Entrevista com Ana Carolina Carlos de Oliveira, autora da obra Lavagem de Dinheiro: Responsabilidade Pela Omissão de Informações

19/08/2019

A entrevista de hoje é com Ana Carolina Carlos de Oliveira, autora da obra "Lavagem de Dinheiro: Responsabilidade Pela Omissão de Informações". O título já está disponível para compra no nosso site!

1. Carolina, qual a proposta do livro "Lavagem de Dinheiro: Responsabilidade pela Omissão de Informações"? O que podemos esperar do livro?

A proposta do livro é bastante clara: como deve ser a resposta penal para os sujeitos obrigados que não cumprem com os deveres administrativos de prevenir a lavagem de dinheiro, e que não enviam informações ao COAF? Como deve ser repensado o crime de lavagem de dinheiro, para que se tipifique mais precisamente o comportamento dos diferentes intervenientes nas operações de lavagem? O leitor pode esperar do livro a resposta detalhada e propostas práticas e legislativas para essas perguntas. Todas elas amparadas em uma abordagem bastante completa e inovadora sobre a forma de pensar dogmaticamente tanto o tipo penal de lavagem de dinheiro quanto sua aplicação prática nos casos de omissão da conduta preventiva devida.

2. De que maneira a temática abordada contribui com a área jurídica?

Creio que o livro pode contribuir para a solução teoricamente mais afinada dos casos mais complexos de lavagem de dinheiro que vem estampando os jornais nos últimos anos. Em muitos casos, junto com as condutas indubitavelmente criminosas de lavagem de dinheiro, há uma área intermediária onde cabe tanto a sanção penal quanto a administrativa, mas que está sendo inteiramente tratada dentro do Direito penal pela jurisprudência brasileira. Ao mesmo tempo, creio que o livro pode contribuir – junto com outras obras de grandes professores, publicadas no último ano – para fazer avançar a teoria das condutas omissivas na práxis do Direito penal econômico brasileiro.

Cada página desse livro foi escrita com muita dedicação, pensando sempre em expor as estruturas da parte geral, as escolhas legislativas, para deixar exposta a racionalidade que podemos seguir na interpretação do crime de lavagem de dinheiro e sua sanção por condutas omissivas. Isso porque a sentença condenatória, ou uma alteração legislativa, deveriam ser somente a consequência de todo um construto lógico, constitucional, pensado na resposta penal mais eficiente, afastando-se toda e qualquer arbitrariedade.

3. O que a obra deseja passar ao leitor sobre a importância desse assunto?

A obra pretende destacar a importância da dogmática penal e da sistematicidade na produção de leis mais modernas, como é o caso da Lei de Lavagem de dinheiro. Acredito que os pesquisadores brasileiros na área do Direito penal têm um trabalho importante pela frente. Temos que modernizar a dogmática do Direito penal no Brasil, estudar mais detalhadamente os porquês e os fundamentos da responsabilidade penal para oferecer respostas proporcionais, adequadas, previsíveis, e sistematicamente coerentes. Para isso está desenhada a teoria do delito, os princípios fundamentais e as estruturas complexas da parte geral do Direito penal. Se me permitem a analogia, temos que construir a “casa” do Direito penal pelos alicerces, e não pelo telhado, ou seja, analisar suas estruturas do de um modo mais profundo e aplica-las corretamente, independentemente de quem seja o réu, o partido político, ou o juiz que está julgando o caso. Nos casos de lavagem de dinheiro mais midiáticos tenho a impressão de que primeiro se decide quem deve ser condenado, e depois se adapta a teoria do Direito penal para encontrar argumentos para sustentar uma condenação que já havia sido decidida de antemão.  Essa é uma tendência infelizmente comum na práxis penal brasileira, e que precisa ser urgentemente alterada por via de argumentos científicos e de uma comunidade cientifica forte no país, produzindo conhecimento internamente, de modo a evitar que o Direito penal de seja instrumentalizado para decisões injustas.

 

4. Qual é a maior dificuldade de falar sobre esse tema? 

Minha maior dificuldade em abordar o tema foi o estágio da nossa doutrina no que diz respeito à interpretação da doutrina da comissão por omissão, e dos fundamentos dos deveres de garante. Enfrentei-me, no Brasil, com uma visão ainda muito formalista, que fazia uma conexão direta entre a lei administrativa e a lei penal para justificar o dever de garante. Salvo notáveis exceções, ousaria dizer que o tratamento manualístico desse tema no Brasil está algo como 40 anos defasado, em comparação com o que se vem produzindo cientificamente a respeito em todos os países de nosso entorno jurídico (e não me refiro somente à Europa, mas também em comparação com alguns países da América Latina). Desde a finalização desse livro, três obras muito importantes sobre o tema foram publicadas no país, mas ainda não estavam disponíveis no momento da pesquisa. Creio que esses esforços demonstram a urgência de se tratar mais a fundo sobre o tema da comissão por omissão na academia brasileira, e espero que essa obra possa contribuir, ainda que minimamente, para esse fim. Apesar dessas obras recentes, temos uma situação grave na chamada “doutrina maioritária” sobre os delitos em comissão por omissão, que ainda desconsidera o principal elemento que fundamenta qualquer punição penal: o exercício de liberdade de qualquer pessoa em assumir ou não um dever de proteção ou vigilância, o ato de disposição livre para determinar os âmbitos de cuidado que estão sob a sua responsabilidade. Por isso, grande parte do livro está dedicado a mostrar como é essencial o vínculo material entre o sujeito obrigado, a omissão de informação, e o crime de lavagem de dinheiro praticado por terceiros.

 

 

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