INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS NO TRIBUNAL DO JÚRI

06/09/2018

A incomunicabilidade dos jurados, nos julgamentos pelo Tribunal do Júri, constitui um dos pilares fundamentais sobre os quais se assenta esta secular instituição.

Há que se considerar, nesse contexto, a polêmica que cerca a manutenção do Tribunal do Júri no ordenamento jurídico brasileiro, haja vista que um “julgamento popular”, feito por leigos, nem sempre espelha um veredicto justo, haja vista as inúmeras interferências contextuais e midiáticas que o caso pode ensejar.

Independentemente disso, fato é que a instituição do Júri permanece em nosso sistema processual penal, estando prevista na Constituição Federal, no art. 5º, XXXVIII, que assim dispõe:

“Art. 5º (...) XXXVIII -  é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados:

a) a plenitude de defesa;

b) o sigilo das votações;  

c) a soberania dos veredictos;  

d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida.”

É bem de ver que, além dos princípios constitucionais assegurados a todos os julgamentos (devido processo legal, ampla defesa, contraditório etc) o art. 5º, XXXVIII, da Constituição Federal, enumera quatro princípios fundamentais pertinentes ao Tribunal do Júri:

a) Plenitude de defesa: que implica no exercício do direito de defesa, pelo acusado, de forma mais abrangente que a ampla defesa, assegurada aos réus em geral, ensejando sua efetiva participação no Tribunal do Júri e possibilitando ao seu defensor lançar mão de todos os argumentos e meios de prova e convencimento dos jurados, ainda que não expressamente previstos em lei.

b) Sigilo das votações: como exceção ao princípio da publicidade dos julgamentos, a votação dos quesitos pelos jurados, no Tribunal do Júri, é feito em sala secreta (atualmente denominada “sala especial”), sendo vedada qualquer forma de comunicação entre eles, que apenas poderão dirigir-se ao juiz presidente em caso de qualquer esclarecimento.

c) Soberania dos veredictos: a decisão dos jurados acerca, basicamente, da autoria e materialidade do crime, não pode ser modificada pelo Tribunal superior em grau de recurso. Nada impede, entretanto, que o Tribunal superior considere a decisão dos jurados manifestamente contrária à prova dos autos (art. 593, III, “d”, CPP).

d) Competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida: essa competência constitucional mínima não pode ser modificada por lei infraconstitucional, podendo, entretanto, ser ampliada para abranger outros delitos.

Queremos destacar, neste artigo, justamente o “sigilo das votações”.

Como é sabido, o art. 466 do Código de Processo Penal estabelece que “antes do sorteio dos membros do Conselho de Sentença, o juiz presidente esclarecerá sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades constantes dos arts. 448 e 449 deste Código”, deixando cristalina a obrigatoriedade de que o juiz presidente também advirta “os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa...”, devendo a incomunicabilidade ser certificada nos autos pelo oficial de justiça.

Nesse aspecto, cabe ao juiz presidente especial atenção a esta advertência aos jurados, não podendo o magistrado se limitar à menção do dispositivo legal ou a uma advertência meramente formal. Deve-se ter a certeza de que os jurados compreenderam a importância do sigilo e da incomunicabilidade, que pode ensejar a sua exclusão do Conselho de Sentença e, até mesmo, a dissolução do Conselho pelo juiz presidente, sob pena de nulidade absoluta do julgamento.

A propósito, vale colacionar interessante decisão do Superior Tribunal de Justiça, publicada no Informativo 630, dando conta de que, durante o debate em plenário do Tribunal do Júri, estando com a palavra o representante do Ministério Público, uma jurada haveria afirmado, em alto e bom tom, que teria efetivamente havido crime.

No venerando acórdão, exarado nos autos do HC 436.241-SP, da relatoria da Ministra Maria Thereza de Assis Moura, vem retratada parte da ata de julgamento lavrada na ocasião, em que se menciona: “A requerimento da Defesa, fica consignado em ata que no início dos debates a Promotora de Justiça perguntou ‘qual seria a conduta’ e uma jurada se manifestou dizendo ‘é um crime’, sendo prontamente advertida.”

No caso retratado, limitou-se o juiz presidente a advertir a jurada, prosseguindo o julgamento em seus ulteriores termos, culminando com a condenação do acusado.

O Superior Tribunal de Justiça, em sede de “habeas corpus” anulou o vergastado veredicto dos jurados, ao pretexto de que a manifestação inoportuna da jurada teria constituído quebra do sigilo das votações, a ensejar a nulidade absoluta do julgamento.

Portanto, em sede de julgamento pelo Tribunal do Júri, mormente quanto aos trâmites legais em plenário (“judicium causae”), deve o juiz presidente, e também as partes, dispensar especial atenção ao estrito cumprimento da ritualística processual, até porque o desrespeito aos preceitos basilares previstos constitucionalmente enseja a nulidade absoluta de toda a solenidade.

 

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