Cláusula de desempenho na incorporação de tecnologias em Saúde

06/05/2019

Tema importante no Direito à Saúde é aquele atinente à incorporação das tecnologias em Saúde.

Como regra, no âmbito do SUS, a Conitec faz o estudo e em caso favorável há publicação de Portaria de incorporação do medicamento ou produto, conforme prevê a Lei 8080/90, seguindo-se com a aquisição e entrega da tecnologia. Neste caso, o Estado assume o risco pela ineficácia do tratamento.

Contudo, “a adoção de uma tecnologia pode trazer incertezas, principalmente quando a evidência na literatura é escassa, ou ainda quando existem lacunas quanto ao desempenho no mundo real, ou seja, no cotidiano dos pacientes e não somente em estudos clínicos com pessoas e ambientes controlados. Essas dificuldades podem ser sanadas por meio de medidas alternativas que visam gerar evidências adicionais sobre o valor terapêutico das tecnologias.”[1]

Neste sentido, uma modalidade interessante é aquela em que há o compartilhamento da responsabilidade pelo desempenho do produto em Saúde. Ou seja, trata-se de um sistema em que o preço do produto somente será definido posteriormente, após o surgimento e a avaliação dos resultados decorrentes da sua utilização pela população.

“Para isso, o pagamento da tecnologia está ligado à apresentação de evidências dos efeitos reais, ou seja, em como a tecnologia ao ser utilizada impacta na saúde e na qualidade de vida do paciente. Nessa modalidade, portanto, não se considera apenas os resultados de estudos controlados utilizados na ATS, mas os resultados produzidos com o uso da tecnologia no dia a dia dos pacientes (estudos observacionais). Assim, o Estado e a Indústria compartilham a responsabilidade pelas incertezas em relação aos benefícios com o uso da tecnologia.”[2]

Como se observa, tal modelo é um ótimo mecanismo para dividir os custos da incorporação de tecnologias em um sistema universal de Saúde. Além disso, ele tem como base os resultados apresentados no quotidiano – com o uso do produto – e não apenas na Avaliação das Tecnologias em Saúde, em que se analisa apenas o aspecto teórico, com os estudos já realizados (revisões sistemáticas, entre outros).

Para a eficácia do acordo desempenho é importante que estejam claramente definidos alguns pontos, tais como:

  • Qual o valor mínimo e máximo a ser pago pelo produto;
  • Como e quem fará a avaliação de desempenho;
  • Qual é o desfecho pretendido;
  • Se a publicidade do acordo será sempre necessária;
  • Hipóteses de cessação do contrato, principalmente pela ineficiência do produto;
  • Obrigações das partes;
  • Possível padronização mundial do acordo, observadas as especificidades epidemiológicas;
  • Manutenção do compartilhamento de risco em caso de judicialização;
  • Definição sobre o momento do pagamento (prévio com posterior reembolso pelo laboratório ou pagamento diferido).

 

No Brasil, houve a incorporação do nusinersena (spinraza) para atrofia muscular espinhal (AME) 5q tipo I, no âmbito do Sistema Único de Saúde – SUS, conforme Portaria 24/2019 da Secretaria de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos. Contudo, o estudo da Conitec sobre o caso indicou que não há ainda evidências científicas para os demais tipos de AME. Assim, com a finalidade de “contemplar estes outros tipos e gerar mais dados que colaborem para avaliação de tratamento, o Ministério da Saúde estuda a incorporação do nusinersena na modalidade compartilhamento de risco. [...] Neste formato, o governo arca com os custos do medicamento naqueles casos em que são constatadas melhorias na saúde do paciente.”[3]

No contexto, enquanto o medicamento é utilizado as entidades envolvidas (Estado e Indústria) acompanham o caso, avaliando o desempenho do tratamento e o seu desfecho.

Portanto, o compartilhamento de resultados – cláusula ou acordo de desempenho - é uma excelente possibilidade para reduzir a responsabilidade do Estado em relação aos tratamentos e, principalmente, para permitir o acesso mais rápido e facilitado das pessoas às tecnologias de alto custo.

 

Notas e Referências

[1] BRASIL. Conitec. Acordos de Compartilhamento de Risco são possíveis no Sistema Único de Saúde brasileiro? Disponível em http://conitec.gov.br/acordos-de-compartilhamento-de-risco-sao-possiveis-no-sistema-unico-de-saude-brasileiro. Acesso em: 29 Abr. 2019.

[2] BRASIL. Conitec. Acordos de Compartilhamento de Risco são possíveis no Sistema Único de Saúde brasileiro? Disponível em http://conitec.gov.br/acordos-de-compartilhamento-de-risco-sao-possiveis-no-sistema-unico-de-saude-brasileiro. Acesso em: 29 Abr. 2019.

[3] BRASIL. Conitec. Ministério da Saúde incorpora nusinersena para Atrofia Muscular Espinhal (AME). Disponível em http://conitec.gov.br/ministerio-da-saude-incorpora-nusinersena-para-atrofia-muscular-espinhal-ame. Acesso em: 30 Abr. 2019.

 

 

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