É tempo de pandemia e incerteza econômica. Para além de qualquer opinião acerca das políticas adotadas a nível de confinamento e combate ao Corona Vírus (COVID 19, a partir de agora, neste artigo), o fato é notório: desde o motorista de passeio, passando pelo profissional até as transportadoras e distribuidoras, todos necessitam adaptar-se a este momento, isso incluiu a adoção de cuidados básicos em matéria de direito de trânsito.
Dado o carácter de extrema relevância do tema, abordarei tal questão apenas sob a ótica legal, especialmente das últimas Deliberações do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), além da abordagem empreendedora que surge da demanda de profissionais e empresas que utilizam a condução de veículos automotores como insumo de seus serviços e produtos, de forma oblíqua, será abordada orientações básicas aos condutores de toda espécie.
Preambulada a questão, passo as últimas atualizações legais em matéria de trânsito que, através das Deliberações nº 185 do CONTRAN, publicada em 20 de março de 2020 e a de número 186, publicada em 26 de março de 2020, assim modificaram os trâmites de recursos de multas de trânsito, processos administrativos de troca de real infrator, suspensão do direito de dirigir, cassação de Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e doutras providência:
Resolução CONTRAN nº 185/2020: ampliação do prazo para processo de habilitação de 12 para 18 meses; interrupção por tempo indeterminado dos prazos dos processos de recursos de multa, processos de suspensão do direito de dirigir e cassação de CNH (defesa prévia, recurso de 1ª e 2ª Instâncias); interrupção por tempo indeterminado do prazo para troca de real infrator; interrupção por tempo indeterminado para o proprietário adotar as providências necessárias à efetivação da expedição de Certificado de Registro de Veículo (CRV) em caso de transferência de propriedade de veículo adquirido desde 19/02/2020, o mesmo para o licenciamento de novos veículos; bem como permite aos motorista a direção de veículo automotor mesmo que a CNH esteja vencida há mais de trinta dias, desde que seu vencimento não seja anterior a 19/02/2020;
Resolução CONTRAN nº 186/2020: suspensão da expedição de novas notificações de autuação e de penalidade.[1]
A princípio, as alterações mencionadas podem dar a falsa impressão de que qualquer infração de trânsito ou necessidade burocrática estatal está dispensada neste período, contudo, além de uma incorreção, tal pensamento pode levar a problemas mediatos com o fim das quarentenas e medidas protetivas adotadas pela União, Estados e Municípios. Portanto, motoristas e empresas devem se atentar para o fato de que tais interrupções possuem um marco fundador, ou seja, um início. Algumas ações não podem ser tomadas neste período, cito, por exemplo: dirigir com CNH vencida em data anterior a 19/02/2020 e deixar de pagar infração de trânsito com vencimento no interim desta interrupção ou em período anterior.
Devo ainda desmistificar que todas as infrações de trânsito cometidas no período desta emergência de saúde pública decorrente do COVID 19 serão devidamente processadas – inseridas nos sistemas dos órgãos e autoridades de trânsito - e, após o fim da pandemia, encaminhada as respectivas notificações aos proprietários dos veículos, bem como que, a autuação oriunda de abordagem pessoal, onde o condutor assina o recebimento do auto de infração, valerá como notificação de autuação, sendo o prazo para apresentação do recursos de defesa prévia 15 dias contados a partir do fim da pandemia, dada a interrupção de prazos prevista na Deliberação nº 185/2020 do CONTRAN.
A partir deste momento, ultrapassada a explanação acerca das últimas alterações em matéria de direito de trânsito, eu exponho diretrizes de cuidados básicos que sugiro aos motoristas e empresas que usufruem ou dependem do trânsito e transporte.
1º) pagamento de multas: Como exposto, a obrigação de pagamento de multas de trânsito não está suspensa, assim, algumas multas venceram e vencerão neste período de quarentena. Assim, o pagamento antecipado de uma multa de trânsito representa um desconto de 20% do valor da multa, conforme art. 284 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB),[2] enquanto que o pagamento da multa vincenda, o quanto antes se dê, representará uma diminuição dos gastos com juros de mora. Indico que consulte o site da instituição bancária conveniada junto ao Departamento de Trânsito de seu estado (DETRANs) ou no site do próprio DETRAN, para consulta das multas que venceram e vencerão neste período.
