IMPOSSIBILIDADE DA REMIÇÃO FICTA OU VIRTUAL

14/06/2018

A remição, termo que significa reparação, compensação, ressarcimento, é um direito do condenado, que pode reduzir, pelo trabalho no interior do sistema prisional, ou pelo estudo, o tempo de duração da pena privativa de liberdade cumprida nos regimes fechado ou semiaberto.

A remição vem prevista no art. 126 da Lei nº 7.210/84, que dispõe:

“Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semiaberto poderá remir, por trabalho ou por estudo, parte do tempo de execução da pena.

  • 1º A contagem de tempo referida no caput será feita à razão de:

I – 1 (um) dia de pena a cada 12 (doze) horas de frequência escolar – atividade de ensino fundamental, médio, inclusive profissionalizante, ou superior, ou ainda de requalificação profissional – divididas, no mínimo, em 3 (três) dias;

II – 1 (um) dia de pena a cada 3 (três) dias de trabalho.

  • 2º As atividades de estudo a que se refere o § 1º deste artigo poderão ser desenvolvidas de forma presencial ou por metodologia de ensino a distância e deverão ser certificadas pelas autoridades educacionais competentes dos cursos frequentados.
  • 3º Para fins de cumulação dos casos de remição, as horas diárias de trabalho e de estudo serão definidas de forma a se compatibilizarem.
  • 4º O preso impossibilitado, por acidente, de prosseguir no trabalho ou nos estudos continuará a beneficiar-se com a remição.
  • 5º O tempo a remir em função das horas de estudo será acrescido de 1/3 (um terço) no caso de conclusão do ensino fundamental, médio ou superior durante o cumprimento da pena, desde que certificada pelo órgão competente do sistema de educação.
  • 6º O condenado que cumpre pena em regime aberto ou semiaberto e o que usufrui liberdade condicional poderão remir, pela frequência a curso de ensino regular ou de edu-cação profissional, parte do tempo de execução da pena ou do período de prova, observado o disposto no inciso I do § 1º deste artigo.
  • 7º O disposto neste artigo aplica-se às hipóteses de prisão cautelar.
  • 8º A remição será declarada pelo juiz da execução, ouvidos o Ministério Público e a defesa.”

Inclusive, nos termos do que dispõe o art. 128 da Lei de Execução Penal, será computado o tempo remido para a concessão do livramento condicional e do indulto.

É de se ressaltar, entretanto, que somente tem direito a remição o preso que cumpre pena nos regimes fechado e semiaberto. Sentenciado em gozo de regime aberto não faz jus a remição, conforme já pacificado em diversos precedentes dos Tribunais Superiores.

O trabalho prestado deverá ser comprovado por atestado expedido pela direção do estabelecimento prisional, documento que será apresentado ao juízo da execução instruindo o pedido de remição. Após oitiva do Ministério Público, o juiz da execução declarará remidos os dias pelo trabalho, através de decisão. Contra essa decisão é cabível o agravo em execução.

Com relação à remição da pena pelo estudo, embora inicialmente não admitida em lei (mas reconhecida pela jurisprudência – Súmula 341 do STJ), passou a ser prevista expressamente pelo art. 126 da Lei de Execução Penal, com a redação que lhe foi dada pela Lei nº 12.433/11. Isso em razão dos benefícios trazidos pelo estudo ao processo de recuperação e ressocialização do condenado.

Nesse sentido, inclusive, o art. 83, § 4º, da Lei de Execução Penal, com a redação dada pela Lei nº 12.245/10, prescreve que os estabelecimentos penais deverão contar com salas de aulas destinadas a cursos do ensino básico e profissionalizante, sendo que a Lei nº 13.163/2015 acrescentou o art. 18-A ao referido diploma de execução, dispondo que “o ensino médio, regular ou supletivo, com formação geral ou educação profissional de nível médio, será implantado nos presídios, em obediência ao preceito constitucional de sua universalização.”

Mas a questão que se coloca em debate é a seguinte: tem o preso direito a remição se cumpre pena em estabelecimento que não dispõe de condições para o trabalho ou para o estudo?

Cremos que não. O trabalho é um direito do preso e não uma obrigação do Estado, de forma que é condenável a prática de conceder remição ao preso que não trabalhou, alegando ausência de condições para o trabalho no estabelecimento prisional.

Alguns juízes de execução concedem a chamada “remição ficta” ou “remição virtual”, sob o pretexto de que o preso que cumpre pena em estabelecimento prisional que não tem condições para o trabalho ou para o estudo não pode ser prejudicado pela ineficiência do Estado, daí porque, mesmo sem trabalhar ou estudar, poderia remir fictamente um dia de pena para cada três dias supostamente trabalhados ou para cada doze horas supostamente estudadas.

Essa prática abjeta, felizmente, não é comum nas varas de execução penal e nos Tribunais Estaduais, sendo de todo vedada pelo Supremo Tribunal Federal que, em diversos precedentes, tem se manifestado pela impossibilidade de concessão da chamada “remição ficta ou virtual”.

A propósito: “Nos termos do art. 33 c/c art. 126 da Lei de Execução Penal, a remição da pena exige a efetiva realização de atividade laboral ou de estudo por parte do reeducando, ‘o qual deve comprovar, de modo inequívoco, seu real envolvimento no processo ressocializador, razão por que não existe a denominada remição ficta ou virtual’ (RHC 124.775-AgR, DJe 19.12.2014). 2. Embargos de declaração recebidos como agravo regimental, ao qual se nega provimento.” (STF – HC 132779 ED – MS – Rel. Min. Alexandre de Moraes – 1ª Turma – DJe 15.12.2017).

Em outra decisão, o Supremo Tribunal Federal reafirmou o mesmo entendimento: “Por falta de previsão legal, não há direito subjetivo ao crédito de potenciais dias de trabalho ou estudo em razão da inexistência de meios para o desempenho de atividades laborativas ou pedagógicas no estabelecimento prisional. O Regime Disciplinar Diferenciado impõe ao preso tratamento penitenciário peculiar, mais severo e distinto daquele reservado aos demais detentos, estabelecendo que o preso somente poderá sair da cela individual, diariamente, por duas horas, para banho de sol. Não há previsão, na Lei de Execução Penal, para que o preso, no regime disciplinar diferenciado, deixe a cela para executar trabalho interno, o que também se erige em óbice ao pretendido reconhecimento do direito à remição ficta. Recurso não provido.” (STF - RHC 124775 - RO – Rel. Min. Dias Toffoli – 1ª Turma – DJe 19.12.2014).

Portanto, não é possível se admitir a “remição ficta” ou “remição virtual”, não apenas porque inexiste previsão legal para a sua concessão, mas também porque o trabalho ou o estudo do preso devem ser inequivocamente comprovados, demonstrando ele pleno engajamento no processo ressocializador e não possuindo, como bem entendido pelas Cortes Superiores, direito subjetivo ao crédito de potenciais dias de trabalho ou estudo em razão da inexistência de meios para o desempenho de atividades laborativas ou pedagógicas no estabelecimento prisional em que cumpre pena.

 

 

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