Conciliação repressiva: o que é?

05/12/2015

 Por Maurilio Casas Maia - 05/12/2015

Recentemente, comemoraram-se os 5 (cinco) anos da Resolução n. 125/2010 (veja aqui) do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a qual versa sobre a “Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário”. O novo CPC de 2015 (veja aqui), por sua vez, positivou princípios[1] gerais da mediação e conciliação, sendo agora mais um potente instrumento em favor desse instrumento de efetivação à 3ª onda renovatória de acesso à Justiça (CAPPELLETTI e GARTH, 1988).

Certamente, são inegáveis as vantagens da conciliação e da mediação enquanto medidas de pacificação social. O juiz de direito Rafael Cró (2010, p. 25), exemplificativamente, pontua a minimização de acúmulos dos processos nos Tribunais, a redução de custos decorrentes da demora no trâmite processual e o incremento da participação da população nos processos de resolução de conflitos, enquanto vantagens da utilização de meios autocompositivos.

Com efeito, se por um lado o reforço da importância dos meios alternativos de soluções de conflitos é inegável, por outro lado, porém, a expansão da terceira onda renovatória de acesso à Justiça impõe alguns cuidados e alertas quanto à sua utilização.

Nessa senda, você sabe o que seria “conciliação repressiva”? Bem, conciliação repressiva é conceito utilizado por Boaventura de Sousa Santos (2008, p. 102-103) a fim de expor situações em que os litigantes possuem diferenças “muito grandes” entre si e nas quais o “vulnerável” aceitaria a conciliação simplesmente porque “não tem alternativa”. A expressão “conciliação repressiva” ainda não é muito comum na doutrina brasileira, mas é fenômeno já observado por muitos juristas pátrios.

Daniel Amorim Assumpção Neves (2015, p. 31), por exemplo, encara com receio a distância econômica entre o litigante contumaz e o eventual no Direito do Consumidor, preocupando-se com o risco de a conciliação ser ato de necessidade e não de vontade.

Na mesma linha de raciocínio, Fredie Didier Jr. (2015, p. 280) alerta para o perigo de convolar a autocomposição em mera causa de redução ou aceleração de processos junto ao Poder Judiciário. E ressalta: “É perigosa e ilícita a postura de alguns juízes que constrangem as partes à realização de acordos judiciais”.

Fernanda Tartuce (2015, p. 297), com estudos aprofundados sobre a temática, também revela preocupação com a autocomposição enquanto “etapa necessária” do procedimento no NCPC, em especial quando presente a desigualdade e a vulnerabilidade do litigante.

No quadro socialmente patológico da conciliação repressiva, três elementos ganham importância: assistência técnico-jurídica, informação e elucidação informativa. O referido trinômio será essencial para que se possa pensar em fulminar resquícios de dominação e injustiça social do quadro autocompositivo.

Assim, percebe-se que a “conciliação repressiva” – uma patologia jurídica a ser combatida e eliminada nas tentativas de autocomposição–, é reconhecida tanto pela doutrina nacional quanto estrangeira, e seu risco de manifestação nas relações desniveladas, entre desiguais, é muito mais acentuada, exigindo dos conciliadores e juristas a devida atenção a fim de não convolar a autocomposição em instrumento de dominação e injustiça social. Em tais casos, assistência técnico-jurídica, informação e elucidação informativa são elementos de um trinômio essencial à efetivação da Justiça Material no âmbito da denominada terceira onda renovatória de acesso à Justiça.

Longe de apresentar toda tessitura do problema “conciliação repressiva”, o presente texto pretendeu lançar o problema à luz, a fim de torná-lo um alvo comum de atenção e cuidado frequente dos juristas. Enfim, sejam as conciliações emancipadoras e não repressivas.


Notas e Referências:

[1] NCPC, “Art. 166. A conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada.”

BRITO, Rafael Almeida Cró. Formação Humanística: Resolução n. 75. Conselho Nacional de Justiça. São Paulo: Nelpa, 2010.

CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução: Ellen Gracie Northfleet. Porto Alegre: Fabris, 1988.

DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil: Introdução ao Direito Processual Civil, Parte Geral e Processo de Conhecimento. V. 1. Salvador: Jus Podivm, 2015.

NEVES, Daniel Amorim Assumpção. Novo Código de Processo Civil – Lei 13.105/2015. São Paulo: Método, 2015.

SANTOS, Boaventura de Sousa. Para uma revolução democrática da Justiça. 2ª ed. São Paulo: Editora Cortez, 2008.

TARTUCE, Fernanda. TARTUCE, Fernanda. Igualdade e Vulnerabilidade no Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2012.

______. Mediação nos conflitos civis. 2ª ed. São Paulo: Método, 2015.

______. Vulnerabilidade processual no Novo CPC. In: Sousa, José Augusto Garcia de. (Coord.) Defensoria Pública. Salvador: Jus Podivm, 2015. (Coleção Repercussões do Novo CPC, v. 5. Coordenador Geral: Fredie Didier Júnior).


Maurilio Casas Maia é Mestre em Ciências Jurídicas pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Pós-Graduado lato sensu em Direito Público: Constitucional e Administrativo; Direitos Civil e Processual Civil. Professor de carreira da Universidade Federal do Amazonas (UFAM) e Defensor Público (DPE-AM). 

Email:  mauriliocasasmaia@gmail.com .


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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