ABDPRO #63 - O PROBLEMA DA EFICÁCIA DOS ATOS POSTULATÓRIOS E DO POSSÍVEL CONDICIONAMENTO DELA PELA VALIDADE DELES VISANDO AO INDICATIVO DE UMA SOLUÇÃO ANALITICAMENTE VIÁVEL À QUESTÃO DO CHAMADO ÔNUS ARGUMENTATIVO DAS PARTES  

19/12/2018

 Coluna ABDPRO

 

  1. Considerações iniciais

O texto de hoje tem um sentido muito especial para mim. Digo isso porque se, de um lado, aperfeiçoarei algumas concepções que antes defendidas; de outro, contudo, terei de criticar algo que já defendi, inclusive em publicações.

Tratarei do problema da eficácia dos atos do procedimento (mais especificamente, dos atos postulatórios). A ênfase por ser dada é referente à relação entre o plano de validade de tais atos e o plano de eficácia deles.

Para tanto, precisarei me valer de algumas premissas. O marco teórico é a concepção ponteana do fato jurídico.

    

  1. Distinção entre validade e eficácia do ato jurídico         

Como cediço, na concepção teórica acima, a vida do fato jurídico dá-se em três planos fenomênicos: existência, validade e eficácia, sendo o primeiro verdadeira condição de possibilidade para a ocorrência dos últimos.

Tendo o fato como existente, pode-se falar em sua validade (restrita aos atos jurídicos lícitos) e sua eficácia.

Antes de tudo, validade e eficácia são estados do ato jurídico. São qualidades dele, portanto. Pode-se dizer que o existir do fato tem a ver com a categoria da substância; a validade e a eficácia dele são acidentes seus.

Para ser válido e/ou eficaz, faz-se necessária a ocorrência dos chamados pressupostos de validade e, conforme o caso, de eficácia. Tendo, aqui, por pressuposto como aquilo que é necessário para algo: no caso para uma e para a outra. Assim, diz-se que: i) se presentes os pressupostos de validade, o ato é válido; ii) analogamente, se presentes os de eficácia.

É importante frisar, nesse sentido, que validade e eficácia (ex)surgem de algo (a ocorrência dos seus respectivos pressupostos). Compõem o “ser” do ato e, por isso, são passíveis de, sendo necessário, declaração, inclusive pela vida judicial.

Especificamente, validade tem a ver com a formalidade do ato. Válido – em Pontes de Miranda – é aquilo que está “despido” de defeitos; em contrapartida, inválido é o que está defeituoso. Eis a razão de, salvo previsão normativa expressa em contrário, os pressupostos de validade referirem-se às solenidades necessárias para a prática do ato.

Já a eficácia refere-se ao problema do poder de praticar o ato. Seja a existência dele mesmo, seja sua titularidade (= legitimidade). A não ocorrência destes não torna o ato debilitado, mas simplesmente ineficaz. Ou seja, na sua função, o ato é insuscetível de gerar seus efeitos, ao menos os precípuos.

É importante, todavia, distinguir os pressupostos de eficácia, das chamadas determinações inexas e daquilo que se conhece por elemento integrativo.

Como visto, pressuposto de eficácia é tudo que se faz necessário para que o ato tenha a qualidade de eficaz, ou seja: seja aptidão a produzir seus efeitos.

Nas determinações inexas (como a condição e o termo), pelo contrário, pressupõe-se que o ato tenha eficácia. Ou seja, tenha a potencialidade de produzir efeitos, sendo estes submetidos à alguma modalização. Uma coisa, por exemplo, é uma alienação praticada por quem não tem o poder de alienar (caso de ineficácia); outra é a alienação submetida a algum evento futuro e incerto (condição), caso do proprietário que aliena a coisa sob a condição de o adquirente constituir família. Neste último caso, o ato, em si, é eficaz, algo que lhe é externo (e, portanto, não lhe é causa) modula sua eficácia, tolhendo-a. Daí, com toda a propriedade, Pontes de Miranda usar o adjetivo “inexa” para designar esses acontecimentos.

Já os chamados elementos integrativos não dizem respeito à eficácia em si do ato jurídico, mas a algum determinado efeito específico. A distinção entre efeito precípuo e efeito específico é, desse modo, a chave para a diferenciar o autêntico pressuposto de eficácia do elemento integrativo. No exemplo da alienação, em se tratando de um bem sujeito a registro, como os imóveis, este não é necessário para a eficácia do ato de alienação propriamente: entre os acordantes, a alienação é eficaz; contudo, faz-se indispensável para que o acordo produza o efeito – contra quem for – de transmissão da titularidade do domínio.

