Aspectos Legais da Agroecologia – Por Wagner Carmo

04/06/2017

A produção agrícola é um dos dilemas do mundo e seu enfrentamento passa, necessariamente, pela revisão da relação estabelecida pelo homem com o meio ambiente natural – uso e conservação da natureza; pelo aumento da capacidade produtiva – essencial para garantir alimentos à população urbana; e pela justiça social no campo – requisito intrínseco à dignidade humana.

Neste contexto, a produção de alimentos passou a ser desenvolvida por sistemas agrícolas, sendo caracterizada, atualmente, por dois modelos produtivos; o sistema agrícola intensivo, caracterizado pela utilização de técnicas e tecnologias ligadas à mecanização, insumos, herbicidas e inseticidas e o sistema agrícola extensivo, que utiliza elementos dispostos na própria natureza.

A ideia do presente artigo é apresentar a agricultura extensiva praticada pelo sistema agroecológico e seus aspectos normativos dispostos no Brasil pelo Decreto Federal n.º 7.794 de 20/agosto/2012, que criou a Politica Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – PNAPO, combinando-a com as Leis Federais n.º 11.326/2006 que dispõe sobre as diretrizes para a formulação da Política Nacional da Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais e a 10.831/2003 que regula a agricultura orgânica.

Por definição científica[1], a agroecologia é uma ciência que fornece os princípios básicos para o estudo e tratamento dos ecossistemas, tanto produtivo quanto preservadores dos recursos naturais, e que sejam culturalmente sensíveis, socialmente justos e economicamente viáveis.

Sob o ponto de vista normativo, considera-se produção de base agroecológica aquela que busca aperfeiçoar a integração entre capacidade produtiva, uso e conservação da biodiversidade e dos demais recursos naturais, equilíbrio ecológico, eficiência econômica e justiça social. (art. 2º, inciso III do Decreto n.º 7.794/2012).

Decorre da definição que a agroecologia pressupõe uma produção agrícola que tenha por base a conjugação de princípios da ordem econômica, com garantia da capacidade de produção eficiente, em propriedade que observe a função social, desenvolvendo agricultura para sustentar as famílias envolvidas no processo produtivo e, também, para realizar o abastecimento do mercado consumidor; da ordem social, com a valorização do trabalho humano e pela existência digna e da ordem ambiental – exigindo-se a defesa do meio ambiente por meio da conservação e do equilíbrio ecológico – a sustentabilidade.

Para tanto, a agroecologia possui como objetivo integrar, articular e adequar políticas, programas e ações indutoras da transição agroecológica e da produção orgânica de base agroecológica, contribuindo para o desenvolvimento sustentável; para a qualidade de vida da população por meio do uso reacional dos recursos naturais e para a oferta e o consumo de alimentos saudáveis. (art. 1º do Decreto n.º 7.794/2012).

Assim, é possível encontrar, primeiro, uma clara opção normativa pelo sistema extensivo de produção, com o reconhecimento de sua importância na medida em que indica a necessidade de criação de politicas e programas que favoreçam a transição da agricultura tradicional/convencional para a agroecologia. Segundo, que existe uma separação entre agroecologia e produção orgânica, fixando que a agroecologia contem a produção orgânica, porem, a produção orgânica não é, necessariamente, agroecológica.

Alias a separação é necessária, pois, a realização de uma leitura despretensiosa do §2º do art. 1º da Lei Federal n.º 10.831/2003, que regulamenta a agricultura orgânica no Brasil pode levar a uma interpretação equivocada dos institutos; já que a Lei Federal n.º 10.831/2003 estabeleceu que o conceito de sistema orgânico de produção agropecuária e industrial alcança os conceitos de sistemas ecológico, biodinâmico, natural, regenerativo, biológico, agroecológicos e permacultura.

Neste caso, a citação agroecológico consiste em uma consideração histórica do desenvolvimento da política de produção agropecuária orgânica no Brasil e no Mundo, através das correntes ideológicas, explicando, inclusive, que na agroecologia é possível produzir produtos orgânicos.

