Considerações acerca do Plano Estadual de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes do Pará

15/02/2022

Coluna Direitos de Crianças, Adolescentes e Jovens / Coordenadores Assis da Costa Oliveira, Hellen Moreno, Ilana Paiva, Tabita Moreira e Josiane Petry Veronese

1. O Plano Estadual de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes do Pará – PEEVSCA/PA tem a duração decenal, correspondente aos anos de 2021 a 2031 e tem por realizadores o Comitê Estadual de Enfrentamento à Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes – CEEVSCA-PARÁ, e o Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Pará (CEDCA/PA), com representação da sociedade civil organizada e do poder público, com suporte administrativo e operacional da Secretaria de Estado de Assistência Social, Trabalho, Emprego e Renda do Pará – SEASTER.

O CEEVSCA-PA tem por integrantes as seguintes Instituições: Conselho Regional de Serviço Social 1º Região (CRESS/PA); Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Pará (OAB/PA); Pastoral da Criança; Movimento República de Emaús; Lar Fabiano de Cristo; Centro Solidariedade da Criança e do Adolescente (CSCA); CACBA – Rádio Margarida; GEMPAC; Conselho Regional de Psicologia da 10º Região – CRP 10; Pastoral do Menor; Cáritas Regional; Comissão Justiça e Paz – CNBB; SEASTER; SEDUC; (CAEC/Escola Hilda Vieira/USE 09); SEGUP (DIPREV/Grupamento Fluvial); PARÁPAZ; FASEPA; Polícia Civil (DAV); SEAP; SUSIPE; Ministério Público do Estado; Tribunal de Justiça do Estado; PMB-SESMA e FUNPAPA; Polícia Rodoviária Federal e Secretaria de Estado da Saúde do Pará.

2. O Plano Estadual em tela apresenta, inicialmente, os seguintes tópicos introdutórios: Percurso Conceitual, Percurso Jurídico e Percurso Estatístico da violência sexual contra crianças e adolescentes.

Ao tecer análise a respeito do referido percurso conceitual, o Plano Estadual situa o debate a respeito da violência sexual e cita, como formas desta violação de direitos o abuso sexual; a pornografia; a pedofilia e a exploração sexual comercial ou por meio das mídias, bem como conceitua as seguintes violências sexuais praticadas contra crianças e adolescentes: incesto; estupro de vulnerável; exibicionismo; assédio sexual; pedofilia e exploração sexual, afirmando ainda que:

A violência sexual produz efeitos devastadores na vida objetiva e subjetiva das crianças, adolescentes e suas famílias, mesmo que de forma diferenciada, pode acarretar conflitos na ordem social, comportamental, física, cognitiva e/ou emocional. Quando a violência sexual acontece, os sujeitos de uma hora para outra estão às voltas com exames, interrogatórios, inquéritos, laudos, perícias, atendimento médico, psicológico, social e jurídico, uma trama que parece não ter fim, provocada por um adulto com consequências para toda uma sociedade, exigindo ações articuladas pelas políticas públicas/sociais na construção do sistema de garantia de direitos (PARÁ, 2021, p. 4).

No tópico dedicado à apresentação do Percurso Jurídico, o PEEVSCA/PA expõe historicamente a proteção jurídica da criança e do adolescente, citando, a nível internacional, a Declaração dos Direitos da Criança de Genebra, de 1924; a criação do Fundo das Nações Unidas para Infância – UNICEF, ocorrida em 1946; a Declaração dos Direitos da Criança datada de 1959 e a Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança. No tocante à proteção à criança e ao adolescente na legislação brasileira, indica o Código Mello Mattos, de 1927 e o Código de Menores, de 1979 como normas regidas pela Doutrina Menorista, bem como a transição para a Doutrina da Proteção Integral, oportunizada pela promulgação da Constituição Federal de 1988.

Já no que se refere ao Percurso Estatístico, importante o destaque realizado no sentido de que

não existe uma só base de dados dos processos de prevenção ou mobilização utilizados para contabilizar as ações de enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes, nem mesmo as notificações, atendimentos e encaminhamentos de ordem médico, social, psicológica, jurídica ou policial possuem um único sistema de alimentação das medidas adotadas quando a violência ocorre (PARÁ, 2021, p. 6).

