MEDIDA DE SEGURANÇA

30/05/2019

 

Como regra, ao agente dotado de culpabilidade (imputável em razão de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento) aplica-se a pena, uma das espécies mais comuns de sanção penal.

Ao agente não culpável (inimputável por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, que era, ao tempo da ação ou omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento) não se aplica pena, mas medida de segurança.

Já ao agente semi-imputável, que, em virtude de perturbação de saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado, não era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento (agente fronteiriço), aplica-se pena reduzida, a qual, entretanto, pode ser substituída por medida de segurança, de acordo com o disposto no art. 98 do Código Penal.

Assim, temos o seguinte quadro relativo à sanção penal:

a) para os imputáveis: pena;

b) para os inimputáveis: medida de segurança;

c) para os semi-imputáveis: pena reduzida ou medida de segurança.

A medida de segurança, conceitualmente falando, é uma espécie de sanção penal imposta pelo Estado aos inimputáveis (art. 26, caput, do CP) visando a prevenção do delito, com a finalidade de evitar que o criminoso que apresente periculosidade volte a delinquir. Enquanto o fundamento da aplicação da pena reside na culpabilidade, o fundamento da medida de segurança reside na periculosidade.

São três os pressupostos de aplicação das medidas de segurança:

a) prática de fato definido como crime;

b) periculosidade do sujeito;

c) ausência de imputabilidade plena.

Periculosidade, como é cediço, é a potencialidade de praticar ações lesivas.

A periculosidade pode ser real (quando precisa ser comprovada) ou presumida (quando não precisa ser comprovada).

No caso dos inimputáveis, a periculosidade é presumida, pois a lei determina a aplicação da medida de segurança, pressupondo que sejam eles dotados de potencialidade criminosa. No caso dos semi-imputáveis, a periculosidade é real, pois deve ser verificada pelo juiz à luz do caso concreto, ensejando a escolha entre a aplicação de pena reduzida ou a imposição de medida de segurança.

Há duas espécies de medidas de segurança:

a) medida de segurança detentiva, que consiste na internação em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico (art. 96, I, do CP);

b) medida de segurança restritiva, que consiste na sujeição a tratamento ambulatorial (art. 96, II, do CP).

Para a aplicação da medida de segurança, deverá o réu ser submetido a processo regular, sendo-lhe observadas todas as garantias constitucionais. No final do processo, em fase de sentença, o juiz deverá, tratando-se de inimputável, absolver o réu, impondo-lhe medida de segurança.

Essa medida de segurança poderá consistir em:

a) internação, quando ao crime forem previstas pena de reclusão ou de detenção;

b) tratamento ambulatorial, quando ao crime for prevista pena de detenção.

Portanto, a natureza jurídica da sentença que impõe ao réu inimputável medida de segurança é absolutória imprópria (art. 386, parágrafo único, III, do CPP).

Nesse sentido, a Súmula 422 do Supremo Tribunal Federal: “A absolvição criminal não prejudica a medida de segurança, quando couber, ainda que importe em privação de liberdade”.

Merece ser ressaltado que nos crimes apenados tanto com reclusão como com detenção a espécie de medida de segurança adequada será a de internação. A lei faculta ao juiz, entretanto, no art. 97, “caput”, segunda parte, do Código Penal que submeta o agente a tratamento ambulatorial, no caso de ser o fato previsto como crime apenado com detenção, sempre em atenção à gravidade do delito, às circunstâncias do fato e à periculosidade apresentada. Em qualquer fase do tratamento ambulatorial, poderá o juiz determinar a internação do agente, se essa providência for necessária para fins curativos.

O prazo da internação ou do tratamento ambulatorial será indeterminado, de acordo com o disposto no art. 97, § 1.º, do Código Penal, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia médica, a cessação da periculosidade. Entretanto, o Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça, em inúmeros precedentes, já vinham firmando o entendimento de que o limite máximo de 30 anos previsto pelo art. 75 do Código Penal se aplicaria também às medidas de segurança. Mais recentemente, inclusive, a orientação prevalente é a de que a duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito cometido.

