DO FATO JURÍDICO DO DIREITO AO RECURSO – 6ª PARTE

03/09/2019

Dando sequência, tendo finalmente terminado a análise quanto ao item (3.1), o qual tem por temática a decisão como elemento base do fato jurídico recursal, passo a analisar os demais elementos. O primeiro deles refere-se à recorribilidade, tema do presente texto. Para facilitar a compreensão, a numeração seguirá a partir da última, sendo a (3.2) o marco deste reinício.

3.1. Da recorribilidade: considerações iniciais

Analiticamente, define-se recorribilidade como a qualidade daquilo que é recorrível. Obviamente, trata-se de uma definição redundante (e exatamente por isso analítica); no entanto, já apresenta um dado fundamental: o conceito definido é uma qualidade. Logo, não existe por si, apenas em outro. Este último – a substância – é algum fato ao qual se atribui a qualidade designada. Como visto no item anterior, ele é decisão. Portanto, não há de se falar que a recorribilidade é algo que pressupõe o direito ao recurso; é a decisão que assim o é.

A existência da recorribilidade, porém, é dado suficiente para confirmar a hipótese de que não é a decisão o fato jurídico do direito ao recurso, sendo dele apenas um componente. Se já se tinha demonstrado que ela não pode assim o ser porquanto sua causa final não é a geração de tal direito; agora, isso resta ainda mais claro, visto que, para tanto, faz-se necessário outro elemento, externo à decisão em si.

Desse modo, se em termos factuais gerais, a recorribilidade não existe sem a decisão, pois que esta é o fato que a sustenta; no nível da factualidade jurídica, decisão e recorribilidade são elementos de um mesmo fato jurídico, no sentido de substância mesma. Daí se poder dizer que a segunda é um pressuposto (rectius: requisito) de existência do fato jurídico recursal. Isso tal como se diz que a capacidade jurídica do agente o é em relação aos atos jurídicos em geral, conquanto, substancialmente, a capacidade esteja no agente. 

Numa linguagem mais ponteana, referente ao fato da decisão tem-se a regra jurídica que prevê o recurso e, assim, uma espécie de estado de recorribilidade, mas não se tem ainda a formação do fato jurídico recursal, uma vez que são necessários outros elementos para tanto. Estes, embora se deem no mesmo momento, pós-cedem, para o fim aqui analisado, a recorribilidade. Ora, antes de alguém poder recorrer de algo é necessário haver a possibilidade de recurso. Esses outros elementos são a legitimidade (no sentido posicional) e o interesse, ainda por serem analisados.

Mais um motivo, portanto, para se dizer equívoco o entendimento que equipara recorribilidade e fato jurídico recursal, já que, não obstante a recorribilidade de uma decisão, o sujeito referido possa não ter nenhum interesse ou, antes mesmo, sequer tenha a necessária posição jurídica.    

No próximo texto, analisarei a problemática em torno do locus normativo adequado ao estabelecimento da recorribilidade.

 

 

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