Entrevista com Luiz Magno, autor de Constitucionalismo para Além da Constituição - #entrevistadasemana

19/02/2020

1. Dr. Luiz poderia falar um pouco sobre a proposta do livro “Constitucionalismo para Além da Constituição”?    

O livro pretende discutir se as funções de ordenação social atribuídas à constituição no início do Estado moderno ainda são aptas a “constituir” as comunidades políticas contemporâneas em cenário marcado por profundas transformações nas relações de interdependência e no papel a ser desempenhado pelo Estado.

Tendo isso em mente, defendemos que apesar de sua profunda crise de identidade, a constituição ainda se constitui como ideia-força apta a prover integridade sistêmica e a operar como parâmetro de legitimidade do espaço público.

No entanto, para que isso seja possível, defendemos que a constituição deva ser compreendida a partir de um comprometimento radical com o pluralismo e com a inclusão do outro, a fim de que seja redimensionada sua “capacidade de produção de discursos constitucionais” aptos a produzirem (novos) pontos de convergência material entre os integrantes da comunidade política.

Como se pode perceber, em um contexto de profunda divisão e antagonismos, a busca por implementação de mecanismos discursivos voltados a aproximar e promover a aproximação entre grupos e pessoas em torno de um projeto comum de sociedade, representa um dos maiores desafios contemporâneos nas democracias ocidentais.

 

2. Dos assuntos abordados no livro, qual deles o Dr. entende ser mais pertinente para o atual momento político que vivemos no país e por quê?

O livro aborda uma questão que se revela crucial ao debate político contemporâneo: a erosão da autoridade das instituições constituídas e o aumento exponencial de narrativas concorrentes sobre o (melhor) sentido a ser atribuído à constituição.

O fundamento clássico da autoridade estatal (baseada na ideia de hierarquia e de sistema de legalidade) e da noção de coletividade (construída a partir de construção de narrativas de integração e de identidade) não é suficiente para manter graus mínimos de coesão do tecido social (com suas complexidades e assimetrias).

As decisões institucionais relevantes não podem ser proferidas com base tão-somente na competência decisória. Elas devem ser produzidas tendo em vista o desafio de produzir novos pontos de convergência material, voltadas à aproximação dos interesses conflitantes. E, de acordo com o pluralismo compreensivo, isto não significa agir pautado por uma “nova” forma de fazer política supostamente “sem intermediários” (pressão direta das ruas e das redes sociais), ou ainda, de esperar que o Poder Judiciário deixe de cumprir sua função contra majoritária essencial à estabilização democrática (e passe a ouvir o clamor das ruas).

Afinal de contas, reproduzo aqui um trecho da conclusão do livro, “o dever de reconciliação faz com que se assume que dificilmente as concepções de bem concorrentes serão plenamente satisfeitas. Todavia, por outro lado, as individualidades constituídas nutrem a expectativa de que não serão levadas a se submeterem a sacrifícios tais que inviabilizem o exercício (ou impeçam o florescimento) de sua própria identidade.”

 

3. O que a obra deseja passar ao leitor?

É verdade que a perspectiva adotada no livro acaba sendo um tanto otimista, porque ainda se baseia em uma crença de que os múltiplos discursos em torno da constituição podem ser capazes de forjar novos pontos de convergência na sociedade. Portanto, o longo diagnóstico de crise de identidade constitucional que é feito na obra, acaba por exigir de nós um compromisso democrático com a defesa da “constituição”.

Ao fim, reproduzo pequeno trecho da apresentação da minha grande e saudosa amiga, Cecilia Caballero Lois, “ao conseguir encontrar um elo entre a manutenção das funções tradicionais da constituição, compreender a sua crise e apontar para as suas configurações possíveis, [o autor] finalmente comprova como o passado, o presente e o futuro são a gramática da constituição para além dela própria.”

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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