (ou instituição financeira) que não tem qualquer relação com o crédito exequendo, muito menos como isso poderia impactar positivamente na execução (senão para pressionar o executado a dispor de bens impenhoráveis). E sequer foram indicados sequer sinais de que o executado realiza gastos supérfluos com o cartão de crédito – não que isso justificasse a medida, pois o correto seria penhorar os esses bens (se duráveis, naturalmente), ao invés de cancelar o cartão de crédito, pura e simplesmente. Ademais, é da realidade de parte significativa das pessoas de classe média e média-baixa brasileiras utilizarem o cartão de crédito para pagarem parte das suas despesas ordinárias (v.g. compras de supermercado, remédios etc.). Por isso, privá-las desse recurso creditício pode onerar demasiadamente a ordenação básica de suas vidas, não produzindo qualquer resultado útil para a execução e, pior, gerando ainda mais problemas de inadimplência, ou seja, ao invés de resolver um problema criam-se outros. Isso pode até ser sintoma de daninha falta de educação financeira – para além da própria escassez de renda –, mas é dado da realidade que não pode ser ignorado ou minimizado.

Tem mais uma hipótese: se o executado paga o cartão de crédito com seu salário lato sensu e este não pode ser penhorado, descabe perscrutar sobre como ele gasta o seu salário. Lembre-se que a penhora do salário voltou à discussão legislativa por ocasião da elaboração do CPC e o consenso democrático possível foi admitir a sua penhora, qualquer que seja o seu valor, para satisfazer o crédito alimentício, e quando superior a cinquenta salários mínimos, para satisfazer qualquer crédito (art. 833, § 3º, CPC). Frise-se que é político o critério para definir quando e quanto do salário é possível penhorar, por isso só pode ser definido na arena política, ou seja, pelo parlamento (povo) brasileiro. Mas a partir do momento em que é vertido em lei, torna-se jurídico e não pode ser aplicado conforme a concordância, conveniência o qualquer outro critério subjetivo de quem quer que seja, vedando-se peremptoriamente a penhora de salário fora das hipóteses previstas em lei. É solução dura, provavelmente incoerente com a realidade financeira do país e certamente geradora de muita frustração – todos que já se viram às voltas com uma execução já viram suas pretensões frustradas por causa disso. Porém, não havendo inconstitucionalidade nas regras que disciplinam o tema – e não há! –, é o preço a pagar para viver numa Democracia.

De modo que o cancelamento do cartão de crédito não apresenta qualquer adequação ao fim desejado (reverter em pagamento ao exequente), mas uma forma de (no mínimo) constranger o executado a abrir mão de seus bens impenhoráveis para pagar.

Por todo o exposto, nota-se que, no caso analisado, o emprego das medidas indutivas inominadas se mostrou completamente inadequado à realização dos fins a que se prestam, constituindo apenas formas de punir o executado por não pagar, bem como formas (até inconscientes) de pressioná-lo a abrir mão de bens impenhoráveis para pagar, tudo ao arrepio de diversos direitos fundamentais (mínimo existencial e direito de ir e vir). Equívoco patente, pois[11].

6 – Aceitação dos limites da responsabilidade patrimonial

Uma reflexão final.

A execução se rege pela regra da responsabilidade patrimonial, recaindo – passe o truísmo – sobre o patrimônio do executado. Por isso, a execução forçada somente pode ser eficaz quando o executado dispõe de bens penhoráveis. Isto é, a inexistência ou insuficiência de bens penhoráveis do executado irremediavelmente frustra a execução. Não há técnica executória capaz de suplantar esse dado da realidade sócio-econômica.

Sabe-se que os bens impenhoráveis escapam à regra da responsabilidade patrimonial. E aí, pode-se discutir se as regras de impenhorabilidades são insuficientes, razoáveis ou amplas, a merecerem alargamento, manutenção ou redução, respectivamente. Mas – de novo – isso deve ser feito no âmbito parlamentar, da discricionariedade política dos representantes eleitos do povo – o que se passou muito recentemente com o NCPC, diga-se de passagem –, e não na difusa discussão caso a caso, ao alvedrio de um onisciente e clarividente Estado-juiz. É opção política pátria que as impenhorabilidades constituam questão de reserva de lei, não podendo o Judiciário funcionar como uma espécie de terceiro turno permanente do processo legislativo. E conquanto todo texto legal seja inexoravelmente interpretável (aliás, o direito é uma prática interpretativa), nem todo sentido (=produto da interpretação) é correto. Sim, ainda que com mais ou menos dificuldade de precisão, há sentidos corretos e incorretos. E é retumbantemente incorreta a interpretação que considera possível utilizar uma técnica indutiva (art. 139, IV, CPC) para forçar a parte a abrir mão de bens impenhoráveis (art. 833, CPC).

