Indulto, graça e anistia: diferenças essenciais – Por Ricardo Antonio Andreucci

05/01/2017

Em 22 de dezembro de 2016, no final do ano passado, o Presidente da República, por meio do Decreto nº 8.940, concedeu indulto às pessoas nacionais e estrangeiras condenadas a pena privativa de liberdade, não substituída por restritivas de direitos ou por multa, que tenham, até 25 de dezembro de 2016, cumprido as condições previstas no citado diploma.

No preâmbulo do decreto, o Presidente da República invoca sua competência constitucional privativa para conceder o indulto, aduzindo se tratar de “tradição, por ocasião das festividades comemorativas do Natal”.

Nesse aspecto, vale ressaltar que o indulto é causa de extinção de punibilidade, prevista no art. 107, II, do Código Penal, ao lado da graça e da anistia.

Mas, afinal, quais as diferenças entre indulto, graça e anistia?

A anistia é o esquecimento jurídico de uma ou mais infrações penais. Pode, ainda, ser considerada uma declaração pelo Poder Público de que determinados fatos se tornaram impuníveis por motivo de utilidade ou relevância social. Quando se aplica a crimes políticos, é chamada de anistia especial, e, quando aplicada a crimes comuns, é chamada de anistia comum.

Segundo o disposto nos arts. 5º, XLIII, da Constituição Federal e 2º, I, da Lei n. 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), não se aplica anistia aos delitos de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, ao terrorismo e aos definidos como crimes he­diondos. Com relação à tortura, a Lei n. 9.455/97, em seu art. 1º, § 6.º, veda a concessão de anistia e graça ao condenado.

Conforme o disposto no art. 48, VIII, da Constituição Federal, a concessão de anistia é atribuição do Congresso Nacional, através de lei penal de efeito retroativo.

A anistia pode alcançar várias pessoas, pois se refere a fatos, extinguindo a punibilidade do crime, que deixa de existir, assim como os demais efeitos de natureza penal. Assim, a anistia opera efeitos “ex tunc”, ou seja, para o passado, extinguindo todos os efeitos penais da sentença condenatória. Não extingue, entretanto, os efeitos civis da sentença penal, tais como a obrigação de indenizar, de reparar o dano etc.

Pode-se citar como exemplo a Lei n. 12.505/11, alterada pela Lei n. 12.848/13, que, no seu art. 1.º, concedeu anistia aos policiais e bombeiros militares que participaram de movimentos reivindicatórios por melhorias de vencimentos e condições de trabalho ocorridos: I — entre o dia 1.º de janeiro de 1997 e a publicação desta Lei nos Estados de Alagoas, de Goiás, do Maranhão, de Minas Gerais, da Paraíba, do Piauí, do Rio de Janeiro, de Rondônia e de Sergipe; II — entre a data de publicação da Lei n. 12.191, de 13 de janeiro de 2010, e a data de publicação desta Lei nos Estados da Bahia, do Ceará, de Mato Grosso, de Pernambuco, do Rio Grande do Norte, de Roraima, de Santa Catarina, do Tocantins e do Distrito Federal.

Anistiado o crime, o sujeito, se cometer novo delito, não será considerado reincidente.

Já a graça é forma de clemência soberana e se destina a pessoa determinada e não a fato, sendo denominada indulto individual na Lei de Execução Penal. A graça é a concessão de clemência, de perdão ao criminoso pelo Presidente da República, nos termos do art. 84, XII, da Constituição Federal, por meio de decreto. Pode o Presidente da República, entretanto, delegar essa atribuição aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União (art. 84, parágrafo único, da CF).

A graça é sempre individual, ou seja, concedida a um sujeito determinado, e, nos termos do art. 188 da Lei de Execução Penal, deve ser solicitada por petição do condenado, por iniciativa do Ministério Público, do Conselho Penitenciário ou da autoridade administrativa. O pedido de graça será sempre submetido à apreciação do Conselho Penitenciário, por exigência do art. 189 da Lei de Execução Penal.

O indulto (ou indulto coletivo) também representa uma clemência, um perdão concedido pelo Presidente da República por meio de decreto. O indulto tem caráter de generalidade, ou seja, abrange várias pessoas, referindo-se a fatos, e pode ser concedido sem qualquer requerimento.

Tanto o indulto quanto a graça podem ser plenos ou totais, quando extinguem totalmente a punibilidade, e parciais, quando concedem diminuição da pena ou sua comutação (substituição da pena por outra de menor gravidade). Indulto ou graça parciais são chamados de comutação. A graça e o indulto extinguem somente as sanções mencionadas nos respectivos decretos, permanecendo os demais efeitos da sentença condenatória, sejam penais ou extrapenais. Assim, vindo o sujeito agraciado ou indultado a cometer novo crime, será considerado reincidente.

Vale lembrar que a Lei n. 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), regulamentando o art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, diz que os crimes de tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes definidos como hediondos, consumados ou tentados, são insuscetíveis de graça ou indulto.

Por fim, não se deve confundir (como ocorre frequentemente nos meios de comunicação) indulto com saída temporária.

A saída temporária é benefício previsto nos arts. 122 a 125 da Lei nº 7.210/84 (Lei de Execução Penal), visando propiciar ao condenado a possibilidade de saída do estabelecimento prisional sob determinadas condições, contribuindo para o seu retorno gradativo à liberdade.

A saída temporária somente pode ser deferida aos condenados que cumprem pena privativa de liberdade em regime semiaberto, nos casos de visita à família, de frequência a curso supletivo profissionalizante, bem como de instrução do 2º grau ou superior, na Comarca do Juízo da Execução, e de participação em atividades que concorram para o seu retorno ao convívio social. A ausência de vigilância direta não impede a utilização de equipamento de monitoração eletrônica pelo condenado (por exemplo, as tornozeleiras), quando assim determinar o Juiz da execução.

A autorização de saída temporária será concedida por ato motivado do Juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a administração penitenciária e dependerá de comportamento adequado do condenado, de cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena, se for primário, e 1/4 (um quarto), se reincidente, e da compatibilidade do benefício com os objetivos da pena. O prazo de saída temporária será não superior a 7 (sete) dias, podendo ser renovada por mais 4 (quatro) vezes durante o ano.

Ao conceder a saída temporária, o juiz imporá ao beneficiário as condições de fornecimento do endereço onde reside a família a ser visitada ou onde poderá ser encontrado durante o gozo do benefício, o recolhimento à residência visitada, no período noturno, e a proibição de frequentar bares, casas noturnas e estabelecimentos congêneres, além de outras que entender compatíveis com as circunstâncias do caso e a situação pessoal do condenado.

Quando se tratar de frequência a curso profissionalizante, de instrução de ensino médio ou superior, o tempo de saída será o necessário para o cumprimento das atividades discentes. Nos demais casos, as autorizações de saída somente poderão ser concedidas com prazo mínimo de 45 (quarenta e cinco) dias de intervalo entre uma e outra.

É bom ressaltar que o benefício será automaticamente revogado quando o condenado praticar fato definido como crime doloso, for punido por falta grave, desatender as condições impostas na autorização ou revelar baixo grau de aproveitamento do curso.

A eventual recuperação do direito à saída temporária dependerá da absolvição no processo penal, do cancelamento da punição disciplinar ou da demonstração do merecimento do condenado.


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