Ainda sobre rock e os direitos civis: o casamento gay. O brown vs. board education de nossa geração

30/06/2015

 Por Germano Schwartz - 30/06/2015

Eu li o subtítulo dessa coluna em um post da timeline do Facebook do Professor Ivar Hartmann, da FGV-Rio. Copiei-o literalmente. Esse era o comentário do Ivarzinho, como gosta de chamá-lo o Paulo Cauduro, colega dele de docência nos idos da ESADE (hoje FADERGS), sobre o recente julgamento da Suprema Corte Americana que julgou ser impossível aos entes federados considerar ilegal o denominado casamento gay.  Nenhuma lei federal, portanto, poderá dizer que o casamento é a união entre homem e mulher, exclusivamente.

A decisão, tomada na semana passada, no dia 26 de Junho, é, de fato, histórica. Ainda mais no contexto americano, em que ainda impera, em muitos estados, especialmente os do “meio”e no Texas (quase um outro país), a visão puritana dos WASP (White, anglo saxon and protestant). Por essa razão ela correu o mundo. Real e virtual. Neste último, foi impressionante a quantidade de apoio que a decisão recebeu, especialmente na colocação das cores do movimento pró-casamento, com algum efeito visual, nas fotos do perfil de cada pessoa.

No Mestrado em Direito e Sociedade do Unilasalle/Canoas (aqui) há uma disciplina dedicada a estudar, comparativamente, as decisões judiciais de grande impacto no mundo todo e suas consequências no sistema social global. Chama-se Decisões Judiciais e Reflexividade Judicial e foi criada pelo Marco Jobim. A Cristiane Oliveira, sua professora atual, terá, agora, um novo desafio. Não tenho dúvidas de que estamos falando, como bem apontou o Ivar, do Brown vs Board of Education da nossa geração. Logo, mister se tornará o estudo de seus argumentos (para quem leu os votos, adianto que a ligação Direito e Sociedade é debatida à saciedade). Sobre as conexões do caso Brown vc Board of Education com o Direito & Rock, permitam-me reportá-los à recente coluna que escrevi aqui mesmo no Empório do Direito (aqui).

Veja-se. Estamos no ano de 2015. Mesmo estando no terceiro milênio, presenciamos reações medievais à decisão. No Brasil, substanciada por esse luminar da inteligência tupiniquim: Malafaia. Vocês conseguem imaginar, então, o que representou, nos USA, a figura de Little Richard? Um negro que cantava rock e que, pior, era homossexual? Em 1955 ele estourou na América com o hit Tutti Frutti. Você realmente achou que essa fruta a que ele se referia era, literalmente, uma fruta? Trata-se, na verdade, de uma gíria (“fruity”) que significa, basicamente, “agindo de modo gay“. Genial. Os Estados Unidos cantando que estava agindo de uma maneira gay. Subversão típica do rock.

https://www.youtube.com/watch?v=2bqeSGpP9PI

Agora mesmo estou lendo um excelente livro. Mate-me, por favor. Trata-se de um texto delicioso. Conta a história do punk por meio dos depoimentos de seus personagens principais, dentre eles Lou Reed. As primeiras páginas são diretas. O cantor do Velvet Underground não esconde sua preferência sexual e narra todas as suas aventuras à época. Seus pais tentaram curar sua “tendência homossexual” com tratamento de choque elétricos. Três vezes por semana. Na letra de Kill your Sons  ele demonstra seu sofrimento:

Seus dois psiquiatras estão lhe dando choques de dois bits

Eles dizem que vão deixá-lo morar em casa, com seu pai e sua mãe

Ao invés de ficar em um hospício

Mas toda a vez que você deseja ler um livro

Você não consegue chegar até a página 17

Porque você se esqueceu onde estava

Então, você, de fato, não consegue ler

Você não sabe que eles vão matar seus filhos?

https://www.youtube.com/watch?v=-e-CNQTHN8Y

Freddie Mercury, por seu turno, nunca escondeu sua homossexualidade. Orgulhava-se. Sua banda se chamava “Rainha”. O Quenn foi um dos maiores grupos da história. Sua grandiloquência e suas performances teatrais se escoravam, muito, no talento de Freddie. Em Good Old Fashioned Lover Boy  ele cantava:

Posso diminuir as luzes e te cantar músicas cheias de coisas tristes,

Podemos dançar tango só pra dois.

Posso fazer serenata e gentilmente tocar com as cordas do seu coração,

Ser seu Valentino, só pra você.

Ooh meu amor - ooh meu amante,

O que você vai fazer hoje à noite, hem rapaz?

Programe meu alarme, ligue meu encanto,

É porque eu sou um amante bem antiquado.

Ooh deixe-me sentir seu coração bater (cada vez mais rápido, mais rápido!)

Ooh, ooh deixe-me sentir seu amor esquentar,

Venha cá e sente-se na minha cadeira-elétrica de amor,

E diga-me o que você sente logo depois, é tudo que eu quero

Para que eu e você tenhamos um romance.

Diga a palavra - seu desejo e uma ordem

https://www.youtube.com/watch?v=PI3LAgGBxqU

No terreno do heavy metal, uma das bandas ícones do gênero, o Judas Priest, representou, por muito tempo, o supra sumo do “macho”, posto que hoje o Manowar toma para si. Qual foi a reação dos headbangers ao saber que um dos maiores vocalistas do rock de todos os tempos e frontman do Judas, é homossexual? No início, reprovação; agora, aceitação. Idolatria. Mas os sinais sempre estiveram lá, não? Roupas de couro e todo o visual estavam presentes para quem tivesse uma mente mais aberta.

https://www.youtube.com/watch?v=-e-CNQTHN8Y

Mais recentemente, no plano do black metal, Gaahl, do Gorgoroth, falou sobre ser gay nesta entrevista. O tecladista do Faith No More, Roddy Bottum, também comenta livremente sobre sua orientação. Sinal dos tempos. De um rock que, em Litlle Richard e outros, mais uma vez, antecipou-se. Gritou. Sofreu. Cantou. Mas agora, esse mesmo rock, na figura de tantos outros homossexuais, como era o caso, no Brasil, de Renato Russo e de Cazuza, entre outros, pode comemorar a recente decisão da Suprema Corte americana.

https://www.youtube.com/watch?v=m591K2awZi0  

Shiny Happy People!

  https://www.youtube.com/watch?v=iCQ0vDAbF7s


 

GermanoGermano Schwartz é Diretor Executivo Acadêmico da Escola de Direito das FMU e Coordenador do Mestrado em Direito do Unilasalle. Bolsista Nível 2 em Produtividade e Pesquisa do CNPq. Secretário do Research Committee on Sociology of Law da International Sociological Association. Vice-Presidente da World Complexity Science Academy.      

Publica na coluna semanal DIREITO E ROCK no Empório do Direito, às terças-feiras.                                                                                                                                                                                   


Imagem ilustrativa do post: Autor desconhecido // Com alterações Disponível em: https://lisarichardsrocknrollpolitics.wordpress.com/2014/06/20/marriage-equality-is-bull-what-equality-when-homosexuals-demand-all-rights-for-them-or-else/gay-communist/


 

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

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