Audiências de Mediação e Conciliação em Ações de Família – Por Cinthya Nunes Vieira da Silva

26/05/2017

Coordenador: Gilberto Bruschi

Embora essa já fosse a tônica do CPC de 1973, o novo Código de Processo Civil reforçou a importância da conciliação nas ações de Família, inclusive estabelecendo que a audiência poderá ser dividida em quantas vezes forem necessárias para que a solução consensual seja viabilizada. [1]

Da mesma forma, o novel diploma ainda registra que todos os esforços para solução amigável nas ações de família deverão ser utilizados, devendo o juiz da causa se valer de profissionais de outras áreas do conhecimento para realização da mediação e da conciliação.[2]

Ainda que o dispositivo em questão não esteja a impedir que o próprio juiz da causa exerça o papel de conciliador/mediador, o verbo dever, ali empregado, pode levar à conclusão de que se trata mais do que mera faculdade. Na prática forense, sobretudo, o que se denota é que, desejando o juiz conduzir ele mesmo a audiência de conciliação, ou não dispondo o juízo de conciliadores e mediadores, no mínimo é necessária cautela para não se proceder a pré-julgamentos.

A grande questão que se impõe é que ao conduzir pessoalmente uma conciliação, muitos juízes dão diretrizes daquilo que estão ou não dispostos a conceder. Não raras vezes, na lide forense, é comum que os advogados que militam na área do Direito de Família tenham que orientar seus clientes, ainda durante a audiência, a aceitar determinado acordo, ainda que não favorável, diante da postura do juiz que manifesta seu convencimento sobre o pedido ou a oposição trazida pelas partes. Nesses casos, a audiência de conciliação perde o seu maior objetivo, que vem a ser a pacificação social, a composição amigável de relações familiares conflituosas, que atingem não apenas os envolvidos, mas muitas vezes a saúde física e mental da prole.

No momento em que as partes anuem com um acordo pela perspectiva de que é o melhor que irão alcançar, deixa de existir o sentimento de que conseguiram o melhor que o consenso foi capaz de atingir. Quando a decisão realmente emana das partes, ainda que através da intervenção adequada de terceiro, isso não somente pode colocar fim ao processo, mas apaziguar o litígio em si, o que, sem dúvida, pode até mesmo impedir demandas futuras, como as revisionais de alimentos.

Por certo que não o juiz não está impedido de ser, ele mesmo, o responsável pela conciliação, mas, caso ainda o deseje ou seja necessário, deverá se conscientizar de que a imparcialidade exigida vai além de não ser favorável a uma das partes, mas também de que é imperativo não demonstrar, em momento algum, qual seria a medida que o seu livre convencimento motivado tomará. Além do mais, há outros fatos a serem ponderados, eis que, mesmo que as ações de família mormente envolvam interesses indisponíveis na essência, dentro da parcela de disponibilidade que possuem, não havendo lesão a direitos de terceiros ou mesmo de um dos envolvidos, as partes devem ser livres para compor o arranjo que melhor lhes aprouver, acordo ao qual só foram capazes de realizar após ingressarem no Judiciário.

Por óbvio que juízes podem e vários são, capazes de levar as partes à consecução de excelentes acordos, mas dispondo o Poder Judiciário de estrutura para tanto, muito melhor para todos os envolvidos que as audiências de conciliação sejam realizadas por conciliadores especialmente treinados e dedicados a isso. De fato, por outro lado, de nenhuma valia terá tal solução se não houver pessoas aptas, habilitadas a conciliar. Audiências de conciliação nas quais o interlocutor, seja juiz, seja conciliador, limita-se a perquirir sobre a viabilidade de acordo, configuram-se não somente um desrespeito com os jurisdicionados e advogados, como também um imenso desperdício de todos os envolvidos.

Um ponto que merece ser destacado é que as audiências de mediação, em regra realizadas por mediadores especialmente qualificados para tal, nas quais não há qualquer indício perceptível às partes de como provavelmente irá se posicionar o juiz da causa, no mínimo confere a elas a oportunidade de se manifestarem, de externar, sem maiores formalidades, o conflito, as mágoas que as levaram até ali. Feita de forma adequada, os benefícios da mediação vão além da resolução de uma relação processual, eis que é capaz de atingir também a verdadeira causa de pedir, aquela que, nas ações de família, é sempre o pano de fundo, ou seja, as mágoas existentes entre cônjuges, companheiros, pais e filhos, etc.

A mediação nas ações de família, mesmo quando não resulta na solução amigável do litígio, contribui para a vida das partes, consistindo no momento no qual podem ser ouvidas mutuamente, sem que isso constitua meio de prova em seu desfavor. Há ainda o fato de que a realização da mediação como meio de se buscar um acordo, realizada por mediadores, permite ao juiz a liberação da pauta de audiências, que poderá ser preenchida com audiências de instrução e julgamento, as quais, sem dúvida, apenas podem ser conduzidas pelo juiz de direito.

Inevitável a conclusão de que um acordo, seja em que tipo de processo for, mas sobretudo naqueles que envolvem questões de família, é sempre a solução mais esperada. O que se sustenta nessas linhas é que, em alguns casos, como naqueles nos quais o acordo é realizado em audiência de conciliação realizada por juiz de direito, pode ser resultado muito menos do mútuo desejo ou consenso das partes, mas sim de uma única alternativa de uma das partes diante do pré-julgamento que o juiz revela.

Diante do expresso no art. 696 do CPC, assim, a melhor interpretação, mais consentânea com o resultado efetivo que ser espera alcançado nos acordos realizados nas ações de família, é que o juiz não deva realizar a audiência de tentativa de conciliação/mediação, mas que deva, obrigatoriamente, ser auxiliado por outros profissionais especialmente habilitados a tanto.


Notas e Referências:

[1] Art. 696 CPC/2015.

[2] Art. 694 CPC/2015.


 

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