Este último problema se apresenta no âmbito processual com muita importância, máxime no que tange aos negócios jurídicos processuais. Parte da processualística, no entanto, pelo que venho percebendo (não há espaço aqui para citar os responsáveis), vem dando causa a todo tipo de confusão quando do trato do tema.

 

  1. Relações entre os planos da validade e da eficácia         

 

Chego ao momento de estabelecer as relações possíveis entre o plano da validade e o da eficácia. O que se coloca aqui é uma verdadeira sintaxe deles. Ou seja, do ponto de vista lógico, como um se apresenta tendo o outro por referente.

Tal como será explicitado abaixo, o plano da validade é antecedente ao da eficácia. Isso, no entanto, não faz com que, a priori, haja qualquer tipo de  condicionamento entre o “ser” válido e o “ser” eficaz do ato. Tal relação depende, exclusivamente, do direito positivo. 

Por óbvio, até pelo já adiantado neste texto, o plano da existência é, sempre, necessário aos demais. Trata-se, aqui, de uma questão ontognosiológica, logo estranha a contingências do direito positivo.

O que não se tem, todavia, é a necessária sucessão: existência e, por isso, validade e, com esta, eficácia. Há quem, inclusive, fale numa suposta “escada ponteana dos planos”. Uma absurdidade se se levar em conta os postulados apresentados pelo jurista alagoano. Possivelmente, dita por quem nunca tenha se dado ao trabalho de, mesmo superficialmente, analisar a concepção teórica em que, pelo rótulo designado, parece se ancorar.

Em verdade, o ato (logo existente) pode ser válido e eficaz; inválido e ineficaz; válido e ineficaz e, por fim, inválido e eficaz. Tudo isso tem a ver com o preenchimento, ou não, dos respectivos pressupostos: como colocado, há pressupostos referentes à validade e outros referentes à eficácia.

Não obstante, é possível que a validade do ato condicione a eficácia dele. Aqui, a validade estrutura-se como antecedente lógico da eficácia. Assim, a falta de um pressuposto de validade, além de implicar invalidade do ato, acarreta o estado de ineficácia.

O contrário, entretanto, não é possível. Não por uma questão normativa, mas sim pela própria essência do ato. Não é crível que o estado de ineficácia implique defeituosidade, pois, como visto, o plano da validade antecede logicamente ao da eficácia, situando-se entre este e o plano da existência.  

Diante disso, dizer que a validade condiciona a eficácia é algo que soa natural; não obstante, é ao direito positivo que se reserva a operacionalização de tal condicionamento. Por motivos dos mais variados, como a questão em torno da previsibilidade (fundamento da segurança jurídica), imputa-se eficácia ao chamado ato jurídico defeituoso.

No âmbito do direito privado, todavia, por força de uma interpretação conjunta dos arts. 166, caput, 172 e 177, todos do CC, tem-se, como regra, a ineficácia do ato por força de sua defeituosidade. O mesmo dá-se no âmbito do direito do consumidor (art. 51, CDC).  

Desse modo, posto que o plano da validade como um todo anteceda ao da eficácia, o conteúdo dele (ou seja, o ser válido ou inválido do ato) não condiciona, em necessidade, o conteúdo do plano da eficácia.

Mas falar de ineficácia é algo mais complexo. É preciso analisar de forma pormenorizada a que efeito se está a aludir quando se diz que tal ato é ou não eficaz. Quando se diz, e. g., ser um contrato de compra e venda eficaz, alude-se ao fato de ele, gerando uma relação jurídica obrigacional, atribuir ao comprador o direito à coisa e, ao vendedor, o direito ao preço. Isso porque a eficácia desse tipo contratual é, precipuamente, a mencionada. Em contrapartida, dizê-lo ineficaz é referir-se à impossibilidade de ele produzir tal alteração nas esferas jurídicas dos sujeitos por ele envolvidos.

