Derrota do Coaf: centrão, PT, abafa

22/05/2019

 

Na Câmara Federal há um poderoso grupo de deputados de partidos diversos que prossegue articulado desde a Constituinte de 1987, independentemente de quem governe, cuidando das suas demandas pessoais e das diligências conservadoras do Brasil: o denominado centrão.

O termo centrão refere-se a um “conjunto de partidos políticos que não possuem orientação ideológica específica e tem como objetivo assegurar uma proximidade ao poder executivo de modo que este lhes garanta vantagens e lhes permita distribuir privilégios por meio de redes clientelistas.

Não se trata necessariamente de um grupo de espectro político-ideológico centrista, mas de um agrupamento de siglas de orientação conservadora, geralmente composto por parlamentares do ‘baixo clero’, que atuam conforme seus próprios interesses, ligado a práticas fisiológicas” (Wikipédia).

O centrão (09mai19) tirou o Conselho de Controle de Atividades Financeiras – Coaf do Ministério da Justiça e restringiu o trabalho dos auditores fiscais. PP, PSD, DEM, PR, MDB, DEM e PSDB somaram-se a PT, PDT e PSB objetivando levar o Coaf para o Ministério da Economia.

Criado em 1998 no governo Fernando Henrique Cardoso, o Coaf é estratégico para ações de combate à corrupção. Trata-se de um órgão de inteligência financeira que recebe informações de setores obrigados por lei a informar transações suspeitas de lavagem de dinheiro.

Os setores que prestam informações ao Coaf sobre operações anômalas são as instituições pelas quais passam grandes volumes de dinheiro, como bancos e corretoras. Foi o Coaf que identificou movimentações atípicas realizadas por Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro.

Isso só é possível porque o órgão escrutina pessoas físicas ou jurídicas que comercializam bens móveis de luxo ou alto valor (igual ou superior a R$ 10 mil), intermedeiem a sua comercialização ou exerçam atividades que envolvam grande volume de recursos em espécie.

O Coaf tem trabalhado em conjunto com a Polícia Federal. A PF está sob a égide do Ministério da Justiça. Esse Ministério “está” Sérgio Moro. Com erros (alguns abusos de autoridade), mas sobretudo com acertos (a pertinaz persecução de corruptos), o ex-juiz não agrada a muitos políticos.

O centrão mais PT, PDT e PSB precautelaram-se: incluíram na MP que trata da matéria “um parágrafo segundo o qual a competência do auditor da Receita Federal ‘limita-se, em matéria criminal, à investigação dos crimes contra a ordem tributária ou relacionados ao controle aduaneiro’”.

Major Olímpio (em quem não votaria) tem minha concordância: “A limitação de atuação dos auditores fiscais ao rol taxativo de crime específico contra a ordem tributária e o controle aduaneiro fulmina a investigação e a eventual punição de quem comete crimes complexos” (Daniel Carvalho, FSP,11mai19).

O Coaf não tem lado: No Mensalão, oficiou à CPI dos Correios saques do esquema de pagamentos à base do governo petista. Em 2018, identificou movimentações bancárias atípicas de mais de R$ 1,2 milhões de Fabrício Queiroz (o referido ex-assessor do filho de Jair Bolsonaro).

Para que se avalie o volume de trabalho do órgão, “De janeiro a novembro de 2018, produziu 6.786 relatórios de inteligência financeira, relacionou 348.984 pessoas físicas ou jurídicas, consolidou 302.648 comunicações de operações financeiras” (Daniel Carvalho, FSP,11mai19).

O jabuti cerceador do Coaf foi incluído pelo relator da MP e líder de Bolsonaro no Senado, Fernando Bezerra Coelho, do MDB – coligado de Lula e Dilma. O episódio é bastante para que se perceba a tramoia. Senão, ressalto: PP, PSD, DEM, PR, MDB, DEM e PSDB somaram-se a PT, PDT e PSB.

InfoMoney: “Comissão impõe derrota a Moro e retira Coaf do Ministério da Justiça – O resultado representa uma nova derrota política do ministro Sérgio Moro, que trabalhou pela mobilização de parlamentares a favor da atual estrutura da pasta” (Marcos Mortari, 09mai18).

Marcus Fabiano (Facebook, 09mai19): “Não Moro, mas o Povo: a derrota do Coaf não é uma perda particular de Sério Moro. Essa é uma interpretação personalista e medíocre, a mesma que o toma como algoz de um Lula supostamente injustiçado (a propósito: Temer livre?).

A derrota do Coaf é de todos os que sofremos as agruras de uma corrupção autoimunizada pelo acesso privilegiadíssimo às altas burocracias públicas e privadas.  Não é por acaso que a derrota do Coaf novamente uniu o PT aos antigos PDS, PFL e PMDB, que dispensam adjetivação.

O personalismo é o sarcófago das instituições. Nele o povo é uma abstração bovina encarnada no bezerro de ouro que só faz aguardar o próximo rei do gado”. A personalização do bem ou do mal, à esquerda ou à direita, é uma manobra populista simplória, mas efetiva, pelo menos no Brasil.

Enfim: o Coaf “derrotado”, serve a quem? 1) dará argumento à direita fanática do PSL; 2) dará festa de (falsa) vitória à esquerda de direita do PT. Bolsonaro, arrogante, foi surpreendido; o PT é velho cúmplice do centrão, lugar de político abafar corrupção. Ah!, e o povo? Aí, a “derrota” serve a ninguém.

 

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