Era uma vez o devido processo legal que foi destruído pelo seu inimigo Estado de Exceção: A morte do Estado Democrático de Direito

13/07/2017

Por Geovane Peixoto - 13/07/2017

A triste decisão proferida pelo “paladino da justiça da república de Curitiba” me fez pensar em um novo conto de fadas, como intitulado acima. Claro que alguns, antes de sequer se dar o trabalho de ler, como é cada vez mais usual hoje, vão de cara classificar esse texto como algo “ideológico” ou partidário (e podia até ser mesmo), mas o que contarei é a triste história de um “assassinato”.

Há muito tempo atrás, em 1215, com a edição da Magna Charta, acontece a incorporação definitiva ao direito do princípio do devido processo legal, mesmo considerando que:

A noção de devido processo legal como cláusula de proteção contra a tirania é ainda mais antiga: remonta ao Édito de Conrado II (decreto Feudal Alemão de 1037 d.C.), no qual pela primeira vez se regisrtra por escrito a ideia de que até mesmo o Imperador está submetido às “leis do império”.[1]

A necessidade de respeito aos ritos e garantias processuais, então, no paradigma ocidental, se constrói, desde então, como algo precípuo, e até mesmo inerente ao Estado de Direito, pois “se a história das penas é uma história dos horrores, a história dos julgamentos é uma história de erros; e não só de erros, mas também de sofrimentos e abusos”[2].

Torna-se, portanto, de suma importância a defesa de um devido processo legal, agora incorporado ao texto da Constituição Federal de 1988 (art. 5º, LIV), na qualidade de direito fundamental, impondo-se como um dos valores primazes para garantir a dignidade humana, devendo, assim, ser percebido como uma cláusula substancial, e não mais como garantia procedimental.

Diante desse cenário, importante anotar como “o processo penal brasileiro está em desconformidade com a cláusula do devido processo legal”[3], uma vez que a sua assunção eficaz demanda a “existência efetiva de um sistema de controle do poder exercido em face de cada um de nós é condição de possibilidade à implementação do devido processo legal substancial”[4].

Na consecução de um processo devidamente em conformidade com o sistema jurídico, também se faz importante entender que há uma distinção entre o processo civil e o processo penal, que demanda a aplicação de postulados e conceitos diversos, pela própria lógica que os distancia. Embora existam muitos defensores de uma teoria unitária para o processo, é importante, desde já, consagrar que “o Direito Processual Civil tem o seu próprio conteúdo, que o difere substancialmente do conteúdo do Direito Processual Penal, razão pela qual não é possível aplicar princípios e regras do Processo civil ao Processo Penal”[5].  O resultado da não adoção desta ideia é que:

Com relação ao Direito Processual Penal, especificamente, deve-se ter em conta que jamais foi capaz de construir uma teoria do processo própria, mas, simplesmente, incorporou e adaptou, acriticamente, aquilo que foi construído, na passagem do século XIX para o século XX, no âmbito do direito processual não penal.[6]

É preciso, sob essa ótica, por exemplo, perceber que o processo penal deve ser visto como um conjunto de garantias, notadamente constitucionais, para assegurar que seja conduzido de forma devida (em conformidade com o sistema jurídico, que por sua vez é regido substancialmente pela Constituição Federal). Assim, contraditório, ampla defesa, licitude das provas, presunção de inocência, entre outras, são imprescindíveis para um processo penal legítimo, embora não seja tudo, nem tampouco a solução do problema, é o mínimo que se pode esperar[7].

Nessa linha, conjugando a necessidade de respeito ao devido processo legal substancial com o respeito ao princípio da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da Constituição Federal de 1988), não se pode admitir condenações que não estejam pautadas em provas lícitas (art. 5º, LVI, da Constituição Federal de 1988) inquestionáveis da culpabilidade do cidadão.

Cabe, nesse caso, o ônus de produzir a prova lícita inquestionável ao acusador. O direito de defesa do réu será adstrito aos limites das provas produzidas pelo seu acusador, consoante está tutelado pelo nosso sistema jurídico processual pátrio.

Não se pode admitir, portanto, provas e acusações decorrentes de evidências ou probabilidades (pasmem com essa nova figura inserida no processo penal por teorias absurdas de “paladinos da moral e da justiça”). O Estado Democrático de Direito, como defende o título deste escrito, está pautado no devido processo legal substancial, que rechaça estas absurdas e elícitas ideias.

Os valores constitucionais são compatíveis com o Estado de Direito; os regimes de evidência são com ele incompatíveis. Entre ambos, não parece que ao sistema processual possa caber grande margem de escolha – afinal, ele é o microcosmo democrático do Estado de Direito. (...) É este o motivo pelo qual o quadro dos princípios a eleger não pode considerar-se senão parcialmente disponível – e o critério de admissibilidade não pode ser outro senão o da democraticidade. Em bom rigor, o sistema processual de inspiração democrático constitucional só pode conceber um e um só <<princípio unificador>>: a democraticidade; tal como só pode conceber um e um só modelo sistêmico: o modelo democrático. [8]

Não que isso não tenha acontecido antes no Brasil, trata-se de prática reiterada (uma triste “jurisprudência” que se vem consolidando), mas chegamos ao ano de 2017 e o fatídico processo que culminou com a decisão de primeiro grau, proferida pelo “messiânico” juiz curitibano, que acatou as alegações finais do Ministério público Federal, pautada em fortes “convicções” e “probabilidades”, mas sem provas efetivas[9], que condenou criminalmente um ex-presidente da República.

Um verdadeiro absurdo, uma decisão antitética aos valores constitucionais do nosso devido processo legal. Desamparada de provas, mas, insisto, com muita convicção, é quase uma evocação religiosa de tanta fé que existe que alguma entidade metafísica deve saber de algo que confirme as probabilidades de eles estarem certos.

Exemplifico com um trecho da decisão:

  1. É que, segundo a Acusação, a concessão do apartamento ao ex-Presidente teria ocorrido de maneira subreptícia, com a manutenção da titularidade formal do bem com o Grupo OAS, também com o objetivo de ocultar e dissimular o ilícito.
  2. Então, embora não haja dúvida de que o registro da matrícula do imóvel, de nº 104801 do Registro de Imóveis do Guarujá, e que se encontra no evento 3, comp228, aponte que o imóvel permanece registrado em nome da OAS Empreendimentos S/A, empresa do Grupo OAS, isso não é suficiente para a solução do caso.

Ele é acusado de ter recebido um imóvel, como forma de corrupção. Porém este é de propriedade formal do suposto corruptor, e arremata que o fato de não ter a propriedade não significa que não seja dele.

Questiona-se: qual a prova, então, de que ele recebeu o apartamento? Resposta: efetivamente, nenhuma; o que se vê nas alegações finais e na decisão é a construção de argumentos de convicção e probabilidade, mas nenhuma prova inequívoca. Documentos sem assinatura, documentos rasurados, documentos que indicam a intenção de compra de um outro imóvel, reportagens (pasmem), etc., basta ler os originais[10].

O processo penal brasileiro atinge, definitivamente, o padrão kafkaniano[11]; dotado de incertezas e obscuridades, distante do ideal de um devido processo legal, capaz de produzir injustiça, em nome de outros interesses não evidentes (ou muito evidentes, mas dissimulados por uma razão cínica).

A destruição do devido processo legal, e a consequente “morte” declarada do Estado Democrático de Direito, são, nesse caso, de responsabilidade do Estado de Exceção que vivenciamos no Brasil[12].

(...) em tempos de crise, o governo constitucional deve ser alterado por meio de qualquer medida necessária para neutralizar o perigo e restaurar a situação normal. Essa alteração implica, inevitavelmente, um governo mais forte, ou seja, o governo terá mais poder e os cidadãos menos direitos.[13]

Em síntese, “a exceção, portanto, decorre de uma necessidade do Estado que leva ao afastamento do direito, ou seja, a sua suspensão, para garantir-lhe a sobrevivência”[14].