Quando se fala que não é ato de todo ineficaz deve-se, caso se tenha por fundamento as premissas ponteanas, colocar o problema em perspectiva. A razão é que, com mais propriedade, a eficácia do ato jurídico ineficaz é, em verdade, a eficácia de outro fato jurídico que tem o ato ineficaz na composição de seu suporte fático. É o que se dá com a alienação por quem não pode alienar, que, conquanto ineficaz, “gera”, presentes outros pressupostos, para o adquirente o direito ao ressarcimento por perdas e danos. Em rigor, a ineficácia do ato de alienação é reintroduzida no sistema como elemento do suporte fático do fato jurídico indenizativo.

Não obstante, a chamada eficácia precípua do ato jurídico pode ser muito complexa, de modo que é possível o ato ser, numa parte, eficaz e, ao menos numa outra, não o ser. Isso é fundamental para a compreensão dos atos do procedimento, especificamente dos atos postulatórios.

É o que se verá a seguir.

 

4. O problema da eficácia dos atos postulatórios           

Rapidamente, tem-se por ato postulatório, aqui, aquele pelo qual se requer a tutela jurisdicional, entendendo esta em seu sentido mais amplo, como, ao menos, alguma das tantas possíveis eficácias de uma decisão judicial. Desse modo, são atos postulatórios: a petição inicial, a contestação, o recurso, a impugnação à execução de sentença etc.

Consoante preconiza Pontes de Miranda, os atos postulatórios (a petitio, como muitas vezes ele chama) são compostos, basicamente, de: comunicação de fato (as alegações), comunicação de vontade (traduzida no pedido, aquilo que, de fato, se quer do Estado-juiz) e declaração de vontade (ou seja, a disposição acerca do que está ou não a ser processualizado).  

Não é demais ressaltar que os atos postulatórios compõem a cadeia procedimental, que, como um todo, é uma autêntica comunicação.  

Por óbvio, por se tratarem de atos jurídicos, têm os planos da existência, validade e eficácia em sua vida. Este texto não é local adequado para esmiuçar, nem mesmo categorialmente, os pressupostos referentes a cada um dos planos dos atos postulatórios. Além disso, a abordagem deve ser feita de modo individualizado para cada um dos tantos previstos na legislação processual vigente. Do contrário, não se terá Dogmática Jurídica, mas sim uma pseudometafísica de baixíssima qualidade. É sempre bom frisar: não há a possibilidade de análise apriorística do problema.  

É, contudo, objeto deste trabalho a demonstração de que a eficácia de tais atos deve ser entendida como um complexo. Nela, há variantes e variáveis. Desse modo, há erro em afirmações do tipo: “o ato processual, mesmo defeituoso, é eficaz até que seja nulificado”. O erro está no fato de que, em vez de analisar a estrutura do ato como um todo, desvelando onde nele há ou não eficácia, se toma o ato como um monólito, o que, definitivamente, ele não o é. Em tal tipo de erro, reconheço, já incidi tantas vezes, inclusive em obras publicadas, como meus comentários ao Sistema de Nulidades (art. 276-283) para o Novo Código de Processo Civil Comentado da Editora LUALRI.    

O recurso é um bom exemplo para esclarecer. Quando se diz que um recurso é eficaz faz-se alusão ao estado de ele poder gerar determinados efeitos, universalmente conhecidos, como efeito obstativo e o efeito devolutivo. Para estes, salvo se faltar algum pressuposto de eficácia ao ato recursal (como a tempestividade), o recurso, mesmo defeituoso, nasce eficaz.

Isso, contudo, não abrange toda a eficácia do ato recursal. Como ato postulatório que é, ele existe para produzir outros efeitos. Por exemplo, a interposição do recurso gera para o Estado-juiz o dever de conhecê-lo para, no mínimo, analisar sua admissibilidade. Observe-se que tal dever não pré-existe ao recurso, é a interposição deste que o faz existir.   

Ademais, com a interposição, gera-se o dever de admissão caso estejam presentes seus pressupostos para tanto. Aqui, tem-se o nó górdio do problema: a produção do dever de admissão não depende da simples interposição (e, logo, da “mera” existência do ato recursal), mas sim do preenchimento dos aludidos pressupostos. Ou seja, para tanto, o recurso precisa ser válido e eficaz, de modo que, caso tenha algum defeito (em se tratando da validade), fica impossibilitado de gerar tal efeito. Aqui, o estado de validade do ato condiciona, posto que não totalmente, a eficácia do ato.

É importante frisar que a interposição defeituosa é reintroduzida no sistema como elemento do suporte fático do fato jurídico que gera para o recorrente o direito a sanar o recurso (por força, na generalidade, do parágrafo único do art. 932, CPC).