Não se ignora que o executado pode dispor livremente da proteção legal da impenhorabilidade. Mas ou isso é livre e de boa-fé, e, portanto, lícito, ou isso é obtido mediante pressão injusta, quando faltará genuína liberdade na manifestação de vontade, redundando em invalidade. Decididamente, o executado não pode ser pressionado (inconsciente e/ou veladamente) a fazê-lo. É bom insistir que o executado tem o direito de resistir às investidas constritivas mediante exceção de impenhorabilidade, instituída, lembre-se, a bem da preservação do seu mínimo existencial. A invocação dessa defesa pode até ser antipática e frustrante, mas é conforme a direito; a pressão para que dela decline, não. Cobrar renúncia de quem deve pode ser desejável do ponto de vista moral, mas não jurídico. E nesses pontos se faz necessário lembrar que a moral (de quem interpreta!) não corrige o direito[12].

Eis onde se justifica o fator shylockiano referido no título do texto.

Em O Mercador de Veneza, Shylock emprestou dinheiro a Antonio. Sentindo-se contrariado por ofensa deste proveniente de suas rusgas, o agiota judeu exigiu como pagamento uma libra de carne de Antonio, tal como previsto no contrato. No fundo, já não queria o pagamento, mas vingança. Porém, mediante vitória de uma interpretação esdrúxula obtida por expediente, no mínimo, desonesto, mesmo para a época, Pórcia encontrou uma forma de evitar que a vingança do credor gerasse um espetáculo cujo único objetivo era a humilhação do devedor (seu amado).

Especula-se que Shakespeare escreveu o romance por volta de 1598. Os tempos são outros. O avanço civilizatório impede que se tolere, entre nós, qualquer coisa parecida com arrancar o couro, literalmente, do devedor que não paga. Hoje, até parte dos bens não pode ser tomada à força. Mas o tempo não é capaz de apagar a essência humana. E tanto lá como cá, pode acontecer de a razão ceder (por vezes de modo até compreensível, embora não justificável) ao desejo de vingança e de humilhação do outro.

Eis o dilema que se coloca diante da aplicação do art. 139, IV, CPC: se pode ser mecanismo em prol da efetividade da tutela jurisdicional, caso manejado de modo inadequado, também pode se converter em instrumento de exposição do executado a vexame, submetendo-o à humilhação e ao ridículo para aplacar toda uma gama de frustrações – não só do executado, frise-se –, além do deleite e gozo (no sentido psicanalítico) do revide moral (num doentio e sádico processo de expiação)[13].

Shylock quis usar o direito para se vingar. Pode ser que os credores de hoje desejem o mesmo (lá e cá, mediante eufemismos bem intencionados e compreensíveis, mas ainda assim eufemismos!). Pórcia torceu o direito para impedir que isso acontecesse. Hoje, em 2016, é possível interditar a vingança pelo direito, sem malabarismos. Resta saber qual personagem assumiremos no enredo da história contemporânea do art. 139, IV, CPC. Com uma lembrança: no Estado Democrático de Direito não há escolha legítima possível!


Notas e Referências:

[1] MARINONI, Luiz Guilherme. ARENHART, Sérgio Cruz. MITIDIERO, Daniel. Novo Código de Processo Civil Comentado. 2ª Ed. RT. 2016, p. 273.

[2] Na verdade, não se trata de medidas indutivas atípicas, senão de medidas indutivas inominadas, uma vez que há tipicidade nestas medidas em razão de estarem previstas no “tipo aberto” do art. 139, IV.

