Do extermínio do “débil” e da esperança do “essencial” em “A Lista de Schindler”

12/03/2016

Por Bruna Fernanda Bronzatti e Laura Mallmann Marcht - 12/03/2016

“Se você não tomar cuidado vira um número até para si mesmo. Porque a partir do instante em que você nasce classificam-no como um número (...) Profissionalmente falando você também é.

(...) Se há uma guerra, você é classificado por um número. Numa pulseira com placa metálica, se não me engano. “Ou numa corrente de pescoço, metálica”

Clarice Lispector

A Lista de Schindler - Schindler's List-, é uma película norte-americana de 1993, dirigida por Steven Spielberg. O enredo traz a história de Oskar Schindler, homem simpatizante do nazismo, rico. Sua fortuna servia para adquirir o que bem lhe condizia, produtos no mercado negro, bebidas, bens, produtos, mulheres. Porém, essa história tomaria outro rumo e faria com que a vida de muitas pessoas não fosse mais apenas um número de mortos na guerra.

O filme supracitado discorre acerca de uma história verídica que ocorreu durante a Segunda Guerra Mundial (1941-1945). Relata fatos que expressam as severas violações aos Direitos Humanos, que ao serem analisados em seu contexto, demonstram a necessidade da defesa e promoção das garantias inerentes a cada indivíduo. Não por acaso, há após o fim da grande guerra, a criação da Organização das Nações Unidas, que logo no preâmbulo de sua Carta, traduz o escopo de “preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade”.

E não é só a violência física que persiste nesses tempos, mas a impossibilidade de se ter liberdade de expressão, de possuir a sua propriedade, bens materiais, gerir a própria empresa, liberdade religiosa, à educação, à privacidade, a ter uma família, à identidade pessoal, à individualidade, e o maior bem de todos, o da vida e de constituir-se como povo são literalmente rechaçados. A película coloca em xeque aspectos daquele tempo, mas que possuem direta aplicabilidade na contemporaneidade.

Em um dos negócios que realizara, Schindler conhece Itzhak Stern, contador judeu que numa troca de conversas comenta sobre a mão de obra judia, para ele a melhor uma das mais baratas naquela época. Oskar inova ao apropriar-se de uma fábrica utensílios de cozinha, após o decreto que proibia os judeus de serem proprietários de negócios. Era uma forma de enriquecer com a guerra.

Para tentar realizar negócios e dar um up na empresa, Oskar começa a fazer uma jogada com os possíveis compradores, oficiais nazistas de alta patente, oferece jantares, festas, cortesias. Itzhak foi contratado por ser um contador judeu, uma vez que sua mão-de-obra era mais barata que a de um polonês, e seria ele a mente que faria com que a ambição patrão tomasse forma. Com seus argumentos convenceriam seu chefe que os judeus representavam maior lucratividade maior para o negócio. Fez com que toda a força de trabalho fosse exercida por esses. As famílias judias passaram a trocar reservas financeiras por postos de trabalho, e os deixava longe do campo de concentração. E assim, os negócios cresciam.

Em contraponto, a guerra avançava, acabar-se-iam os guetos, seriam transferidos todos para os campos de concentração. Com a influência que possui, Shindler conheceu muitas pessoas, dentre elas, Amon Goeth, comandante de um dos campos, o que seria útil após quando os trabalhadores da fábrica começaram a ser transportados para o campo de Plaszóvia.  Schindler convenceu Goeth a separá-los dos demais, e fossem levados para um lugar onde estariam protegidos.

O gueto da cidade estava sendo invadido. Dias mais tarde, a instrução quanto à cremação dos cadáveres mortos no massacre já estava sendo passada, o caos se alastrava, mas a indagação era: o que poderia ser realmente feito?

Schindler nem mais parecia aquele homem que se preocupava apenas com a fortuna que possuía e o que mais poderia agregar a ela, resolveu que de alguma forma poderia ajudar aquelas pessoas indefesas que estavam morrendo simplesmente porque não correspondiam ao padrão exigido;

Schindler e o contador já estavam próximos, o patrão começou a ver com outra ótica a situação e passou a ter empatia para com aquelas. Já que nada do que havia sido feito até aquele momento tinha dado certo, resolveu então tomar uma das decisões que mudariam a sua vida e de muitas outras pessoas.

