Em entrevista, o autor Manuel Monteiro Guedes Valente fala sobre o livro “Prova Penal: Estado Democrático de Direito”

24/07/2016

Manuel Monteiro Guedes Valente é um dos autores do livro “Prova Penal: Estado Democrático de Direito, juntamente com Geraldo Prado, Nereu José Giacomolli e Edson Damas da Silveira. Abaixo, confira a entrevista concedida ao Empório do Direito:

Qual é a proposta do livro “Prova Penal: Estado Democrático de Direito”, publicado recentemente pela Editora Empório do Direito? (confira aqui)

Como o próprio título nos elucida é um livro que pretende recordar a Todos que a produção e a valoração da prova penal têm limites inultrapassáveis em um Estado democrático de direito. Limites que não existem em um Estado de direito formal – que pode revestir natureza justicialista, securitária, autoritária ou totalitária por colocar a defesa do coletivo como principal objetivo e acima de todos os cidadãos – e relembrar que, em um mundo em mudança e vivencial de crises económicas, sociais e políticas, se impõe uma resistência em ceder a toda e qualquer facilidade probatória.

Todos os autores – que nos trazem uma abordagem transversal e transnacional do tema da prova – colocam toda a dinâmica em um rosto: o ser humano, seja rico seja pobre, seja citadino seja rural, seja letrado seja iletrado, seja detentor de cognoscibilidade seja dotado de elevada iliteracia, seja branco seja preto, seja amarelo seja vermelho. Todos são seres humanos. E a produção e a valoração da prova devem sempre respeitar todas as diferenças e aplicar a lei processual penal se acordo com o princípio da liberdade, atracado ao princípio da legalidade e à tetralogia do princípio da igualdade.

A nossa proposta é apresentar um livro que aborda a prova penal como um tema central da dogmática meta positiva, supraconstitucional, jurídico-constitucional e infraconstitucional de todo o Direito porque assenta em uma lógica de defesa e garantia efetiva da liberdade de todo o Ser Humano.

Por que vocês consideram o tema da obra “o núcleo essencial do processo penal”?

Porque falar de prova penal é falar da relação intersubjetiva comunicacional de toda uma sociedade democrática e defensora de valores que os nossos antepassados nos legaram e que devemos defender sob pena de progredirmos ao passado. A prova é a manifestação concreta de toda a dinâmica de um processo-crime que vai decidir da vida de pessoas de carne e osso: vítima – reintegração ou não do bem jurídico lesado ou colocado em perigo de lesão (caso contrário não respeitamos o desiderato daqueles que se sentem lesados e antes os defraudamos com produções e valorações que, em um futuro mais ou menos próximo, as instâncias judiciárias superiores vão declarar nulas ou proibidas); indiciado/arguido – que vai responder a um processo-crime, que deve primar por conter provas leais, democráticas, legais e transparentes sob pena de negarmos o Direito fundamental de e a uma defesa justa e livre própria de um Estado democrático e de direito; a prova é a demonstração clara da essência do processo penal, mas acima de tudo da espinha dorsal do Estado e demonstrativa do nível sociocultural de uma sociedade contemporânea, pelo que se impõe a esta sociedade, que se diz democrática, uma atitude de repulsa contra os abusos de poder, contra a produção e valoração de prova ilícita, contra a produção e valoração de prova com a prática de crimes, contra a produção e valoração de prova assente na destruição das relações de confiança entre os seres humanos; sob pena de nos transformarmos em Sodoma e Gomorra; e membros de toda uma comunidade – que esperam que se restabeleça a paz jurídica e social com uma atuação leal e transparente dos operadores judiciários – Juízes, Ministério Público, Polícia e Advogados – e essa paz jamais se restabelecerá com uma produção de prova por meio da prática de meios inidóneos, totalitários, desleais e, até mesmo, com a prática de crimes e a sequente valoração.

Os fins jamais devem justificar os meios e no processo penal é importante que este axioma seja a pedra angular de todo o sistema jurídico-criminal material e processual que não pode ser abandonado, mas antes aprofundado e ampliado. A prova é um tema que se prende com o princípio da superioridade ética do Estado e que realiza a justiça dentro do quadro do Direito e nunca a qualquer custo. A limpidez da prova é um imperativo ético de cada operador judiciário e, muito em especial, de um Estado democrático de direito.

Guedes Valente afirma que “nosso direito processual penal é o Direito por excelência dos inocentes”, por que vocês consideram esta afirmação importante?

Todo o Direito é Direito do Ser Humano. Mas o Direito processual penal é "o Direito por excelência dos inocentes" por três grandes razões:

- O justo processo ou devido processo legal existe para limitar o ius puniendi do Estado, materializando os princípios e os axiomas regentes do processo penal e criando regras e normas de atuação de todos os operadores judiciários no respeito e concretização da Constituição e do direito supraconstitucional vigente em um espaço e tempo dinâmico das relações humanas. É um Direito criado por seres humanos, aplicado por seres humanos sobre seres humanos, cuja aceção disforme – errónea – é uma natural causa da vida humana (erra é próprio da natureza humana).

- O devido processo legal tem como princípio reitor a presunção de inocência que deve ser cada vez mais entronizado como estado de inocência de modo a evitar as presunções ou estados de culpa dos tempos contemporâneos muito projetados pela comunicação social. A inocência é ou deve ser uma realidade fático-jurídica até sentença condenatória transitada em julgado. A inocência é um estado concreto que deve assumir-se contra os estados de culpa ou as presunções de culpa, porque estas conduzem a investigação a resultados finais em nada conducentes ao culpado, mas apenas a um culpado.

- Considera-se, ainda, que os operadores judiciários de um Estado democrático de direito têm o dever de carrear para o processo-crime todas as provas legítimas, legais e lícitas que possam levar à responsabilização do agente do crime, todas as provas que possam demonstrar a sua inocência e todas as provas que possam identificar ou determinar causas de justificação supralegais e legais, causas de exclusão da culpa e, ainda, todas as circunstâncias atenuantes.

Este axioma, defendido por Guedes Valente, tem como pedra basilar a ideia de que o processo penal mais do que ser o Direito constitucional aplicado (Henkel), ou sismógrafo do tecido constitucional ou o sismógrafo da Constituição do Estado (Roxin), é um Direito de liberdade. É, por isso, o Direito por excelência dos inocentes que gladiam pela sua liberdade e pela liberdade de todos os seres humanos.

O livro destina-se a qual público alvo?

O público alvo deste livro são Juízes de todos os tribunais, Ministério Público, Policiais Criminais (em especial, Polícia Judiciária Federal e Estadual), Advogados Criminais ou não Criminais, Políticos e Todos os que se dedicam à defesa de valores como a democracia, a justiça, a lealdade, a transparência legiferante e a liberdade.

O livro deve ser lido por todos os cidadãos de modo que possamos, de uma vez por todas, entender e consciencializarmo-nos de que sem justiça – justa (legítima, válida, vigente e efetiva) – não temos democracia e muito menos Direito.


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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