Breves comentários sobre a decisão do STJ em relação ao rol da ANS  

20/06/2022

O Superior Tribunal de Justiça concluiu o julgamento sobre a natureza jurídica do rol da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar), assentando que:

1. O rol de procedimentos e eventos em saúde suplementar é, em regra, taxativo;

2. A operadora de plano ou seguro de saúde não é obrigada a arcar com tratamento não constante do rol da ANS se existe, para a cura do paciente, outro procedimento eficaz, efetivo e seguro já incorporado ao rol;

3. É possível a contratação de cobertura ampliada ou a negociação de aditivo contratual para a cobertura de procedimento extra rol;

4. Não havendo substituto terapêutico ou esgotados os procedimentos do rol da ANS, pode haver, a título excepcional, a cobertura do tratamento indicado pelo médico ou odontólogo assistente, desde que (i) não tenha sido indeferido expressamente, pela ANS, a incorporação do procedimento ao rol da saúde suplementar; (ii) haja comprovação da eficácia do tratamento à luz da medicina baseada em evidências; (iii) haja recomendações de órgãos técnicos de renome nacionais (como Conitec e Natjus) e estrangeiros; e (iv) seja realizado, quando possível, o diálogo interinstitucional do magistrado com entes ou pessoas com expertise técnica na área da saúde, incluída a Comissão de Atualização do Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde Suplementar, sem deslocamento da competência do julgamento do feito para a Justiça Federal, ante a ilegitimidade passiva ad causam da ANS.[1]

Alguns comentários iniciais sobre a aludida decisão:

1º não há previsão para cobertura universal a todo e qualquer tratamento (salvo situações expressamente contratadas);

2º critérios abstratos de decisão judicial (dignidade da pessoa humana, razoabilidade, entre outros) não podem ser aplicados sem a adequada concretude com a questão sanitária;

3º a legislação também exige prova de evidências em saúde (artigo 10, §5º, e artigo 10-D, §3º, ambos da Lei 9.656/98);

4º Medicina Baseada em Evidências é um instrumento de Avaliação de Tecnologia em Saúde – ATS e não pode ser desconsiderada na decisão judicial;

5º a decisão restabelece o equilíbrio da relação usuário e plano de saúde, pois o rol exemplificativo permitia o fornecimento de tratamentos experimentais e sem evidência científica (o que viola toda e qualquer regra de ATS)[2];

6º a nova posição vai exigir maior atuação da ANS, com a atualização constante do rol;

7º haverá necessidade de ampliação e fortalecimento dos NatJus – Núcleos de Apoio Técnico ao Judiciário, com a finalidade de qualificar e proteger os seus integrantes;

8º a decisão não precisa de modulação temporal, pois: (a) a carga maior é de efeito declaratório e (não constitutivo) e; (b) o ponto central da discussão é de natureza sanitária, ou seja, não se pode modular evidência científica (esta resposta está nos estudos existentes na época própria);

9º o STJ não reduziu direitos dos consumidores, apenas assentou que o direito existe quando há aplicação de ATS - Avaliação de Tecnologia em Saúde, tornando-se insuficiente uma mera prescrição médica;

10º a decisão do STJ se alinha à posição do STF nos julgamentos dos Temas 6 e 500 das Repercussões Gerais (saúde pública).

Como se observa, a decisão do STJ tem importante impacto no sistema de saúde suplementar, cabendo à sociedade fiscalizar o cumprimento das normas e fomentar a atuação da ANS, do Judiciário e das operadoras de plano de saúde para concretizar a saúde da melhor forma possível.

 

Notas e Referências

[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Rol da ANS é taxativo, com possibilidades de cobertura de procedimentos não previstos na lista. 08/06/2022. Disponível em: https://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/08062022-Rol-da-ANS-e-taxativo--com-possibilidades-de-cobertura-de-procedimentos-nao-previstos-na-lista.aspx. Acesso em: 18 Jun. 2022.

[2] SCHULZE, Clenio Jair. Rol da ANS exemplificativo para tratamento sem evidência científica? In Empório do Direito. 30 Mai. 2022. Disponível em: https://emporiododireito.com.br/leitura/rol-da-ans-exemplificativo-para-tratamento-sem-evidencia-cientifica. Acesso em: 18 Jun. 2022.

 

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