Introdução.
Para José Eli da Veiga (em artigo denominado Indicadores de Sustentabilidade)[1], embora capeiem a noção de sustentabilidade em quase todas as áreas do conhecimento, eles obrigatoriamente têm suas raízes nas reflexões de duas disciplinas consideradas científicas: a ecologia e a economia.
Para o agrônomo ecologista, a ecologia enfrentou o dilema de que sustentabilidade ecossistêmica corresponderia a um suposto ‘equilíbrio’” e que o conceito de resiliência seria a capacidade que tem um sistema de enfrentar distúrbios mantendo suas funções e estruturas. Ou seja, a aptidão do sistema absorver choques e ao mesmo tempo alcançar a eficiência da adequação e da reorganização para obter vantagens/benefícios ambientais.
Pelo viés ecológico, portanto, um ecossistema será eficiente quando fosse capaz de manter o nível de resiliência diante da baixa dos estoques de capital natural ou do equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a transformação do ambiente natural – a resiliência é a capacidade que o ambiente possui de processar, tratar, regenerar (“sobreviver”) diante da relação envolvendo os recursos naturais que são extraídos do ambiente para serem manufaturados e o resultado (resíduo) da produção industrial que são devolvidos para o ambiente.
Na economia, por sua vez, a discussão de sustentabilidade encontrou divergências a partir do conceito de sustentabilidade “fraca” e de “sustentabilidade “forte”. Jose Eli da Veiga explica que a sustentabilidade fraca toma como condição necessária e suficiente a regrinha de que cada geração legue à seguinte o somatório de três tipos de capital que considera inteiramente intercambiáveis ou intersubstituiveis: o propriamente dito, o natural/ecológico e o humano/social. Explica que na contramão está a sustentabilidade forte, que destaca a obrigatoriedade de que pelo menos os serviços do “capital natural” sejam mantidos constantes.
O enfoque econômico transporta intrinsecamente a premissa da economia de mercado, e toda mensuração estatística é relativa, por essência, em razão de que desconsidera os aspectos físicos, ou seja, não inclui a variação dos estoques de capital natural.
No Brasil, os índices estatísticos que pretendem medir a sustentabilidade estão organizados a partir de sistemas puramente econômicos, como é o caso do PIB – Produto Interno Bruto e do IDH – Índice de Desenvolvimento Humano. O PIB possui limitações uma vez que (a) não contabiliza como valor monetário as transações realizadas nas econômicas informais e (b) ignora os custos da degradação ambiental e da depleção dos recursos naturais. Já o IDH, por sua vez, negligência variáveis ligadas à área ambiental. Tal característica resulta em uma estatística limitada, pois, ao misturar variáveis de fluxo de renda (pessoal ou familiar) com as variáveis sociais (educação, saúde e emprego), toma por sustentável um dado local apenas pelos elementos econômicos, cerceando os aspectos do meio ambiente natural ou físico. Pelo IDH, o bem-estar de uma sociedade será melhor quanto maior for a renda, apenas a renda.
O presente ensaio pretende apontar, resumidamente, as questões relacionadas com os indicadores estatísticos que pretendem traduzir a sustentabilidade de um dado local em um determinado momento a partir dos argumentos e notas do Professor José Eli da Veiga.
A origem cientifica dos indicadores estatísticos em matéria ambiental.
Data de 1972, mesmo ano da conferência de Estocolmo, a publicação científica que resultou no embrião dos estudos acerca dos indicadores estatísticos sobre o meio ambiente, por William D. Nordhaus e James Tobin (série Economic Research do National Bureau of Economic Research – Estados Unidos. Neste primeiro momento, a discussão estava focada da percepção de obsolescência do crescimento econômico. O debate estava voltado para refutar o modelo de crescimento econômico associado ao incremento populacional e a voracidade da exploração dos recursos naturais (ou a perda de recursos naturais), a partir do crescimento econômico dos Estados Unidos da América.
Nordhaus e Tobin, estudando o PIB, chegaram à conclusão que era necessário encontrar uma medida capaz de medir a sustentabilidade a partir do bem-estar, trazendo para dentro do índice econômico, além das variáveis que regulam a produção; uma variável que pudesse expressar o bem-estar através da capacidade de consumo - a MEW – medida de bem-estar econômico.
O problema, visível da teoria de Nardhaus e Tobin foi a desconsideração dos danos provocados pela depleção dos recursos naturais, com a redução dos estoques de capital natural para manter a produção econômica.
Sucessor da medida de bem-estar econômico, a ISEW – medida de bem-estar econômico sustentável, organizada pelo economista Herman F. Daly foi uma importante ferramenta para medir a sustentabilidade, contudo, foi impactada pela dificuldade em realizar a medida dos danos ambientais em detrimento dos ganhos na qualidade de vida do Ser Humano – a melhoria da qualidade de vida gerava, inevitavelmente danos ao meio ambiente natural ou a redução do estoque de capital natural.