[3] Postura assumida a partir da adesão ao paradigma pós-positivista de norma e de sentença/decisão, tal como defendidos por Georges Abboud, Henrique Garbellini Carnio e Rafael Tomaz de Oliveira: “o conceito pós-positivista de norma jurídica não pode mais possuir acepção semântica, porque norma não pode ser confundida com o texto normativo. A norma somente surge na solução de um caso jurídico, seja ele real ou fictício. Portanto, perante o paradigma pós-positivista do direito, não se pode mais confundir texto normativo com norma. Assim, ‘o texto normativo é o programa da norma, representa o enunciado legal (lei, súmula vinculante, portaria, decreto), produto de um complexo processo concretizador em que são envolvidos o programa normativo e o âmbito normativo. Em suma, a norma não é nem está contida na lei (apesar de ela ser elemento importante para a formulação da norma). Somente após a interpretação jurídica, destinada a solucionar um caso concreto (real ou fictício), é que surge a norma jurídica. (…) A concepção da decisão judicial como simples silogismo formulado a partir de um procedimento lógico-formal apresenta-se plenamente defasado, isso porque, a sentença não pode mais ser conhecida como silogismo em que se formula a norma por meio de um método lógico-formal. Todavia, a sentença na qual é produzida uma norma para solucionar o caso concreto (real ou fictício), ocorre de maneira estruturante, afinal, não existe um descobrir da norma (como se ela correspondesse à vontade da lei ou do intérprete), o que de fato existe é um produzir/atribuir sentido à norma diante da problematização de um caso concreto”. (Introdução à Teoria e à Filosofia do Direito. RT. 2013, p. 316-317).

[4] Para acessar a decisão de primeiro grau: http://www.conjur.com.br/2016-set-07/reu-pague-divida-juiza-suspende-cnh-confisca-passaporte. Para acessar a decisão de segundo grau: http://www.conjur.com.br/2016-set-09/justica-anula-decisao-suspendeu-cnh-cartao-credito-reu

[5] Sobre o contraditório na execução, conferir: CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. V.II. 17ª Ed. Lumen Juris, 2009, p. 148-150; VIEIRA, Luciano Henrik Silveira. A Observância da Principiologia Processual-Constitucional no Processo de Execução. Dissertação de mestrado apresentado ao PPGD da PUC-MG. 2014, p.102-107.

[6] A doutrina já destacou a necessidade de o art. 139, IV, CPC, ser aplicado e comparticipação das partes e do juiz: “A cláusula do artigo 139, IV, somada à cláusula geral de negociação processual (artigo 190), pode gerar uma quebra racional do discurso de protagonismo judicial hábil a uma proposta comparticipativa de implementação de direitos. Afinal, a teoria da jurisdição desde o Segundo pós-guerra no exterior e desde a Constituição de 1988, no Brasil, clama por uma revisitação que coloque à prova suas bases em face dos novos desafios decorrentes do aumento das espécies e complexidade das litigiosidades e dos ganhos da teoria do direito” (STRECK, Lenio Luiz. NUNES, Dierle. Como interpretar o artigo 139, IV, do CPC? Carta branca para o arbítrio? http://www.conjur.com.br/2016-ago-25/senso-incomum-interpretar-art-139-iv-cpc-carta-branca-arbitrio. Acessado em 15.09.2016.

[7] “o contraditório limita a cognição do juiz e baliza a extensão da fundamentação nos seguintes moldes: i) o que não passou pelo contraditório não pode ser objeto de decisão; ii) tudo o que foi submetido ao contraditório (questões de fato e de direito) deve ser objeto de manifestação do juiz, na fundamentação da decisão”. (SOUSA, Diego Crevelin de. DELFINO, Lúcio. Convite a um Processualismo Constitucional Democrático: o CPC-2015 e o dever de fundamentação das decisões judiciaishttp://emporiododireito.com.br/convite-a-um-processualismo-constitucional-democratico/. Acessado em 16.09.2016.