Vivemos, portanto, em um estado de anomia, que admite o afastamento do sistema jurídico constitucional (principalmente da Constituição Federal), em prol de medidas que servem para resguardar a “ordem”. A supressão de direitos e garantias fundamentais é admissível, em favor da defesa da sociedade.

Para garantir a “legitimidade” desse Estado de Exceção, porém, se faz imprescindível a figura do inimigo[15]. No caso brasileiro, definida como A CORRUPÇÃO[16]. Figura abstrata e metafísica, que pode tomar qualquer forma.

Essa construção discursiva sempre se dá por meio da invocação da figura do inimigo, aquele ser desprovido de qualquer proteção política ou jurídica, de qualquer direito fundamental mínimo inerente ao ser humano. Esse inimigo clama pela figura de um Estado autoritário pelo medo que ocasiona na sociedade.[17]

A disseminação da ideia de um núcleo impoluto da sociedade (na mítica figura da “República de Curitiba” – composta pelos agentes estatais - juízes, membros do ministério público, delegados, etc.), que está promovendo todos os esforços necessários para combater A CORRUPÇÃO (?). A questão é: este é um fenômeno novo que justifique tais medidas de exceção?

Não se pode sonegar o fato de que a corrupção tem suas origens histórica e cultural[18]. Preciso, pois, investigar as condições historicamente construídas para a disseminação da corrupção no Brasil[19].

O Brasil foi (...) colonizado, numa infeliz coincidência histórica, por uma nação que se encontrava praticamente falida, sem condições materiais, culturais e morais para formar, nesta parte do mundo, uma sociedade de homens livres. Que se poderia, pois, esperar de uma sociedade fundada na aventura, e não no trabalho, na caça ao índio, na escravidão do negro, na degradação da mulher, na mancebia geral, na prostituição, na ignorância, na superstição, na injustiça e no medo? Que se poderia espera num país cujas terras eram dadas de graça, e em tratos imensos, a fidalgos incapazes de cultivá-las enquanto se negava uma nesga de terra àqueles que queriam plantar e criar? (...) Quem nada possui nada pode defender. E muito menos ideais ou princípios. Não se encontra, evidentemente, no clima nem na raça a causa de nossos males. Ela está nessa estrutura econômica quase inalterada em mais de quatro séculos. Somos, como povo, a expressão moral, a manifestação espiritual dessa estrutura.[20]

A grande realidade é que, “ao contrário do que ocorreu em outras colonizações, no caso específico do Brasil, os colonizadores não se preocuparam em construir o estofo moral do povo, muito menos se preocuparam com o seu destino, enquanto nação”[21].

O fato é que sempre esteve presente na história do Brasil o fenômeno da corrupção, uma vez que:

Corrupção política, como tudo mais, é fenômeno histórico. Como tal, ela é antiga e mutante. Os republicanos da propaganda acusavam o sistema imperial de corrupto e despótico. Os revolucionários de 1930 acusavam a Primeira República e seus políticos de carcomidos. Getúlio Vargas foi derrubado em 1954 sob a acusação de ter criado um mar de lama no Catete. O golpe de 1964 foi dado em nome da luta contra a subversão e a corrupção. A ditadura militar chegou ao fim sob acusações de corrupção, despotismo, desrespeito pela coisa pública. Após a redemocratização, Fernando Collor foi eleito em 1989 com a promessa de caça aos marajás e foi expulso do poder por fazer o que condenou. De 2005 para cá, as denúncias escândalos surgem com regularidade quase monótona.[22]

A partir daí, em um Estado de exceção para o combate à “corrupção”, então, aceita-se uma anomia, e a retirada de direitos fundamentais, sob a justificativa de que se está combatendo algo capaz de destruir a nossa vida em sociedade, desconsiderando os argumentos históricos acima apresentados.

