Debate: Quando o Fascismo Torna-se Cada Vez Mais Forte

07/09/2018

Coluna O Direito e a Sociedade de Consumo / Coordenador Marcos Catalan

Na penúltima quinta-feira, dia 23 de Agosto, na sala do Law & Politics Lab, do prédio 14 da Universidade La Salle - Canoas/RS, ocorreu o debate “Quando o Fascismo Torna-se Cada Vez Mais Forte”. O encontro foi organizado pelo grupo de pesquisa Teorias Sociais do Direito (TSD), vinculado ao PPG em Direito da Universidade La Salle e contou com a palestra Professor Jose Rodrigo Rodrigues (Doutor em Filosofia pela UNICAMP, pesquisador e professor do Programa de Pós-graduação da Unisinos).

Como parte integrante da programação, o Professor Jose Rodrigo Rodrigues apresentou seu mais novo artigo, ainda em construção, intitulado “Um Novo Ciclo Autoritário: Para Uma Democracia Multinormativa”. O texto foi debatido por Fernando Goya Maldonado (pesquisador e doutorando pelo Centro de Estudos Sociais de Coimbra/PT) e Fiammetta Bonfigli (pesquisadora, Pós-doutora em Direito pela Universidade La Salle e Doutora em Sociologia do Direito pela Universidade de Milão).

Na fria noite do dia 23 de Agosto, em torno de sessenta pessoas ocuparam a sala do Law & Politics Lab que contou com a participação de membros do grupo de pesquisa do TSD, do público em geral, bem como também dos alunos da graduação em direito da La Salle, com especial participação dos alunos de graduação da Professora Paula Pinhal de Carlos.

O Professor Jose Rodrigo Rodrigues iniciou a apresentação de seu texto por fazer referências ao que o autor denomina primeiro ciclo autoritário. De acordo ele, o primeiro ciclo autoritário sucedeu-se durante a segunda guerra mundial, do qual decorrem, em período subsequente, avanços em garantias e em estabilidade social promovidas pelo Estado de Direito.

Em seguida, o Professor ponderou que o declínio contemporâneo dos avanços jurídicos trazidos pelo Estado de Direito é perceptível, bem como a ascensão de novas perspectivas autoritárias, promovida, em especial, por novas formas de regulação social que pervertem a ordem legal. Como um exemplo a essa nova realidade, o palestrante citou os novos modais de mobilidade (Uber, Cabify) que geram uma regulação que segmenta e individualiza tanto motorista quanto usuários. Há, assim, com essas novas regulações dos modais de mobilidade, uma redução da possibilidade reivindicatória dos motoristas/usuários, visto que qualquer problema e/ou descontentamento com a plataforma pode resultar na exclusão do motorista/usuário da plataforma.

De acordo com o palestrante, não existem, nesse momento, soluções jurídicas para regular essas ordens autárquicas que geram a fragmentação do direito, mas ele acredita que soluções hibridas (misto entre normas públicas e privadas) poderão ser, em um futuro não muito distante, parte da solução para tais questões.

O debatedor Fernando Maldonado iniciou seus comentários expondo que a crise política que leva ao um novo ciclo autoritário é formada, na realidade brasileira, tanto por fatores estruturais quanto por fatores conjunturais. Com um suporte da autora Ester Solano, a fala do primeiro debatedor expôs, por primeiro, alguns dos fatores estruturais. De acordo com ele, os fatores estruturais giram em torno da crise multifacetada da representatividade, dos quais destacou a dificuldade de compatibilizar o tempo político do sistema representativo (lento, rígido, hierarquizado) com o tempo imediatista da tecnologia, informação e mídia contemporânea. Tal incompatibilidade agrega problemas a já difícil relação entre a condição distributiva do sistema democrático e o modo de produção capitalista.

Com relação aos problemas conjunturais, o debatedor recordou alguns elementos que fragilizaram a democracia brasileira como o impeachment, a deterioração da conciliação de classes, o judiciário militante, bem com uma mídia espetacularizada. Realidade essa que estimulou a nossa democracia de já baixa intensidade a uma democracia de baixíssima intensidade. O debatedor recordou também da importância da divisão da sociedade civil nas categorias analíticas de sociedade civil intima, sociedade civil estranha e sociedade civil incivil, proposta por Boaventura de Sousa Santos, para assim melhor compreender a manutenção permanente do “Estado de Exceção”.

A debatedora Fiammetta, por sua vez, chamou inicialmente a atenção para a efetiva manutenção dentro das democracias contemporâneas de um “Estado de Exceção”. Com suporte em Giorgio Agamben e corroborando com a fala do debatedor Fernando, a debatedora expôs que teorias sócio-jurídicas, como, por exemplo, a teoria do Direito Penal do Inimigo, de Gunther Jacobs, contribuem para a construção de um inimigo em comum, fundamental para o pensamento totalitário. Dessa forma, a noção de inimigo presente contribui para o pensamento que justifica a manutenção de violências e abusos a determinados grupos sociais. Esse pensamento, de acordo com a debatedora, colabora para a política de morte, para a necropolítica, nos termos de Achile Mbembe, como bem evidencia os dados sobre encarceramento de massas e extermínio da juventude negra no Brasil.

Por fim, Fiammetta chamou atenção para a importante compreensão da realidade autoritária que existe no Brasil e que não concluiu vinte e um anos após a ditatura militar. Na fala da debatedora, essa realidade que não pode ser compreendida, em profundidade, sem uma leitura atenta do que é o Estado e do que é o direito.

As falas dos debatedores foram seguidas de uma interessante rodada de perguntas e de respostas. Todos que quiseram manifestar-se tiveram oportunidade – como não poderia ser diferente em um debate sob esse enfoque. Assim, após quase duas horas e meia de conversas, com a sala ainda completamente lotada, terminou-se o profícuo debate sobre uma temática extremamente sensível e contemporânea.

 

 

Notas e Referências

Agamben, Giorgio (2004) Estado de Exceção. São Paulo: Boitempo

Mbembe, Achille (2003) Necropolitics. Duke University Press. Public Culture. vol. 15. nº 1. pp. 11-40.

Jakobs, Gunther; Cancio Meliá, Manuel (2007) Direito Penal do Inimigo. Noções e críticas. Porto Alegre: Livraria do Advogado.

Santos, Boaventura de Sousa (2003) Poderá o Direito Ser Emancipatório? Portugal: Revista Crítica de Ciências Sociais. pp. 3-76.

Solano, Esther (2018) Crise da Democracia e Extremismos de Direita. São Paulo: Friedrich-Ebert-Stiftung (FES) em ANÁLISE nº 42.

 

Fotos: Arquivo Pessoal de Camila Belinaso

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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