A Técnica de Seleção do Estudo de Caso na Metodologia da Pesquisa em Direito

20/12/2021

Coluna O Direito e a Sociedade de Consumo / Coordenador Marcos Catalan

Nos últimos textos desse autor para o Empório do Direito, promoveu-se análises sobre a atuação do Governo Federal e suas conexões com temas relevantes (e preocupantes) da Sociologia do Direito como a Necropolítica, o Pensamento Fascista e atuação em prol da Barbárie. No entanto, acredita-se que já estamos em um nível alto de desgaste com a realidade (e o surrealismo) que 2021 apresenta-se. Por esse motivo, entende-se por ser interessante aliviar o foco a conexão entre ciência política e sociologia do direito e, assim, direcionar pensamento ao estudo metodológico.

Dessa forma, longe de ser um abandono ao pensamento crítico característico dos escritos desse acadêmico, o presente texto busca um diálogo sobre Metodologia da Pesquisa em Direito (MPD), a fim de também contribuir com os pesquisadores da área de interlocução. Nesse sentido, esse trabalho propõe uma reflexão sobre a Técnica de Seleção do Estudo de Caso aplicadas a MPD.

Com isso, a base fundacional desse pequena reflexão consiste em explicitar os meios de seleção da estratégia de pesquisa do Estudo de Caso em relação a outras técnicas investigativas e, assim, promover um elemento de estímulo aos investigadores quando necessitarem estruturar suas definições metodológicas de pesquisa. Ademais, a MDP do Estudo de Caso é uma estratégia de pesquisa empírica capaz de alcançar dados empíricos que outra técnicas não permitem, mas, mesmo assim, ainda muito pouco utilizada nas ciências jurídicas e sociais.

Assim, de acordo com Robert Yin (2001, 24), a escolha entre as principais estratégia de pesquisa em ciências sociais parte de cinco opções: (i) experimento, (ii) levantamento, (iii) análise de arquivos, (iv) pesquisa histórica e (v) estudo de caso. Importa destacar que o autor propõe essas cinco estratégias direcionadas para pesquisa em ciências sociais e que, no presente trabalho também se entende como alusiva às MPD.

Em sequência, Robert Yin expressa que a escolha de qual dessas estratégias será a mais adequada para a pesquisa depende de três condicionantes. As três deposições do autor podem ser resumidas em:  

  • Por meio de que forma se promove a questão de pesquisa?;
  • A extensão de controle que o pesquisador posasui sobre os eventos comportamentais envolvidos?;
  • O grau de enfoque do acontecimento enquanto histórico ou contemporâneo?.

Nesse sentido, cada estratégia será mais apropriada de acordo com o objetivo da pesquisa e, assim, para definir qual estratégia, deve-se seguir a tabela abaixo:

Tabela 1 – Estratégias de Pesquisa

Estratégia

Forma da questão de pesquisa

Exige controle sobre eventos comportamentais?

Focaliza acontecimentos contemporâneos?

 

Experimento

Como, Por que

Sim

Sim

Levantamento

Quem, O que, Onde, Quantos, Quanto

Não

Sim

Análise de Arquivos

Quem, O que, Onde, Quantos, Quanto

Não

Sim/Não

Pesquisa Histórica

Como, Por que

Não

Não

Estudo de Caso

Como, Por que

Não

Sim

(Fonte: Cosmo Corporation em (Yin, 2001, p. 24)

Tendo em consideração o quadro acima, a primeira questão que se deve promover direciona-se a forma da questão de pesquisa. Deste modo, a estratégia de pesquisa do Estudo de Caso será a mais indicada quando a pergunta de pesquisa apresentar-se através de questionamentos iniciados por “Como” ou “Por que”. Assim, se a pergunta de pesquisa, por exemplo, for “Como se comportou o Juiz ou Tribunal ou Porque se comportou assim o Juiz ou Tribunal?”, é possível que se esteja lidando com uma investigação que tenha como melhor estratégia o Estudo de Caso.

No entanto, outras duas questões devem ser abordada antes dessa definição. A primeira dessas questões consiste em definir se a investigação exige controle sobre eventos comportamentais. Por esse ângulo, torna-se necessário o estudo definir a abrangência que o pesquisador possui no controle dos eventos comportamentais associados à pesquisa e, com isso, questionar-se: o estudo exige controle sobre eventos comportamentais?

Não como uma regra absoluta, mas é pouco comum nas pesquisas sóciojurídicas o investigador deter esse controle sobre os eventos comportamentais associados, sendo essa condição mais comumente reservas da pesquisas aos estudos de medicina ou psicologia. Deste modo, em o estudo respondendo de forma negativa a capacidade de regulação das ocorrências comportamentais e, assim, sem pretensões metodológicas de controle analítico de comportamento, a investigação afasta-se também da estratégia de Experimento.