Portanto, parece estar demonstrado o fato de que o que se tem pela eficácia de um ato processual (no que importa a este texto, mais especificamente, do ato postulatório) é um complexo, de forma que cada parcela dele deve ser analisada separadamente.

 

Sendo isso certo, deve-se repelir, por total falta de cientificidade, definições como a mencionada acima, que não passam de lugares-comuns retóricos de pouquíssima densidade.   

Agora passarei a enfrentar o problema do chamado ônus argumentativo das partes a partir do que foi aqui estabelecido.

 

  1. Observações necessárias sobre o modo como neste texto se tem a questão do ônus argumentativo das partes

Neste texto, não estou tomando partido de que as partes têm, por analogia com os deveres argumentativos do juiz previstos no § 1° do art. 489, CPC (mais especificamente seu inciso V), o ônus de bem articular suas postulações. Estou apenas tendo essa ideia – transformada em última moda pela processualística – como um dado a fim de, diante disso, dizer como fica a questão da validade/eficácia do ato postulatório.   

Sabe-se que, tal oneração, vai além da descrição das questões de fato (aqui, em observância ao disposto no inciso III do art. 319, CPC), de modo que se impõe  às partes, de igual modo, a justificação das chamadas questões de direito. 

O tema, todavia, precisa ser muito mais bem esclarecido, em especial no que tange às suas condições de possibilidade e às diversas consequências que dele advêm. 

No primeiro caso, por exemplo, pode-se falar em necessidade de a parte ter de descrever o texto normativo referentes a regras originantes de seu direito (por estas, entenda-se aquelas que, pela incidência, geram o direito subjetivo a que a parte diz ter)?

No segundo caso, pode-se dizer que, na hipótese de a parte deixar de alegar um determinado fundamento jurisprudencial (algum precedente que influencie a sorte de sua causa), ela não poderá mais dele se valer, recorrendo, por exemplo, com base no mencionado fundamento?

O labor dogmático é complexo. Exige de que quem o faça o exame – na maior razão possível – de todas as condições de possibilidade das teses defendidas e, além disso, de todas as consequências que, por lógica, disso advêm. Apenas “lançar a ideia”, como muito se faz, é algo antidogmático, constituindo uma pseudometafísica nos moldes já afirmados.

Como este texto tem por finalidade muito mais provocar aqueles que defendem esta mencionada temática de última moda, e não propriamente a ela aderir, tomarei, como dito, a tese acima com algo dado, de modo a dar a ela uma escorreita roupagem analítica.

Desse modo, tomo, aqui, por ônus argumentativo das partes a alegação e a adequada articulação das chamadas questões de direito (incluindo-se nestas o que se tem por fundamentos jurisprudenciais e, até mesmo, doutrinários) nos atos postulatórios.   

 

6. Uma distinção fundamental: não alegação e alegação desarticulada da matéria 

Por matéria, tenho exatamente as questões de direito nos moldes delineados acima. Mas não basta elas em si mesmas, o que tem importância para o processo é a alegação delas. O relato que, pelos diversos suportes textuais que a normatividade processual estabelece (como as petições), delas se faz, mais propriamente. Juridicamente, esses relatos têm natureza de comunicações de fato (Pontes de Miranda), sendo partes integrantes dos atos postulatórios.  

Só por isso a distinção indicada no título deste item se faz imperiosa; pela própria essência o não alegar (um nada, dentro deste contexto) difere do alegar mal, que é um ser, embora imperfeito.   

Pragmaticamente, no entanto, a distinção tem mais impacto. Isso porque as consequências de um e de outro caso são completamente diferentes, sequer se podendo falar em oposição delas. 

Por nada ser, o não alegar sequer dá ensejo ao âmbito para se poder falar em validade/invalidade e eficácia/ineficácia. E por um motivo muito simples: em termos jurídicos, ao não alegar a matéria, não se tem suficiência do suporte fático quanto ao ponto. Ela não existe como substância apta a gerar ao Estado-juiz o dever de apreciar a questão.