Esta ausência de sistematização, cruzamento e disponibilização de dados é apresentado no Plano Estadual como fruto da ausência de ações intersetoriais, de planejamento conjunto e de investimento financeiro na perspectiva do enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes (PARÁ, 2021, p. 6) e justifica o fato de o Plano Estadual tratar apenas de uma breve amostra dos dados publicizados por órgãos oficiais no período de 2011 a 2019, traçando o perfil das vítimas quanto à idade e sexo; características da violência sexual , como: local da violência, caráter de repetição, sexo do agressor e vinculo familiar entre o agressor e a vítima, índice de casos por regiões do Estado e indicativo dos municípios com maiores percentuais de violência contra a criança e o adolescente.

3. O PEEVSCA/PA está organizado em 06 (seis) eixos: Prevenção; Atenção; Defesa e Responsabilização; Comunicação e Mobilização Social; Participação e Protagonismo e Estudos e Pesquisa de modo que objetiva materializar um conjunto de ações articuladas de forma técnica, política e financeira para o enfrentamento das diversas modalidades de violência sexual cometidas contra crianças e adolescentes no Estado do Pará (Pará, 2021, p. 18).

Dentre os eixos enumerados acima, o inaugural é o da Prevenção, tendo por objetivo fortalecer a formação e a capacitação continuada das instituições/entidades/grupos de forma regionalizada/municipalizada para o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes. Apresenta 34 ações, dentre as quais consta: implantar, capacitar e monitorar as unidades notificadoras de violências nos municípios; realizar oficinas de capacitação sobre violência sexual contra crianças e adolescentes aos municípios com CRAS quem atendem comunidades tradicionais (indígenas, quilombolas e ribeirinhos); capacitação continuada dos gestores/trabalhadores da sociedade civil e dos servidores do Estado envolvidos no atendimento de crianças e adolescentes e o incentivo aos conselhos municipais à criação de legislação municipal visando o enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes.

No Eixo II consta a Atenção. Composto por 10 ações, este eixo objetiva a promoção e a proteção integral de crianças e adolescentes em situação de violência sexual, bem como dos seus familiares, considerando a prioridade no atendimento. Dentre 10 ações, destacamos as seguintes: apoiar tecnicamente os municípios do estado com populações tradicionais nas ações de Busca Ativa para documentação civil e inserção no CadÚnico; executar o cofinanciamento estadual através do processo de regionalização para a implantação de CREAS Municipais de pequeno porte 1 e garantir a escuta especializada a adolescentes vítimas ou testemunhas de violência quando atendidas pela FASEPA.

O terceiro Eixo apresentado no Plano Estadual é o da Defesa e Responsabilização. Este eixo possui quatro objetivos: garantir a aplicação das leis de proteção para crianças e adolescentes vítimas ou em risco de violência sexual; inibir no estado do Pará atividades voltadas à exploração sexual infanto-juvenil, especialmente de turismo e tráfico com fins sexuais; garantir a aplicação das leis de proteção a crianças e adolescentes, vítimas ou em risco de violência sexual, estimulando a responsabilização social das empresas/instituições executoras de grandes empreendimentos econômicos no Estado e humanizar o atendimento às vítimas.

Este Eixo III é composto por 15 Ações, das quais ressaltamos as que seguem:  fortalecer a estrutura de atendimento às crianças e aos adolescentes nas varas, promotorias e defensorias, com jurisdição em municípios onde haja execução de grandes projetos (conforme Resolução do CONANDA nº 215/2018), especialmente no tocante à instalação ou implantação dos recursos humanos; intensificar as operações conjuntas incluindo o tema da exploração sexual como objeto de investigação pelo núcleo de inteligência das polícias, objetivando a realização de operações policiais e apuração de fatos criminosos, ao combate das redes de exploradores; realizar audiências públicas para discutir questões referentes ao enfrentamento da violência sexual, sobretudo em regiões com altos índices, bem como de atrativo turístico e de realização de grandes projetos econômicos e exigir o cumprimento da notificação compulsória por parte das instituições responsáveis pela educação, saúde e assistência social com base nos artigos 13 e 245 do ECA.