Ademais, não posso deixar de registrar outra triste realidade, embora não seja o centro deste escrito, que diz respeito a seletividade. É possível condenar sem provas, com base em fé e convicções, mas é difícil receber uma denúncia com provas. A “demonização” política de lula e do seu partido é algo que só pode ser negado pelos inocentes ou pelos cínicos.

A condenação do ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva é mais um capítulo dessa história. Não resta dúvida da extensão agora alcançada pelo braço do Estado de exceção brasileiro, a cartada final e definitiva no desrespeito ao devido processo legal, e demais direitos fundamentais, cujo preço é o estado de anomia e incerteza, que nos deixa a seguinte pergunta: quem será a próxima vítima?

Não sei a resposta, mas sei que a história não chegou ao fim, embora a morte do Estado Democrático de Direito esteja declarada, o que traz tristeza e preocupação. Espero que como em contos ficcionais, ele possa ser ressuscitado e possamos ter ainda um final feliz, mas enquanto isso....

Bom, ao final, é bom lembrar de Bertold Brecht:

Primeiro levaram os negros Mas não me importei com isso Eu não era negro

Em seguida levaram alguns operários Mas não me importei com isso Eu também não era operário

Depois prenderam os miseráveis Mas não me importei com isso Porque eu não sou miserável

Depois agarraram uns desempregados Mas como tenho meu emprego Também não me importei

Agora estão me levando Mas já é tarde. Como eu não me importei com ninguém Ninguém se importa comigo.

(“Intertexto”)


Notas e Referências:

[1] DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil – Vol. 1. 18ª ed. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 66.

[2] FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal. 2ª ed. São Paulo: RT, 2006, p. 556.

[3] LOPES JR., Aury e ROSA, Alexandre Morais da. Processo Penal no Limite. Florianópolis: Empório do Direito, 2015, p. 16.

[4] Idem. Ibidem, loc. cit.

[5] MOREIRA, Rômulo de Andrade. Uma Crítica à Teoria Geral do Processo. Porto Alegre: Magister, 2013, p. 11.

[6] DUCLERC, Elmir. Por uma Teoria do Processo Penal. Florianópolis: 2015, p. 11.

[7] “Durante muito tempo, julgamos que o apelo aos princípios garantistas, previstos na constituição, seria o bastante para construir, num Brasil que saía de um regime de exceção, um direito penal compatível com o Estado Democrático de Direito. Passados todos esses anos, o resultado é que os problemas, nessa área, só se agravaram. Temos hoje uma das maiores populações carcerárias do mundo, que cresce a uma velocidade 16 vezes superior à população nacional, sem que se tenha podido recolher dessa realidade qualquer fruto positivo, senão superlotação, colonização de presídios por facções criminosas e uma violência que vem de dentro para fora do sistema.” (Idem. Ibidem, p. 10)

[8] MARTINS, Ruy Cunha. O Mapeamento Processual da Verdade. In PRADO, Geraldo; MARTINS, Ruy Cunha e CARVALHO, L. G. Grandinetti Castanho de. Decisão Judicial: A cultura jurídica brasileira na transição para a democracia. São Paulo: Marcial Pons, 2012, p. 79/80.

[9] Vide o excelente texto sobre as alegações finais do MPF nesse caso: NEVES, Marcelo. Denúncia vazia: com crença e convicção, mas sem provas nem razões. Disponível em: http://jornalggn.com.br/noticia/denuncia-vazia-com-crenca-e-conviccao-mas-sem-provas-nem-razoes-por-marcelo-neves.

[10] Alegações finais disponível em: https://d2f17dr7ourrh3.cloudfront.net/wp-content/uploads/2017/06/EPROCMOB_CONSULTA_PUBLICA.jfpr_.50465129420164047000.912.912-701496410874393760035007439993.pdf.

Decisão judicial disponível em: http://www.r7.com/r7/media/pdf/Evento%20948%20-%20SENT1.pdf.

[11] Alusão à obra “O Processo”, de autoria de Franz Kafka.