2º) apresentação dos Recursos por meio eletrônico: Conforme prevê o art. 285, § 3º, do CTB,[3] ao recurso de multa poderá ser atribuído o efeito suspensivo, com isso, suspendesse a exigibilidade do pagamento da multa até seu julgamento em definitivo. Diante da flexibilização ou paralização do funcionamento de certos órgão e autoridades de trânsito, indico o protocolo de recursos por meio eletrônico junto aos órgãos que oferecerem essa possibilidade ao contribuinte. Por óbvio, esta orientação complementa a primeira (pagamento da multa), na medida em que não impede o pagamento da multa, apenas o suspende, entrementes, a possibilidade de suspensão do pagamento também poderá ser uma medida a ser adotada, caso o efetivo pagamento da multa de trânsito represente, para o proprietário do veículo, um dano maior do que postergar a dívida pela infração de trânsito.
3º) agir normalmente: por falta de mais específica nominação, optei pelo uso do “agir normalmente”, com isso, quero dizer que a interrupção de prazos não deve ser tomada pela completa inércia. Atente para os prazos de recursos, troca de real infrator e obrigações assessorias que venceriam neste período e não deixe para agir ao final da quarentena. Assim, caso possua uma frota onde haja indicação dos condutores infratores, relacione infrações e condutores, o mesmo serve para os setores de recursos humanos e motoristas profissionais que necessitam possuir um prontuário, por assim dizer, limpo de infrações.
4º) busque informações junto aos DETRANs: Por fim, eu indico a pesquisa de notícias junto ao sítio eletrônico oficial do DETRAN de seu estado, pois, as deliberações CONTRAN possuem abrangência nacional, não estando prejudicada a adoção de outras medidas pelos respectivos DETRANs, a nível estadual. Cito, por exemplo, o DETRAN/RJ que desbloqueou as CHN dos condutores que haviam cumprido o período de penalidade de suspensão do direito de dirigir, porém sem a realização de frequência no curso de reciclagem. [4][5]
Dado o fim das orientações, aquele que procurar seguir estes poucos cuidados evitará problemas mediatos pós COVID19, enquanto que poderá destinar tempo e recursos para a adoção de outros cuidados necessários nesse período de pandemia, seja para o seu negócio, sua profissão ou simplesmente para que cumpra todas as obrigações atinentes as sistemáticas e burocracias em matéria de direito de trânsito.
Notas e Referências
[1] Distinguindo-se a notificação de autuação da de penalidade, pode-se assim dizer: a primeira é aquela que dá ciência de uma infração de trânsito, quando poderá haver a indicação do real infrator, pedido de substituição de penalidade por advertência, além da apresentação de recurso de defesa prévia; enquanto que a segunda é classificada como aquela que gera a obrigação do pagamento de multa, além de computar pontos ao prontuário do condutor, também passível de recursos, os de 1º e 2ª instância.
[2] Art. 284. O pagamento da multa poderá ser efetuado até a data do vencimento expressa na notificação, por oitenta por cento do seu valor.
[3] Art. 285. O recurso previsto no art. 283 será interposto perante a autoridade que impôs a penalidade, a qual remetê-lo-á à JARI, que deverá julgá-lo em até trinta dias. [...] § 3º Se, por motivo de força maior, o recurso não for julgado dentro do prazo previsto neste artigo, a autoridade que impôs a penalidade, de ofício, ou por solicitação do recorrente, poderá conceder-lhe efeito suspensivo.
[4] Relembro que a suspensão do direito de dirigir é um processo administrativo passível da aplicação concomitante de duas penalidades: a primeira é suspensão do direito de dirigir em si, isto é, não dirigir; enquanto que segunda se refere a frequência em curso de reciclagem de condutores infratores (CRCI).
[5] Fonte: extra.globo.com, disponível em: https://extra.globo.com/noticias/rio/motorista-que-nao-fez-reciclagem-esta-com-cnh-suspensa-tera-documento-desbloqueado-pelo-detran-rj-24378257.html acesso em 27 abr. 2020.
Imagem Ilustrativa do Post: Transito // Foto de: Gustavo Serrano // Sem alterações
Disponível em: https://www.flickr.com/photos/gusdrinks/59622028/
Licença de uso: https://creativecommons.org/publicdomain/mark/2.0/