A metodologia econômica e as medidas de sustentabilidade.
O principal motivo (ou o motivo mais preponderante) que influenciou o fracasso dos métodos MEW e ISEW, foi o fato de que ambos utilizaram as bases metodológicas da economia para calcular a sustentabilidade, expressada pela qualidade de vida ou bem-estar.
A pegada ecológica, por sua vez, foi apresentada como um modelo estatístico cuja metodologia de abordagem excluiu as bases monetárias e incluiu índices de fácil compreensão e assimilação pelos diversos públicos com carência de um índice que fosse capaz de revelar a sustentabilidade a partir apenas da matriz do consumo.
Igualmente aos métodos MEW e ISEW, a pegada ecológica também foi criticada, especialmente pelo fato de não considerar (ou não conseguir medir) a capacidade regenerativa do ambiente, resultando em um déficit ecológico em relação ao processo de produção agrícola, por exemplo.
Outro método de medida da sustentabilidade apresentado ao mundo é proveniente do Butão – Índice de Felicidade Nacional Bruta do Butão (Felicidade Interna Bruta - FIB. O método FIB considera, ao contrário dos modelos tradicionais de medir a sustentabilidade, que o desenvolvimento de uma sociedade humana surge quando o desenvolvimento considerar (a) a promoção da educação e a inclusão social; (b) a preservação e promoção dos valores culturais; (c) a resiliência ecológica na base do desenvolvimento sustentável; (d) o estabelecimento da boa governança; (e) a preservação dos valores capazes de garantir a vitalidade comunitária; (f) a saúde; (g) o desenvolvimento sustentável para inclusão e potencialização do Padrão de Vida; (h) a diminuição da jornada de trabalho e promoção de tempo livre e de lazer; (i) o estimulo à participação em atividades esportivas e, (j) igualdade entre gêneros e liberdade de pensamento.
A crítica ao FIB decorre, exclusivamente, da suspeita de que não seja possível reproduzir o modelo de bem-estar e felicidade em outros países, dada as particularidades naturais, físicas e populacionais do Butão.
A Report by the Commission on the Measurement of Economic Performance and Progress.
A comissão criada no segundo semestre de 2009, trouxe importante contribuição para resolução dos impasses relativos aos índices estatísticos de sustentabilidade. A comissão concluiu que é necessário cindir os indicadores, ou seja, uma coisa é medir a economia, outra coisa é medir a qualidade de vida (bem-estar), e uma terceira coisa é medir a sustentabilidade do desenvolvimento. Assim, a comissão propôs o seguinte:
O PIB deve ser inteiramente substituído por uma medida bem precisa de renda domiciliar disponível e não de produto;
A qualidade de vida só pode ser medida por um índice composto bem sofisticado, que incorpore até mesmo as presentes descobertas desse novo ramo que é a economia da felicidade;
A sustentabilidade exige um pequeno grupo de indicadores físicos, e não de malabarismos que artificialmente tentam precificar coisas que não são mercadorias.
Vê-se, pela proposição da comissão, primeiro que os índices PIB e IDH, baseados na visão produtiva, não exprimem adequadamente a perspectiva econômica ambiental, segundo que a qualidade de vida deve considerar a economia da felicidade e, terceiro que a sustentabilidade deve considerar as bases naturais (estoques de capital natural) e a biocapacidade do ambiente promover a resiliência e a regeneração natural.
Sobre as proposições da comissão, o Professor José Eli da Veiga destaca três mensagens:
1ª – medir sustentabilidade difere da prática estatística standard em uma questão fundamental para que seja adequada, são necessárias projeções e não apenas observações.
2ª - medir sustentabilidade também exige necessariamente algumas respostas prévias e questões normativas. Também nesse aspecto há forte diferença coma atividade estatística standard;
3ª – medir sustentabilidade também envolve outra dificuldade no contexto internacional. Pois não se trata apenas de avaliar sustentabilidade de cada pais em separado. Como o problema é global, sobretudo em sua dimensão ambiental, o que realmente mais interessa é a contribuição que cada pais pode estar dando para a sustentabilidade global.
Conclusão.
A dimensão estatística do Meio ambiente pressupõe a análise do uso do recurso natural que entra na economia; como a economia devolve o recurso (inclusive na forma de resíduo) para o ambiente e a capacidade de o ambiente manter o ativo de estoques de recursos naturais, inclusive pela pela resiliência ou biocapacidade de tratamento, pelo ambiente, dos recursos devolvido ao meio ambiente.
Pelo artigo, restou claro que os índices utilizados pela maioria dos países não são adequados, notadamente, por não incluir a relação de consumo (ao contrário, valoram apenas a produção) e, também, por não incluir a biocapacidade do ambiente como uma variável.
Notas e Referências
[1] Texto elaborado a partir de notas e argumentos do artigo do Professor José Eli da Veiga.
Imagem Ilustrativa do Post: walk in the woods // Foto de: guilherme jofili // Sem alterações
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