[12] Vide texto de Lenio Streck disponível em: http://www.conjur.com.br/2017-jun-29/senso-incomum-check-list-21-razoes-pelas-quais-estamos-estado-excecao.

[13] Rossirer, 1948, p. 5 apud AGAMBEM, Giorgio. Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo, 2004, p.21.

[14] SERRANO, Pedro Estevam Alves Pinto. Autoritarismo e golpes na América Latina: Breve ensaio sobre a jurisdição e exceção. São Paulo: Alameda, 2016, p. 69.

[15] “(...) o tema do inimigo da sociedade ganhou o primeiro plano de discussão.

Talvez os teóricos tenham caído, até, certo ponto, na negação do fenômeno do endurecimento das legislações penais sancionadas por causa ou a pretexto de situações de emergência, até que a realidade legislativa alcançou um ponto que impedia qualquer mecanismo de fuga. O certo, porém, é que a invocação de emergências justificadoras de Estado de exceção não é de modo algum recente. Se nos limitarmos à etapa posterior à Segunda Guerra Mundial, constataremos que há mais de três décadas essas leis vêm sendo sancionadas na Europa – tornando-se ordinárias e convertendo-se na exceção perpétua -, tendo sido amplamente superadas pela legislação de segurança latino-americana.” (ZAFFARANI, E. Raúl. O Inimigo no Direito Penal. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 13/14)

[16] “Corrupção é um termo ouvido com muita frequência hoje em dia. Contudo, causa muita discussão quanto a sua origem e a sua conceituação, sendo raramente apresentada com uma definição clara de seu entendimento. De uma maneira geral, a sua compreensão está relacionada tanto com o aspecto moral quanto com o jurídico. Especialmente com depravação, costumes sociais, roubo, furto, enriquecimento ilícito, favorecimento indevido, suborno, propina, etc. (...) Segundo grande parte dos estudiosos, a corrupção, assim como a violência e a avareza, é condição da natureza humana, por isso, sendo circunstâncias integradoras ou energias inerentes à natureza do ser humano, podendo elas vir à tona e manifestar-se em qualquer um de nós, causando consequências imprevisíveis. Assim, de um modo geral, parece haver concordância de que a origem da corrupção está na própria natureza humana que, igual a outras hipóteses nada edificantes, tais como a violência, a avareza e o ódio, possui controles decorrentes do meio em que o homem vive: família, religião, grupo social, educação, formação, Estado Democrático, etc., mas que podem, por circunstâncias de contexto, romper os controles sociais e causar malefícios terríveis.” (MILESKI, Helio Saul. O Estado Contemporâneo e a Corrupção. Belo Horizonte: Del Rey, 2015, p. 344/345.)

“A corrupção representa momentos de mau funcionamento das organizações do sistema político, que criam sistemas de incentivo para que esse tipo de comportamento se torne comum na política. Estes momentos de mau funcionamento do sistema institucional da política estão associados ao fato de as organizações do sistema serem poucoadaptáveis às mudanças, simples, sujeitas à captura por parte da burocracia do Estado e pouco coesas. Quando isso ocorre, segundo Huntington, ocorre a corrupção na política.” (FILGUEIRAS, Fernando. Marcos Teóricos da Corrupção. In AVRITZER, Leonardo et alii. Corrupção: Ensaios e Críticas. 2ª ed. Belo Horizonte: UFMG, 2012, p. 301.)

“No caso do Brasil, é bem clara a vigência de uma cultura que vê com olhos lenientes a trapaça em favor do interesse próprio e a inobservância das regras em qualquer plano, e que provavelmente se articula com nossa herança de escravismo, elitismo e desigualdade. Quer se trate das grandes ‘maracutaias’ que provocam a indignação da classe média (curiosamente, já que ela sem dúvida compartilha a cultura em questão), quer das formas mais brutais e violentas de criminalidade, que se expandem, ou mesmo da instabilidade que tem marcado tão longamente as nossas instituições políticas, essa cultura desatenta às regras se mostra de maneiras diversas.” (REIS, Fábio Wanderley. Corrupção, Cultura e Ideologia. In AVRITZER, Leonardo et alii. Corrupção: Ensaios e Críticas. 2ª ed. Belo Horizonte: UFMG, 2012, p. 329.)