O Eixo IV se dedica à participação e protagonismo e sua execução objetiva construir o protagonismo de crianças e adolescentes sobre seus direitos, visando o fortalecimento da sua autoestima e defesa contra a violência sexual e possui 12 Ações, de modo que a título exemplificativo apontamos as que seguem: criar um projeto político-pedagógico envolvendo metodologias voltadas ao público infanto-juvenil em situação de vulnerabilidade pessoal e social à violência sexual, para uma intervenção na incidência política, protagonismo e participação, especialmente na região do Marajó e áreas de grandes projetos conforme resolução do CONANDA 215/2018; fortalecer através de rodas de conversas junto ao CRAS e CREAS da RMB ações sobre o protagonismo da população transexual infanto-juvenil para o enfrentamento à violência sexual e realizar oficinas de teatro sobre a temática da violência sexual para crianças e adolescentes, com a metodologia da Rádio Margarida na região metropolitana de Belém e Marajó.

O Eixo V se refere à Comunicação e Mobilização Social e apresenta como objetivo envolver a Sociedade Civil e o Poder Público no enfrentamento à violência sexual contra crianças e adolescentes e conta com 14 ações para a execução deste objetivo. Destas 14 Ações, destacamos: estimular, apoiar e assessorar os municípios mediante a realização de oficinas para a elaboração dos planos municipais de enfrentamento a violência sexual de crianças e adolescentes; divulgar mecanismos de denúncias, notificação e investigação da violência sexual cometidas contra crianças e adolescentes no estado, nas escolas públicas estaduais e municipais e manter ativo o Portal, Instagram e outras redes sociais da Rádio Margarida em defesa de crianças e adolescentes, com divulgação da temática da violência sexual.

Em continuidade, o Eixo VI, denominado “Estudos e Pesquisas” almeja diagnosticar a situação e as condições de enfrentamento da violência sexual pelo Governo e ONGs e as instâncias de controle social. é formado por 14 Ações, as quais ilustramos com as seguintes: consolidar a análise das informações de violências através do Sistema de Informação de Notificação e Agravos (SINAN), pela atuação da Diretoria de Vigilância em saúde e Departamento de Epidemiologia e áreas técnicas; criar um sistema de gestão dos dados provenientes das ações do plano estadual de enfrentamento à violência sexual de crianças e adolescentes e criar um Observatório sobre violência sexual contra crianças e adolescentes.

Há que considerar a importância deste Plano Temático em enfrentamento à violência sexual ainda presente contra crianças e adolescente no Pará (e em todas as Regiões do Brasil), isso pelo recorte destacado e histórico para esta política e atuação necessária da sociedade civil e do exercício do controle social e da própria participação e protagonismo de crianças e adolescentes.

Assim, aponta-se como premente o monitoramento do PEEVSCA/PA seja fomentado e promovido pelo Poder Público, aqui diretamente o Poder Executivo, inclusive para se fazer cumprir a deliberação do CEDCA/PA no âmbito da Resolução n.º 084/2021, de 14/09/2021, que dispõe sobre a formação da Comissão Interinstitucional de Monitoramento do Plano de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes do Estado do Pará, e dá outras providências. No entanto, ainda na presente data não se observa tal formação e organização de estrutura deliberada e descrita na referida Resolução, que, dentre outros, indica que em todo mês de maio a partir de então sejam apresentados os resultados das ações inseridos no Plano conforme programação anual de atividades.

Em suma, é constante demanda para que dê fato prosseguia com a efetivação dos direitos da criança e adolescentes, em especial na proteção de seus direitos, prevista desde as deliberações dos conselhos de direitos e nas conferências temáticas que ainda se busca e exige o cumprimento, para que o presente e futuro sejam melhores.

 

Notas e Referências

PARÁ, Plano Estadual de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes do Pará disponível em:

https://www2.mppa.mp.br/data/files/C2/27/17/44/72649710AAB61497180808FF/17.1%20Plano%20Estadual%20de%20Enfrentamento.pdf, acessado dia 09 de fevereiro de 2022.

____. Resolução n.º 084/2021, de 14/09/2021, que dispõe sobre a formação da Comissão Interinstitucional de Monitoramento do Plano de Enfrentamento da Violência Sexual Contra Crianças e Adolescentes do Estado do Pará, e dá outras providências. Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente do Pará. Publicado no Diário Oficial do Estado do Pará n.º 34.709, de 24/09/2021.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Statue of Justice - The Old Bailey // Foto de: Ronnie Macdonald // Sem alterações

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