Por Tânia Iró da Motta - 20/07/2017
1 INTRODUÇÃO
O tráfico de drogas que vem tipificado no artigo 33 da Lei de Drogas (Lei 11.343/2006), é o responsável pela maioria das prisões em flagrante que ocorrem hoje no Brasil.
E de acordo com levantamentos da USP e do juiz Luís Carlos Valois apontam que isso ocorre em 74% dos casos. E 91% dos processos decorrentes dessas detenções terminam com condenação.[1]Convém lembrar que a lei 11.343/2006 também descreve no artigo 28 a caracterização para usuário de drogas.
2 USUÁRIO OU TRAFICANTE
A princípio o que distingue o usuário do traficante seria a quantidade e o tipo de drogas que seriam encontradas com o cidadão, um problema que não foi resolvido pela nova Lei de Drogas que não determina parâmetros seguros de diferenciação entre as figuras do usuário e a do pequeno, médio ou grande traficante, questão essa, aliás, que já era problemática na lei anterior (6.368/1976) ”[2]
É no momento da prisão e na delegacia que uso vira tráfico, que furto vira roubo, que as histórias se fazem, se constroem, e que vão para o papel[3].
Desta forma cumpre questionar se é legítimo prender ou condenar alguém apenas com base em testemunhos de policiais?
É sabido pelo senso comum, que os policiais ao abordar um sujeito e com ele encontrar, drogas, a atribuição de usuário ou traficante vai depender da rua onde ocorreu a abordagem, a cor e o nível social do indivíduo.
Temos que, ocorreu um caso de condenação por tráfico de drogas vindo de segunda instância onde foi apontado no Superior Tribunal de Justiça como exemplo dos problemas da legislação brasileira para lidar com o tema, no caso em tela, um homem foi condenado por tráfico pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul após ser preso com 0,7 gramas de crack[4].
E ao mesmo tempo comprar mais de 80 pedras de crack para distribuição a amigos não é tráfico de drogas, crime tipificado no artigo 33, caput, da Lei 11.343/2006, mas ‘‘consumo compartilhado’’, figura típica descrita no parágrafo 3º da mesma lei[5].
Diante destas informações nefastas, percebemos que a palavra do policial acaba tendo um efeito gigantesco no processo, é muito difícil revertê-la, porque considera-se que o policial tem fé pública. Sem outras testemunhas, fica a versão do policial contra a versão do réu ou da ré. Daí é quase impossível conseguir uma absolvição[6] ou evitar que de forma preventiva mais um cidadão se some a massa carcerária que sequer possui condenação.
De acordo com nossa legislação se um alcoólatra for encontrado caído na sarjeta completamente embriagado, vai para o hospital, no entanto se um usuário, que não merece de forma alguma ser tratado como criminoso, for encontrado com mais de um cigarro de maconha por exemplo, será enquadrado como traficante pois o entendimento é de que um é para consumo próprio e os outros para fins de comércio e distribuição.
Só em análise dos tribunais superiores poderá haver uma chance de absolvição, mas até lá o usuário, que necessitava de tratamento não de punição, já ficou encarcerado mais de um ano, acabando com suas chances de reabilitação, pois por ser usuário e necessitar da droga, acabará por integralizar as facções existente para manter seu vício.
Por ter participado da abordagem, da prisão, o policial não deveria ser ouvido como testemunha, e sim como informante, opina o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro Salo de Carvalho. O status é semelhante ao da vítima na ação, e se baseia no pressuposto de que a testemunha deve ter um distanciamento mínimo do fato, de forma a formar uma visão razoavelmente crítica sobre ele. Assim, diminuiria o peso do relato do agente no processo[7].
3 CONCLUSÃO
Lamentavelmente primeira abordagem policial seja ela pela polícia civil, ou militar já define se o sujeito é usuário ou traficante.
Os critérios utilizados para esta classificação/condenação, são em sua totalidade subjetivos. O efeito disso, é que pelo tráfico ser equiparado a crime hediondo, o indivíduo classificado com traficante é imediatamente aprisionado e por que não dizer condenado antecipadamente. A legislação deveria ser clara e taxativa para que houvesse a proteção dos usuários, que são doentes, que necessitam de tratamento, em muitos casos pode ser o início do fim de uma vida, pela utilização equivocada da legislação.
A análise junto a delegacia, deveria ser sempre acompanhada por um advogado ou defensor público, para que se pudesse desqualificar de crime para doença, de pena para encaminhamento a tratamento, para que em vez de levar para o presidio se levasse para a família ou se encaminhasse para os órgãos que providenciam a recuperação do sujeito.
Notas e Referências:
[1] http://www.conjur.com.br/2017-fev-22/entrevista-maira-fernandes-advogada-criminalista
[2] http://www.conjur.com.br/2017-fev-20/stj-aponta-pena-trafico-07g-exemplo-falha-lei
[3] http://www.conjur.com.br/2017-fev-22/entrevista-maira-fernandes-advogada-criminalista
[4] http://www.conjur.com.br/2017-fev-20/stj-aponta-pena-trafico-07g-exemplo-falha-lei
[5] http://www.conjur.com.br/2017-jun-20/comprar-crack-fumar-amigos-nao-trafico-drogas
[6] http://www.conjur.com.br/2017-fev-22/entrevista-maira-fernandes-advogada-criminalista
[7] http://www.conjur.com.br/2017-fev-17/74-prisoes-trafico-apenas-policiais-testemunhas
. Tânia Iró da Motta é Graduada em Direito pela UniRitter Laureate International Universities, Cursando Especialização em Direito Penal e Processo Penal pela UniRitter Laureate International Universities. Membro da Associação Brasileira de Advogados Criminalistas, da Associação dos Criminalistas do Estado do Rio Grande do Sul. Advogada. Endereço eletrônico: taniairo@hotmail.com.
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