COMENTÁRIOS AO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL: ARTIGO 14

10/07/2020

Coluna Isso Posto / Coordenadores Ana Paula Couto e Marco Couto

Ouça a leitura do artigo.

Seguimos comentando os artigos do Código de Processo Penal, dando continuidade às nossas colunas anteriores elaboradas neste sentido.

Art. 14. O ofendido, ou seu representante legal, e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade.

O art. 14, caput, do CPP, não apresenta maior complexidade, muito embora o mesmo seja da maior importância para que se compreenda que a fase investigativa não adota os princípios da ampla defesa e do contraditórios previstos em sede constitucional. Veja-se que o art. 5º, LV, da Constituição Federal, dispõe que aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes. Considerando que o inquérito policial tem natureza administrativa, um intérprete menos atento pode entender que o termo  administrativos previsto na norma constitucional abrange igualmente o inquérito policial, o que não é verdade.

É que o inquérito policial tem natureza de procedimento policial, enquanto o texto constitucional se refere propriamente ao processo administrativo-disciplinar, que tem natureza e objetivo distintos do inquérito policial.

Isso justifica o fato de as provas colhidas em sede policial deverem ser reproduzidas, em regra, na fase processual, a fim de que possam ser submetidas aos princípios do contraditório e da ampla defesa, permitindo que o juiz as leve em consideração no momento da prolação da sentença. Não custa lembrar que o art. 155, caput, do CPP, dispõe que o juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas. Portanto, o juiz não pode fundamentar a sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação justamente porque a sua produção não decorreu da observância dos princípios do contraditório e da ampla defesa. 

A própria redação do art. 14, caput, do CPP, deixa clara essa situação quando afirma que o ofendido, o seu representante legal e o indiciado podem requerer a realização de qualquer diligência, a qual será realizada, ou não, de acordo com o entendimento da autoridade policial. O delegado de polícia preside a investigação, devendo orientar as diligências a serem realizadas de acordo com a linha investigativa que estabeleceu. Na verdade, o ofendido, o seu representante legal e o indiciado sugerem a produção de alguma prova, cabendo à autoridade policial determinar, ou não, a sua realização.

Quanto ao ofendido e ao seu representante legal, é conveniente lembrar que a figura do assistente de acusação pressupõe a existência do processo criminal propriamente dito. Veja-se que o art. 268, caput, do CPP, dispõe que, em todos os termos da ação pública, poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no art. 31. Portanto, somente após o recebimento da denúncia, será possível a atuação do assistente de acusação, o que não impede que o ofendido ou o seu representante legal sugiram, na fase investigativa, a produção de alguma prova.

Quanto ao indiciado, é importante lembrar que a autoridade policial não é obrigada a realizar a diligência por ele sugerida, ainda que relevante, pertinente e necessária. O art. 400, § 1º, do CPP, dispõe que o juiz pode indeferir a produção das provas consideradas irrelevantes, impertinentes e protelatórias que porventura sejam requeridas na audiência. A contrario sensu, deve ser admitida a produção das provas relevantes, pertinentes e necessárias. Mas isso ocorre na fase judicial. Na fase policial, o art. 14, caput, do CPP, confere discricionariedade à autoridade policial para determinar a realização das provas que entender adequadas à investigação, podendo, portanto, indeferir eventual requerimento feito pelo indiciado.

Convém registrar que, diante do indeferimento do seu pedido, o indiciado tem a possibilidade de dirigir o seu pleito diretamente ao Ministério Público, o qual poderá requisitar a realização de tal diligência, caso adira ao entendimento do indiciado.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Statue of Justice - The Old Bailey // Foto de: Ronnie Macdonald // Sem alterações

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