Magister dixit

24/01/2024

Há duas concepções principais a respeito do\a professor\a: sabem; merecem respeito. Como generalização, discordo. Nenhuma profissão, necessariamente, atribui saber à\ao profissional que a exerce. Antes de seguir, todavia, situo-me: sou professor, sou filho e pai de professora, acho professor/a a profissão mais importante do mundo. Quero, todavia, dizer algumas considerações sobre modos de professorar.

Nas bordas sociais do Brasil, nas partes mais longínquas das cidades grandes, há extrema violência. Seria difícil deixar a escola fora disso. Nos educandários de periferia registram-se agressões diárias a professore\as, e muito\as lecionam com risco de vida. Uma vida de sacrifícios. Não abordo essa questão. Trato do\a professor\a das escolas de classe média, as que frequentamos o\as que temos melhor sorte.

Ainda vivemos alguma herança do chamado saber de autoridade: supostamente, o\a professor\a detém saber, dado que é professor\a. Contudo, ninguém lhe afere o conhecimento. Em geral, o\a mestre conhece, mesmo, mais do que o\a aluno\a. Um tanto, contudo, sobrevive de lançar tiradas acacianas sobre crianças. Ora, como nenhum adulto volta à escola para conferir a categoria de quem lhe educou, fica tudo por isso mesmo.

Tive eu, todavia, já formado em curso superior, a oportunidade de realizar minha conferência – e em razoável condição de fazê-lo – do saber de vário\as antigo\as professore\as da minha infância e adolescência. E afirmo sem mesuras: a um tanto dele\as o\as reputo tolo\as e até estúpido\as, exatamente como já os acreditava desde os meus tempos de escola primária. Intuitivamente eu percebia limites, contradições, preconceitos etc.

Explico: concluí meu colegial no interior e prestei vestibular na capital, para Direito. Diplomado, emendei formação acadêmica (mestrado, doutorado). Mas esse pé na academia não me impediu de retornar a casa, para advogar. Meus títulos me levaram a participar, então, da criação do curso de Direito da Unisul, e nele fui professor. Como a vidinha interiorana ia devagar, decidi-me a, na mesma Universidade, cursar Psicologia.

Adveio uma situação peculiar: fui professor de ex-professor meu; ex-professor meu foi meu colega como professor; tornei a ser aluno de ex-professor; ex-professor foi meu colega de turma; houve um caso em que aluno meu era, concomitantemente, meu professor. Encontrei oportunidade de conviver com personalidades que eu já via como venerandas, mas a outras fui obrigado a confirmar que eram, de fato, lamentáveis.

Em todo esse entrecruzar, revi, com muito desprezo, uma senhora que me lecionara português. Fui sua vítima na seguinte situação: a tarefa era escrever um conto e o conto, em datilografia, deveria receber capa, como se fosse a de um livro. Cumpri o dever com denodo. Ao apor na capa o título da “obra” e o meu nome, decidi escrevê-los com letra minúscula. A professora, para triste surpresa minha, entendeu de me reprovar.

Levei-lhe o contexto da minha causa literária: não havia erro, fizera opção artística. Desconsiderou-o; contra-argumentou com preceitos da língua escrita. Muni-me de bons livros, mostrei-lhe capas redigidas com minúsculas. Pretextou serem desacerto gramatical. Levei-lhe meu último recurso: uma respeitável sua colega de magistério, em volume publicado, redigira tal e qual eu o fizera. Laborei em vão. Qualquer razão já estava derrotada.

Magister dixit: o mestre o disse. Expressão latina utilizada para sustentar um argumento referindo-se a uma autoridade havida por inquestionável. Há professore\as que só se mantêm com argumentos de autoridade. E a autoridade na qual se escoram, além da dele\as mesmo\as, é o senso comum de que professor\a supostamente sabe. Eu conferi: embusteiro\as existem. Se a sua criança se queixar, é possível que seja o caso.

 

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