Antígona: das raízes aos frutos

07/05/2016

Por Laura Mallmann Marcht – 07/05/2016

Antígona de Sófocles expõe um dos maiores debates contemporâneos, a esfera do justo e injusto. A tragédia inicia quando Édipo, amaldiçoado pelos deuses de Olimpo pela grande ambição da família por poder, desvenda o enigma da Esfinge e torna-se então, rei de Tebas. Sem saber que era seu pai biológico, Édipo mata Laio e casa com sua esposa Jocasta. Ao descobrir a relação incestuosa, Édipo arranca seus próprios olhos e se exila em Colono. Jocasta se suicida.

Polinices e Etéocles, filhos de Édipo, renegam o pai e acordam que alternariam o reinado anualmente. Ele lança então, uma maldição aos dois filhos para que morram nas mãos um do outro e não desfrutem de seu legado e após, morre em Colono. Um ano após o reinado de Etéocles, Polinices juntamente com os Sete Chefes, reclama seu direito ao trono de Tebas, lutando contra seu irmão que não respeitou o anteriormente acordado, concretizando a maldição de Édipo.

Suas outras duas filhas, Antígona e Ismene, entram em conflito quando Creonte (atual rei de Tebas e irmão de Jocasta) publica um édito que Polinices não poderia ser sepultado por atentar contra o bem estar de Tebas e quem desobedecesse, seria apedrejado até a morte. Etéocles teria o direito ao sepultamento, por ter defendido a cidade.

Ao comparar a obra à dificuldade da mulher contemporânea em ser reconhecida, nota-se que apesar da mesma ter conquistado espaço na sociedade, o preconceito é ainda intrínseco e presente em diversos âmbitos, Ismene retrata essa mulher, oprimida e amedrontada pelo poder do Estado. A mulher na Grécia Antiga, não era reconhecida como cidadã por ter seus direitos bastante restritos à manutenção econômica do lar e ao cuidado com os filhos.

Antígona, mesmo sabendo das conseqüências da contravenção de enterrar seu irmão, defende sua tradição por entender que há uma lei divina, universal e natural que ultrapassa o poder de um soberano, diz respeito a um mínimo de dignidade que merece um ser humano durante a vida e a morte, e o enterra com suas próprias mãos. Para ela, a morte será bem vinda e honrada, pois o plano terreno é inferior e temporário comparado a plenitude do plano supraterreno, representando a lei divina.

É a exposição do Direito Natural, em que ela acredita ser superior ao Positivismo de Creonte. Em contraposição, Creonte representa a lei humana e com autoritarismo e ganância, demonstra sua crença em que os fins justificam os meios e desconsidera os motivos pelos quais Antígona transgrediu a lei.

Hémon, filho de Creonte e noivo de Antígona, tenta interceder por ela e sem sucesso, é sentenciada à morte. Tirésias (leitor de oráculos) avisa Creonte que sofreria muito, pois os Deuses estavam furiosos com sua atitude radical sobre o destino de Polinices. Creonte resolve então, libertá-la, mas era tarde, ela já havia se matado para não esperar a morte. Hémon, também se suicida ao presenciar o ato final de Antígona, em seguida, Eurídice, mãe de Hémon e esposa de Creonte, não resiste a angustia de ver seu filho morto e vai de encontro à morte.

O conflito entre o interesse pessoal e o interesse público, a lei humana e a lei divina é o ápice da narrativa. Passado quase 2mil e 500 anos, e o Direito evoluído muito, ainda há a discussão sobre as normas que abrangem para além do mero Direito Positivo. Creonte representando o Estado e Antígona o indivíduo social e político. A desobediência civil de um indivíduo reprimido pela tirania do rei e a relação entre homens e deuses, com suas respectivas forças naturais, explicam porque a obra é atemporal e mundialmente conhecida.

A ironia do texto se encontra no fato de que tanto Antígona e Creonte são castigados por seus pontos de vista radicais. Antígona é castigada com a morte por achar que poderia tomar a posição de deusa e fazer o que achava justo e correto em seu ponto de vista. Creonte é ainda mais castigado, por desconsiderar a dor de Antígona em pensar que seu irmão não teria sua alma resguardada por conta da falta de sepultamento. Creonte percebe o que fez tarde demais e tudo poderia ser resolvido através do diálogo.

Os desejos da sociedade e do Estado sempre estiveram em conflito, nota-se isso na obra, mas como fazer para haver harmonia entre ambos? É o que Sófocles põe em questão, afinal, o Estado serve para organizar a estrutura da sociedade, mas se a mesma não estiver disposta a mudança e adaptação, não há como obter bons resultados, só haverá anarquia e o estado de guerra.


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Laura Mallmann Marcht. Laura Mallmann Marcht é acadêmica do Curso de Direito da UNIJUÍ-RS e bolsista voluntária no projeto de pesquisa “Direito e Economia às Vestes do Constitucionalismo Garantista”, coordenado pelo Prof. Dr. Alfredo Copetti Neto. . .


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O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.


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