[8] Felizmente, instantes antes deste texto ser enviado para publicação, tomou-se conhecimento de judicioso texto do prof. Marcelo Abelha Rodrigues, publicado neste dia 21.09.2016, onde, para o bom dimensionamento do tema, demonstra que, diferentemente do direito estadunidense, o direito brasileiro não concede ao juiz um só poder que agrega indistintamente medidas indutivas e punitivas, tendo, ao contrário, requisitos e finalidades distintas: “O artigo 139 do CPC está diretamente atrelado às medidas processuais punitivas e às medidas processuais executivas. Este dispositivo tem um destinatário claro o juiz como enuncia o Título do Capítulo I “dos poderes, dos deveres e da responsabilidade do juiz”. Observe-se que no artigo 139, III e IV do CPC, embora muito próximos os incisos, neles estão separadas duas modalidades de atuações distintas do magistrado brasileiro. O realce que eu fiz foi necessário porque no modelo anglo-americano essas duas atuações do juiz não são consideradas distintas e se amalgamam num só poder (contempt of power). (…) aqui no Brasil não temos essa mesma amplitude até mesmo pelas nossas raízes culturais atreladas ao privatismo do civil law. (…) Retornando ao nosso raciocínio, e sempre tendo em mente o que o magistrado deve fazer para punir processualmente o executado cafajeste, é preciso lembrar que os dois incisos, III e IV, do artigo 139 revelam exatamente este duplo dever do magistrado brasileiro de atuar, respectivamente, reprimindo atos contra a dignidade à justiça e também desferindo medidas de execução direta ou indireta para assegurar o cumprimento de suas ordens [em especial as ordens de execução]. Como já disse a volto a repetir, no modelo anglo-americano, por exemplo, estes dois papeis estariam no mesmo dispositivo e no mesmo inciso. Aqui, por razões históricas e culturais refletem faces diversas da mesma moeda (poderes do juiz), o verso e o anverso, com fins diversos e regimes jurídicos diferentes. Embora emanem do mesmo juiz e se voltem contra a mesma pessoa e ainda derivem do poder/dever/função judicial contido no artigo 139 do CPC, tratam-se de figuras distintas aqui no Brasil, com diferentes finalidades no processo e por isso mesmo com distintos regimes jurídicosNão foi por acaso que os poderes-deveres de contempt of court do juiz brasileiro estão explicitados no inciso III do artigo 139 e os poderes-deveres de promover o cumprimento das ordens judiciais no inciso IV do mesmo dispositivo”. Mais adiante, o professor capixaba tem o cuidado de ressalvar que não é o nome dado à medida (indutiva, sob pretensa aplicação do art. 139, IV, CPC) que define a sua natureza, senão o fim (confessado ou não) a que se destina: “Enfim, é preciso ter muito clara a percepção de que o que define uma medida processual como coercitiva ou punitiva é a sua finalidade imediata [inegável que como toda e qualquer sanção punitiva, há, sempre, embutida e inerente uma função coercitiva decorrente do risco da punição, mas este não é o fim primeiro da regra do artigo 77, §2º], ou seja, se ela serve de instrumento para se obter um resultado a realizar ou se ela serve para punir uma conduta já realizadaNão é propriamente o seu nome, de onde emana ou o destinatário da medida processual que identificam se é coercitiva ou punitiva a medida processual. Frise-se, é a sua função, sua finalidade”. Finalmente, destaca que a abertura legislativa é para a aplicação de medidas indutivas, não para as medidas punitivas: “Como existe uma atipicidade dos meios executivos, é certo que o magistrado está “livre” para escolher em cada caso concreto, com fulcro no artigo 139, IV do CPC, as medidas processuais (coercitivas ou subrogatórias) que sejam adequadas, necessárias, proporcionais e razoáveis para assegurar o cumprimento da ordem judicial. Por outro lado, o mesmo não se passa com as sanções processuais imputáveis àquele que viola o dever de boa-fé e colaboração com a Justiça. Aqui não há a tal da atipicidade de sanções, antes o contrário. O artigo 139, III apenas menciona que o magistrado poderá “prevenir ou reprimir qualquer ato contrário à dignidade da justiça e indeferir postulações meramente protelatórias”, sem dizer, hora nenhuma, que ele estará “livre” para escolher a medida punitiva que lhe parecer adequada ou necessária ou razoável. Destarte, poderá aplicar o artigo 139, III valendo-se das sanções processuais previstas pelo próprio legislador processual, mas sem prejuízo de outras sanções penais e civis cabíveis (art. 77, §2º)”. (sublinhou-se). in http://m.migalhas.com.br/depeso/245946/o-que-fazer-quando-o-executado-e-um-cafajeste-apreensao-de-passaporte Acessado em 21.09.2016.

[9] Mas o dispositivo deve ser aplicado com racionalidade, deixando de ser “embasamento para medidas arbitrárias e autoritárias de restrição de direitos fundamentais, com o propósito utilitarista de satisfação de obrigações pecuniárias e tornar-se-ia fonte de uma satisfação processual-jurisdicional sofisticada e comparticipativa dos direitos. O perigo é o artigo 139, IV, ser transformado em instrumento de um quase desforço físico, só que com autorização judicial” (STRECK, Lenio Luiz. NUNES, Dierle. Como interpretar o artigo 139, IV, do CPC? Carta branca para o arbítrio? http://www.conjur.com.br/2016-ago-25/senso-incomum-interpretar-art-139-iv-cpc-carta-branca-arbitrio. Acessado em 15.09.2016.

