Direito à saúde e a perda de uma chance  

27/09/2021

No âmbito da responsabilidade civil a teria da perda de uma chance consiste na possibilidade de postular indenização contra aquele que reduziu ou impediu a oportunidade de obtenção de algum benefício.

Segundo o Superior Tribunal de Justiça – STJ “a perda de uma chance tem por objetivo reparar o dano decorrente da lesão de uma legítima expectativa que não se concretizou porque determinado fato interrompeu o curso normal dos eventos e impediu a realização do resultado final esperado pelo indivíduo.”[1]

O fundamento jurídico para a teoria da perda de uma chance está previsto nos artigos 186, 927 e 944 do Código Civil.

No âmbito do direito sanitário a teoria da perda de uma chance é amplamente conhecida.

Há vários exemplos de decisões do Superior Tribunal de Justiça que ensejaram a condenação ao pagamento de indenização por falha na prestação do serviço, tais como:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. DEVER REPARATÓRIO. OCORRÊNCIA DE DANO. DEMONSTRAÇÃO DA EXISTÊNCIA DE ATENDIMENTOS MÉDICOS DEFEITUOSOS PELOS HOSPITAIS. SÚMULA 7/STJ. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SÚMULA 83/STJ. FUNDAMENTO DO ARESTO IRRELEVANTE PARA A CONCLUSÃO TOMADA - TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. IMPUTAÇÃO DO PAGAMENTO A AMBOS OS HOSPITAIS. SÚMULA 7/STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. OCORRÊNCIA DE DANOS MORAIS. MONTANTE INDENIZATÓRIO. ENTENDIMENTO FUNDADO EM MATÉRIA FÁTICA. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO. 1. Consoante o aresto, tratava-se de responsabilidade objetiva dos recorrentes e estes não teriam demonstrado a ausência de danos à recorrida. Ao contrário, entendeu-se que a prova dos autos teria caracterizado a ocorrência de defeito no atendimento hospitalar. Essas ponderações - a respeito da ocorrência de prestação de serviço defeituoso pelos hospitais e carência de prova de responsabilidade dos recorrentes de que os atendimentos teriam sido adequados - foram feitas com base fática, atraindo a aplicação da Súmula 7/STJ, que incide sobre ambas as alíneas do permissivo constitucional. 2. A conclusão do acórdão no sentido da responsabilidade objetiva dos insurgentes está em sintonia com a jurisprudência desta Corte Superior - Súmula 83/STJ. Precedentes. 3. O julgado firmou a responsabilidade civil dos dois hospitais, porquanto ambos não teriam agido de acordo com o protocolo recomendado para o atendimento da autora. Incidência da Súmula 7/STJ. 4. Inexistiu debate na segunda instância acerca da nulidade da petição inicial - carência de apreciação a respeito da indevida acumulação de pedidos. Embora opostos e apreciados os embargos de declaração, não foi alegada ofensa ao art. 1.022 do novo CPC. Esse quadro atrai o texto da Súmula 211/STJ. 5. O aresto firmou a existência de ato ilícito, motivo a ocasionar a reparação por danos morais no montante de R$ 15.000,00 (quinze mil reais). Aplicação do óbice da Súmula 7/STJ, pois há o dever reparatório, para o qual foi fixada indenização adequada e proporcional. 6. Agravo interno desprovido.

(AgInt no AREsp 1737837/RJ, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/05/2021, DJe 05/05/2021)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE CRIOGENIA. COLETA DE CÉLULAS-TRONCO NO MOMENTO DO PARTO E POSTERIOR ARMAZENAMENTO. FALHA NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. PERDA DE UMA CHANCE. VALOR DO DANO MORAL NÃO EXCESSIVO. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO STJ. DECISÃO MANTIDA. 1. Relativamente ao valor do dano moral, conforme entendimento pacífico do STJ, a modificação da quantia arbitrada é admitida, em recurso especial, apenas quando excessivo ou irrisório o montante fixado, violando os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade (AgRg no AREsp n. 703.970/DF, Relator Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 18/8/2016, DJe 25/8/2016, e AgInt no AREsp n. 827.337/RJ, Relator Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 18/8/2016, DJe 23/8/2016). 2. No caso concreto, o valor estabelecido pelo Tribunal de origem não se mostra excessivo, a justificar sua reavaliação em recurso especial, incidindo o óbice da Súmula n. 7 do STJ. 3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no REsp 1454025/RJ, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 06/05/2020)

 

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. CIVIL. REPARAÇÃO CIVIL. DANO MORAL. AVC HEMORRÁGICO. TRATAMENTO IMEDIATO. NÃO OCORRÊNCIA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. CONFIGURAÇÃO. ÓBITO DO PACIENTE. PERDA DE UMA CHANCE. VALOR INDENIZATÓRIO. REDUÇÃO. INVIABILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ. 1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e 3/STJ). 2. Na hipótese, rever a conclusão do tribunal de origem, que concluiu restar configurado nos autos o nexo de causalidade entre a conduta lesiva da agravante e a perda de uma chance do paciente, o que reduziu suas chances de sobrevivência, exige o reexame do contexto fático-probatório, procedimento vedado em recurso especial em virtude do disposto na Súmula nº 7/STJ. 3. O caso concreto não comporta a excepcional revisão por esta Corte, pois o valor indenizatório não se revela exorbitante para reparar o dano moral sofrido em virtude da perda de uma chance de sobrevivência do pai dos autores em função da demora no tratamento decorrente da omissão da agravante. 4. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1536238/RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/03/2020, DJe 13/03/2020)

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. DEMORA NO ENFRENTAMENTO DE INFECÇÃO. VALOR DA INDENIZAÇÃO. APLICAÇÃO DA TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. CONSTITUIÇÃO DE CAPITAL. OBRIGATORIEDADE. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. De acordo com a jurisprudência desta Corte de Justiça, a responsabilidade dos hospitais e clínicas (fornecedores de serviços) é objetiva, dispensando a comprovação de culpa, notadamente nos casos em que os danos sofridos resultam de infecção hospitalar. 2. No que se refere ao argumento sobre a necessidade de redução proporcional do valor da indenização, pela aplicação da teoria da perda de uma chance, tem-se que tal questão não foi objeto de prequestionamento nas instâncias ordinárias, recaindo nos óbices das Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal. [...] 5. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1377652/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 28/05/2019, DJe 04/06/2019)

Importante anotar que o sucesso da tese exige demonstrar “que a chance perdida é séria e real, não sendo suficiente a mera esperança ou expectativa da ocorrência do resultado para que o dano seja indenizado.”[2]

Assim, a perda de uma chance é perfeitamente aplicável no âmbito do direito sanitário como forma de reparar danos praticados.

 

Notas e Referências

[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1757936/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 28/08/2019.

[2] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1757936/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 28/08/2019.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Statue of Justice - The Old Bailey // Foto de: Ronnie Macdonald // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/ronmacphotos/8704611597

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura