As medidas socioeducativas para adolescentes: concepção, normativa e aplicação

17/12/2019

Coluna Direitos de Crianças, Adolescentes e Jovens / Coordenador Assis da Costa Oliveira

As medidas socioeducativas são uma espécie de “sanção” para aquele adolescente que comete um ato infracional. O termo sanção está propositalmente entre aspas, uma vez que, tecnicamente, um adolescente não recebe uma pena no sentido de suplício, punição, mas sim, uma medida que tem caráter pedagógico e que visa mostrar para este adolescente um mundo novo, o qual muitas vezes ele não conhece, qual seja, o mundo dos direitos e deveres, buscando assim que ele não cometa novamente o ato ilícito. Sendo importante também reafirmar que estas medidas visam de maneira pedagógica levar ao adolescente ao acesso a estes desconhecidos direitos e deveres e, bem como, tem como um dos objetivos principais a mudança de valores destes sujeitos.

Neste sentido, segue o conceito, retirado do site do Ministério da Cidadania, que nos diz o seguinte, “[o] adolescente autor de ato infracional é responsabilizado por determinação judicial a cumprir medidas socioeducativas, que contribuem, de maneira pedagógica, para o acesso a direitos e para a mudança de valores pessoais e sociais dos adolescentes.”[1]

Para ficar bem nítido, é importante trazermos que existem também as medidas de proteção, que são aquelas que são aplicadas quando há a ameaça ou a possibilidade de ameaça aos direitos das crianças e dos adolescentes, neste sentido segue o artigo 98 do Estatuto da Criança e do Adolescente- ECA:

Art.98 As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados:I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável;III - em razão de sua conduta[2].

Estas estão tipificadas a partir do capítulo II, do ECA. Retornando ao tema principal do presente artigo, as medidas socioeducativas, são aplicadas aos maiores de 12 anos e menores de 18 anos quando praticarem um ato infracional. Sendo esta caracterizado pela prática de um ato descrito como crime no Código Penal, mas que praticado por adolescente é chamado de ato infracional. É considerada para a aplicação da medida a data do fato, a capacidade de cumprimento pelo adolescente, às circunstâncias e a gravidade do ato infracional cometido. É preciso explicar que o princípio do devido processo Legal deve, necessariamente, ser respeitado quando da aplicação destas. Conforme artigo 110 do ECA, e bem como não se deve de maneira nenhuma se aplicar como pena os trabalhos forçados, de acordo com o artigo 112 §2º do Estatuto.

Quais são as Medidas Socioeducativas?

As medidas socioeducativas em espécie são: advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviços à comunidade; liberdade assistida; semiliberdade; e, internação.

Por advertência, concebemos o momento em que o juiz, em sala de audiência, irá advertir, falar de modo firme com o adolescente, demonstrando o quão ruim é para ele praticar um ato infracional, demonstrando a ele os prejuízos que ele irá ter em caso de cometimento de novo delito. Sendo esta reduzida a termo e assinada. Com relação à obrigação de reparar o dano, a autoridade poderá determinar que o adolescente devolva a coisa, e faça o devido ressarcimento do dano sofrido pela vítima, sendo possível também ser a reparação feita de outra forma que compense o prejuízo da vítima. 

No que diz respeito à prestação de serviços a comunidade, esta espécie de medida consiste na prestação de serviços a comunidade, ou seja, o adolescente realizará tarefas gratuitas de interesse social, por período não excedente há 6 meses, sendo estas feitas em hospitais, entidades assistenciais, escolas e outros estabelecimento congêneres, podendo também ser realizada em programas comunitários ou governamentais, estas atividades levarão em consideração as aptidões do adolescente, devendo ser realizadas em jornadas não superiores há 8 horas semanais, em dias úteis e não úteis. Desde que não prejudique a frequência escolar e/ou a jornada normal de trabalho.

Com relação à liberdade assistida, esta consiste no ato de o adolescente ser acompanhado, auxiliado e orientado por pessoas designada por autoridade competente, por prazo inicial de 6 meses, podendo a qualquer momento serem prorrogada, revogada ou substituída por outra medida.