Chegou a hora de passar a noite digitando os nomes daqueles que seriam transportados para Tchecoslováquia ao invés de Auschwitz. Até mesmo aqueles que anteriormente não foram aceitos, seja por preconceito ou por outros fatos que os impossibilitaram de serem contratados ou permanecerem na empresa, foram inseridos na lista e ali eram mais que números, eram números que correspondiam à vida, pensados um a um. Para cada nome da lista, a quantia a ser desembolsada iria para Goeth, que tomaria as medidas necessárias para o que o desvio de rota fosse bem sucedido.

Schindler não poupa esforços e muito menos dinheiro. Ele e Stern trabalham na lista que irá salvar mil e cem judeus do destino traiçoeiro que aguarda Auschwitz. O plano consiste em transferi-los com o pretexto da importância da mão-de-obra para uma fábrica de armamentos.

Entretanto, algo inesperado acontece no transporte das mulheres e crianças judias. As mesmas são enviadas a Auschwitz, onde tem seus cabelos cortados e roupas removidas. É a preparação para o banho da morte. Ao notar o erro da ferrovia, Oskar logo vai ao encontro das senhoras para reclamá-las. O responsável pela cidade estranha a atitude do empresário, mas logo aceita por uma porção de diamantes. Com grande artimanha, o conceito de “essencial” é redefinido aos guardas para salvar quantas pessoas fosse possível. O erro foi reparado.

Por meses a fábrica Schindlers’s Brinnlitz funcionou, e como o esperado, não prosperou na produção de armas. O empresário encontra-se falido em função dos gastos com a empresa. A rendição da Alemanha é anunciada, os operários são libertados e Oskar precisa fugir, em função de ser considerado um criminoso nazista.

Mais uma vez, o recurso cinematográfico relata as lutas com as quais o Direito enfrenta diariamente. Após décadas das mais traumatizantes experiências mundiais, a humanidade de cada indivíduo ainda é questionada. Ainda existem conflitos, assassinatos em massa e crimes que permanecem impunes. Ainda, os cidadãos são questionados enquanto sua humanidade, pela rua raça, cor, etnia, opção sexual, dentre outras tantas diferenças que se evidenciam.

A diversidade permanece incompreendida. Pessoas morrem todos os dias simplesmente por serem diferentes do padrão que se conhece por correto. Schindler é só mais um dos personagens que sacrificaram muito de suas vidas para poder ajudar outras tantas. Nesse sentido, o movimento constitucionalista deve ser levado em consideração, uma vez que pelo estado excepcionado da Alemanha, aproximadamente 50 milhões de cidadãos, comuns, iguais a tantos outros, foram assassinados arbitrariamente. Se ainda há o questionamento da importância da aplicabilidade da Carta Magna atualmente, a resposta resta clara: ela existe para que todos, em sua totalidade, tenham direitos básicos como a vida, bem como seu desenvolvimento digno.

"Aquele que salva uma vida, salva o mundo inteiro”.


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Bruna Fernanda Bronzatti

. Bruna Fernanda Bronzatti é acadêmica do Curso de Direito da UNIJUÍ/RS e bolsista de Iniciação Científica PIBIC/CNPq no projeto de pesquisa “Direito e Economia às Vestes do Constitucionalismo Garantista”, coordenado pelo Prof. Dr. Alfredo Copetti Neto. . .


Laura Mallmann Marcht

. Laura Mallmann Marcht é acadêmica do Curso de Direito da UNIJUÍ-RS e bolsista voluntária no projeto de pesquisa “Direito e Economia às Vestes do Constitucionalismo Garantista”, coordenado pelo Prof. Dr. Alfredo Copetti Neto. . .


Imagem Ilustrativa do Post: Birkenau gate // Foto de: Lars K Jensen // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/larskjensen/2745492650

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode


O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


 

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