Deixo claro: não é que o ato postulatório, como ato jurídico, não exista, porquanto, para isso, é bastante o pedido (o petitum é o elemento de suficiência do suporte fático de tal tipo de ato). Mas, posto que haja ato postulatório, ele não existe como fundado naquela matéria não afirmada. O raciocínio a ser aqui empregado é o mesmo que se utiliza para a causa de pedir que, em concorrência com outra, pode fundar um determinado pedido: caso um pedido possa lastrear-se em duas ou mais causas de pedir, não se pode dizer que há pedido fundado em alguma delas que não fora deduzida, embora o pedido em si exista.

O não alegar não é um problema, portanto, de eficácia/ineficácia do ato postulatório, muito menos de validade/invalidade dele. Simplesmente, no caso, não há ato postulatório fundado naquilo que não fora alegado. Com maior simplicidade, pode-se dizer: não há aquela determinada matéria a justificar o ato postulatório. Em termos de ônus argumentativo, é de dizer não ter sido observada sua exigência.  

Já se esta última tiver sido mal alegada, o panorama é bem diverso. Aqui se tem a substância, embora deformada. Há um vício na postulação, e não sua ausência, mesmo que circunstancial. A hipótese aqui é de má observância do ônus argumentativo.   

Dito isso, passo a analisar a problemática dentro das premissas de validade/invalidade e eficácia/ineficácia já estabelecidas

  1. A má observância do ônus argumentativo dentro do contexto da validade/invalidade e eficácia/ineficácia dos atos postulatórios 

É de se perguntar, com o rigor necessário, observar o ônus argumentativo é algo referente à validade ou à eficácia do ato postulatório? Tal observância seria um pressuposto de validade ou um pressuposto (propriamente) de eficácia deste último?

Ora, diante do que já se disse, sabendo que não há texto legal especificando algo diverso, não se pode dizer outra coisa que não seja ser relativo à validade o pressuposto em questão. Isso porque não se trata de algo que tenha a ver com o poder de praticar o ato postulatório, como a titularidade dele. É algo referente à sua solenidade, mais especificamente um pressuposto de cariz argumentativo-redacional.  

Logo, sendo de validade, sua não observância ocasiona, no ponto, a invalidade do ato postulatório. É preciso frisar, por mais que o encadeamento lógico do que aqui se está a dizer faça denotar, que o estado de invalidade não é do ato postulatório como um todo. Cinge-se ao ponto que liga este último à matéria (questão de direito) mal articulada. Quanto ao restante, presentes, claro, os respectivos pressupostos, a postulação é válida.

E, por ser de validade o problema, há de se verificar se se está diante de um caso para aplicação de alguma regra que possibilite a sanação do defeito do ato, de modo a validá-lo. Tal regra não só existe no sistema de modo geral (art. 283, CPC, acima de tudo), como também é replicada para as especificidades, caso da petição inicial (art. 321, CPC) e dos recursos (parágrafo único do art. 932, CPC). Sua previsão genérica, contudo, é importantíssima para, em supletividade, ser invocada para casos nos quais não haja previsão específica, o que se dá com a contestação, por exemplo.   

A sanação, aqui, ocorre por correção do defeito. Ou seja, ao praticante do ato postulatório imputa-se o ônus de emendar. Ao Estado-juiz compete possibilitar ao onerado a emenda, algo que se perfaz com a intimação deste último para tanto, sob pena de, agora sim, inadmissibilidade.

Repare-se, a consequência pela não observância deste segundo ônus (não o de bem articular inicialmente, mas o de consertar a articulação malfeita) é sim uma inadmissibilidade; não do ato postulatório como um todo, mas sim de sua porção que resta maculada (aplica-se, aqui, o disposto na segunda parte do art. 281, CPC).  

Do ponto de vista da eficácia do ato, o caso se encaixa no modelo da validade condicionante da eficácia. Não desta como um todo, mas sim da porção maculada, até porque, havendo condicionamento da eficácia pela validade, ele só pode se dar, obviamente, naquilo que no todo do ato está debilitado.

Isso significa dizer que, enquanto pendente o defeito, não há de se falar em dever do Estado-juiz analisar a matéria mal articulada, sendo a possibilidade de tal dever ser gerado completamente encerrada na hipótese de, na forma acima estabelecida, vir a ocorrer a inadmissibilidade.

Atente-se, todavia, que o estado de ineficácia acima diz respeito tão-somente ao dever de apreciar aquela determinada matéria.

Eis, portanto, mais um exemplo de pressuposto de validade condicionante da eficácia de ato postulatório.

São essas, por ora, minhas considerações sobre este relevante tema.

 

 

 

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