O terceiro destaque encontra-se no parágrafo único do art. 1º do Decreto n.º 7.794/2012, pois, considera que a responsabilidade pela política agroecologia é da União, porem, que a implantação e que a execução serão realizada em regime de cooperação com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios. No caso, houve uma preocupação salutar à agroecologia, pois, provavelmente seria impossível executar as politicas públicas agroecológicas sem a participação dos demais entes da federação, especialmente os Municípios, primeira estrutura do Estado a ser acessada e procurada pela família rural.

O art. 2º do Decreto, por sua vez, imbrica a agroecologia com a agricultura familiar, notadamente pelo conceito de produto oriundo da sociobiodiversidade. Por sociobiodiversidade compreende-se a produção que promove a conservação e o uso sustentável da biodiversidade e a garantia de alternativas de geração de renda para as comunidades rurais.

A inter-relação pressupõe que a norma articula e interliga a agroecologia com os conceitos e diretrizes da politica nacional da agricultura familiar constante da Lei Federal n.º 11.326/2006. Indica que os produtos gerados a partir das cadeias da agricultura familiar podem estar compreendidos na agroecologia e, ainda, que a agroecologia, nos termos da politica nacional da agricultura familiar, possui como diretriz básica a manutenção e valorização de praticas e saberes locais, a geração de renda, a melhoria da qualidade de vida e do ambiente.

Para tanto, as diretrizes da agroecologia no Brasil estão voltadas para o atendimento da dinâmica que envolve a produção oriunda da agricultura familiar e a produção orgânica, com destaque para: a) a promoção da soberania e da segurança alimentar e nutricional; b) o direito humano à alimentação adequada e saudável, por meio da oferta de produtos orgânicos e de base agroecológica isentos de contaminantes e que ponham em risco a saúde, c) a promoção do uso sustentável dos recursos naturais, d) a garantia das relações de trabalho que favoreçam o bem-estar de proprietários e trabalhadores, e) a conservação dos ecossistemas naturais, f) a recomposição dos ecossistemas modificados, por meio de sistemas de produção agrícola e de extrativismo florestal que reduzam o uso de resíduos poluentes e a dependência de insumos externos para a produção, g) a promoção da sustentabilidade, h) a valorização da agrobiodiversidade e dos produtos da sociobiodiversidade, i) o estímulo às experiências locais de uso e conservação dos recursos genéticos vegetais e animais, j) a ampliação da participação da juventude rural na produção agroecologia e, l) a contribuição na redução das desigualdades de gênero (art. 3º do Decreto n.º 7.794/2012).

Cabe ao Estado, para cumprimento das diretrizes da politica agroecológica a criação de um plano nacional; a instituição de crédito rural e a constituição do financiamento e do seguro agrícola; o estabelecimento de medidas fiscais e tributárias específicas; o investimento em pesquisa, inovação cientifica e tecnológica; a capacitação profissional e o acesso à educação e a assistência rural. (art. 4º e 5º do Decreto n.º 7.794/2012).

A gestão da politica agroecologia deverá ser realizada por meio da Comissão Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica – CNAPO e pela Câmara Interministerial de Agroecologia e Produção Orgânica – CIAPO, cuja composição é paritária entre o Estado e a Sociedade Civil. (art. 7º e 8º do Decreto n.º 7.794/2012).

Conclui-se, que a abordagem normativa agroecológica pretende, objetivamente, oferecer instrumento de Estado para a produção agrícola e o desenvolvimento de agroecossistemas que minimizem o uso de insumos químicos, valorizando proficuamente a saúde humana por meio do oferecimento de produtos saudáveis, conservando os recursos naturais e promovendo o desenvolvimento sustentável da comunidade rural.


Notas e Referências:

[1] FREITAS, E. R. de, BLANCO, M.S.SG. Agroecologia: conceito, 2010. Artigo em Hypertexto. Disponível <htttp://infobibos.com/Artigos/2010_2/agroecologia/index.htm> acesso em 02/06/2017.


 

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