O regime de semiliberdade, este consiste em uma forma de transição para o regime em meio aberto, ou seja, nesta espécie, é possível a realização de atividades externas, dependendo ou não de autorização judicial, sendo obrigatórias a escolarização e a profissionalização. Sobre a medida de Internação em estabelecimento educacional, diz Raissa dos Santos Silva em artigo publicado na revista eletrônica Conteúdo Jurídico

  A internação em estabelecimento educacional é a medida mais extrema, mas tem caráter pedagógico. A internação constitui medida privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento,

Seguindo o seu raciocínio, Raissa Silva nos brinda, dizendo o seguinte, “a medida não comporta prazo determinado, mas em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a três anos. Atingido o limite temporal, o adolescente deverá ser liberado, colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida.”[3]

De acordo com o artigo 122 do Estatuto da Criança e do Adolescente, são hipóteses para a aplicação desta medida: 1- O ato infracional é cometido mediante grave ameaça ou violência a pessoa; 2- Por reiteração no cometimento de outras infrações graves; 3- descumprimento reiterado e injustificável da medida anteriormente imposta. Sendo estas hipóteses taxativas, não podendo haver outras. Importante dizer que estas medidas podem ser aplicadas com as medidas de proteção previstas no artigo 101 do ECA. Podendo, antes de iniciado a lide procedimental para a apuração do ato infracional, o representante oferecer remissão, ou seja, perdão, devendo ser considerado esta como forma de exclusão do processo, se as circunstancias e consequências do fato forem boas, bem como o contexto social, a personalidade do adolescente, e o grau de sua participação no ato forem favoráveis. Caso haja concordância do juiz, este extinguirá o processo.

 

A medida socioeducativa gera impunidade?

Feitas estas considerações, é importante, agora, trazermos uma reflexão acerca do procedimento que apura os atos infracionais de crianças e adolescentes. A apuração de um ato infracional exige alguns atos, sejam eles, apresentados no fluxograma abaixo:

Obtido em: https://espacomacsilva.com.br/fluxograma-do-procedimento-de-apuracao-de-ato-infracional-atualizado-em-7-10-2016/

 

Sendo que, este procedimento se assemelha ao Processo Penal, com algumas peculiaridades, conforme a imagem abaixo:

Obtido em: https://jus.com.br/artigos/58583/medida-socioeducativa-uma-analise-a-partir-da-prestacao-de-servico

Como se verificou acima, não há que se falar de impunidade quando se trata de medidas socioeducativas, uma vez que impunidade, de acordo com o dicionário, significa ausência de punição, o que não se verifica no caso em comento, já que conforme vislumbramos acima, existe sim uma forma de “punição” para o adolescente que eventualmente venha a cometer um ato infracional, qual seja, as medidas socioeducativas. O que talvez cause esta sensação, é o fato de que a “punição” para este adolescente é bem diferente daquela que comumente conhecemos, ou seja, a ideia da medida socioeducativa é de cunho pedagógico, ou seja, não visa o punir por punir, mas sim visa mudar a ideia que aquele adolescente possui de mundo, visa mostrar valores a ele, visa em ultimo fim torná-lo um adolescente melhor e um adulto que não volte a cometer outros delitos.  Não que a pena no Processo Penal não tenha este fim, e tem, ocorre que, quando se trata de pessoas em desenvolvimento, este fim é bem mais presente. Deste modo conclui-se que, é preciso que se fale sobre o ECA, é imensamente preciso que escrevamos sobre ele para que todos saibam as suas normatizações, para que somente assim, possamos de uma vez por todas acabar com esta ideia de que, o adolescente não tem regras e fica impune.

 

Notas e Referências

[1] Cf. http://mds.gov.br/assistencia-social-suas/servicos-e-programas/servico-de-protecao-social-a-adolescentes-em-cumprimento-de-medida-socioeducativa-de-liberdade-assistida-la-e-de-prestacao-de-servicos-a-comunidade-psc

[2] Cf. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8069.htm

[3] Cf. http://conteudojuridico.com.br/consulta/Artigos/46743/estatuto-da-crianca-e-do-adolescente-aspectos-gerais-das-medidas-protetivas-e-das-medidas-socioeducativas

 

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