[10] De se notar que cada vez mais se entende que ao Direito Administrativo Sancionador devem ser aplicadas as garantias do contraditório, ampla defesa, devido processo legal, na amplitude que estas tem no âmbito do Direito Penal, ou seja, “ambos tipos de infracciones se juzguen teniendo las mismas garantías para la aplicación de la sanción”. (BACIGALUPO, Silvina. La responsabilidad penal de las personas jurídicas. Barcelona: Bosch, 1998 , p. 240-241).

[11] Ainda que diversamente deste texto, que relaciona o uso do art. 139, IV, CPC, a uma forma (inconsciente e/ou velada) de pressionar o executado a dispor de bens penhoráveis, o prof. Marcelo Abelha Rodrigues afirma que em todos os casos que aplicaram o referido dispositivo por ele analisados – ditos assim, genericamente –, observou que, a pretexto de aplicar legitimamente medidas indutivas inominadas (art. 139, IV), o que se fez, na verdade, foi aplicar ilegitimamente medidas punitivas atípicas (art. 139, III). Em que pese a perspectiva distinta, sua conclusão guarda enorme afinidade eletiva com a tese ora proposta: “Nestes exemplos que têm pipocado no país, observa-se que os magistrados estão impondo medidas restritivas de direitos pessoais como apreensão do passaporte, proibição de ir ao estádio, apreensão da carteira de motorista, etc. como se fossem medidas coercitivas destinadas a pressionar o devedor a cumprir uma obrigaçãoEm todos os julgados que eu li, absolutamente em todos, pareceu-me claro que estamos diante de uma função punitiva, e não propriamente coercitiva, onde o magistrado deixa evidente a sua irresignação com a conduta do executado cafajeste, com seu comportamento desrespeitoso com a violação do dever ético, da boa-fé e da colaboração com a justiça, fato que se encaixa como uma luva no artigo 77, IV do CPC e no artigo 774 do mesmo diploma. Trata-se de punição pela violação do dever de boa-fé e colaboração com a justiça travestida ou nominada de “medida coercitiva”. É preciso reconhecer que o inehrent power do contempt of court anglo americano não é simétrico ao brasileiro. Aqui, felizmente ou infelizmente, a atipicidade é tão somente dos “meios necessários” para cumprimento das ordens judiciais, e não das medidas sancionatórias ou punitivas pelos descumprimentos, embaraços e indignidades cometidas pelo executado cafajeste. Não nos parece que seja lícito ao magistrado – ainda que esteja legitimamente bravo e irritado e indignado como com os atos processuais do executado cafajeste – possa, incorretamente, denominar de “medida coercitiva” uma “medida sancionatória” e, com base na atipicidade de meios executivos, inventar uma medida processual punitiva atípica, portanto, que esteja fora do rol de sanções desta estirpe previstas pelo legislador. Não pode haver uma sanção, seja ela processual ou não, sem prévia lei que a defina, e, sem contraditório ou devido processo que permita alguém contra ela se defender; mas aqui não nos dedicamos ao espaço da análise do contraditório e do devido processo na imposição de sanções processuais punitivas, que, deve ser respeitado. Na verdade, confesso que acho absurdo que o ordenamento jurídico processual não apresente um sistema de punição processual que seja adequado e consentâneo com a proteção que o processo, que a dignidade da justiça deve ter. Contudo, por mais que eu odeie o executado cafajeste e ache que ele mereça ser punido com a apreensão de seu passaporte, de sua carteira de habilitação, que fique sem a TV a cabo, sem poder frequentar estádios, etc., eu não posso admitir que estas penalidades processuais sejam aplicadas sem lei prévia que as defina e sem um devido processo. Não há no nosso sistema a possibilidade de aplicação de ofício pelo juiz de sanções punitivas processuais atípicas”. http://m.migalhas.com.br/depeso/245946/o-que-fazer-quando-o-executado-e-um-cafajeste-apreensao-de-passaporte Acessado em 21.09.2016.