A segunda estratégia, por sua vez, proposta pelo autor Yin, consiste em identificar se o enfoque de investigação tem como foco acontecimentos sob uma perspectiva de eventos contemporâneos ou de acontecimentos históricos. Há uma proximidade entre essas duas estratégias, na qual Robert Yin admite inclusive uma sobreposição de técnicas, mas algumas fontes de dados os diferenciam. Nas palavras do próprio autor

O estudo de caso é uma estratégia escolhida ao se examinarem acontecimentos contemporâneos, mas quando não se podem manipular comportamentos relevantes. O estudo de caso conta com muitas técnicas utilizadas pelas pesquisas históricas, mas acrescenta duas fontes de evidências que usualmente não são incluídas no repertório de um historiador: observações diretas e série sistemática de entrevistas. Novamente, embora os estudos de caso e as pesquisas históricas possam se sobrepor, o poder diferenciador do estudo é a capacidade de lidar com uma ampla variedade de evidências – além do que pode estar disponível no estudo histórico convencional (Yin 2001, 27).

É interessante que esse processo de decisão da estratégia de pesquisa proposta por Robert Yin é promovida por meio de uma lógica ou dinâmica de exclusão, verificando-se através dos tipos de questões de pesquisa (a forma da questão da pesquisa; a extensão de controle que o pesquisador tem sobre os eventos comportamentais e o grau de enfoque do acontecimento enquanto histórico em oposição a acontecimentos contemporâneos). Nesse sentido, parte-se da definição da estratégia de investigação que a pesquisa não se encaixa, a fim de definir qual estratégia apresenta-se com mais adequada.

Além disso, existe outra vantagem relevante para a escolha do Estudo de Caso na perspectiva de Robert Yin. De acordo com o autor, o estudo de caso consiste na estratégia mais adequada para se trabalhar o “Como” ou “Por que” de acontecimentos contemporâneos, dos quais o investigador possui pouco ou nenhum controle em relação aos fatos envolvidos (Yin, 2001, p. 28). Assim, mais uma vez, a estratégia de Estudo de Caso aparece como apropriada para pesquisas sóciojurídicas, na medida em que costumeiramente os investigadores não possuem controle sobre os acontecimentos contemporâneos vinculados, na medida em que os fatos jurídicos gerados pelos atores envolvidos são totalmente alheios ao controle do investigador.

Assim, pensar sobre a Metodologia de Pesquisa em Direito através da estratégia do estudo de caso é bastante relevante para a evolução das investigações de campo jurídico. Nesse sentido, é salutar expor que todas as estratégias de pesquisa possuem vantagem e desvantagens, avanços e limitações para a pesquisa, afinal seu escopo é promover os alicerces estruturais, as ancoragens fundacionais que sedimentam o escopo da pesquisa. 

Nesse sentido, é manifesto que os desafios de uma pesquisa vão muito além das orientações metodológicas, perpassando pela revisões do estado da arte na temática selecionada, definições do problema, da justificativa e da hipótese de pesquisa. Ademais, sem nunca esquecer das necessárias condições materiais para o desenvolvimento da investigação, bem como do próprio financiamento do pesquisador.

Portanto, com o intuito de estímulo à ciência nacional, com especial destaque para as pesquisas sóciojurídicas, que o presente texto expõem a Técnica de Seleção do Estudo de Caso na Metodologia da Pesquisa em Direito.

 

 

Notas e Referências

Burawoy, Michael. 1998. “The Extended Case Method”. Sociological Theory 16(1): 04/33.

Chizzotti, Antônio. 2006. Pesquisa em Ciências Humanos e Sociais. Petrópolis, RJ: Editora Vozes.

Gil, Antonio Carlos. 2008. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. São Paulo: Atlas.

Konzen, Lucas. 2013. “Norms and Space: Understanding Public Space Regulation in the Tourist City”. Tese de Doutorado. Universidadde de Milão.

Santos, Boaventura de Sousa. 1983. “Os Conflitos Urbanos no Recife: O caso do Skylab”. Revista Crítica de Ciências Sociais (11): 09/60.

Stake, Robert. 2006. Multiple Case Study Analyses. New York: The Guildford Press.

Yin, Robert. 2001. Estudo de Caso: Planejamento e Métodos. 2o Edição. São Paulo: Bookman.

 

Imagem Ilustrativa do Post: Statue of Justice - The Old Bailey // Foto de: Ronnie Macdonald // Sem alterações

Disponível em: https://www.flickr.com/photos/ronmacphotos/8704611597

Licença de uso: http://creativecommons.org/licenses/by/4.0/legalcode

O texto é de responsabilidade exclusiva do autor, não representando, necessariamente, a opinião ou posicionamento do Empório do Direito.

Sugestões de leitura