Esboço de um «modelo naturalista» para o Direito (Parte 16)

14/12/2018

«Entre una bacteria y  Shakespeare, algo ha pasado». Jorge Wagensberg 

 É certo que se trata de experimentos intelectuais, mas, se baseiam em teorias razoáveis? Não parece que seja assim. Falar de um ponto de partida prévio à sociedade é absurdo, pois servem para lembrar-nos de que nunca houve uma sociedade “anterior”. Os grupos humanos atuais nasceram a partir de grupos de Homo erectus, e estes a partir de grupos de Australopithecus, e estes, por sua vez, de antepassados comuns aos humanos e chipanzés que eram de maneira provável uns animais com uma certa vida social. Portanto, para uma compreensão mais adequada do comportamento humano normativo parece necessário ver a vida ética e social humana como um produto da história evolutiva que nos precede, isto é, com antecedentes em outras espécies até o aparecimento de uma espécie essencialmente social, prioritariamente moral, particularmente cultural e decididamente diferente como a nossa.

Sendo assim, cabe defender que entre o mundo do “ser” e o mundo do  “dever-ser” existe uma manifesta e íntima relação, razão suficiente para considerar nossa faculdade ética como um análogo de outras faculdades mentais. Admitir este fato é, indubitavelmente, o caminho mais seguro para descobrir o fundamento dos modelos e das vias jurídicas de explicação e articulação da conduta social humana. E uma vez admitido que a base ontológica do fenômeno jurídico reside na natureza humana, que o ser humano é essencialmente social e que, como veremos a seguir, toda relação jurídica reside, em última instância , em uma relação social,  a função e finalidade do direito consiste tanto na  articulação combinada dos referidos vínculos sociais relacionais como no dever de atuar em  razão  da  pessoa  e  para a  pessoa humana.

Para dizê-lo de outra maneira, o direito não é mais nem menos que uma estratégia sócio-adaptativa – cada vez mais complexa, mas sempre notavelmente deficiente –  empregada para abordar e articular – de fato, nem sempre com justiça –, por meio de atos que são qualificados como valiosos, os vínculos sociais relacionais  elementares através dos quais os humanos constroem sistemas aprovados de interação e estrutura social. Um artefato cultural que deve ser manipulado para desenhar um modelo normativo e institucional que evite, em um entorno social repleto de assimetrias e desigualdades, a injustiça, a dominação e a interferência arbitrária recíprocas, garantindo certa igualdade material e, em último termo, permitindo, estimulando e assegurando a titularidade e o exercício de direitos (e o cumprimento de deveres) de todo ponto inalienáveis e que habilitam publicamente a existência dos cidadãos como indivíduos plenamente livres.

 

 

Imagem Ilustrativa do Post: O Espelho // Foto de: Ana Patícia Almeida // Sem alterações

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