Compliance e Arbitragem  

23/04/2019

 

Coluna O Novo Processo Civil Brasileiro / Coordenador Gilberto Bruschi

 

            Como alguém que gosta dos dois temas, achei que valia a pena tecer algumas considerações sobre as relações entre o compliance a arbitragem, temas interdisciplinares estes que estão provocando alterações no modo de funcionamento das sociedades; não apenas no modo de operar o direito.

            Antes de mais nada, é notório que a arbitragem se expandiu de maneira absolutamente significativa no Brasil e fora dele. Também é verdade que a popularidade das competições de arbitragem e a necessidade de novos e adequados meios para a solução tempestiva e legitimadora de conflitos a conferem uma enorme perspectiva de crescimento nas próximas décadas.

            Assim como a arbitragem, o compliance, ao contrário do que se poderia supor, não é assunto novo. Mesmo no Brasil, diversas organizações possuem departamentos de compliance estruturados há vários anos. O que existe de novo, isto sim, é a percepção coletiva da importância das técnicas de compliance na busca por soluções pragmáticas e a utilização mais ampla do compliance para justificar a tomada de decisões impopulares.

            O complliance e arbitragem foram projetados para a mais adequada prevenção ou solução a conflitos. É óbvio: como meros instrumentos, tanto o compliance quanto a arbitragem também podem ser utilizados de forma prejudicial à sociedade.

            Sob um prisma puramente descritivo, enquanto as câmaras arbitrais podem sofrer influências negativas - tais como riscos decorrentes do poder de árbitros frequentes - os programas de compliance, ao invés de efetivamente justificarem soluções, infelizmente podem ser utilizados para descobrir e depois sabotar a efetiva solução de falhas.

            Não me entenda mal. Sou um entusiasta tanto do compliance quanto da arbitragem! Ocorre que não podemos considerar os temas de maneira tão ingênua que o discurso supere a nossa experiência. Precisamos operar os dois assuntos cientes e atentos aos perigos que os circundam. 

            Além disso, devemos perceber que existem relações bastante interligadas, desafiadoras e instigantes entre compliance e arbitragem. Visualizo, desde já, quatro delas:

1. Será necessário definir, tanto no processo judicial quanto no âmbito arbitral, se os elementos construídos mediante inteligência artificial em programas de compliance são meios de prova ou são fontes de prova;

2. Ainda não é prática verdadeiramente difundida, mas é inegável que as câmaras arbitrais devem disseminar a adoção de programas de compliance também no Brasil; 

3. O compliance já proporciona diversos fundamentos fáticos e jurídicos que embasam discussões arbitrais em muitos temas. Logo, assuntos ligados à corrupção também podem ser tema de disputas arbitrais, especialmente quanto às responsabilidades decorrentes do fechamento de contratos mediante atos de corrupção;

4. Como saberemos se os programas de conformidade livrarão os membros dos Conselhos e os Administradores de responsabilidades? É nesse tipo de garantia que os programas se transformarão? É por meio do processo, enfim, inclusive do processo arbitral, que os precedentes de maior vulto decidirão quais são os programas substanciais (efetivos) de compliance, e quais serão as responsabilidades de conselheiros e demais administradores.

            Certa vez me perguntei por qual motivo a common law possui tribunais do juri em ações civis. Ao estudar o tema, percebi que naqueles sistemas o cidadão muitas vezes se sente mais desinformado quanto às normas do que na civil law, e novamente me perguntava por qual motivo se baseava um sistema na limitação daquilo que a civil law chama de liberdade judicial.

            Descobri, após algum tempo, que dentre outras razões culturais, a estrutura da common law se deve à maturação democrática, pois houve momentos históricos em que a sociedade passou a desconfiar dos juízes e da complexidade de suas” normas, preferindo adjudicar para si própria este julgamento.  

            Compliance a arbitragem são, portanto, duas não necessariamente novas – embora absolutamente atuais, necessárias e inevitáveis – formas de prevenção e solução de conflitos.

            São formas de enfrentamento que se desenvolvem como alternativas de peso, especialmente em face dos acontecimentos mais recentes, ganhando espaço e popularidade em ritmo de progressão geométrica e possuindo imbricações absolutamente disruptivas ao pensamento e ao modo de produção do cenário jurídico tradicional. 

 

 

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Imagem Ilustrativa do Post: Bridge in Toruń // Foto de: Kamil Porembiński // Sem alterações

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