A questão restou pacificada com a edição da Súmula 527 do Superior Tribunal de Justiça: “O tempo de duração da medida de segurança não deve ultrapassar o limite máximo da pena abstratamente cominada ao delito praticado”.

O prazo mínimo de internação será de 1 a 3 anos, findos os quais será o agente submetido a perícia médica, que se repetirá de ano em ano ou a qualquer tempo, por determinação judicial (art. 97, § 2.º, do CP).

Para que alguém seja internado em hospital de custódia e tratamento psiquiátrico ou seja submetido a tratamento ambulatorial, há a necessidade de expedição da respectiva guia pela autoridade judiciária (art. 172 da LEP). Essa guia será extraída pelo escrivão, que a rubricará em todas as folhas e a subscreverá com o juiz, e será remetida à autoridade administrativa incumbida da execução (art. 173 da LEP).

A cessação de periculosidade é procedimento regulado pelos arts. 175 a 179 da Lei de Execução Penal.

Já a desinternação ou a liberação do agente será sempre condicional. Isso significa que deverá ser restabelecida a situação anterior se o agente, antes do decurso de um ano, pratica fato indicativo de persistência de sua periculosidade.

Merece ser ressaltado que a desinternação progressiva não é prevista em lei. Trata-se de aplicar a medida de segurança de forma progressiva, por meio de saídas terapêuticas, evoluindo para regime de hospital-dia ou hospital-noite e outros serviços de atenção diária tão logo o quadro clínico do paciente assim o indique. Essa possibilidade vem sendo admitida pelos tribunais superiores, assim como a progressão de internação para tratamento ambulatorial.

Em razão da vigência da Lei n. 10.216/2001, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária editou a Resolução nº 5, de 4 de maio de 2004, que dispõe a respeito das diretrizes para o cumprimento das Medidas de Segurança, adequando-as às previsões legais: “3. O internado deverá ter acesso ao melhor tratamento consentâneo às suas necessidades, da mesma qualidade e padrão dos oferecidos ao restante da população. (...) 5. A medida de segurança deverá ser cumprida em hospital estruturado de modo a oferecer assistência integral à pessoa portadora de transtornos mentais, incluindo serviços médicos, de assistência social, psicológicos, ocupacionais, de lazer etc. (...) 8. Nos Estados onde não houver Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico os pacientes deverão ser tratados na rede SUS”.

Outrossim, estabelece o art. 183 da Lei n. 7.210/84 (Lei de Execução Penal) que, “quando, no curso da execução da pena privativa de liberdade, sobrevier doença mental, o juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou da autoridade administrativa, poderá determinar a substituição da pena por medida de segurança”.

Trata-se da medida de segurança substitutiva.

A dúvida que se estabelece é saber se o prazo de duração dessa medida de segurança substitutiva será indeterminado ou se estará limitado ao restante da pena privativa de liber­dade aplicada. O mais lógico é que tal medida tenha seu limite fixado no restante da pena privativa de liberdade que o condenado tinha ainda por cumprir. E isso porque a imputabilidade, no caso, foi verificada no momento do crime, quando o agente era inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento, recebendo, em contrapartida, a justa punição. Se, no curso da execução, tornou-se doente mental, merece tratamento, mas não por tempo indeterminado. Vencido o prazo inicialmente fixado para a pena privativa de liberdade e persistindo a doença mental, deverá o agente ser desinternado e colocado à disposição do juízo cível competente, para que se lhe promova a interdição ou outra medida adequada. Restabelecendo-se o agente, voltará para o cárcere.

Por fim, o sistema vicariante significa a possibilidade de aplicação de pena reduzida ou medida de segurança ao semi-imputável, em substituição ao sistema do duplo binário, utilizado anteriormente à reforma de 1984.

Nesse sentido, diz o art. 98 do Código Penal:

“Art. 98. Na hipótese do parágrafo único do art. 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos termos do artigo anterior e respectivos §§ 1.º a 4.º.”

Assim, se o semi-imputável pratica um crime, poderá ser-lhe aplicada uma pena reduzida ou uma medida de segurança.

O que irá determinar uma ou outra sanção será a periculosidade do agente, que deverá ser constatada pericialmente, já que, no curso do processo, deverá ser iniciado um incidente de insanidade mental.

 

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