[17] SERRANO, op. cit., p. 70.

[18] “A corrupção, literalmente, é a ação pela qual uma coisa apodrece ou se estraga. Assim, os desvios da conduta humana, a raiz do problema confunde-se com os próprios costumes (mores), com àquele que se deixa corromper, estragar, vender, subornar. (...) Sem dúvida alguma, sendo um fenômeno cultural, tem explicações e revelações na análise dos povos, na análise da forma de sua organização e formação. Tudo influencia no fenômeno. A cultura, a religião, a história, a organização jurídica do Estado dão respostas parciais para entende-la.” (FIGUEIREDO, Marcelo. A “Corrupção” e a Improbidade – Uma reflexão. In PIRES, Luis Manuel Fonseca; ZOCKUM, Maurício; ADRI, Renata Porto (Coord.). Corrupção, ética e moralidade administrativa. Belo Horizonte: Fórum, 2008, p.254.)

“Outro fator importante e relevante da análise da corrupção é a questão cultural. Efetivamente, para entender-se um ato como corrupto ou não, deve-se buscar a definição desse ato no contexto cultural da sociedade. Assim, pode-se dizer que o suborno, o presente e a propina, em sua definição, é um assunto cultural. Todavia, como a cultura é dinâmica e está em constante mudança, o modo de cultura no tempo e no espaço é que irá ditar se um ato é ou não corrupto.” (MILESKI, 2015, op. cit., p. 364.)

[19] “Há quem sustente que a corrupção no Brasil teria as suas raízes históricas remontando ao descobrimento. A primeira notícia que se tem, conquanto não configure exatamente uma forma de corrupção, pelo menos pode dar margem a dúbia interpretação. Assim, não teria sido de todo desinteressada a primeira carta, do punho do escriba Pêro vaz de Caminha, datada de Porto Seguro da Ilha de Vera Cruz, a 1º de maio de 1500, em cujo final ele solicita favores para o genro – Jorge de Osório – ao rei D. Manuel, de Portugal.” (HABIB, Sérgio. Brasil: Quinhentos Anos de Corrupção – Enfoque Sócio-Histórico-Jurídico-Penal. Porto Alegre: SAFE, 1994, p. 3.)

“Quem quer que nos leia com real interêsse, e não por simples curiosidade ou passatempo, há de chegar, por fôrça, à conclusão de que os nossos males têm sua origem nas condições econômicas em que nos constituímos e, com ligeiras modificações, continuamos, como descendentes, herdeiros e continuadores de fidalgos arruinados, dependentes de mercês reais, e, portanto, servis, amorais, e de colonos plebeus, degredados e degradados, ignorantes, indolentes e devassos, em situação econômica ainda mais precária. E tanto os fidalgos que vinham feitorizar o país como os plebeus, que vinham para a aventura, só tinham, com raríssimas exceções, uma aspiração: a de voltarem ricos, e o mais cedo possível.” (ROMERO, Abelardo. Origem da Imoralidade no Brasil. Rio de Janeiro: Conquista, 1967, p. 225.)

[20] ROMERO, 1967, op. cit., p. 226/227.

[21] HABIB, 1994, op. cit., p. 11.

[22] CARVALHO, José Murilo. Passado, Presente e Futuro da Corrupção Brasileira. In AVRITZER, Leonardo et alii. Corrupção: Ensaios e Críticas. 2ª ed. Belo Horizonte: UFMG, 2012, p. 200.


Geovane Peixoto. . Geovane Peixoto é Doutor e Mestre em Direito Público (UFBA). Mestre em Políticas Sociais e Cidadania (UCSAL). Professor de Direito Constitucional da UFBA, UNIFACS e Faculdade Baiana de Direito. .


Imagem Ilustrativa do Post: Broken Reflection // Foto de: Ryan McGilchrist // Sem alterações

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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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