A tributação sobre lucros e dividendos em face da capacidade contributiva

24/02/2019

Desde 1996, com a alteração trazida pelo art. 10 da lei 9249, os lucros e dividendos distribuídos pelas empresas a seus sócios ou acionistas são isentos da cobrança de Imposto de Renda, tributando-se apenas o lucro diretamente na empresa. Sem entramos no debate existente entre as diferentes posições ideológicas relativas ao tema, discutiremos, de forma breve, a compatibilidade entre a isenção trazida pelo dispositivo e a Constituição Brasileira, mais precisamente, com o princípio da capacidade contributiva, presente no artigo 145, § 1, que dispõe: “sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte...”.

Resumidamente, podemos dizer que do referido princípio decorre que o Estado deve exigir das pessoas que contribuam para as despesas públicas de acordo com sua capacidade, ao passo que, os que detêm maior poder econômico contribuam progressivamente mais, em comparação aos menos providos de riqueza¹.

É sabido que o sistema tributário brasileiro impõe alta carga tributária ao contribuinte, têm pouca progressividade, além de ser extremamente complexo. Essa falta de progressividade tem sido alvo de pesquisas recentes, entre elas, o estudo intitulado “Tributação e distribuição da renda no Brasil”, realizado pelo Centro Internacional de Políticas para o Crescimento Inclusivo (2015)².

Segundo o estudo: “Os brasileiros super-ricos pagam menos imposto, em proporção da sua renda, que um cidadão típico de classe média alta, sobretudo o assalariado, o que viola o princípio da progressividade tributária, segundo o qual o nível de tributação deve crescer com a renda. Cerca de dois terços da renda dos super-ricos (meio milésimo da população) está isenta de qualquer incidência tributária, proporção superior a qualquer outra faixa de rendimentos. O resultado é que a alíquota efetiva média paga pelos super-ricos chega a apenas 7 por cento, enquanto a média nos estratos intermediários dos declarantes do imposto de renda chega a 12 por cento.”

Os pesquisadores concluem ainda que esta distorção se deve, em grande medida, a isenção da cobrança de imposto de renda sobre lucros e dividendos, sendo que: “Dos 71 mil brasileiros super-ricos, cerca de 50 mil receberam dividendos em 2013 e não pagaram qualquer imposto por eles.” Da lista dos países que integram a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento (OCDE), apenas a Estônia tem dividendos totalmente isentos de imposto de renda, assim como o Brasil³.

Conforme se extrai da pesquisa supracitada, estamos tributando regressivamente quem possui maior capacidade econômica, ao isentarmos a distribuição de lucros e dividendos. Enquanto os ganhos obtidos pelos trabalhadores na forma de salário podem ser tributados em até 27,5%, empresários e acionistas são isentos quando recebem rendimentos a título de lucros e dividendos.

Neste sentido, tramita o PL 588/2015, que objetiva: “fazer incidir o Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF) calculado à alíquota de 15% sobre a distribuição de lucros e dividendos a pessoas físicas e jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior – isentando os empresários cujas empresas estão inscritas no Simples”.

Os últimos governos têm se furtado de enfrentar o assunto. Entretanto, urge a necessidade de se debater, em nosso Legislativo, doutrina e Judiciário, a possível incompatibilidade entre a referida isenção e os princípios que regem nosso sistema tributário, de sobremaneira a capacidade contributiva, bem como deve-se buscar alternativas para, no caso de retornarmos ao que a legislação previa até 1995, se evitar a bitributação e a sonegação fiscal.

 

Notas e Referências

1 - Paulsen, Leandro. Curso de direito tributário completo / Leandro Paulsen. – 8.ed. – São Paulo: Saraiva, 2017.

2 - http://www.ipc-undp.org/publication/27816

3 - https://www.nexojornal.com.br/expresso/2016/04/08/Como-o-sistema-tribut%C3%A1rio-brasileiro-colabora-para-a-desigualdade

 

 

Imagem Ilustrativa do Post: Texas State Capitol, Austin // Foto de: hampusklarin // Sem alterações

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