[12] “Isto quer dizer, no mínimo, que a moral não pode ser corretiva. Moral não corrige o direito. Isto também quer dizer que uma decisão jurídica não é uma “questão de moral ou de filosofia moral”. A partir disso tudo, venho sustentando que os juízes tem responsabilidade política. Eles cumprem um papel. (…) É claro que, dada a cooriginariedade entre Direito e Moral (e o fato de o comando jurídico não poder contrariar o conteúdo moral, apesar de com este não se confundir), o argumento jurídico é, radicalmente, moral (por isso Dworkin irá ainda mais longe e dirá que o Direito é um branch da Moral). Mas a moralidade que o jurista articula quando argumenta não é a sua moralidade privada; não é a mesma que governa suas escolhas pessoais. A moralidade pública e política é outra, e gira, em Estados Democráticos ao menos, em torno de um sistema de direitos.  Você tem ou não tem um direito? Essa resposta depende de uma argumentação moral, e o juiz tem a responsabilidade política de desenvolvê-la de forma adequada. Não depende de uma escolha.” STRECK, Lenio Luiz. Matar o gordinho ou não? O que as escolhas morais têm a ver com o Direito? in http://www.conjur.com.br/2014-ago-28/senso-incomum-matar-gordinho-ou-nao-escolha-moral-ver-direito. Acessado em 16.09.2016.

[13] Por feliz coincidência, o prof. Marcelo Abelha Rodrigues também divisou a afinidade do tema ora tratado com o maravilhoso romance de Shakespeare, criticando o exequente que prefere humilhar o devedor a receber seu crédito: “Isso porque é na execução para pagamento de quantia que uma parte, ou a totalidade do patrimônio do executado, será expropriada à força pelo Estado para pagar a dívida que está sendo executada. Meus senhores e minhas senhoras, é nesta hora que nós vamos saber quem é quem. Eu não vou dizer que não existam exequentes cafajestes, como Shylock, abominável credor do Mercador de Veneza que prefere a carne do devedor ao invés do dinheiro da esposa do seu fiador, e, que por isso mesmo, numa defesa jurídica mirabolante, acaba se dando muito mal no final, sem uma coisa e nem outra, sem carne e sem dinheiro”. In http://m.migalhas.com.br/depeso/245946/o-que-fazer-quando-o-executado-e-um-cafajeste-apreensao-de-passaporteAcessado em 21.09.2016.


jorge-bheron-rochaJorge Bheron Rocha é Mestre em Ciências Jurídico-criminais pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra com estágio na Georg-August-Universität Göttingen, Alemanha. Sócio fundador do Instituto Latino Americano de Estudos sobre Direito, Política e Democracia – ILAEDPD. Membro da Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo – ANNEP e da Associação Brasileira de Direito Processual – ABDPro. Defensor Público do Estado do Ceará. Professor de Penal e Processo Penal da Graduação e Pós-Graduação. E-mail: bheronrocha@gmail.com / Facebook aqui.


bruno-campos-silvaBruno Campos Silva é Mestrando em Direito Processual Civil pela PUC-SP. Especialista em Direito Processual Civil pelo CEU-SP. Professor de Direito Processual Civil do Centro de Ensino Superior de São Gotardo-MG (CESG). Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP. Membro da Associação Brasileira de Direito Processual – ABDPro. Membro do Centro de Estudos Avançados de Processo – CEAPRO. Membro do Conselho Editorial da Revista Magister de Direito Civil e Processual Civil. Membro do Conselho de Redação da Revista Brasileira de Direito Processual – RBDPro. Coautor de obras coletivas na área do Direito Processual Civil. Diretor Adjunto Departamental do Instituto dos Advogados de Minas Gerais – IAMG. Presidente da Comissão de Direito Ambiental da 14ª Subseção da OAB-MG. Sócio fundador do escritório “Bruno Campos Silva Advocacia”. Especialista em Mercado de Carbono pela Proenco-SP. Membro da Associação dos Professores de Direito Ambiental do Brasil – APRODAB. Membro da Deutsch-Brasilianische Juristenvereinigung. Membro do Instituto dos Advogados de Minas Gerais – IAMG. Membro do Conselho Editorial da Revista Internacional REID do IEDC. Membro do Conselho Editorial da Revista Magister de Direito Ambiental e Urbanístico. Coordenador e coautor de obras coletivas nas áreas do Direito Ambiental e Urbanístico. Membro do Instituto Brasileiro de Advocacia Pública – IBAP. Advogado em Minas Gerais e Brasília. E-mail: brunocamposadv@outlook.com.


Diego Crevelin de Sousa. Diego Crevelin de Sousa é Especialista em Direito Processual Civil (Universidade Anhaguera-Uniderp). Membro da Associação Brasileira de Direito Processual (ABDPro). Professor de Direito Processual Civil e Direito do Consumidor das Faculdades Integradas de Aracruz – FAACZ, ES. Advogado.. .


Imagem Ilustrativa do Post: François Rabelais // Foto de: Peter K. Levy // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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