Por Luciano Scheer - 19/06/2015
Como se não bastasse tantos problemas e crises para a comunidade jurídica se preocupar – crise do ensino jurídico, austeridade, terceirização do trabalho, xenofobia, ódio político, intolerância religiosa etc. -, mais uma vez volta à pauta do Congresso Nacional a redução da maioridade penal. A comissão especial da Câmara dos Deputados que discute a maioridade penal aprovou nesta quarta-feira (17), por 21 votos favoráveis e 6 contrários, o relatório do deputado Laerte Bessa (PR-DF) que reduz de 18 para 16 anos a idade penal para os crimes considerados graves.[1]
Engana-se quem pensou ser este um assunto resolvido, pois o oportunismo de políticos e da grande mídia em promover o caos, para lograr “simpatizantes”, está sempre latente. A propósito, como bem resumiu Bertolt Brecht, “A cadela do fascismo está sempre no cio.". Diante de tamanha aberração legislativa, em que 54 países que a adotaram não reduziram a criminalidade – Alemanha e Espanha voltaram atrás- [2], faz-se necessário, mais uma vez, tecer algumas considerações.
O senso comum não usa métodos científicos, apenas vale-se da práxis herdada. É o saber populista, apaixonado que, diante do problema encontrado, repete o que já foi dito sem examinar a fundo a relevância do conhecimento apresentado: É um conjunto de crenças aceitas como verdades inquestionáveis [3]. A Lei é um instrumento – apenas um instrumento, e não uma vara de condão – que regula o desenvolvimento das relações sociais, perseguindo a boa convivência e reduzindo as consequências dos conflitos inerentes ao pensar/agir humano.
Não raro se vê jornalistas bancando de juristas, psicólogos, economistas, sociólogos, e por aí vai. Esquece-se de informar, como manda o estatuto da categoria, com rigor e isenção, sem sensacionalismo [4]. Considerando-nos parte de uma sociedade democrática, precisamos enfrentar os problemas como cidadãos que somos, e não repetidores ou especialistas num assunto que se quer tenhamos estudado o seu mínimo.
É digno de lamento ver defensores da redução da maior idade com o argumento que adolescentes, do alto de seus 16 anos, já sabem (sic) o que fazem. É correto pensar que um adolescente não praticará determinada conduta por haver leis prevendo pena? As relações sociais parecem ser mais complexas do que certos achismos populistas, além de que, segundo os números da Secretaria Nacional de Segurança Pública (Senasp), o percentual de homicídios e tentativas de homicídio, entre menores de 16 a 18 anos, é de 0,5%. [5]
Em pleno século XXI ainda caminhamos a passos lentos no aspecto social. Parece que a sociedade sempre está apagando o fogo. Remediar passou a vir antes da prevenção, e esta depois da tragédia. Já ensinava Cesare Beccaria, há 249 anos: "É melhor prevenir os crimes do que ter de puni-los; e todo legislador sábio deve procurar antes impedir o mal do que repará-lo, pois uma boa legislação não é senão a arte de proporcionar aos homens o maior bem estar possível e preservá-los de todos os sofrimentos que se lhes possam causar...”. [6]
O curioso é que os defensores da liberdade e do Estado mínimo são os mesmos que usam de bravatas invocando, contraditoriamente, mais ações do Estado na repressão para adolescentes infratores. Nesse caso, diferentemente quando o assunto é liberdade econômica, o alargamento da atividade estatal é louvado. O estimulo colossal ao consumo, a ostentação da opulência daqueles que podem consumir nunca é questionado como sendo o possível causador da criminalidade.
Antes de qualquer opção punitiva por parte do Estado, aquele que deveria garantir primeiramente direitos fundamentais. Mais sensato seria a autocrítica, no sentido de buscar fortalecer suas políticas sociais em educação de qualidade, saúde, cultura de paz, distribuição de renda etc.
Inegável a dificuldade para fazer com que o Estado e a sociedade saiam do senso comum e busquem resolver a criminalidade com inteligência. Porém é preciso mobilização por parte da comunidade jurídica, principalmente pelo momento de ascensão conservadora no parlamento e nas ruas do Brasil.
Notas e Referências:
[2] http://oglobo.globo.com/opiniao/o-mito-da-reducao-da-maioridade-penal-15759255
[3]https://www.youtube.com/watch?v=xGY9kOs17u8&feature=youtu.be Direito e Literatura – Senso Comum
[4] http://www.erc.pt/documentos/legislacaosite/Lei64_2007.pdf
[6]http://www.oab.org.br/editora/revista/revista_08/e-books/dos_delitos_e_das_penas.pdf
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Luciano Scheer é graduando em Direito na Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul – Unijuí, 1º Secretário do Centro Acadêmico do Curso de Direito, Câmpus Ijuí – CADI-Ijuí, bolsista voluntário no grupo de pesquisa Direito e Economia às Vestes do Constitucionalismo Garantista, e-mail: luciano.scheer@unijui.edu.br.
Imagem Ilustrativa do Post: The Crown // Foto de: Shaer Ahmed // Sem alterações
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