Coordenador: Gilberto Bruschi
A partir dos comandos contidos nos arts. 13/15 da Lei n° 13.105/2015, vem sendo admitido, em linhas gerais, a aplicação do Novo CPC nos processos eleitorais, trabalhistas, administrativos e tributários. A respeito do rito sumaríssimo, dos juizados especiais, da mesma forma a aplicação subsidiária e supletiva se faz necessária, ainda de forma mais cabal, já que a originária Lei n° 9.099/95 foi criada a partir da própria disciplina do CPC/1973, para causas de menor potencial econômico.
Sendo o rito sumaríssimo voltado para a concretização do macro princípio da efetividade, por certo muitas disposições tendentes a incrementar a segurança jurídica podem não ser acomodadas de forma tão natural, como é a hipótese da concessão de prazos dilatórios na fase instrutória (art. 139, VI do Novo CPC) e o incentivo a uma maior flexibilidade e dinamismo procedimental pela via, por exemplo, dos acordos de procedimento (art. 191 do Novo CPC)[1].
Por outro lado, a disciplina principiológica do codex seria fundamental que fosse respeitada, aqui especialmente a lógica do contraditório prévio e o da fundamentação completa das decisões judiciais. Tais elementos integram a essência do devido processo legal, e, portanto, fazem parte dos direitos processuais fundamentais das partes, com arrimo constitucional, forte especialmente no art. 5°, LIV c/c art. 93, IX da CF/88. Relativizar tais funções no rito sumaríssimo significa autorizar a ilação de que é facultativo desrespeitar as garantias processo-constitucionais nos Juizados Especiais, o que é inaceitável.
O princípio da não surpresa e a exigência de sentenças fundamentadas de maneira exemplar, estamos convictos, nada contradizem o espírito da legislação dos juizados especiais, a não ser que admitamos que por razões de natureza econômica se tolere um processo de segunda classe, o que além de imoral é inconstitucional[2].
O Novo CPC, assim, vem em boa hora, exigindo o contraditório prévio e a fundamentação das decisões (a partir dos arts. 10 e 11 da Lei n° 13.105/2015), sendo já por aí explicada a ausência de legitimidade que vem sendo verificada no rito sumaríssimo, a partir do momento em que se entende que as decisões não precisariam ter fundamentação completa e mesmo que a ausência de contraditório efetivo ente as partes litigantes não seria fator de grave nulidade procedimental. Colocamo-nos, portanto, absolutamente contra essas relativizações de rito, que acabam sim comprometendo o aproveitamento adequado da prestação jurisdicional nos Juizados.
Com relação à sistemática de prazos entendemos como viável a contagem em dias úteis, o que em um primeiro momento de vigência do Novo CPC vinha sendo empregado no rito sumaríssimo. No entanto, ao menos a partir de meados de 2016 iniciou-se movimento mais forte em sentido contrário, a fim de que os prazos de processos que correm nos Juizados Especiais cíveis e nos juizados da Fazenda Pública passassem a ser contados em dias corridos; isso é o que determinaram o Enunciado Cível 165 e o Enunciado da Fazenda Pública 13, aprovados em junho no 39º Encontro do Fórum Nacional de Juizados Especiais (Fonaje).
Por outro lado, a suspensão de prazos fixados no período de recesso forense, de 20 de dezembro a 20 de janeiro, inclusive, deve ser respeitado tanto no rito comum como no rito sumaríssimo, não havendo razões aqui para distinções.
Outros cenários viáveis. É de se reconhecer a aplicação do codex no que toca à redução dos formalismos excessivos, de acordo com o comando geral do art. 932, par. único. Nesse mesmo diapasão, o princípio da primazia do mérito relaciona-se a qualquer rito, devendo ser aplicado o art. 139, IX nos Juizados. Ainda relacionado: os comandos de efetivação das decisões judiciais são bem-vindas nos Juizados, sendo respeitados os comandos contidos no art. 297 c/c art. 139, IV do Novo CPC.
Os avanços feitos pelo codex com relação às tutelas provisórias, de urgência e evidência (art. 294 e ss.), por certo podem ser adaptadas ao micro-sistema dos Juizados Especiais, mesmo porque amplamente de acordo com o macro princípio da efetividade, que orienta o rito sumaríssimo. Embora não prevista expressamente nas leis que regulamentam os juizados especiais (Lei 9.099/1995, Lei 10.259/2001, Lei 12.153/2009), a mediação deve fazer parte da estrutura para a autocomposição dos conflitos levados aos juizados; nos juizados especiais também é possível a realização de negócio processual, desde que respeitados os princípios informadores dos juizados e o controle judicial previsto no parágrafo único do art. 190, CPC/15[3].
As inovações na linha de formação dos precedentes também precisam ser estudadas e ajustadas à luz dos Juizados, já que por certo há necessidade de segurança e previsibilidade também no rito sumaríssimo. Em especial a tramitação de demandas repetitivas precisam seguir as regras do codex, sendo respeitada nesse particular a hierarquia prevalente do Superior Tribunal de Justiça (STJ) frente à Turma Nacional de Uniformização (TNU).
Com relação às novidades executivas, da mesma forma devem ser aplicadas, embora com ressalvas, de acordo, por exemplo, com o Enunciado 97 do Fórum Nacional de Juízes Estaduais (Fonaje): A multa prevista no art. 523, § 1º, do CPC/2015 aplica-se aos Juizados Especiais Cíveis, ainda que o valor desta, somado ao da execução, ultrapasse o limite de alçada; a segunda parte do referido dispositivo não é aplicável, sendo, portanto, indevidos honorários advocatícios de dez por cento.
Por fim, há de se dizer que o codex é expresso ao regulamentar que o incidente de desconsideração da personalidade jurídica aplica-se aos juizados (art. 1062); como também que os embargos de declaração, tanto no rito comum como no sumaríssimo, tratam de interromper o prazo para interposição de outros recursos (art. 1065). São esses os grandes dispositivos do codex que fazem menção ao rito sumaríssimo, o que deixa claro – façamos questão de repisar – que o Novo CPC trata do procedimento comum, deixando em aberto o exame da compatibilidade dos seus institutos com os Juizados Especiais.
De outra banda, há ainda cenário em que o rito comum adotou a técnica processual já aplicada nos juizados: trata-se da não preclusão de decisões interlocutórias de menor gravidade, as quais sequer desafiam protesto anti-preclusivo (como na justiça do trabalho), devendo a irresignação ser apresentada tão somente como preliminar em recurso ao segundo grau – exatamente como sempre se processou nos Juizados, em que inclusive nunca houve espaço para manejo do agravo de instrumento[4].
Notas e Referências:
[1] RUBIN, Fernando. Efetividade Versus Segurança Jurídica: cenários de concretização dos dois macro princípios processuais no novo CPC. In: Fredie Didier Jr., Lucas Buril, Ravi Peixoto, Ale-xandre Freire. (Org.). Coleção Novo CPC, doutrina selecionada - Parte Geral, Volume 1. 1ed.Salvador: Jus Podivm, 2015, v. 1, p. 437-457.
[2] RUBIN, Fernando. Os ritos processuais sumaríssimos no Brasil. Unisul de Fato e de Direito, v. 10, p. 257-267, 2015.
[3] RUBIN, Fernando. O Novo CPC: Da construção de um novel modelo processual às principais linhas estruturantes da Lei n° 13.105/2015. São Paulo: Lex Magister, 2016, 1ª edição esgotada.
[4] RUBIN, Fernando. Necessárias questões atuais em processo previdenciário. Revista Dialética de Direito Processual, v. 140, p. 45-51, 2014.
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